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sexta-feira, 26 de maio de 2023

Pecadores vingativos - Augusto Nunes

 Revista Oeste

O Sistema não se contenta com o fim da Lava Jato. Quer castigar quem cumpriu a lei

Sergio Moro | Foto: Marcelo Chello/Shutterstock
 
Em 22 de abril de 2021, durante o julgamento no Supremo Tribunal Federal que transformou Luiz Inácio Lula da Silva em vítima da parcialidade do juiz Sergio Moro, o ministro Luiz Roberto Barroso desenhou a metodologia utilizada para desmontar ofensivas judiciais contra delinquentes condenados à perpétua impunidade. “Quem acompanhou o que aconteceu na Itália conhece o filme da reação dos corruptos”, disse Barroso. Era uma alusão à Operação Mãos Limpas, abatida por um contra-ataque distribuído por três frentes. “Primeira: mudanças na legislação ou na jurisprudência”, prosseguiu Barroso. “A segunda é a demonização de procuradores e juízes. Terceira: sequestro da narrativa e cooptação da imprensa para mudar os fatos e recontar a história.” Assim que a Operação Lava Jato se aproximou de territórios jamais devassados por homens da lei, a estratégia que dera certo no país europeu foi reprisada no Brasil, com idêntico sucesso, pela confederação dos gatunos intocáveis.

Registradas as semelhanças, Barroso apontou uma diferença que não melhora a imagem do Brasil. Na Itália, os corruptos vitoriosos se contentaram com a restauração do direito de delinquir em paz. “Aqui a corrupção quer também vingança”, constatou. “Quer ir atrás dos procuradores e dos juízes que ousaram enfrentá-la, para que ninguém nunca mais tenha a coragem de fazê-lo. No Brasil de hoje, temos os que não querem ser punidos, o que é um sentimento humano e compreensível. Mas temos um lote muito pior. É o formado pelos que não querem ficar honestos nem daqui para a frente. Esses gostariam que tudo continuasse como sempre foi.” Amparado nesse diagnóstico, Barroso juntou-se à minoria contrária à ideia de colar em Sergio Moro, principal juiz da Lava Jato, o estigma da “suspeição”. O bloco vencedor achava que, com a desqualificação do magistrado, a soltura do réu Luiz Inácio Lula da Silva seria engolida sem engasgos até por quem aplaudia o desempenho da maior e mais eficaz operação anticorrupção de todos os tempos.publicidade


Em junho de 2020, numa entrevista ao programa Roda Viva, o ministro rejeitou enfaticamente a tese de que a operação “foi comprometida pela criminalização da política”. Na resposta, usou a expressão “foi crime mesmo” para definir o que aconteceu na Petrobras, na Eletrobras, na Caixa Econômica Federal, no crédito consignado e nos fundos de pensão. “A gente não deve criminalizar a política nem politizar o crime”, foi em frente. “Desvio de dinheiro, gerente devolvendo 150, 180 milhões, não é possível alguém achar isso natural. Isso não é política, isso é bandidagem. A corrupção no Brasil foi uma criminalidade estrutural, institucionalizada e sistêmica. A Lava Jato ajudou a mudar a cultura de impunidade no país.” Para o entrevistado, “a sociedade deixou de aceitar o inaceitável, e desenvolveu uma imensa demanda por integridade, por idealismo e por patriotismo”. Uma busca ligeira na internet atesta que a Lava Jato foi louvada também pelos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cármen Lúcia e até Gilmar Mendes. Publicamente, só o decano Gilmar mudou radicalmente de ideia. Depois de atribuir à operação o desmonte da usina de roubalheiras controlada pelo PT, a metamorfose de toga transformou os procuradores, os juízes e até Curitiba em seus grandes satãs.

No momento, Gilmar se emociona com o livro em que Emílio Odebrecht jura que só assinou o acordo de leniência que agora tenta anular por ter sucumbido à tortura. Eis aí outro forte candidato a uma vaga no Inquérito das Fake News. Barroso nunca renegou o que disse sobre a Lava Jato, mas tem evitado comentários sobre a operação desde que o STF virou protagonista do faroeste à brasileira que rebaixou a fascista, desinformado ou golpista todo brasileiro cujas opiniões possam retardar o sepultamento em cova rasa dos projetos políticos de Jair Bolsonaro. Os remanescentes da Lava Jato já foram castigados pelas mudanças na legislação e na jurisprudência profetizadas por Barroso. Há tempos vêm sendo sistematicamente demonizados. O consórcio da imprensa faz o que pode para transformar xerifes em vilões e bandidos em homens da lei. Vive-se agora a etapa da vingança, tramada por ressentidos sem cura, traumatizados pelo pavor de ouvir batidas na porta às 6 da manhã, que anunciavam a chegada da Polícia Federal e do ajuste de contas. Barroso acompanha em silêncio o cortejo de decisões arbitrárias, medidas absurdas, prisões ilegais, inquéritos secretos e outras bofetadas na cara da Constituição.

Juízes e procuradores da Lava Jato eram responsabilizados de meia em meia hora por agressões ao devido processo legal e ao direito de ampla defesa que só existiram na imaginação de advogados especializados em chicanas de picadeiro. Alexandre de Moraes não para de fazer o que Sergio Moro nunca fez — sem ouvir um pio dos colegas de Egrégio Plenário. No diversificado buquê de engaiolados pela ofensiva anticorrupção, não há um único e escasso injustiçado. Eram todos criminosos, mas foram socorridos pelos superjuízes. O TSE, um atrevido puxadinho do Supremo, precisou de 66 segundos, muito cinismo e uma argumentação de picadeiro para cassar o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol. Punido por ter liderado a força-tarefa de procuradores, Deltan sofreu um castigo adicional. Fora o deputado federal Marcel Van Hattem, do Partido Novo, nenhum parlamentar compareceu à manifestação de solidariedade promovida em Curitiba. Animado com o avesso das coisas, o doleiro Alberto Youssef resolveu exigir alguma compensação pela ofensa gravíssima: a Polícia Federal grampeou sem autorização judicial uma conversa telefônica com algum parceiro de patifarias que se recusa a identificar.

