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sábado, 25 de julho de 2020

Paradoxos e paraquedas - Nelson Motta

Militares são preparados para matar e morrer

Desde sua origem nos guerreiros da Antiguidade, os militares são treinados para matar. Para cumprir as ordens de seus superiores, conquistar novos territórios, e defender com a própria vida a pátria e os cidadãos que lhes pagam os salários. Exige-se grande disciplina e respeito à hierarquia, um general não discute suas ordens com um capitão, não há nem pode haver “democracia interna” em um exército coeso e unido. [aliás, democracia, especialmente em excesso, não combina com um combate exitoso ao coronavírus.]

Com a evolução das guerras e do poder destrutivo, exércitos históricos como o de Alexandre, o Grande, as legiões romanas de Júlio César e a máquina militar nazista desenvolveram especialistas em logística, engenharia, química, física, medicina, comunicações, tecnologia, armamentos, veículos de combate. Das armaduras medievais aos macacões e capacetes de astronauta antivírus e antirradiação, os militares são preparados para matar e morrer e para obedecer à Constituição como um soldado a um general. Numa democracia não se cumprem ordens, a não ser as judiciais, debate-se com os representantes da sociedade e vota-se o que é melhor para o país.

Com sua vocação para a piada e os paradoxos, o Brasil tem um capitão expulso do Exército por planejar ações terroristas por maiores salários que manda em todos os generais.
[nada contra a democracia, apenas a frase anterior da matéria, mostra que o pensamento de Winston Churchill "...a democracia é a pior forma de governo, à exceção de todas as demais formas que têm sido experimentadas ao longo da história.", elogia uma forma de governo que tem falhas graves, por criticar que o presidente Bolsonaro, eleito com quase 60.000.000 de votos, em eleições realizadas no Brasil, país  que apregoam vive sob o 'estado democrático de direito', mande em todos os generais.
Se vivemos em uma democracia a vontade soberana do Povo precisa e deve ser respeitada.
E uma das 'virtudes' apregoadas da democracia é que o Poder Militar se subordina à Consituição e esta atribui ao Presidente da República o comando supremo das Forças Armadas. 
A propósito: não esqueçam que o capitão foi absolvido das acusações pela mais instância da Justiça Militar de União = Superior Tribunal Militar.]  
Militarizou seu governo num aparelhamento igual ao do PT, só que o PT comandava sindicatos e movimentos sociais, e Bolsonaro comanda oficiais com tropas armadas. Ninguém duvida que ele se arriscaria a criar uma crise institucional, arrastando o que ele acha ser o “seu” Exército, para livrar os filhos da cadeia. Não chega a ser uma causa nobre, digna do Exército de Caxias.

Homens e mulheres do povo que chegaram por seus próprios méritos aos mais altos postos da hierarquia militar têm arraigada consciência de seus deveres com as instituições civis e democráticas. Estudaram e trabalharam muito a serviço de nossa soberania e das nossas instituições, e não parecem dispostos a participar das aventuras de um paraquedista lunático que caiu de paraquedas no poder.

Nelson Motta, colunista - O Globo


sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Lula é alvo de excludente de ilicitude - Folha de S. Paulo

Reinaldo Azevedo 

Juízes do TRF-4 e representante do Ministério Público Federal deram a entender que tudo é permitido a quem acusa e julga

O julgamento do recurso de Lula pela 8ª Turma do TRF-4 na última quarta (27) nada teve a ver com direito, leis, Constituição e outros substantivos que afastam a barbárie em benefício do pacto civilizatório. O que se viu no tribunal foi um concerto de vontades em favor de uma forma especial de excludente de ilicitude. Também nesse particular, o procurador-regional da República Maurício Gotardo Gerum e os três desembargadores se mostraram bastante afinados com o governo de turno.



Excludente de ilicitude? Os magistrados e o representante do Ministério Público Federal deram a entender que tudo é permitido a quem acusa e julga: do plágio descarado na sentença, praticado pela juíza Gabriela Hardt —só 1%, destacou João Pedro Gebran Neto, o relator—, aos pitos e lições de moral dirigidos ao réu. Wesley Safadão não sabia, mas estava rebolando um clássico do direito contemporâneo ao cantar: “99% anjo, perfeito/ Mas aquele 1% é vagabundo”. [é habitual, basta ler um voto de um ministro do Supremo, a transcrição de trechos de sentenças, de votos - exatamente o que fez a juíza Gabriela Hardt, apenas não citou a autoria do material transcrito, situação que é reprovável apenas do ponto de vista administrativo e deve ser levado em conta que o material citado não represente sequer 1% do texto do qual foi transcrito.]



