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sábado, 25 de março de 2023

O dilema dos militares - J. R. Guzzo

Revista Oeste

A violência no Rio Grande do Norte é a mais recente prova de que as Forças Armadas ainda não sabem qual é o seu papel na democracia brasileira 

Edição 157

[Em nossa opinião, o certo  é que se deixar por conta do pt = perda total, as Forças Armadas do Exército serão desmontadas e substituídas por 'milícias bolivarianas'; as FF  AA precisam cumprir a Constituição na íntegra - o que inclui, suas atribuições - agindo quando convocadas ou,  diante de uma inércia que coloque a manutenção da ORDEM em risco, ou a SOBERANA NACIONAL.]

 Treinamento do Exército na selva | Foto: Flickr Exército Brasileiro/Divulgação

Treinamento do Exército na selva | Foto: Flickr Exército Brasileiro/Divulgação

“Nós somos da pátria a guarda.”
Canção do Exército

O Estado do Rio Grande do Norte está dentro do território brasileiro? Caso esteja: trata-se de uma área do Brasil que foi ocupada por alguma potência estrangeira, ou por uma organização terrorista, e sobre a qual o Estado nacional não exerce mais soberania?  
O fato é que o Rio Grande do Norte está vivendo, na vida real, como se fosse um pedaço do Brasil governado por bandos de criminosos com metralhadora na mão, e não pelas autoridades estaduais e federais legalmente constituídas. 
 Não há lei. Não há direitos do cidadão. Não há proteção do poder público para as pessoas poderem exercer em paz as suas atividades
Em alguns dias, os bandidos fizeram cerca de 300 ataques armados contra tudo que lhes passou pela cabeça, em cerca de 60 cidades diferentes do Estado, ou algo assim. Destruíram propriedade pública e privada. Incendiaram uma estação de trem, mataram um policial, agrediram pessoas. Praticaram todo tipo de atos de vandalismo — e de terrorismo puro e simples. 
 
Gravaram vídeos, em que aparecem com máscaras e armas pesadas, falando de suas exigências: segundo dizem, querem “melhores condições” nos presídios estaduais, incluindo televisão nas celas e algum tipo de obrigatoriedade legal para as visitas íntimas
Nunca se chegou, em nenhum Estado brasileiro, a uma situação semelhante de anarquiacom exceção, é claro, dos morros, favelas e “comunidades” do Rio de Janeiro
Ali, há anos, ou décadas, os governos já desistiram oficialmente de exercer qualquer autoridade verdadeira e entregaram o poder aos traficantes de droga — inclusive em cumprimento de ordens das altas esferas da justiça.

Em vídeo, grupo armado faz exigências ao governo 
do Rio Grande do Norte | Foto: Reprodução
Durante sete dias inteiros, pelo menos, o governo federal não fez nada a respeito, nem mesmo um comentário — era como se o problema estivesse acontecendo na Bolívia.  
Quando fez, enfim, foi para um discurso constipado do ministro da Justiça — e, ainda assim, sem uma palavra de reprovação para os crimes e criminosos. Falou como se houvesse “dois lados” a serem ouvidos; ficou a um centímetro de admitir algum tipo de “negociação” com os bandidos ou, pior, de ceder aos seus ultimatos. 
 Anunciou que o governo daria “100 milhões de reais” para a governadora — que, por sinal, é do PT. Deu a entender que acha a história toda muito “exagerada”, que o governo está sofrendo “pressões” e que é contra o envio de força militar para fazer o trabalho de defesa da população que a governadora obviamente não fez, ou não quis fazer
 
