Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador . Nova Zelândia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador . Nova Zelândia. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 20 de julho de 2020

A política da negação - Fernando Gabeira

Em Blog

domingo, 31 de maio de 2020

O efeito colateral e o “critério científico” - Alon Feuerworker

Análise Política


As medidas de isolamento e afastamento sociais são apontadas desde o começo da ação do SARS-CoV-2 como essenciais para, como se diz, achatar as curvas de infecção e mortes pelo novo coronavírus. O objetivo desejado, e totalmente legítimo, é evitar o colapso do sistema hospitalar.

Mas o achatamento tem efeito sobre os dois eixos, o horizontal (x) e o vertical (y). Se empurram para baixo o y máximo, jogam para adiante os valores de x onde o y ainda é significativo. O já célebre gráfico abaixo (clique nele para ampliar), um hit desde o começo da pandemia, explica bem:

Outro gráfico, agora obtido a partir de dados colhidos na vida real (clique na imagem para ampliar), mostra que as iniciativas para achatar a curva por aqui talvez tenham mesmo alcançado algum sucesso. Comparado com os países mais em evidência na pandemia, o Brasil parece ter reduzido a inclinação da curva na sua etapa ascendente:
 
A fonte é o hotsite do Financial Times especializado na Covid-19, e as curvas representam a média móvel dos sete dias mais recentes de novas mortes registradas diariamente. O que é, atenção!, diferente de mortes diárias. Mas todo sucesso tem um preço, um efeito colateral. O nosso é as medidas de isolamento já estarem de língua de fora, perdendo o fôlego, enquanto a curva ainda sobe.
Outro efeito colateral: a bagunça política, sem par no planeta, impediu que a curva achatasse o tanto que podia.

Como o Brasil não é um país nórdico, nem uma Nova Zelândia, não dá para estender indefinidamente o isolamento à espera de a curva começar a descer.
Ou talvez desse, desde que o governo e a opinião pública estivessem verdadeiramente dispostos a sustentar a economia (imprimir dinheiro, fazer dívida) até a curva embicar para baixo.

Tem gente boa que defende fazer assim, mas a hegemonia intelectual está do outro lado. Por isso, vivemos um período de certa loucura, em que se defende simultaneamente 
1) o lockdown “até a vitória final” e 
2) manter a aversão à expansão ilimitada do gasto público.

O que só seria possível se amplas camadas da população estivessem dispostas a ficar sem ter o que comer à espera de o vírus ser finalmente neutralizado. Improvável. Então a vida impõe-se. As atividades vão voltando pouco a pouco de modo irrefreado e na prática caótico, enquanto os governantes se escondem atrás de marquetagens disfarçadas de “critério científico” para justificar a volta nestas circunstâncias, só para não admitir que estão sendo atropelados pelos acontecimentos.

Havia opções, claro. Uma era bloquear geograficamente a expansão do vírus desde muito antes de este espalhar. Fechar o país, e no país fechar as cidades e regiões em que aparecessem casos. Vem dando certo em Hubei, e no resto da China. Mas agora é engenharia de obra feita. Ninguém com poder decisório propôs isso a tempo. E vamos pagar por esse lapso não apenas em mortes. Pagaremos também em um prolongamento do sofrer econômico. Que é função direta da falta de confiança do público. Confiança que anda em baixa e assim ficará por um bom tempo.
Também porque a descoordenação e os conflitos na política levam o cidadão e a cidadã com um mínimo de bom senso a puxar o freio de mão nas despesas, pessoais e empresariais.

Alon Feuerworker, jornalista e analista político - Análise Política

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Alto risco de tragédia - Fernando Gabeira

Em Blog

Um governo que se aproxima de uma situação limite numa pandemia 

Para viabilizar sua trajetória política, Moro precisará se distinguir de Bolsonaro

Num momento em que todos reprisam, o governo é pródigo em lançar novelas inéditas. Mal acabou a novela Mandetta, entrou no ar a Sergio Moro, e começaram as filmagens da Paulo Guedes. O que está acontecendo na cabeça do presidente Bolsonaro? Ela foi sacudida pelo impacto do coronavírus.  Muitas mudanças estão sendo determinadas, no fundo, pela política escolhida por Bolsonaro para enfrentar este que é o maior acontecimento trágico no mundo moderno. Onde governos conservadores ou progressistas triunfaram, como é o caso da Austrália e da Nova Zelândia, Bolsonaro afundou.