Hardt, a mesma juíza que havia homologado aquele acordo que garantia o emprego de multa paga pela Petrobras numa fundação de direito privado, teve seu trabalho elogiado pelo relator. Que este ignorasse o escândalo do plágio, já seria do balacobaco. Que a cópia dos 40 parágrafos tenha dado ensejo a encômios e retórica laudatória, bem... Eis o excludente de ilicitude que troca a pistola pela toga. Essa mesma turma anulou outra sentença da juíza —no caso, por colar a peça acusatória do Ministério Público. Mas sabem como é... Se Lula tem de ser preso, tudo é permitido. [o artigo do Código Penal vigente e nem o projeto de lei que cuida do excludente de ilicitude leva a matéria para fora do Direito Penal.
Assim, a conduta da juíza na elaboração de uma sentença judicial, não é reprovável.
Quanto a que o condenado petista, que está temporariamente em liberdade, volte para a cadeia é algo justo e necessário.]



A objetividade cedeu espaço ao proselitismo, à causa, ao embate que nada tinha a ver com Lula. Gebran Neto, Leandro Paulsen e Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz já não respondiam à ordem legal, ao direito, às regras escritas, mas ao alarido e a corporações eventualmente feridas em sua onipotência. Como restou claro nos votos, os crimes atribuídos ao réu ofendiam menos a consciência jurídica do grupo do que a insistência em declarar-se inocente e em apontar um concerto político para aprisioná-lo.



Há de se evocar aqui a metáfora, que já é um clichê nos cursos de direito, do moleiro que se insurge contra Frederico, o Grande. A tanto o súdito se atreveu na certeza de que ainda existiam juízes em Berlim. Em brilhante artigo, o desembargador Ney Bello, do TRF-1, elaborou a síntese perfeita: “Os juízes abandonaram Berlim quando substituíram o direito pela sua moral particular e viram-se como profetas de um novo amanhecer. Alguns substituindo os códigos por uma Bíblia ou outro texto sagrado, o que é mais assustador ainda”.



A 8ª Turma do TRF-4 não tinha de necessariamente seguir a maioria formada no Supremo: no julgamento de um habeas corpus, o tribunal decidiu por maioria de 7 a 4 que devem ser anuladas as sentenças em que o corréu delatado teve negado o pedido para entregar suas alegações finais depois do corréu delator. A ação penal sobre o sítio de Atibaia se inscreve no caso. Ressalto tratar-se de decisão ancorada no inciso LV do artigo 5º, uma cláusula pétrea, que assegura “o contraditório e a ampla defesa”. Mas também as cláusulas pétreas, com perdão do trocadilho, se tornaram pedras para alvejar a ordem legal. Alertamos mais com a Berlim de 1940 do que com a de 1740...[Ao pretender que uma decisão ad nunc retroaja sobre processos  julgados o STF esqueceu de conferir poderes adivinhatórios , com efeitos retroativos, aos juízes que prolataram as sentenças anteriores.]



Um colegiado não estar obrigado pela burocracia judicial a seguir um fundamento civilizatório não pode ser entendido como carta branca para uma decisão obviamente concertada, que mal esconde, e nem é preciso apelar às entrelinhas, o intuito de desafiar o entendimento da corte constitucional da Berlim do cerrado, alinhando-se, como ignorar?, com as vontades de Frederico, o Grande de turno. Em 2018, Sergio Moro aceitou o convite para ser ministro de Bolsonaro sete meses depois de assinar a ordem de prisão de Lula. Segundo revelou Gustavo Bebianno em entrevista a Fábio Pannunzio, o então juiz já havia mantido cinco ou seis conversas, no curso da campanha, com Paulo AI-5 Guedes sobre a possibilidade de assumir a Justiça. Insuspeito de isenção, convenham. [O STF, certamente vai se pronunciar sobre a alegada suspeição, declarando-a inexistente.]



O TRF-4 me faz crer que a campanha de 2022 realmente já começou.