Essa governadora está entrando em seu quinto ano seguido no cargo; as condições denunciadas como abjetas dos presídios do Rio Grande do Norte são de responsabilidade direta dela e da administração do PT. Como recompensa por sua incompetência e descaso, recebeu o presente de 100 milhões do ministro — dinheiro do qual provavelmente nunca mais ninguém vai ouvir falar, e muitíssimo menos receber qualquer prestação de contas. 
 O Supremo Tribunal Federal, enfim, que deu a si próprio poderes não previstos em nenhuma lei para servir como polícia nacional de vigilância contra “atos antidemocráticos”, não deu um pio sobre o assunto
 
Tem 600 pessoas presas ilegalmente numa penitenciária de Brasília sob a acusação de terrorismo; 
já teve mais de 1.000, e de vez em quando solta um novo lote de detidos, com a explicação de que não se achou nenhuma prova contra eles. 
(Por que diabo, então, estavam presos? Quer dizer que o STF não sabe o que o sujeito fez de errado — mas enfia o infeliz na cadeia para descobrir, e solta quando chega à conclusão de que não conseguiu descobrir nada?) Mas em relação ao terrorismo explícito do Rio Grande do Norte o STF não achou coisa nenhuma; se achou, não disse.
Capa da Revista Oeste, edição 151 | Foto: Shutterstock
Não é nenhuma surpresa, é claro, nos casos do governo federal e do governo estadual do PT — afinal, eles se mostram sistematicamente a favor do crime, da violência e dos bandidos de todos os tipos
Sua “política de segurança” é “desencarcerar” gente presa, dar mais verbas para ONGs que trabalham em favor dos criminosos e “discutir” a legalização das drogas. “As prisões estão cheias de pessoas inocentes”, diz Lula, que também já justificou o roubo de celulares e deu a entender que não considera que os policiais sejam seres humanos. Na sua opinião, o problema do Brasil não é o crime sem limites e cada vez mais violento; é a situação jurídica dos presidiários. 
O ministro da Justiça fez uma visita amigável a um dos mais notórios focos do crime no Rio de Janeiro, a favela da Maré — antes de ir ao Rio Grande do Norte. 
 
Também é mais do que esperada a neutralidade do STF. Seus ministros tomam decisões sobre todos os assuntos; vigiam até mesmo grupos de WhatsApp, prendem um deputado federal por nove meses e anulam leis legalmente aprovadas pelo Congresso Nacional. [ignoram indultos concedidos legalmente pelo presidente da República.] Mas, em matéria de crime, só têm tomado decisões que os criminosos e os seus advogados aplaudem
Já chegaram a proibir que a polícia do Rio de Janeiro faça voos de helicóptero sobre as favelas, ou se aproxime a 100 metros de uma escola o que levou os traficantes, é óbvio, a concentrarem sua atividade em torno justamente das escolas.
Tudo bem, isso é o Sistema Lula-PT e isso é o STF
Mas e as Forças Armadas? As Forças Armadas, segundo está escrito na Constituição, existem para defender o território do Brasil contra agressões externas e garantir a ordem e a segurança internas, o cumprimento das leis e o exercício dos poderes constitucionais — quando solicitadas a agir por qualquer um deles. 
O Rio Grande do Norte faz parte do território do Brasil. A ordem e a segurança internas estão sendo agredidas por bandos armados; não são inimigos externos, com nacionalidade estrangeira, mas causam danos graves à população e ao Estado. 
A lei está sendo violada ali todos os dias, e o poder constitucional do Executivo não é mais exercido dentro das fronteiras estaduais. 
 
Salvo a promessa dos “100 milhões de reais” apresentada pelo ministro, os governos federal e do Rio Grande do Norte não fizeram até agora nada de efetivo para proteger a população dos crimes de que está sendo vítima, nem assegurar os seus direitos.  
Também não fizeram nada, na prática, para exercer a autoridade legal que lhes cabe. 
Uma das perguntas que o cidadão pode fazer, diante de tudo isso, é se as Forças Armadas deveriam intervir na situação para defender a ordem, a segurança e a lei numa área definida do Brasil — já que, além dos criminosos, ninguém está tendo ação nenhuma por ali.

