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quarta-feira, 12 de junho de 2019

Diálogos permitem várias versões

Interpretações

Como a palavra escrita não tem entonação, é possível ter-se versões diferentes sobre o mesmo tema

A decisão do Conselho Nacional de Justiça de não levar adiante um pedido de investigação sobre o hoje ministro Sérgio Moro, sob a alegação de que ele não é mais juiz e, portanto, não está sob a jurisdição do CNJ, retira qualquer possibilidade de punição no campo jurídico a respeito das conversas reveladas pelo site Intercept. A questão agora fica por conta do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai julgar no dia 25 um pedido de suspeição do juiz Moro feito pela defesa do ex-presidente. Esse pedido já foi rejeitado em diversas instâncias da Justiça, e a única novidade são as conversas reveladas agora.

A Segunda Turma, como fez ontem com o pedido de anulação dos julgamentos do TRF-4, deve mandar para o plenário a decisão dessa nova ação da defesa de Lula, pela gravidade de suas conseqüências. As conversas, mesmo não fazendo parte da ação que será julgada, certamente afetarão a decisão dos juízes. É difícil imaginar que o presidente da Corte, Dias Toffoli, e o ministro Alexandre de Moraes, aceitem julgar com base em provas recolhidas ilegalmente, já que eles são os líderes de uma ação singular do Supremo contra as fake news, e a atuação de hackers nas redes sociais. O que mais impactou quem leu a troca de mensagens entre o então juiz Sérgio Moro e o chefe dos procuradores da Lava-Jato, Deltan Dallagnol é a informalidade com que tratam de assuntos relacionados ao processo do ex-presidente Lula.


Jornalisticamente é compreensível que o Intercept tenha escolhido trechos sobre o ex-presidente Lula para abrir o que deve ser uma série. Não há registros, porém, de conversas sobre investigados de outros partidos políticos que, como ressaltou o procurador Dallagnol em defesa da Lava-Jato, já acusou só em Curitiba políticos e pessoas vinculadas ao PP, ao PT, ao PMDB, ao PSDB, ao PTB, e só a colaboração da Odebrecht nomeou 415 políticos de 26 diferentes partidos.

O trecho do Intercept em que Moro claramente sugere que os procuradores ouçam uma testemunha sobre uma suposta transferência ilegal de imóveis de filho do ex-presidente Lula, parece ser o mais próximo de um aconselhamento, o que é proibido pelo Código de Processo Penal e, teoricamente, pode ser motivo de anulação do julgamento.

“Então. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é seria”, escreveu Moro. “Obrigado!! Faremos contato”, respondeu Dallagnol pouco depois. “E seriam dezenas de imóveis”, acrescentou o juiz. O que está sendo considerada uma sugestão indevida, na verdade, segundo fontes ligadas aos procuradores de Curitiba, foi uma maneira informal de oficiar ao Ministério Público a ocorrência de um possível crime que precisava ser apurado.

Qualquer pessoa, sobretudo um servidor público, [redundante destacar que mesmo um  juiz sendo considerado MEMBRO do Poder Judiciário, ele é antes de tudo um SERVIDOR PÚBLICO, além do que a obrigação de comunicar se estende a QUALQUER PESSOA.
Se ocorreu o tal diálogo Moro estava apenas cumprindo um DEVER LEGAL.]  tem o dever legal de encaminhar a denúncia ao Ministério Público. Não se sabe se Moro formalizou o ofício depois, ou achou suficiente essa comunicação através de mensagem de celular. Mais adiante, segundo a transcrição do Intercept, o procurador disse que ligou para a fonte, mas ela não quis falar. “Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa”, cogitou Dallagnol. Ao que tudo indica, diz o Intercept, o procurador estava considerando criar uma denúncia anônima para justificar o depoimento da fonte.

O juiz Sergio Moro endossou a gambiarra, na interpretação do Intercept: “Melhor formalizar então”, escreveu Moro. Assim como essa interpretação leva a um desvio de conduta, outras podem revelar uma relação informal, mas dentro da lei. Moro, alegam as mesmas fontes, quando escreveu “melhor formalizar, então”, estava advertindo Dallagnol de que teria que oficializar esse pedido, incluindo seu ofício aos procuradores. Como a palavra escrita não tem entonação, é possível ter-se versões diferentes sobre o mesmo tema.

Moro já disse que não tem condições de confirmar a veracidade das conversas, mas não negou que elas tenham acontecido. A certeza de que as conversas são editadas pelo site Intercept, revelada por ele, se deve, entre outras coisas, ao fato de estranhar que não haja nomes citados nessa suposta conversa. Ainda mais quando Dallagnol diz que vai mandar procurar a tal testemunha.

Merval Pereira, jornalista - O Globo

 

terça-feira, 11 de junho de 2019

Encrencados veem Castelo de Areia na Lava Jato



O vazamento de mensagens surrupiadas de celulares da turma da Lava Jato leva corruptos e corruptores a planejar a conversão da maior operação anticorrupção da história num grande mangue com cheiro de Castelo de Areia —nome de uma operação de 2009, que balançou os pilares da empreiteira Camargo Correa e acabou anulada no Superior Tribunal de Justiça por falha processual. 

Sergio Moro não precisava ter enviado para Deltan Dallagnol uma mensagem sugerindo a inversão de fases da investigação. Era desnecessária uma indagação do então juiz para o coordenador da Lava Jato: "Não é muito tempo sem operação?". Eram inconvenientes as mensagens de Moro e Dallagnol sobre temas como densidade de provas, vazamento estratégico de grampos e o teor de decisões judiciais…

Ainda não surgiu elemento capaz de transformar condenado em inocente. Mas tudo o que veio à luz e o que ainda está para sair das sombras faz a alegria da oligarquia político-empresarial, Lula à frente. Tudo o que precisavam era de matéria-prima para questionar a validade das provas da Lava Jato, apresentando a operação como uma versão hipertrofiada de operações antigas, que foram asfixiadas nos tribunais de Brasília. Na Castelo de Areia, por exemplo, reuniram-se provas de lavagem de dinheiro, evasão de divisas, corrupção e caixa dois. 

O STJ mandou tudo para o arquivo sob a alegação de que a investigação nascera de uma denúncia anônima. Comparar esse caso à Lava Jato é um sacrilégio. O lixo que vazava pelas bordas do tapete há dez anos hoje está na vitrine. Gente poderosa tornou-se impotente. Será uma pena se o Judiciário enxergar na comunicação tóxica da Lava Jato pretextos para virar a página do combate à corrupção para trás. [Detalhe: qualquer investigação ou outro procedimento judicial que busque inocentar Lula - anulando a condenação e até mesmo pretendendo voltar o tempo para que Lula não seja preso (na cabeça de lulopetista e seus militontos até a máquina do tempo pode ser inventada.) - não irá em frente, por um detalhe: provas ilegais não anulam processos.]

Blog do Josias de Souza