Coluna do Reinaldo Azevedo - Folha de S. Paulo

 

 

terça-feira, 9 de outubro de 2018

Oposição antecipada

“Hoje, com a volta dos parlamentares a Brasília, o Congresso deve fervilhar em razão do resultado das eleições proporcionais. Será um grande encontro de derrotados”

Derrotados nas urnas, os candidatos Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) derivam para a oposição antecipada aos dois candidatos que vão disputar o segundo turno das eleições, Jair Bolsonaro (PSL), que obteve 46,3% dos votos, e Fernando Haddad (PT), com 29,8% dos votos. Como outras lideranças do chamado “centro democrático”, entre as quais o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, não pretendem apoiar nenhum dos dois candidatos, com o argumento de que ambos não têm claros compromissos democráticos, nem apoiar o governo a ser formado por eles, seja quem quer que ganhe. É uma espécie de “oposição, já!”.

A mesma posição está sendo discutida no PPS, partido que sofreu duas derrotas importantes: o senador Cristovam Buarque (DF) não conseguiu se reeleger; Roberto Freire (SP), presidente da legenda, também foi surpreendido pelo tsunami eleitoral que afastou do Congresso muitas lideranças políticas de prestígio. “Posso lhe adiantar que, pelo Brasil democrático, defendo que o PPS não apoie nenhum dos dois contendores nesse segundo turno. E se posicione desde logo como oposição responsável respeitando a Constituição de 88 e lutando pelas reformas, seja qual for o presidente eleito”, anunciou Freire no Twitter.

Bolsonaro, líder da disputa, ontem anunciou que não fará concessões para vencer as eleições. Em entrevista à rádio Jovem Pan, disse que não pode “virar o Jairzinho paz e amor” e se “violentar”, mas falou em pacificar o país e insistiu na plataforma política focada no binômio: mais segurança, menos corrupção. Em entrevista à TV Globo, negou a intenção de modificar a Constituição, proposta do general Hamilton Mourão, seu vice: “Sou capitão, mas quem manda sou eu, serei o presidente”. Bolsonaro se beneficia da onda gerada a seu favor no primeiro turno, que provocou grandes viradas em alguns estados importantes, nos quais seus candidatos obtiveram grande votações em eleições majoritárias e proporcionais.

O candidato do PT, Fernando Haddad, ontem esteve mais uma vez em Curitiba, para conversar com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como fez em todas as semanas de campanha. Também em entrevista à TV Globo, anunciou que havia reformulado seu programa e que não mais pretende convocar uma Constituinte. Disse que fará emendas constitucionais via Congresso para fazer a reforma tributária e acabar com o teto de gastos. Adiantou que está procurando entendimentos com o PDT, de Ciro Gomes, e com o PSB, o grande aliado nos estados do Nordeste, onde Haddad venceu as eleições. Nos bastidores da campanha, a grande mudança foi a entrada do senador eleito Jaques Wagner, ex-governador da Bahia, no estado-maior petista, para cuidar dos entendimentos políticos. O governador baiano Rui Costa, reeleito com grande votação, anunciou que pretende ampliar ao máximo as alianças de Haddad para o segundo turno.

Bancadas
Hoje, com a volta dos parlamentares a Brasília, o Congresso deve fervilhar em razão do resultado das eleições proporcionais. Será um grande encontro de derrotados. Na Câmara, não se reelegeram 240 dos 513 deputados. A bancada do PT terá 56 deputados e a do PSL, de Jair Bolsonaro, 52 (tinha apenas 8), seguidos pelo PP, 37; MDB, 34; e PSD, 34. A fragmentação aumentou, com a representação de 30 partidos, mas 16 não ultrapassaram a cláusula de barreira.

No Senado, o strike foi ainda maior. A renovação atingiu 74% dos senadores, deixando de fora do parlamento o presidente da Casa, Eunício de Oliveira (CE); o presidente do MDB, Romero Jucá (RR), entre outros. Neste ano, a sigla que mais ganhou cadeiras no Senado ainda foi o MDB, com sete senadores eleitos. Rede e PP têm cinco senadores cada; DEM, PSD, PT, PSDB e PSL, quatro. O PPS elegeu dois, o PTC, um. PMN, PSOL e PCdoB não reelegeram seus senadores.

Nas entrelinhas: Luiz Carlos Azedo - CB