Uns obedecem à lei, a começar pelos brasileiros comuns; os criminosos e os Três Poderes, não. O resultado é um país governado cada vez mais de forma ilegal

Os militares, tanto quanto dá para entender pela posição pública dos seus comandantes, acham que as Forças Armadas não têm de intervir. 
De acordo com o que está escrito na lei, elas só podem ter algum tipo de ação se um dos Três Poderes pedir para agirem, e até agora ninguém pediu nada o governo Lula, por sinal, é francamente contra qualquer atividade do Exército, Marinha e Aeronáutica na vida civil, a não ser para prestar assistência em desastres naturais, e olhe lá
Se ninguém pediu nada, os militares não podem fazer nada; é o que diz a lei, e a lei tem de ser cumprida, sem “mas”, “porém” ou “por outro lado”. 
O problema, do ponto de vista do interesse direto da população, é que as Forças Armadas observam a legalidade — mas só elas, e isso não adianta nada para o cidadão.  
O Rio Grande do Norte vive em estado de ilegalidade aberta, e o governo permite a ilegalidade. Mais: de legalidade em legalidade, o Brasil veio parar na situação que está aí. 
Uns obedecem à lei, a começar pelos brasileiros comuns; os criminosos e os Três Poderes, não. 
 
O resultado é um país governado cada vez mais de forma ilegal. O Rio Grande do Norte é apenas uma parte do problema. O pior é o que acontece no resto. O crime é protegido no Brasil como em nenhum outro país do mundo — basicamente, pela legislação aprovada no Congresso, ano após ano, por pressão direta de ONGs que defendem criminosos, advogados criminalistas e outros interesses.  
O Poder Executivo se alia com os fora da lei; isso começa pelas declarações públicas do presidente da República
O STF, enfim, mantém o Brasil há anos num regime de exceção — basicamente, com o seu inquérito perpétuo e ilegal sobre “atos antidemocráticos”, que permite aos ministros governarem o país sem prestar conta a ninguém e em violação expressa à legislação em vigor no país. 
Junto com isso, e junto com o Congresso, o Supremo deu a si próprio funções criminais que a Constituição não lhe permite executar e coloca em liberdade, sentença após sentença, todo traficante de drogas ou ladrão do Erário com dinheiro suficiente para pagar escritórios de advocacia que custam na casa dos milhões de reais e conseguem praticamente tudo o que pedem à justiça. 
É ilegal, mas como o STF diz que é legal, e o Congresso concorda com ele, a ilegalidade passa a ser legal; os militares, por sua vez, prestam obediência ao sistema institucional que existe no Brasil de hoje. Não há outro.

As Forças Armadas custaram acima de 115 bilhões de reais em 2022, e vão passar dos 120 bi este ano, uma despesa equivalente ao que o Brasil gasta com a educação pública

As Forças Armadas, desde 1984 e o fim do regime militar, não tiveram nenhuma participação na vida pública do Brasil — a não ser quando foram enviadas ao Rio de Janeiro, por solicitação do governo Michel Temer, para oferecer alguma resistência, qualquer uma, ao crime sem controle. Não resultou, no fim das contas, em nada de realmente útil ou duradouro. Desde o primeiro minuto a ação dos militares foi sabotada pelo STF, pelo Ministério Público e pelo aparelho judiciário em geral, para não falar nos políticos de esquerda e na mídia. 

Os oficiais e soldados não podiam, por decisão da justiça, pedir o RG de nenhum suspeito. Não podiam fazer nada diante de um indivíduo armado com um fuzil automático, a não ser se conseguissem provar, previamente, que ele tinha a intenção de usar a arma para finalidades ilegais
Não podiam dizer uma palavra a ninguém. 
Não podiam responder aos insultos que os bandidos lhes dirigiam, seguros de sua impunidade. 
Adiantaria alguma coisa, agora, irem ao Rio Grande Norte, para repetir a experiência do Rio de Janeiro e a pedido de um governo que manifesta sua hostilidade aberta à ação militar, em todas as oportunidades em que pode fazer isso? 
 