Nascida em março de 2014 para investigar doleiros, a operação logo topou com bandalheiras envolvendo diretores da Petrobras, chefões do PT e empresários de estimação. Juízes, procuradores e policiais federais sem medo seguiram em frente. Acabaram desmantelando o maior esquema corrupto da história, adornado pela participação de empreiteiros podres de rico e até do ex-presidente Lula. O Brasil que presta sentiu-se num Carnaval temporão. Quem detestou a súbita mudança na paisagem foi o Sistema, codinome do ajuntamento de figurões dos Três Poderes, da indústria e do comércio, das cidades e dos campos, de todos os partidos e de todas as tendências — em resumo, o Sistema abrange todas as subespécies empenhadas em ganhar dinheiro com negociatas desde a chegada das primeiras caravelas. A colisão frontal entre a lei e o crime ocorreria em 2016.

Todos os punidos pela Lava Jato estão em liberdade, o Supremo faz o que quer e o Congresso capricha na cara de paisagem. A corrupção deixou de ser um problema a combater

Para a Lava Jato, seria esse o mais produtivo dos anos. As 45 prisões temporárias e 25 preventivas anexaram à população carcerária um punhado de celebridades — por exemplo, os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e Guido Mantega, o marqueteiro do reino João Santana, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Lula foi conduzido coercitivamente à Polícia Federal para depor sobre os casos do triplex no Guarujá e do sítio em Atibaia. Impressionado com o ritmo da operação, o país mal notou o aparecimento da senha para o começo da contraofensiva: “Estancar essa sangria”. A expressão foi recitada por Romero Jucá, líder no Senado de todos os governos, durante uma conversa com o ex-senador Sérgio Machado, então homiziado no comando da Transpetro, um dos braços da Petrobras mais castigados pela gangrena da corrupção. Poucos tiveram paciência para a leitura do diálogo grampeado da Polícia Federal. Como atesta a transcrição dos melhores momentos, a maioria dos brasileiros não sabe o que perdeu. Confira:

Sérgio Machado: Mas viu, Romero, então eu acho a situação gravíssima.

Romero Jucá: Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá (…). Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro, para tocar um gabinete, isso termina por jogar no chão a expectativa da economia. Porque se o Lula entrar ele vai falar para a CUT, para o MST, é só quem ouve ele mais, quem dá algum crédito, o resto ninguém dá mais crédito a ele para porra nenhuma. Concorda comigo? O Lula vai reunir ali com os setores empresariais?

SM: Tem que ter um impeachment.

RJ: Tem que ter impeachment. Não tem saída.

SM: Acontece o seguinte, objetivamente falando. Com o negócio que o Supremo fez, isso de autorizar prisões logo após decisões de segunda instância, vai todo mundo delatar.

RJ: Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo e a Odebrecht vão fazer. Seletiva, mas vão fazer.

SM: Eu estou muito preocupado porque eu acho que o Janot está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.

[Rodrigo Janot era o procurador-geral da República]

RJ: Tem que resolver essa porra… Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria.

SM: Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel Temer.

RJ: Só o Renan que está contra essa porra, porque o Michel é Eduardo Cunha. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.

SM: É um acordo, botar o Michel num grande acordo nacional.

RJ: Com o Supremo, com tudo.

SM: A situação é grave. Porque, Romero, eles querem pegar todos os políticos.

RJ: Acabar com a classe política para ressurgir, construir uma nova casta, pura.

SM: Isso, e pegar todo mundo. E o PSDB, não sei se caiu a ficha já.

RM: Caiu. Todos eles. Aloysio, Serra, Aécio…

SM: Caiu a ficha. Tasso também caiu?

RJ: Também. Todo mundo na bandeja para ser comido.

SM: O primeiro a ser comido vai ser o Aécio. [Baixa o tom de voz] O que que a gente fez junto, Romero, naquela eleição, para ele ser presidente da Câmara? [Muda de assunto] Amigo, eu preciso da sua inteligência.

RJ: Estou à disposição, você sabe disso. Veja a hora que você quer falar.

SM: Preciso ter uma conversa emergencial com vocês.

RJ: Acho que a gente não pode juntar todo mundo para conversar, viu? Você deve procurar o Sarney, deve falar com o Renan. Depois que você falar com os dois, colhe as coisas todas, e aí vamos falar nós dois do que você achou e o que eles ponderaram pra gente conversar.

SM: Não pode ter reunião a três?

RJ: Não pode. Isso de ficar juntando para combinar coisa que não tem nada a ver. Os caras já enxergam outra coisa que não é… Depois a gente conversa os três sem você.

SM: Se não houver uma solução a curto prazo, o nosso risco é grande.

RJ: [Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem “ó, só tem condições sem Dilma. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca”. Entendeu? Então… Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.

SM: Eu acho o seguinte: a saída para Dilma é ou licença ou renúncia. A licença é mais suave. O Michel forma um governo de união nacional, faz um grande acordo, protege o Lula, protege todo mundo. Esse país volta à calma, ninguém aguenta mais. Tem que ter uma paz, um…

RJ: Eu acho que tem que ter um pacto.

Parece conversa de pátio de cadeia. E é. Parece que foi ontem. Foi mesmo, se medido pelo tempo histórico. O parto demorou mais que o previsto e foi complicado, mas o pacto dos morubixabas em perigo está em vigor. Todos os punidos pela Lava Jato estão em liberdade, o Supremo faz o que quer e o Congresso capricha na cara de paisagem. A corrupção deixou de ser um problema a combater.

Tecnicamente, a Lava Jato não morreu. O ex-presidente Fernando Collor foi condenado pelo STF com base em revelações obtidas pela operação. E a juíza Gabriela Hardt, que considerou Lula culpado no caso do sítio em Atibaia, acaba de assumir o posto que foi de Moro e pertenceu por algumas semanas a um caso de polícia fantasiado de juiz. Mas é possível que Collor fosse absolvido se tivesse apoiado Lula. E ninguém sabe quantas semanas (ou quantos minutos) Gabriela permanecerá no cargo.

