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sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Conversas “de cocheira” podem alterar o páreo - Percival Puggina

         Leio, diariamente, a coluna do jornalista Cláudio Humberto em Diário do Poder. Na edição de ontem, ele escreveu:

O Senado começa a discutir nesta terça (24) e votará no dia 8 a proposta que limita decisões monocráticas dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), acusados de “abusar” de interferências nos Poderes, inclusive anulando leis federais e ou “legislando”, o que a Constituição não prevê. A PEC foi pautada no domingo, discretamente. 
É a primeira vez que o Senado exerce a poder de legislar sobre o STF, do qual é o “tribunal”. Outro projeto no Senado fixa mandato para ministros da Corte.

A coluna ainda informa que a tendência para aprovar pode ser alterada em virtude do período de convivência entre ministros do STF e os presidentes da Câmara e do Senado no evento parisiense transcorrido no início deste mês.

Conversas de cocheira mudam a sorte em muitas corridas de cavalo.

Nosso problema, como escrevi outro dia, é que os eleitores esquecem rapidamente as ações e omissões contra o interesse nacional tomadas ontem. E detentores de mandato sabem disso. Para desanuviar a lembrança, reproduzo a informação prestada pelo senador Espiridião Amim ao mesmo Diario do Poder no dia 4 deste mês:

“A Lei das estatais, declarada inconstitucional por um ministro, teve resultado benéfico durante seis anos. É por causa dessa decisão, que segundo levantamento da CNN, se abriu caminho para o governo nomear 587 cargos nas estatais, sem critério, com remunerações anuais que variam de R$ 214 mil a R$ 3 milhões”.

Atenção, eleitor, não esqueça desta informação quando lhe falarem em decisões monocráticas. Do jeito que as coisas estão, cidadãos esquecidos, omissos, desatentos, estão bem representados e fazem parte do desastre nacional.

 Diario do Poder - Transcrito do site Percival Puggina

 

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Além do abrigo - Editorial - Folha de S. Paulo

Brasil deve dar preferência ao acolhimento familiar de crianças, previsto em lei

O melhor lugar para a criança, por óbvio, é em uma família, na qual receba cuidados, afeto e estímulos. Assim o indica, inclusive, a Constituição, ao afirmar o direito à convivência familiar e comunitária.  Há muito a ciência comprova que os menores precisam de mais do que simplesmente ter suas necessidades básicas, como alimentação e higiene, atendidas.

A falta de vínculo pessoal, brincadeiras e conversas têm impacto no desenvolvimento do cérebro infantil, podendo gerar atrasos cognitivos e emocionais permanentes. Quando, por alguma razão, crianças são separadas da família biológica, a evidência científica aponta que a melhor opção é que sejam acolhidas por outras famílias temporariamente —e não que fiquem em abrigos, como acontece com 96% dos mais de 35 mil menores brasileiros sob tutela do Estado.

Além da Constituição, outra lei nacional estabelece que encaminhar as crianças a núcleos familiares se mostra preferível: o Estatuto da Criança e do Adolescente, desde uma alteração feita em 2009. o entanto o Brasil ainda não criou um sistema para que essas famílias acolhedoras estejam prontas —treinadas e certificadas— a receber os meninos e meninas que delas necessitem, como acontece em países como EUA, Espanha, Austrália, Reino Unido e Irlanda.

Há sinais de que o tema começa a gerar interesse e de que integrantes do sistema judicial responsável pelas crianças passaram a ver os lares como uma opção mais vantajosa que os abrigos.  Na cidade de São Paulo, a prefeitura recentemente assinou convênios com três organizações que recrutam e preparam famílias para realizar o acolhimento. Os municípios de Cascavel (PR) e Campinas (SP) já são considerados referências nesse tipo de trabalho.

São bons sinais, mas cumpre fazer muito mais para tirar as crianças dos estabelecimentos impessoais. É evidente que os lares temporários não constituem solução para tudo: problemas como maus-tratos podem acontecer também neles, daí a necessidade de avaliação e supervisão constantes. O objetivo deve ser reunir o menor com sua família biológica ou, na impossibilidade de que isso ocorra, que haja adoção definitiva.

 Editorial - Folha de S. Paulo - UOL

quarta-feira, 12 de junho de 2019

"Moro, Dallagnol e o vazamento de conversas"


Ao longo de toda a sua atuação na Operação Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa que investiga o mega escândalo de corrupção, e o ex-juiz federal Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, sempre foram alvo de críticas daqueles que arquitetaram a pilhagem das estatais para fortalecer o projeto de poder petista. Acusações de parcialidade – uma delas, contra Moro, está para ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal –, de messianismo e até mesmo de desrespeito às garantias mais básicas do Estado Democrático de Direito, tão frequentes quanto infundadas, cresceram em intensidade quando a Lava Jato chegou ao ex-presidente Lula, hoje corrupto condenado em três instâncias da Justiça brasileira.



