No Brasil, o mais recente movimento de protagonismo judicial foi nesta
semana retirarem os direitos eleitorais de um ex-presidente da
República. O leitor atento notará que o traço comum é a flutuação das opiniões conforme as conveniências políticas.
Nos EUA, a Suprema Corte ostenta uma sólida maioria conservadora,
consolidada pelo então presidente Donald Trump. O feito está entre os
principais legados dele. Naturalmente, enfrenta a resistência, ou até a
fúria, do progressismo, revolta que emergiu mais claramente meses atrás a
partir de uma decisão sobre o aborto legal.
Ali a esquerda reclama de um fato: a vontade popular expressa nas urnas
ser revertida por um colegiado que não expressa mais a correlação de
forças na sociedade. Um atentado à democracia, dizem. Biden nega, mas
entre os democratas (do Partido Democrata) corre solta a tese de ampliar
o número de juízes da Suprema Corte e aproveitar a atual maioria do
partido no Senado para esculpir uma corte mais ao paladar progressista.
O leitor atento notará que a eventual manobra espelharia, com precisão,
as acusações dos estadunidenses contra quem rotulam de “autocratas”
mundo afora, líderes políticos que procuram moldar as instituições, em
particular o Judiciário, conforme as próprias conveniências.
Em Israel, a coalizão de centro-esquerda que se opõe a Netanyahu vem
tendo grande dificuldade de chegar ao poder pelas urnas. Um governo
liberal-progressista nascido da penúltima eleição foi bem breve. A
principal aposta da oposição têm sido os múltiplos processos contra o
primeiro-ministro por corrupção. Daí a ênfase na luta em torno da,
segundo essa oposição, independência do Judiciário.
Aqui o leitor brasileiro, mesmo o não tão atento assim, certamente
sentirá alguma semelhança com cenários locais de anos atrás.
Dificuldades eleitorais levam a oposição a depositar em acusações de
corrupção, manifestações de rua e movimentos judiciais a esperança de
remover um líder político duro de derrubar na urna.
Na década passada, depois de perder quatro eleições consecutivas, a
oposição brasileira cansou-se e aproveitou as circunstâncias, sempre
elas, para depor a presidente da República. Em paralelo, processos
judiciais heterodoxos removeram da corrida presidencial um ex-presidente
muito popular, que, além do mais, foi mantido preso durante a campanha
eleitoral por um único voto de diferença no Supremo Tribunal Federal (6 a
5).
Mas nem tudo ali saiu conforme o plano, pois quem preparou o bolo no
impeachment de Dilma Rousseff não comeu o bolo na eleição. Deu zebra.
Quatro anos depois, os múltiplos erros políticos de Jair Bolsonaro e a
competente campanha de reabilitação política de Luiz Inácio Lula da
Silva somaram-se para reverter a situação. O petista, reabilitado,
conseguiu o feito inédito de derrotar na urna um presidente na cadeira. [será que Bolsonaro foi derrotado ou apenas declararam o petista eleito??? É apenas uma pergunta - não é narrativa, versão ou notícia.]
E a musculosa Justiça entra em campo novamente, com sinal trocado. Os papéis invertem-se. Os antes garantistas viram punitivistas, e os antes
entusiastas do ativismo judicial levantam-se em defesa do que chamam de
“devido processo legal”.