De todo modo, parecem tão remotos quanto a Primeira Missa os anos em que milhões de brasileiros puderam acreditar que enfim entrara em vigor a norma segundo a qual todos são iguais perante a lei, e que havia lugar na cadeia para qualquer vivente que incorresse em pecados graves, mesmo que fosse o presidente da República. A corrupção recobrou o viço e esbanja saúde.

Leia também “A bofetada do Benedito”
 
Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste
 
 
 

domingo, 4 de abril de 2021

11 cabeças, uma sentença - Merval Pereira

O Globo

Julgamento de Moro

O julgamento do dia 14 no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a decisão do ministro Edson Fachin de encaminhar para a Justiça do Distrito Federal os processos contra o ex-presidente Lula, anulando suas condenações, o que o tornou elegível para a eleição presidencial de 2022, promete mais polêmicas. Retomado o julgamento da suspeição do ex-juiz Sergio Moro na 2ª Turma do STF, o ministro Nunes Marques surpreendeu muita gente votando contra a tese, no que poderia ser um placar de 3 a 2 contra o relator Gilmar Mendes se a ministra Carmem Lucia não tivesse alterado seu voto, alegando que fatos novos surgiram desde que votara na primeira sessão a favor de Moro. Nada, além das mensagens roubadas dos celulares dos procuradores de Curitiba, surgiu no horizonte para justificar tão brusca mudança de voto.

No dia 14, quando o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar o recurso da Procuradoria-Geral da República contra a decisão de Fachin, essa questão será debatida. Foram ou não usadas as mensagens roubadas dos celulares dos procuradores no julgamento da suspeição de Moro?  
São provas inválidas ou não?
A suspeição em si estará também em julgamento, pois há quem acredite que, tendo Fachin determinado que, com a transferência de jurisdição, o julgamento de Moro perdera o objeto, a sessão não poderia ter prosseguido.  Para que Lula saia novamente Ficha Suja, será preciso que o plenário derrote Fachin, devolvendo os processos para a Vara de Curitiba, restabelecendo as penas. 
É possível que isso aconteça, pois vários ministros consideram que não houve prejuízo a Lula com uma eventual troca de jurisdição, pois os tribunais TRF-4 e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também consideraram Lula culpado. Não havendo prejuízo, os processos voltam para Curitiba.

Outra possibilidade é a maioria considerar que a jurisdição de Curitiba é, mesmo, o foro natural dos processos de Lula. O próprio Fachin, depois de ter feito uma manobra arriscada, e perder, na tentativa de neutralizar Gilmar Mendes na decretação da suspeição de Moro, pode votar contra sua própria decisão, alegando que, ao aceitar a tese majoritária na 2ª Turma de que Curitiba não era a sede natural dos processos da Lava-Jato, o fez em nome do colegiado.

Pessoalmente, porém, sua convicção é de que a jurisdição correta é a 13ª Vara de Curitiba. Sendo assim, em outro colegiado, se sente liberado para votar de acordo com sua consciência. Essa reviravolta é mais fácil de acontecer do que derrubar a suspeição de Moro, pois quatro ministros - Nunes Marques, Carmem Lucia, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski -  já votaram na 2ª Turma pela continuidade do julgamento, que já havia começado, e bastariam apenas mais dois votos para que a decisão fosse mantida.

O ex-presidente Lula, nesse caso, continuaria condenado em segunda instância no processo do sítio de Atibaia, que, prudentemente, a defesa de Lula já está pedindo que o ministro Gilmar Mendes inclua na suspeição de Sérgio Moro já aprovada na 2ª Turma, que agora tem ele como relator da Lava-Jato por ter liderado o voto divergente vencedor.

Dificilmente, porém, o pedido será aceito, pois o próprio Gilmar Mendes fez questão de anunciar que a decisão só se referia ao processo do triplex do Guarujá. A ministra Carmem Lucia também acentuou que sua mudança de voto se dava apenas no âmbito do processos que foi analisado naquele julgamento. A ampliação da suspeição se daria de maneira mais polêmica ainda, pois estaria sendo julgada uma decisão da juíza Gabriela Hardt, que foi quem condenou Lula, pois Sérgio Moro já havia se licenciado da Vara de Curitiba. Mesmo que Moro tenha iniciado o processo, foi a juíza Hardt quem deu a sentença condenatória.  

Merval Pereira, jornalista - O Globo

quarta-feira, 10 de março de 2021

"Decisão de Fachin carece de muitas explicações" - Alexandre Garcia

"Fico imaginando o que pensa o cidadão comum sobre Justiça, quando a decisão de um juiz do Supremo se junta ao auge de uma pandemia que tira vidas, emprego e renda"

De repente, um único juiz decide que estão anulados processos por corrupção do ex-presidente Lula, porque estariam na vara errada. Vale dizer, anuladas as condenações que haviam passado pelo tribunal revisor, o da 4ª Região, em Porto Alegre, e por uma 3ª instância no STJ. 

 Ao mesmo tempo, se lança a versão de que seria para isentar Sergio Moro de suspeição. Se assim fosse, bastaria anular o do tríplex, pois a condenação do caso de Atibaia é da juíza Gabriela Hardt. [em miúdos: a decisão do triplex foi de Moro, acusado de suspeição - só que a do sítio foi da juíza Gabriel Hardt que Fachin, (talvez baseado na onisciência, que supõe possuir)  declarou suspeita, em que pese nenhuma suspeição pese contra a magistrada.]

 [inserido por Blog Prontidão Total]

A decisão de Fachin ainda carece de muitas explicações, sobre como julgou. Fico me perguntando: - se a 13ª Vara não era a apropriada, por que tudo continuou, por cinco anos? [oportuno ressaltar que a decisão em comento do ministro Fachin, somada a uma atitude que adotou em fevereiro passado -  críticas sobre fatos ocorridos em 2018 e sobre os quais silenciou - fortalece o entendimento que seu senso de oportunidade sobre quando se manifestar  privilegia ocasiões em que o potencial  provocativo, explosivo, é maior, mais danoso.]
A Lava-Jato, símbolo da reação do país contra uma gigantesca corrupção institucionalizada, foi sendo desmontada quando o Supremo decidiu separar a Petrobras de outros casos.