 A questão, a partir daí, é a seguinte: para o que servem, então, as Forças Armadas? 
 Por respeitarem a lei, não podem ajudar em nada a segurança dos brasileiros e garantir a proteção que o Estado tem de assegurar para todos. 
Se não existissem, não fica claro como a população perceberia isso, do ponto de vista de sua segurança — ou se iria sentir que perdeu alguma coisa de concreto. Se agem como uma repartição pública, têm a mesma utilidade de uma repartição pública. Como fica, então? 
 As Forças Armadas, segundo o Portal da Transparência, custaram acima de 115 bilhões de reais em 2022, e vão passar dos 120 bi este ano, uma despesa equivalente ao que o Brasil gasta com uma de suas necessidades mais desesperadas, a educação pública; só em aposentadorias e pensões vão gastar perto de 30 bilhões em 2023
Esse dinheiro sai direto do bolso do pagador de impostos. O que ele recebe em troca? Não há resposta coerente para essa pergunta.
Exército brasileiro | Foto: Cb Estevam/CComSEx
Defender o território do Brasil de uma invasão estrangeira? A lei diz que sim, mas, falando a sério, ninguém quer invadir o território do Brasil; ninguém invadiu desde a Guerra do Paraguai, e isso já foi há mais de 150 anos
Se for para fazer a vigilância das fronteiras não está tendo resultado. 
As fronteiras do Brasil estão hoje entre as mais abertas ao contrabando em todo o mundo — passariam por ali, se os traficantes assim quisessem, baterias completas de mísseis, ou tanques de guerra, ou qualquer coisa que possa ser contrabandeada
Existe, e aí existe mesmo, a questão da Amazônia, mas também nesse ponto a utilidade real das Forças Armadas não está definida. Durante o tempo todo, na Europa e dos Estados Unidos, são feitas ameaças à soberania do Brasil na Floresta Amazônica; o discurso é que a região não pertence exatamente ao Brasil e aos brasileiros, mas é um “patrimônio do mundo inteiro” e, por isso tem de ser “internacionalizada”. 
 
O presidente Lula disse que é a favor da soberania do Brasil na Floresta Amazônica, o que é um dever mínimo de qualquer cidadão deste país. Mas, ao mesmo tempo, vive querendo agradar os países ricos nesse assunto; costuma dizer que é preciso “colaboração” com “os esforços” para cuidar da Amazônia, que a “ação mundial” é muito importante para o “clima” e que é preciso “negociar” a respeito. (A maioria dos militantes extremistas que estão no seu governo acha as mesmas coisas, ou muito pior.) Que raio quer dizer tudo isso? Como assim, “negociar?” Negociar o que, exatamente? 
A Amazônia ocupa quase 50% do território nacional; mesmo que o presidente Macron, o bilionário George Soros e a menina Greta se contentassem com metade disso, ainda assim seria um quarto da área que o Brasil tem hoje; é duro. 
Como alguém pode falar em negociação, de qualquer tipo, sobre 25% do território do país? 
Se Lula aceitar, no meio da hipocrisia e da mentirada de costume, alguma espécie de “internacionalização” da Amazônia, e o Supremo disser que pode, a decisão vai ser considerada perfeitamente legal. Para se manter dentro da legalidade as Forças Armadas terão de obedecer. E aí? O que se pode fazer é rezar para que não aconteça nunca.
Infantaria de Selva | Foto: Flickr Exército Brasileiro/Divulgação
Há, enfim, a questão política e de imagem. Pela primeira vez na sua história, as Forças Armadas brasileiras têm de servir ao governo de um presidente condenado pela justiça por corrupção passiva e por lavagem de dinheiro e até hoje não absolvido de nenhum dos crimes de que foi acusado.  
Têm de bater continência para pelo menos 12, uma dúzia inteira, de ministros com processos na justiça.  
A imagem da Aeronáutica, no noticiário, é de uma empresa de táxi aéreo a serviço de ministros, militantes do PT e daí para baixo.  
A Marinha se faz notar por receber, por ordem do governo, navios do Irã no Porto do Rio de Janeiro — embora a comunidade mundial das democracias considere o Irã um país que promove o terrorismo internacional, e tenha pedido que o Brasil se recusasse a fazer o que fez.
 