Os críticos da Lava Jato ganharam um presente nos últimos dias: a divulgação de supostas conversas entre Moro e Dallagnol, cujo conteúdo teria sido obtido por um hacker e enviado ao site de esquerda The Intercept, que por sua vez vem divulgando o que alega ser a troca de mensagens. As reportagens publicadas até o momento não oferecem provas consistentes (como capturas de tela) de que efetivamente se trata do diálogo entre o então juiz e o procurador; por outro lado, até agora nenhum dos personagens envolvidos negou que o conteúdo das mensagens fosse verdadeiro. [mais do que se defender de acusações infundadas e baseadas em supostas provas obtidas de forma criminosa, é DEVER acusar os violadores do sigilo das comunicações privadas.

Oportuno lembrar posição do ministro Fachin sobre provas ilegais, conforme abaixo - parte do voto ministerial:


"Cumpre consignar que ninguém está acima da lei, especialmente da Constituição: nem administradores, nem parlamentares, nem mesmo juízes. Procedimentos heterodoxos para atingir finalidade, ainda que legítima, não devem ser beneplacitados." ]



Qualquer conclusão até o momento será totalmente precipitada



Com a divulgação das mensagens obtidas ilegalmente, a esquerda inicia uma nova tentativa de impor a fábula segundo a qual a Lava Jato não passaria de uma conspiração para derrubar o PT e, especialmente, colocar Lula na cadeia. A estratégia de deslocar todo o foco para as supostas conversas entre Moro e Dallagnol, no entanto, não é capaz de derrubar o enorme conjunto probatório que a força-tarefa construiu ao longo de anos de investigação laboriosa, e que embasou as sentenças de Moro e do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, em processos nos quais a defesa teve todas as oportunidades de se manifestar. Restaria, portanto, à defesa dos articuladores do petrolão tentar anular processos alegando violações de conduta da parte de investigadores e julgador. As mensagens tornariam isso possível?



Tendo em mente apenas o que foi divulgado até o momento, é preciso analisar o caso sob duas óticas. A primeira diz respeito à obtenção das mensagens, e aqui não há a menor dúvida de que houve crime da parte de quem invadiu os celulares das autoridades, do eventual mandante da invasão e de quem as distribuiu para o site The Intercept. O mesmo não se pode dizer dos jornalistas que publicaram as reportagens; eles estão exercendo seu direito à liberdade de imprensa – se o fazem de forma ética, é outra discussão – e têm inclusive garantido o sigilo da fonte, tanto quanto um veículo que divulgue o conteúdo de outros vazamentos, inclusive ligados aos processos da Lava Jato. A invasão de telefones de autoridades é um fato gravíssimo, pois demonstra um grau de ousadia e domínio tecnológico que tem um enorme potencial de instabilidade, e por isso merece apuração criteriosa da Polícia Federal. E a ilegalidade envolvida na forma como as conversas foram obtidas é tanta que chega a surpreender o fato de o Conselho Nacional do Ministério Público, em decisão absurda, já ter aberto processo disciplinar contra Dallagnol e outros procuradores da Lava Jato, apoiando-se em evidências provenientes de violações da lei.


Leia também: Moro e Dallagnol são vítimas (artigo de ModestoCarvalhosa e Gauthama Fornaciari)



Tudo sobre a Operação Lava Jato



Quanto ao conteúdo das mensagens, o que foi divulgado até o momento – pois Glenn Greenwald, fundador do Intercept e um dos jornalistas que assinam as reportagens, diz haver mais conversas ainda não publicadasnão nos permite endossar nem a narrativa de parcialidade, nem a de trabalho conjunto entre acusador e julgador, nem aquela que vê violações dos códigos que regem o comportamento da magistratura e dos membros do Ministério Público. A realidade da Justiça brasileira, e que qualquer advogado conhece, é uma em que juízes, acusação e defesa não dialogam apenas nos autos dos processos, algo que vem sendo ressaltado na repercussão da divulgação das conversas.



Os supostos diálogos mostram, sim, o que seria uma proximidade entre juiz e procurador, talvez até maior que o observado costumeiramente, mas qualquer conclusão até o momento será totalmente precipitada. Isso porque, como lembramos, mesmo dias depois do início da publicação das reportagens, ainda não surgiu nem mesmo a comprovação de que as mensagens trocadas foram efetivamente enviadas por Moro e Dallagnol. E, ainda que surja essa prova, será preciso ter acesso à íntegra das conversas – ou seja, sem omissões de trechos que poderiam até mesmo demonstrar que os interlocutores procederam de forma correta. Entre os supostos diálogos já divulgados, há aqueles que revelam certa imprudência de juiz e procurador, sendo eles os reais autores? Talvez. Há violação do devido processo legal? Só a análise do conteúdo integral permitiria chegar a essa conclusão, o que ainda não é possível fazer.