Fachin criou uma hora da verdade para Lula. Ele deixa de ser o impedido, o condenado, a vítima, para ser o beneficiado por um ministro escolhido por Dilma, ex-advogado do MST, próximo à CUT; suscita mais debate sobre o uso da Petrobras, já que o assunto se atualizou, mas, além de tudo, terá de enfrentar Bolsonaro, que já ocupou o lugar que era dele, Lula — o de ser uma espécie de esperança do povo, e que o povo chama de mito. Lula parece não ter como recusar o desafio que Fachin lhe joga no colo.

O PT já não precisa repetir o candidato que chamavam de poste. Agora, o próprio Lula deixou de ser inelegível e pode disputar a eleição presidencial do ano que vem, se ele quiser. A esquerda pode continuar fracionada, com Ciro e Boulos, ou se juntar a Lula, criando uma frente para evitar a reeleição de Bolsonaro. Outros personagens da corrida presidencial devem estar desolados, como Sergio Moro e João Doria. Mas, sobretudo, fico imaginando o que pensa o cidadão comum sobre Justiça, quando a decisão de um juiz do Supremo se junta ao auge de uma pandemia que tira vidas, emprego e renda.  [e o autor de tão explosiva decisão, nada explica, nada responde e não há a quem questionar. 
Ficam sempre as questões:
 1 -  é prejudicial à  democracia questionar os motivos de que decisões de um integrante do Supremo não possam ser questionadas? 
2 - ou o que prejudica à democracia é proferir decisões e ignorar eventuais questionamentos? 
Citamos democracia, por ser o pretexto de defesa da mesma sempre invocado, até para justificar atos contra a decantada democracia.]
 
Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense

terça-feira, 9 de março de 2021

Fachin pega atalho, bagunça o coreto - Lula desvia o foco na pior hora - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática; Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente

Tudo já caminhava para a anulação das condenações e o resgate da elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para 2022, mas o ministro Edson Fachin arranjou um atalho e chegou direto lá. E justamente no dia em que o presidente Jair Bolsonaro reclamou, enigmático, que “alguns estão se excedendo”. Ganha Lula,[???; sua lenga-lenga não convence a mais ninguém, além do que ele não foi inocentado, apenas será submetido a novo julgamento] de volta ao palanque, ganha Bolsonaro, com o pretexto e o desvio do foco na pandemia, e ganha, enfim, a polarização que tantos prejuízos causa ao País. [perdem: os inimigos do Brasil, os inimigos do presidente, os arautos do pessimismo - as poucas chances que ainda restam de atrapalhar o governo Bolsonaro sofrem mais redução, e terão que optar entre um criminoso condenado e um presidente que insistem em não deixar governar.]

“Eu quero paz, tranquilidade, democracia, respeito às instituições, mas... alguns estão se excedendo”, disse Bolsonaro depois de falar no “meu Exército” e horas antes da decisão monocrática de Fachin. Referia-se a outras questões, como lockdown e toque de recolher na pandemia, e a ameaça velada era a outros atores, como governadores e prefeitos. Mas a decisão de Fachin pode servir de pretexto... 

Indiretamente, isso remete à “advertência” do então comandante do Exército, generaEduardo Villas Bôas, na véspera de uma decisão do mesmo Supremo sobre a prisão do mesmo Lula. Mas com uma diferença: em 2018, Lula era forte e o objetivo era tirá-lo do páreo para a Presidência; para 2022, o Planalto considera Lula o melhor adversário para Bolsonaro. [sempre destacando que quase 30 meses após o alerta do general Villas Bôas, é que o ministro Fachin que na época silenciou, partiu  para críticas, gerando provocações e atiçando o 'deputado Daniel Silveira'. Só não se instalou uma crise entre a Câmara dos Deputados e o Supremo, devido aquela Casa Legislativa ter optado por abrir mãos de sua competência constitucional - imagine se os deputados revogam a prisão do parlamentar.]

Logo, se o Comando do Exército liberou seu comandante e sua conta no Twitter para tentar impedir a soltura e a candidatura de Lula há três anos, hoje, ao contrário, há uma dissimulada comemoração no governo do capitão e dos generais. “O melhor oponente do presidente é o Lula! Sem estresse”, reagiu uma das chamadas “altas fontes” do governo ontem. O processo em curso no Supremo começou com a liberação, para a defesa de Lula, dos diálogos dos procuradores da Lava Jato de Curitiba com o então juiz Sérgio Moro. Foi o start para, depois, declarar a suspeição de Moro e anular as condenações de Lula – primeiro pelo triplex do Guarujá, pelo qual ele foi preso, e depois pelo sítio de Atibaia, pelo qual foi condenado em duas instâncias. O gran finale seria a elegibilidade para 2022. [as condenações foram anuladas, os crimes existiram e as provas continuam válidas. O acusado será julgado e condenado por outro magistrado = mais uma sentença a corroborar as anuladas. Lembrando sempre que uma das duas condenações foi proferida por Moro e a outra pela juíza Gabriela Hardt - sendo que a primeira foi corroborada por todas as instâncias, faltando apenas o Vaticano.]

O preço, porém, sairia caríssimo: a anulação em cascata das condenações e prisões dos demais implicados e até dos R$ 4 bilhões devolvidos por corruptos de diversas estirpes aos cofres públicos. Fachin facilitou as coisas, logo ele que une duas personas aparentemente inconciliáveis: uma tem vínculo de alma com o ex-presidente Lula, outra tem sido voto certo pró-Lava Jato. Assim, sua decisão beneficia Lula, mas tenta preservar a Lava Jato. 

Após anos, Fachin decidiu que, como os processos de Lula não envolviam só a Petrobrás e não tinham a ver com Lava Jato, não eram de competência da 13.ª Vara de Curitiba e, sim, da Justiça Federal no DF. Pronto. Tudo que se refere a Lula volta à estaca zero, mas o STF não precisa, por “perda de objeto”, decretar a suspeição de Moro – que seria a morte da Lava Jato. A dúvida é se Gilmar Mendes vai deixar por isso mesmo. 