O PT, repetidamente, mostra que quer tratar as Forças Armadas como uma empresa particular contratada para prestar serviços de segurança ao governo Lula; vive falando em “reformar” a sua organização, do ensino nas academias militares ao sistema de promoções por mérito. 
No período que se seguiu às eleições de 2022, enfim, o Exército se viu numa situação dificil.
 Poderia ter evacuado a área na frente dos quartéis, onde gente de todos os tipos e convicções protestava contra o resultado que o TSE anunciou para a eleição presidencial — se achasse que as aglomerações eram ilegais. Ou poderia garantir o direito de livre manifestação, se achasse que ninguém ali estava fazendo nada de ilegal; em dois meses de protestos, não houve nenhum incidente ou episódio de violência. No fim, não fez nem uma coisa e nem outra. Apenas permitiu que a polícia de Brasília levasse para a prisão centenas de pessoas que estavam a 8 quilômetros do local onde ocorreram a invasão e os atos de vandalismo contra os edifícios dos Três Poderes.
CPMI 8 janeiro
Manifestantes invadem o Congresso, o STF e o Palácio do Planalto, 
em 8 de janeiro de 2023 | Foto: Wikimedia Commons
Essas pessoas contavam com uma proteção que o Exército, no fim das contas, não se mostrou capaz de lhes dar. É possível que estivessem esperando algo que os militares não poderiam fazer, mas ficaram todos com uma das piores percepções que se pode ter sobre uma força armada — a de que seus oficiais não conseguem agir na hora em que aparece uma dificuldade de primeira grandeza. 
O que os militares poderiam ter feito, então? Não poderiam, com certeza, “intervir” na ordem política, nem impedir pela força a posse de Lula, como queriam muitos dos manifestantes. 
Isso seria crime de golpe de estado, previsto no Código Penal Brasileiro, e se é crime não pode ser cometido, em nenhuma circunstância ou sob nenhuma desculpa — não há nada que se possa discutir a respeito
Mas para as Forças Armadas sobrou o pior de dois mundos. Não ganharam um milímetro de apoio na esquerda, onde continuam sendo odiadas como sempre foram. Perderam, sabe-se lá por quanto tempo, o apoio da direita.  
Os militares, na verdade, estão numa daquelas situações em que é impossível ganhar. 
Têm de cumprir o que diz a lei, obrigatoriamente — mas com a Constituição e a legislação suicidas que vigoram hoje no Brasil, nessa e em tantas outras questões, acabam tendo de sustentar, para permanecer na legalidade, situações que o cidadão comum simplesmente não consegue entender.

Leia também “À espera de um novo triplex”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste

 

sábado, 31 de agosto de 2019

A perda da esperança - Merval Pereira

O Globo

A incongruência  desse governo, em dizer-se parte do mundo ocidental e defender posições completamente em desacordo com os legados mais básicos da cultura desse mundo, ficou patente na recente crise das queimadas da Amazônia.  Como se fosse uma síntese de suas convicções mais arraigadas, no mesmo episódio o presidente Bolsonaro menosprezou os problemas do meio-ambiente, embora tenha sido avisado pelos estudos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e entrou em conflito, direto e pessoal, com o presidente Emmanuel Macron, da França, país símbolo das liberdades individuais e dos direitos humanos, [também inventora e campeã no uso, nem sempre justo, da guilhotina e  traiu, de forma repugnante, os argentinos no caso dos 'exocet' na Guerra das Malvinas.] legados fundamentais do Ocidente à civilização.