Desde o princípio, tenho apontado a causa. Bolsonaro aderiu à camada de gordura que cerca o vírus e seus fluidos ideológicos e o transformou num tema da guerra cultural. Exatamente o oposto do que fizeram Scott Morrison, na Austrália, e Jacinda Ardern, na Nova Zelândia: despolitizaram o vírus.

Ainda esta semana, o chanceler Ernesto Araújo escreveu um artigo contra o que chama de comunavírus. Ele ficou impressionado com um livro do pensador de esquerda Slavoj Zizek que previa enfim a chegada do comunismo. Depois de sonhar com a classe operária ou mesmo o lúmpen proletariado, alguns teóricos de esquerda concentram suas esperanças no vírus como agente transformador. E os bolsonaristas acreditam.

Desde o princípio, Bolsonaro viu a chegada do vírus como algo que ameaçava seu governo. A única forma de neutralizar sua importância era adotar uma tese que permitisse neutralizar os impactos econômicos. Esta tese foi a de imunização de rebanho: a maioria vai ser contaminada, é melhor que isso aconteça logo para que nos livremos do vírus.  Bolsonaro jamais considerou seriamente o fato de que, se muitos se contaminarem ao mesmo tempo, o sistema de saúde entraria em colapso, muitas pessoas morreriam na porta dos hospitais ou em casa. Um cenário que, de certa forma, se desenhou na Itália e mais tarde, de forma grotesca, em Guayaquil. Foi por aí que caiu Mandetta. E indiretamente Moro. Bolsonaro sempre pensou em concentrar poderes. Mas a impossibilidade de determinar sozinho uma política contra o coronavírus condensou seu drama. Os governadores e prefeitos tiveram um papel decisivo. O Congresso os apoiou, o STF chancelou essa autonomia local. [Resumindo: o Congresso e o STF deram aos  governadores e prefeitosbônus de saciar a vaidade de mandar e desmandar, ficando o ônus com a União - complicado vai ficar quando um prefeito mandar fechar e o governador mandar abrir - inclusive o exemplo também vale para estados limítrofes com governadores pensando diferente.]

A relação com Moro já sofria um desgaste. Mas Bolsonaro, na sua solidão, reclamou da ausência do ministro em sua cruzada contra o isolamento social. Moro, segundo alguns, não só era favorável à política de Mandetta, como pensou em decretar multas para quem rompesse com o isolamento social. O que, aliás, acontece em muitos países da Europa. Sem o Congresso, STF, ministro da Saúde e da Justiça, Bolsonaro deu um passo decisivo participando [sic]  de manifestação antidemocrática diante do QG do Exército. Isso resultou num inquérito que acabou se entrelaçando com outro: o das fake news. Os investigados são os mesmos: apoiadores do presidente e, possivelmente, até familiares de Bolsonaro. Moro teve uma chance de sair depois daquela manifestação. Possivelmente estava incomodado com a posição temerária de Bolsonaro sobre o coronavírus. Mas agora estava diante de uma posição temerária contra a democracia.

Moro não se pronunciou. Num determinado momento de sua trajetória, a mulher de Moro escreveu numa rede social que ele e Bolsonaro eram a mesma coisa. Ele pode ter sido salvo agora pela maneira como cai. A tentativa de interferir na autonomia da Polícia Federal é algo que não encontra apenas resistência na corporação, mas em muitos setores conscientes da sociedade. É inconstitucional. Nesse sentido, Moro cai de pé. [cai de pé - a chuvas que formam/alimentam os rios também caem de pé e eles terminam correndo deitados.] Mas, para que sua trajetória política tenha viabilidade, será necessário se distinguir de Bolsonaro, algo que não fez quando esteve no governo. [Moro sem Bolsonaro e com o tempo mostrando que suas denúncias são apenas narrativas criativas do que não ocorreu, estará acabado politicamente.] O tom de seu discurso de saída é um indício de que compreendeu isto. Pelo menos se distanciou da visão atrasada de submeter o trabalho da PF aos desígnios de um presidente. O que é no fundo um crime de responsabilidade.

Mas Moro indicou claramente que Bolsonaro teme o inquérito no Supremo. Resta agora ao STF assumir seu papel institucional e não amarelar diante da pressão de Bolsonaro. É um governo que se aproxima de uma situação limite, como foi o caso de Collor e Dilma. Mas num contexto de pandemia que jogou o planeta na maior crise econômica e social da história contemporânea. Alto risco de tragédia.

Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista


Artigo publicado no jornal O Globo em 27/04/2020