Sob contestação internacional, transferência da de
órgão oficial coincide com escalada com Irã
Nesta
segunda-feira, quando se comemoram os 70 anos da criação de Israel, os Estados
Unidos transferem a sua embaixada no país de Tel Aviv para Jerusalém, atendendo
a um pedido histórico dos israelenses e dos religiosos americanos. E a data não
é uma coincidência: trata-se de mais um símbolo da proximidade entre os dois países.
Mas a festa deve ser restrita, pois a tensão na região está crescente e
especialistas afirmam que a possibilidade de uma nova guerra no Oriente Médio
fica a cada dia mais próxima.
Estradas
em Jerusalém recebem enfeites para inauguração de embaixada americana -
AHMAD GHARABLI / AFP
O local
da nova representação americana em Israel, anunciado em dezembro, escancarou o
apoio incondicional de Washington ao governo de Benjamin Netanyahu,
dificultando a retomada de negociações de paz entre israelenses e palestinos.
Ao mudar a embaixada para Jerusalém sem fazer nenhum outro gesto aos
palestinos, que reclamam o setor oriental da cidade como sua capital, o governo
de Donald Trump deixa de ser visto como mediador do conflito. Em consequência,
a data chamada pelos palestinos de Nakba (dia da catástrofe e do êxodo) — não
por coincidência 15 de maio, dia seguinte à criação de Israel — deverá
registrar recordes de protestos.
“Mover
nossa embaixada não é um desvio do nosso forte compromisso de facilitar um
acordo de paz duradouro; pelo contrário, é uma condição necessária para isso”,
afirmou, em nota, o Departamento de Estado americano.
A medida
reforça a ligação entre o presidente Donald Trump e Netanyahu, um dos líderes
estrangeiros mais próximos do republicano. Especialistas afirmam que essa
aproximação entre os dois é a mais intensa desde os anos 1990, quando Bill
Clinton e Yitzhak Rabin compartilhavam um profundo vínculo de amizade e uma
visão estratégica que os levou à primeira tentativa de um acordo entre os
israelenses e palestinos baseado na premissa da troca de terras por paz.
DESCOMPASSO
COM EUROPA
Além
disso, outros dois fatores contribuem para a escalada de tensão. A mudança da
embaixada ocorrerá seis dias após os Estados Unidos deixarem o acordo nuclear
com o Irã, grande inimigo de Israel na região. Logo em seguida, Israel atacou
bases iranianas na Síria, no que afirmou ser uma retaliação contra o lançamento
de foguetes contra suas forças nas Colinas de Golã — território sírio cuja
conquista por Israel em 1967 não é reconhecida internacionalmente. Esses fatos
se relacionam e ampliam a possibilidade de novos confrontos. — O
conflito entre israelenses e palestinos está envolto em camadas de significado
simbólico, e esses dois dias (aniversário de Israel e Nakba) são especialmente
poderosos — disse ao GLOBO David N. Myers, professor de História Judaica e
diretor do Centro Luskin de História e Política da Universidade da Califórnia
em Los Angeles (UCLA), referindo-se à data escolhida por Trump para a
inauguração da nova embaixada. — E os fatos no Oriente Médio são dinâmicos. A
decisão americana de se retirar do acordo nuclear com o Irã terá repercussões
em toda a região. E são particularmente preocupantes as crescentes tensões na
fronteira norte de Israel com o Líbano e a Síria, em especial a “guerra por
procuração” entre o Irã e Israel (no front da guerra civil síria).
Até agora
poucos países — a maior parte sem expressão diplomática relevante — seguiram o
exemplo e transferiram embaixadas. Na semana passada, foi o Paraguai, por
exemplo. Já os europeus criticam a decisão dos EUA, pois defendem seguir as
resoluções da ONU segundo as quais o status definitivo de Jerusalém deve ser
determinado em negociações. Americanos e europeus também ficaram em posições
contrárias no caso do acordo iraniano, levando Angela Merkel, chanceler alemã,
a afirmar que o Velho Continente não pode mais “confiar” nos EUA.
Por outro
lado, o governo Trump tenta — talvez sem uma estratégia muito clara — repetir
com os palestinos o que fez com os norte-coreanos: tensionar a relação para
buscar um acordo. Mas no Oriente Médio a situação é menos clara do que na
Península Coreana, e o risco de errar na dose, fazendo eclodir um novo
confronto, parece ser maior, segundo especialistas.
— A
mudança da embaixada sinaliza um afastamento de uma política de 30 anos que
tentava uma solução para o conflito dentro da visão de dois Estados. É uma
indicação de que os EUA não pretendem ser um intermediário honesto, mas sim um
aliado de Israel — disse Myers. — Receio que estejamos caminhando para um
período de crescente tensão. Quando há percepção de estagnação e falta de
progresso, surge a perspectiva de violência.
Desde que
ficou claro o apoio incondicional de Trump a suas políticas, o governo de
Netanyahu tem se preocupado menos com a pressão internacional na questão dos
assentamentos em territórios ocupados — são cerca de 600 mil israelenses
vivendo na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Dan Arbell, pesquisador do
Centro de Estudos sobre Israel da American University, na capital americana,
acredita que essa mudança da embaixada é “historicamente errada”:
— Os
Estados Unidos atenderam a um dos mais importantes pedidos de Israel sem pedir
nada em troca, sem utilizar isso como moeda de negociação em um acordo de paz
com os palestinos. Perderam uma oportunidade.
A
cerimônia de inauguração contará com a presença de Ivanka Trump e Jared
Kushner, a filha e o genro do presidente americano, que tem sido um
intermediário nos contatos com Israel. A embaixada começará a funcionar com ao
menos 50 funcionários. São esperados 800 convidados na cerimônia — nenhuma
autoridade palestina.
Essa
mudança também serve como uma luva para as pretensões internas de Trump, pois
parte da base evangélica dos republicanos defende que Israel tem direito à
“terra prometida”.
— A love
story entre Trump e Netanyahu deve continuar — disse Arbell. — A questão
será quando os democratas voltarem ao poder. Acredito que, neste momento, os
israelenses terão grandes problemas.
[Clique aqui e conheça mais sobre a 'manobra suja' feita por um brasileiro quando presidiu parte da Assembleia Geral da ONU, que permitiu a criação de Israel, usando território pertencente ao Povo Palestino e invadido por Israel. ]