Civilidade que não esteve presente no desacato à primeira-dama francesa, Brigitte Macron. Embora tenha dito que não a ofendeu, Bolsonaro apagou sua mensagem misógina do twitter, numa autoincriminação.  Aproveitando-se de uma demagogia ecológica de Macron, que tentou levar a discussão para o lado da
internacionalização da Amazônia, Bolsonaro tirou da manga a carta do patriotismo que, como disse Samuel Johnson, numa versão amenizada, é o último refúgio dos sem argumentos.  Não era preciso, Macron foi isolado pelos demais líderes europeus de peso, como Angela Merkel, da Alemanha e Boris Johnson, da Inglaterra.

Talvez seja a faceta mais nauseante de seu comportamento como chefe de Estado o retrocesso que pretende impingir a uma sociedade que avançou em medidas sociais desde a Constituição de 1988, e nos últimos anos vem ampliando essas conquistas com decisões que nos colocaram no campo de valores comportamentais progressistas contemporâneos. [o avanço que veio com o da Constituição de 88 - a constituição dos direitos sem deveres, do desrespeito aos valores familiares, institucionalizou a corrupção e a impunidade dos marginais - especialmente os de colarinho branco.] Falta ao presidente a compreensão de que é o representante de um país, e não de um restrito grupo de apoiadores que comungam seus pensamentos e se apresenta nas redes sociais de maneira acafajestada.

Bolsonaro não leva em conta alguns dos grandes legados  das democracias ocidentais: separação da figura pessoal do governante, e suas próprias opiniões, do cargo institucional que representa; separação dos assuntos de Governo e de Estado; separação entre Estado e Religião, qualquer que ela seja. Cotidianamente vai de encontro a tudo isso. Na visão de seus mentores, como Olavo de Carvalho, o espírito ocidental estaria sendo mitigado por uma política globalista, e é preciso reforçar a herança histórica, cristã, cultural, bem como o papel da família e do estado de direito a partir da tradição do liberalismo dos EUA.

Seria preciso resgatar o passado simbólico das nações ocidentais, mais calcado no imaginário representado por Trump do que pelas democracias européias. Falando em seminário da Academia Brasileira de Letras, no encerramento de um ciclo coordenado pela escritora Rosiska Darcy de Oliveira intitulado “O que falta ao Brasil?”, o embaixador e ex-ministro Rubem Ricupero [o autor da tese: o que é bom a gente divulga, o que é ruim a gente esconde.] fez uma análise sobre o país às vésperas do bicentenário de sua independência.  Seu temor, registrado no título da palestra - Um futuro pior que o passado? – se baseia na história recente, cujo presente vê atingido por “desgraças simultâneas” que produziram o efeito equivalente ao da guerra “sobre uma sociedade até então poupada de catástrofes históricas, como derrotas e ocupações estrangeiras”.

Para Ricupero, “o Brasil jamais tinha passado por retrocesso tão destrutivo na vida das pessoas por meio do desemprego, do aumento da pobreza, do desalento. Nem experimentara nada equiparável ao profundo impacto depressivo dos escândalos de corrupção que destruíram a autoestima de todo um povo”.  Esse passado próximo, lamenta, não acabou de passar, é ainda o nosso presente. “Neste mesmo instante, ele continua a nos fazer sofrer na persistência da estagnação econômica, do desemprego, do retrocesso social, da barbárie das prisões, da corrupção, da destruição da Amazônia, da degradação dos homens que nos desgovernam”.
O que considera “a mais angustiante crise de nossa História”, Ricupero vê agravada “pelo advento de um governo retrógrado, cujo único programa reside na demolição sistemática do passado”.  Mas, o pior, analisa o ex-ministro Rubem Ricupero, é que “perdemos a esperança, isto é, a confiança de que o futuro nos trará remédio às agruras do presente, da mesma forma que antes o presente costumava superar problemas do passado”.  (Amanhã: “Dar sentido à vida”)