Para além das formalidades e atalhos jurídicos – que ainda têm muito chão, já que a decisão de Fachin foi monocrática –, o efeito mais explosivo é político. Com Lula, a eleição de 2022 é uma. Sem ele, é outra. Se Bolsonaro é absurdo e perigoso na pandemia e em tudo, ainda conta com firmes seguidores e com a alta rejeição a Lula para repetir 2018: ruim comigo, pior com ele! Ontem, teve duas vitórias: a pandemia em segundo plano e as Bolsas em queda por ojeriza a Lula. [a pandemia continua presente, está sendo combatida e será vencida. Se o agora condenado é rejeitado pela maioria dos brasileiros  e as Bolsas, sabiamente, o rejeitam - por ser ele a pior opção para o Brasil - a culpa não é do presidente Bolsonaro.]

Resta saber, agora, se o PT e as esquerdas vão finalmente cobrir o inacreditável vácuo de oposição e se o tal centro, tão difuso, desconjuntado, tem como cavar algum espaço entre Lula e Bolsonaro. Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática da pandemia e do próprio Bolsonaro. Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente. 

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo

 

 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Sítio de Atibaia ganha força na Lava-Jato - Editorial - O Globo

Novo flanco de investigações é prova de que combate à corrupção tem de ser política de Estado

Embora não esteja provado que Lula é o dono do sítio, entendeu a juíza Gabriela Hardt que existe vínculo entre favores de empreiteiras (OAS e Odebrecht) prestados na propriedade e grandes contratos que as empresas  tinham com a Petrobras, capturada por um esquema de corrupção do PT. Tudo está provado, penas começaram a ser cumpridas, e bilhões saqueados  já foram restituídos à estatal. Há tempos está superada a questão sobre se houve ou não corrupção no lulopetismo.
A Lava-Jato, em seus mais de cinco anos de existência, puxa agora um fio que pode levar à origem do dinheiro com o qual Fernando Bittar, Kalil Bittar e Jonas Suassuna Fernando, sócio de Fabio Luis, “Lulinha”, filho de Lula — compraram o sítio que ficou em usufruto do ex-presidente e família.

Estão mapeadas transferências generosas de dinheiro da Telemar/Oi, sem razão plausível, para empresas do grupo de amigos, incluindo Lulinha. O final do percurso do dinheiro suspeito saído da “Supertele” outro delírio petista e que terminou em corrupção e falência seria o sítio. Esta nova operação da Lava-Jato, neste momento, reforça a necessidade de  o combate à corrupção ser perene, constituir uma ação institucional de Estado. É uma questão desimportante se a Lava-Jato deve ser ou não prorrogada indefinidamente. O que tem de delimitar seu tempo de duração é a finalização ou não dos inquéritos com os quais trabalha.

Mais esta ramificação nas investigações sobre o sítio de Atibaia, que pode elucidar a origem do dinheiro usado em sua compra para usufruto de Lula, indica que ainda há o que apurar. E que tem de ser perene o enfrentamento dos esquemas que desviam dinheiro público. O desmonte do grupo do ex-governador Sérgio Cabral no Rio e as evidências de desvios em contratos assinados em São Paulo para a compra de trens por governos tucanos demonstram a extensão pluripartidária e geográfica da corrupção.

O avanço das investigações sobre o sítio precisa servir para reforçar o trabalho em andamento no Congresso para restabelecer a prisão em segunda instância, seja via Código de Processo Penal (CPP) ou por mudanças em dispositivos da Constituição que não sejam cláusulas pétreas. A feliz decisão do STF de preservar o compartilhamento de informações de inteligência financeira entre organismos de fiscalização também ajuda na construção de uma estrutura de combate ao roubo do dinheiro público que seja do Estado e não de governos.

 Editorial - O Globo


quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Avança investigação sobre Atibaia - Merval Pereira

O Globo

Sem esquecer


A operação Mapa da Mina, nome cuja explicação ainda está para ser dada, e representa a própria essência da nova fase da Lava Jato, é um recado para quem acha que já está livre das investigações. Há dois anos e dez meses a Operação Aletheia, que levou o ex-presidente Lula a depor coercitivamente à Polícia Federal no aeroporto de Congonhas, foi iniciada, mas só agora chega a seu fim.  Foram documentos apreendidos naquela ocasião que levaram a essa operação de ontem, e o nome dela é o título da apresentação financeira interna do grupo que foi investigado pela Aletheia. Ainda não se sabe o que significa, mas que o nome é sugestivo, isso é.

Entre os investigados estão os filhos de Lula, Fabio Luis, [vulgo Lulinha] que o ex-presidente dizia ser “o Ronaldinho dos negócios”, Marcos Claudio, Sandro Luis e Luis Claudio. A “coincidência” de que estavam envolvidos em negócios milionários com Jonas Suassuna e a família Bittar, proprietários no papel do sítio de Atibaia, reforça a suspeita de que o ex-presidente era, na verdade, o proprietário oculto do sítio, que seria um pagamento pelos favores feitos a seus negócios.

Os dois entraram em negócios que tinham o apoio financeiro da empresa de telefonia celular Oi, tudo indica, segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, como recompensa a favores do governo. Há de tudo nesse processo, até a evidência de que o aparelhamento das estatais e das agências reguladoras propiciou a nomeação de diretores da Anatel para favorecer os interesses da Oi, inclusive na fusão com a Brasil Telecom que necessitou de uma mudança legal para ser concretizada.

Outra coincidência é que a juíza Gabriela Hardt, que ficou algum tempo como interina de Sergio Moro em Curitiba, recusou ontem a prisão preventiva de Lulinha, pedida pela Policia Federal. A juíza, que condenou Lula no caso do sitio de Atibaia, é constantemente citada pelos petistas como perseguidora de Lula. No caso em que Lula foi condenado pela juíza, o interessante é que a acusação contra Lula é de ter se aproveitado de obras de infraestrutura das construtoras OAS e Odebrecht no sítio que usava como sendo seu. Não houve acusação formal de que o sítio fosse de Lula, porque ainda não havia provas suficientes.