Merval Pereira, jornalista - O Globo


segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Macron diz esperar que Brasil 'tenha logo' um presidente 'que se comporte à altura' do cargo - O Globo


[E o Brasil espera que o presidente francês antes de se intrometer nos assuntos internos brasileiros, cuide dos problemas da França, o que inclui, sem limitar, os 'coletes amarelos']

Presidente francês afirma que comentário de Bolsonaro sobre a mulher dele, Brigitte, foi 'triste', 'desrespeitoso' e 'uma vergonha' para as mulheres brasileiras

O presidente da França, Emmanuel Macron, reagiu nesta segunda-feira a um comentário feito no Facebook pelo presidente Jair Bolsonaro, que no sábado endossou a postagem de um internauta que zombava da mulher de Macron, Brigitte, 24 anos mais velha que o chefe de Estado francês. Em entrevista coletiva ao lado do presidente do Chile, Sebastián Piñera, Macron disse que o comentário sobre Brigitte foi "triste" para os brasileiros, uma "vergonha" para as mulheres brasileiras e "extremamente desrespeitoso". Afirmou ainda que "respeita" os brasileiros e que espera que "eles tenham muito rapidamente um presidente que se comporte à altura" do cargo. — O que eu posso dizer a vocês? É triste, é triste, mas é em primeiro lugar triste para ele e para os brasileiros — afirmou o presidente francês.


No sábado, um seguidor postou foto dos casais Macron e Bolsonaro em um post no Facebook do presidente brasileiro, com a legenda: “Agora entende por que Macron persegue Bolsonaro?”. O presidente brasileiro respondeu: “Não humilha cara. Kkkkkkk”. A postagem do seguidor foi acompanhada de uma montagem: de um lado, Emmanuel Macron e sua mulher Brigitte; e, do outro, o presidente brasileiro e sua mulher, Michelle, 27 anos mais jovem que o chefe de Estado  do Brasil.
A resposta de Bolsonaro viralizou e foi repercutida na imprensa francesa, que criticou a atitude sexista do presidente. Brigitte tem 66 anos, e Macron 42. Na sua campanha para a Presidência, em 2017, Macron já havia reagido a comentários sobre o assunto, dizendo que, se ele tivesse 20 anos a mais, “ninguém pensaria por um segundo que não poderíamos estar legitimamente juntos”.
Promessas descumpridas
Na entrevista ao lado de Piñera, Macron disse que cada dirigente é eleito por seu país, mas que era obrigado a constatar que houve, sem dúvida, "um mal-entendido com o presidente Bolsonaro", que, segundo sua avaliação, descumpriu a promessa de zelar pelo meio ambiente. Ele mencionou, ainda, o episódio ocorrido no final de julho em que o brasileiro cancelou na última hora um encontro em Brasília com o chanceler francês, Jean-Yves le Drian, e foi ao barbeiro , de onde fez uma transmissão ao vivo.
— Eu o encontrei uma primeira vez e ele me falou, uma mão sobre o coração, que tudo faria pelo reflorestamento e o engajamento com o Acordo de Paris para poder assinar o acordo do Mercosul com a União Europeia, e 15 dias depois fazia o contrário demitindo cientistas. Pode-se dizer que não me falou a verdade. Algumas semanas depois, teve um compromisso de urgência no cabeleireiro quando deveria receber nosso ministro das Relações Exteriores. E, ontem, considerou que era uma boa ideia que um de seus ministros da República fizesse insultos a minha pessoa — disse Macron, referindo-se ao ministro da Educação, Abraham Weintraub. [os franceses são tidos como 'refinados' e devem conhecer o protocolo diplomático que não obriga um Chefe de Estado - Bolsonaro - a se encontrar com um chanceler = um ministro de Estado.
O chanceler é que se arvorou, certamente por ser francês, igual ou superior ao Presidente da República Federativa do Brasil, pleiteando um encontro sem agendamento prévio (e sem justificar), quando o seu igual no Brasil é o chanceler Ernesto Araújo.]
No domingo, em sua conta no Twitter, Weintraub disse que Macron é "um calhorda oportunista buscando apoio do lobby agrícola francês". Ele comparou Macron ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem chamou de "Le Ladrón": "Ferro neste Macron, não no povo francês", escreveu o ministro da Educação.
Em sua fala, o presidente francês prosseguiu:
  E ele [Bolsonaro] fez comentários extraordinariamente desrespeitosos em relação a minha esposa. O que posso dizer? É triste. Mas é triste, sobretudo, para ele e os brasileiros. Penso que as mulheres brasileiras têm, sem dúvida, vergonha de seu presidente. Penso que os brasileiros, que são um grande povo, têm um pouco vergonha de ver esse comportamento. Eles esperam, quando se é presidente, que se comporte bem em relação aos outros. Tenho muito respeito e admiração pelo povo brasileiro, e espero muito rapidamente que eles tenham um presidente que se comporte à altura — afirmou.


Macron anunciou ainda uma ajuda financeira de € 20 milhões e também apoio militar para combater os incêndios na Amazônia, respeitando a soberania de cada país da região, mas construindo uma governança que inclua diferentes atores.[confiamos que as Forças Armadas do Brasil NÃO ACEITARÃO o apoio militar dos franceses e nem de nenhum outro país;
quanto a governança proposta pelo francês é desnecessária - cada país cuidará da parte da Amazônia em seu território e a política externa do Brasil não é assuntos dos entes federativos brasileiros.
Na América do Sul, onde Macron pode ter ingerência é a Guiana Francesa.]
— A Amazônia é uma floresta repartida entre nove Estados. Juridicamente falando, cada Estado é soberano. E cada Estado possui também suas regras. São Estados federais em que as regiões têm um papel importante. Quando o ministro das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, viajou ao Brasil em julho, encontrou vários governadores, que são também bastante engajados nesse tema. O Exército brasileiro também foi bastante mobilizado para proteger a floresta que é tão importante para o país. Creio que não se deve esquematizar uma posição brasileira. Há a soberania de cada Estado que deve ser respeitada, e há em cada Estado competências. Devemos construir uma iniciativa que permitirá reflorestar a Amazônia, mas que seja respeitosa da soberania de cada um, do papel das regiões, e a Guiana Francesa será plenamente associada, dos estados do Brasil, dos povos nativos, que são os que fazem viver essa floresta há milênios, e que não podem ser excluídos dessa transição. É preciso encontrar a boa governança.
Internacionalização da Amazônia [o parágrafo abaixo não deixa dúvidas sobre as traiçoeiras intenções do presidente francês.]
O presidente francês deixou ainda em aberto o debate sobre a internacionalização da Amazônia:
— Associações, ONGs e também certos atores jurídicos internacionais levantaram a questão de saber se é possível definir um status internacional da Amazônia. Não é o caso de nossa iniciativa, hoje, mas é um verdadeiro caso que se coloca se um Estado soberano tomasse de maneira clara e concreta medidas que se opõem ao interesse de todo o planeta. Há um todo um trabalho jurídico e político a ser feito. Mas creio poder dizer que as conversas que o presidente Sebastián Piñera (Chile) teve com o presidente Jair Bolsonaro não vão nesse sentido. Acredito que ele tem consciência dessa importância. Em todo caso, tenho essa esperança. Mas é um tema que permanece aberto e continuará a prosperar nos próximos meses e anos. A importância é tão grande no plano climático que não se pode dizer que “é apenas o meu problema”.  

Fernando Eichenberg, especial para O Globo