Desta vez, a acusação é justamente essa, unindo os pontos do caso, que parecia à maioria mais evidente do que o do triplex. Agora, parece que a investigação encontrou o mapa da mina, que leva a milhões de reais recebidos de diversas maneiras pelos parentes do presidente. Houve até um e-mail pedindo ao pessoal da empresa de Jonas Suassuna para limpar das mensagens todas as referencias ao governo. Ele ganhou também muitos negócios para sua empresa de produtos digitais, como a Nuvem de Livros, financiada por dinheiro governamental e que não apresentou resultados que justificassem esse aporte, segundo a acusação.

Várias outras empresas envolvidas há muito na Lava Jato aparecem também nessa investigação, confirmando que, conceitualmente, o trabalho de Curitiba ainda tem muito a revelar. Os bancos de dados das diversas operações levam a novas investigações, como já acontecera outras vezes. Acusações que aparentemente foram descartadas voltam à tona com o prosseguimento das investigações. Foi também uma demonstração de que o Procurador-Geral da República Augusto Aras fez bem em voltar atrás na ideia de reduzir o aparato mobilizado para a Operação Lava Jato.

Ainda há muito a fazer, como garantem os procuradores de Curitiba. A montagem do quebra-cabeças, como classificou o procurador Pozzobon, requer muita persistência, e por isso também os processos não devem ser distribuídos por diversos estados, como volta e meia tentam os advogados de defesa.  A tese de que é preciso centralizar as investigações para ter melhores resultados vai se confirmando à medida que as investigações prosseguem. Novos desdobramentos, como os de ontem, mostram à sociedade que a busca dos culpados nas diversas fases da operação Lava Jato não cessa. 

Merval Pereira, colunista - O Globo



terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Polícia Federal queria prisão de Lulinha, mas MP foi contra e juíza negou pedido

Lava-Jato investiga relação de repasses da Oi a filho do ex-presidente com compra do sítio de Atibaia. Federais também queriam prender sócios do filho do ex-presidente: Kalil Bittar e Jonas Leite Suassuna.

A Polícia Federal (PF) pediu a prisão temporária de Fabio Luis Lula da Silva , o Lulinha , filho do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, na representação que apresentou à juíza Gabriela Hardt para a deflagração da 69ª fase da Operação Lava-Jato . O pedido, no entanto, foi negado pela magistrada. A investigação apura pagamentos da Oi para empresas ligadas a Lulinha e seus sócios que somaram R$ 132 milhões.  Segundo as apurações, parte desses recursos pode ter sido usada para a compra do sítio de Atibaia, pivô de uma das duas condenações já impostas ao ex-presidente na Lava-Jato.

Relembre: Todas as fases da Lava-Jato

De acordo com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, empresas do Grupo Oi/Telemar realizaram as transferências em troca de vantagens obtidas no governo federal em meio ao processo de aquisição da Brasil Telecom - compra que dependia de uma mudança na legislação.

Na representação feita à juíza Gabriela Hardt, além dos mandados de busca e apreensão, o delegado Dante Pegoraro Lemos afirma que era necessário impedir "nova ação imediata de envolvido", destacando que já teriam oportunidade de arquitetar, comandar ou participar de "possível ação de ocultação ou destruição de provas quando da deflagração da 24ª fase da Lava-Jato, em março de 2016.
Os argumentos da Polícia Federal, no entanto, não convenceram o Ministério Público Federal, que se posicionou contra a prisão. Hardt concordou com os procuradores.

A juíza afirmou que não há necessidade de decretação de prisão temporária visto que alguns deles já foram alvos de buscas e apreensão há mais de 3 anos e já possuem ciência de que são alvo de investigações. "O quadro probatório acima descrito é mais do que suficiente para caracterizar causa provável a justificar a realização das buscas e apreensões requeridas pelo MPF, no intuito de buscar novos elementos de prova visando aprofundar as investigações", afirmou a juíza.

Ao todo, foram expedidos 30 mandados de busca e apreensão para a coleta de provas relativa aos crimes de lavagem de dinheiro, organização criminosa, falsidade ideológica e financeira.

O Globo - Brasil

STF confuso, Lula solto e suspeição de Moro: como pensa o presidente do TRF4, Victor Laus - Gazeta do Povo

Fernanda Trisotto

No final de novembro, a 8ª Turma do Tribunal Regional da 4.ª Região (TRF4) não apenas confirmou, como também aumentou a pena imposta ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no processo do sítio de Atibaia, a segunda condenação dele no âmbito da operação Lava Jato.  A decisão ocorreu pouco tempo após o Supremo Tribunal Federal (STF) revisar seu entendimento sobre a sequência da apresentação de alegações finais pelos acusados. Há quem diga que foi uma afronta em relação ao órgão superior. Mas não é o que pensa o presidente do TRF-4, o desembargador Victor Luiz dos Santos Laus.
 “Como o Supremo Tribunal Federal não havia delimitado a forma como seriam feitos esses julgamentos, os desembargadores agiram com absoluta autonomia e liberdade. Eu não vejo no que isso possa ser considerado como uma afronta, uma provocação ao Supremo Tribunal Federal”, declarou Victor Laus em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo. E mais: para Laus, essa “indecisão” do STF atrapalha o andamento do poder Judiciário como um todo, em que pese ser normal revisitar posições de tempos em tempos, na visão do juiz.

É óbvio que quando o Supremo Tribunal Federal decide, a expectativa é que a decisão dele sinalize, oriente, todas as outras instâncias. Mas o que nós temos visto, e você há de convir comigo, é que as últimas decisões do Supremo decidem, mas não decidem. A Corte chega a uma conclusão, mas na hora de enunciar essa conclusão, na hora de proclamar, fica para um segundo momento”, analisa.

O desembargador Victor Laus esteve na redação do jornal nesta segunda-feira (9), e conversou sobre a atuação do TRF4 como revisor dos processos da Lava Jato, o “modus operandi” da operação, o caso de plágio na sentença da juíza Gabriela Hardt, a suspeição de Sergio Moro, o papel do STF e outros temas. O TRF4 é o órgão revisor da Lava Jato. 

Como o senhor avaliou o resultado do último julgamento do caso do sítio de Atibaia, em que o ex-presidente Lula é réu. 
A 8ª turma não só confirmou a sentença, como aumentou a pena. Qual sua avaliação?
Na realidade o nosso tribunal já tem uma longa experiência na matéria criminal. Nós temos duas turmas do âmbito do tribunal que julgam a matéria penal e desde pelo menos 2009 essas turmas julgam exclusivamente processos criminais. Portanto, os desembargadores e juízes que integram essas turmas são profissionais altamente experientes, na matéria criminal e esse julgamento do dia 27, do sítio de Atibaia, na realidade vai nessa linha.

Era um caso, que de certa forma tinha a sua complexidade, mas que teve pela frente três juízes acostumados a decidirem causas complexas, causas de repercussão. Pelo que eu acompanhei, e eu só conheço pela imprensa detalhes desse caso, na realidade o julgamento foi estritamente baseado naquilo que o processo continha, e não pode ser diferente. O juiz quando forma sua convicção, ele analisa os argumentos do Ministério Público, que em princípio formula a acusação, ouve os argumentos que os advogados e a defesa apresentam, no sentido de defender quem está sendo acusado, e nesse entrechoque de posições o juiz analisa o conjunto de provas que existem nos autos e forma sua convicção, no sentido de reconhecer a razão a um outro lado. Nesse caso em particular, formou-se o juízo condenatório em função das pessoas que estavam sendo acusadas, em razão de todas as provas que existiam nos autos.

Como o senhor vê a decisão da 8ª turma, de confirmação dessa sentença, mesmo após o STF ter mudado o entendimento sobre a sequência da apresentação de alegações finais pelos acusados? 
Considera que houve um tipo de enfrentamento por parte do TRF4 em relação ao órgão superior?
 Na realidade, o Supremo Tribunal Federal havia tomado uma decisão próximo a data desse julgamento, enfrentando um processo envolvendo uma terceira pessoa. E nessa oportunidade, a maioria dos ministros entendeu que deveria ser observado um outro procedimento, uma nova ordem de apresentação dessas alegações finais. Mas, no final desse julgamento do Supremo Tribunal Federal, o ministro presidente [Dias Toffoli] anunciou que seria feita uma determinada modulação dos efeitos dessa decisão.

Acontece que essa modulação até o determinado momento não ocorreu. Enquanto não houver essa modulação, todos os tribunais do país podem decidir como entender de direito e foi o que aconteceu no dia 27 [de novembro, no TRF4]. Os desembargadores, a respeito dessa específica questão jurídica, entenderam que não estava demonstrado o prejuízo para um dos acusados. Como Supremo Tribunal Federal não havia delimitado a forma como seriam feitos esses julgamentos, os desembargadores no dia 27 agiram com absoluta autonomia e liberdade. Eu não vejo no que isso possa ser considerado como uma afronta, uma provocação ao Supremo Tribunal Federal.

Antes de assumir a presidência do TRF4, o senhor atuou em diversos julgamentos envolvendo processos da operação Lava Jato. 
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o senhor declarou que em cinco anos nunca ouviu um advogado envolvido em casos da operação defendendo a inocência do cliente no mérito. 
Por que? 
O que isso diz sobre o nosso sistema?
Ao longo desses anos na operação Lava Jato, o tribunal, no caso a 8.ª turma, se debruçou com recursos chamados habeas corpus. Tiveram outros recursos, mas na grande generalidade dos casos foram habeas corpus. E habeas corpus é um instrumento jurídico que não permite uma defesa mais aprofundada. Sem embargo disso, o habeas corpus permite uma defesa, por exemplo, específica relativamente a você dizer que o seu cliente não tem responsabilidade sobre aquilo de que ele está sendo acusado. Mas ao longo desses quatro, cinco anos, esses habeas corpus nunca giraram em torno disso especificamente. Sempre se detiveram em aspectos de forma das ações, nulidades, arguições de impedimentos, ou seja, questões periféricas. O cerne da questão, o âmago da questão, da responsabilidade de quem é acusado, nunca foi objeto de contestação ao longo desses anos. Mais recentemente, sim, o tribunal está julgando agora as apelações criminais.

Então, naturalmente apelação é um recurso em que a controvérsia é examinada profundamente. Agora sim os advogados se viram, digamos assim, obrigados a enfrentar também esses aspectos. Mas já poderia tê-lo feito antes. Talvez tenha sido uma estratégia, eu não sei, eu não entro nesse debate. Mas o fato é que, a grosso modo, nunca se disse que alguém teria sido inocentemente, injustamente, acusado. Poderiam tê-lo feito então. Na realidade, a operação Lava Jato se muniu de um conjunto de elementos, reuniu um conjunto de evidências que provavelmente dissuadiu os advogados de usarem essa tese.

Ou seja, isso demonstra que o trabalho de todos aqueles profissionais que se envolveram na denominada força-tarefa Receita Federal, Controladoria-Geral da União, Advocacia da União, Ministério Público Federal, Polícia Federal – foi um trabalho compartilhado de todas aquelas pessoas que compõem o que eu chamo, e muita gente chama, de sistema de integridade. Isso põe por terra a afirmação de que a operação Lava Jato queria prejudicar A ou B. Não houve isso, nunca houve isso. Sempre foi um trabalho bem feito, sólido, tanto sólido que nunca foi objeto de contestação mais aprofundada.

O senhor considera a Lava Jato um marco para o Judiciário brasileiro?
Eu considero que a operação Lava Jato foi uma ruptura de paradigma. Se nós consideramos que, até 2013, as outras operações policiais que foram realizadas, e tiveram várias, sempre esbarraram em problemas que nos tribunais superiores foram reconhecidos de modo a anulá-las – a Castelo de Areia, Hidra e várias operações –, o que há de novo na operação Lava Jato? Esses profissionais que falei há pouco, lá em 2013, conheciam essas decisões. Em conhecendo o que se decidir, eles se prepararam. Eles olharam: ‘Olha mas não podemos agir dessa forma porque isso os tribunais dizem que está errado. Nós não podemos fazer isso, porque isso tribunais dizem que é insuficiente. Nós não podemos fazer assim, porque isso os tribunais dizem que está errado. Vamos consertar isso.’

E fizeram isso: foram afastando essas lacunas, essas falhas, que eram reconhecidas, de modo que criaram uma forma de trabalho, um método de trabalho. Eu não gosto de usar o juridiquês, mas em Direito nós chamamos modus operandi: encontrar um método de trabalho que afastava todas essas deficiências, que até então vitimavam e anulavam mais investigações. Essa é a receita do sucesso da operação Lava Jato. Eles foram previdentes: se deram conta de tudo o que havia de errado até então, procuraram evitar esses mesmos erros e fizeram um trabalho consequente. Tanto é que nós estamos esses anos todos aí investigando fatos que não são do dia a dia. São fatos de certa forma complexos, porque envolvem a maior empresa petrolífera do país.

Qual sua avaliação sobre a questão do suposto plágio na sentença de primeira instância do sítio de Atibaia?
Essa expressão “copia e cola” está descontextualizada. O público que estiver nos ouvindo, se eventualmente tiver feito mestrado, doutorado ou algum trabalho acadêmico, sabe do que nós vamos falar. Na realidade, é uma estratégia para todo profissional que trabalha com texto fazer o que chamamos de fichamento. A medida em que você vai estudando, você vai separando matérias, você vai fazer um fichamento para num dado momento reunir todo esse material e elaborar seu texto.

No caso concreto, me parece que foi exatamente do que se trata. Ou seja: a juíza Gabriela Hardt tinha uma estrutura de uma sentença, de certa forma delineada no caso paradigma, e essa sentença havia sido feita pelo então juiz Sergio Moro. Ela muito provavelmente tomando como paradigma essa estrutura da sentença procurou adaptar a essa estrutura questões relativas àquele caso que ela estava tratando. E por uma desatenção, creio eu, constou uma locução se referindo ao apartamento, que seria o processo do tríplex, no processo em julgamento, que era do sítio de Atibaia. Agora, daí se dizer por esse fato absolutamente involuntário que houve uma cópia de uma sentença do doutor Moro vai uma longa distância. Quem é professor sabe qual é a técnica de um bom estudante. Ninguém larga do zero: a gente vai reunir elementos, num dado momento a gente reúne e chega ao trabalho final.

Exatamente por isso, que você mencionou agora há pouco, doutor Moro foi questionado por isso. Eu me lembro, uma vez, um advogado entrou com um recurso questionando a rapidez com que o doutor Moro decidia, como se houvesse um Direito a demorar para decidir. Mas o advogado se insurgia: “mas como é que esse juiz julga tão rápido? Não é ele que julga, alguém faz a sentença para ele”. Mas doutor Moro é doutor em Direito, ou seja, ele sabe como se trabalha. Ele vinha pouco a pouco preparando sentença, ia tomando anotações e num dado momento, esgotável a instrução criminal, ele tinha a sentença pronta. Não demorava, diferente de outros juízes que não fazem isso, e quando acaba a instrução largam do zero. Consequentemente vão demorar mais. É uma técnica de trabalho, um método de trabalho, então não vejo nada de extraordinário nisso.

Qual a sua opinião sobre o pedido de suspeição do ex-juiz Sergio Moro, feito pela defesa do ex-presidente Lula, com base nos diálogos divulgados pelo site The Intercept?
 Eu já tive oportunidade de falar sobre isso. O Supremo Tribunal Federal, no episódio de Joesley Batista, em que ele gravou o presidente Michel Temer, no dia em que foi anunciado aquela gravação veio a público dizer: “isso é irregular, isso é ilegal. Bota aquela fita no lixo porque aquilo não vale nada”. Discutiu-se meses a fio a respeito daquela gravação realizada por Joesley Batista.

O que é diferente entre o episódio Joesley Batista e o episódio envolvendo esse site que vem divulgando essas notícias? Joesley Batista estava conversando com o presidente Michel Temer, era um dos interlocutores da conversa. Se eu e você estamos conversando e eu ligo meu celular na função gravação, eu posso amanhã divulgar o áudio porque sou eu que estou conversando com você. E você pode fazer o mesmo, porque nós dois estamos conversando. Ou seja, os participantes da conversação podem mutualmente se gravar e não há nada de ilegal nisso – é até uma defesa sua ou minha. No episódio do Intercept, diferentemente, um terceiro grampeou as conversações que se estabeleciam no aplicativo em questão. Nós sabemos que foi um terceiro que fez isso aí. Isso se chama grampo e grampo, para nós, é ilegal – quem disse isso foi o Supremo Tribunal Federal.

Então, na realidade, o Supremo tem um problema para resolver:
como é que ele vai considerar essas mensagens obtidas pelo site Intercept se elas partem de um grampo? 
Em Direito, nós dissemos que prova nula não gera prova válida. O que é nulo é nulo, tem que ser tornado sem efeito. Eu diria a você que nós estamos diante de uma ilicitude e é bom que o Supremo pense a respeito quando vier a decidir, porque caso ele opte por alterar a sua jurisprudência, ele terá que resolver um grande problema. Amanhã, eu posso gravar o seu celular sem a sua autorização e espalhar para quem quer que seja. Mas, temos que respeitar a privacidade dos outros. Quando eu quero invadir a sua privacidade, eu tenho que pedir ao juiz para dar uma autorização. Nesse caso, o que houve foi um grampo e grampo, para mim, é ilegal.

Como o senhor avalia a recente decisão do STF que proíbe a prisão depois do julgamento de segunda instância?
 O Supremo Tribunal Federal havia decidido essa questão pela primeira vez em 2009. Em 2009, os ministros que compunham o Supremo na época entenderam que a prisão só poderia se dar após o último dos recursos possíveis. Em 2016, ele voltou a examinar o tema e nessa oportunidade, por sete votos a quatro, passou a entender que a prisão poderia se dar já a partir do julgamento de segunda instância. A questão estava superada, no intervalo de sete anos entre uma decisão e outra, estava superada. Em decorrência da decisão de 2016, o nosso tribunal, o TRF4, aprovou a denominada súmula 122. E, doravante, sempre que houvesse uma decisão em segundo grau, não sujeita a qualquer recurso com efeito suspensivo, se dava o cumprimento da pena. E vários tribunais agiram da mesma forma.

Agora no último julgamento, ou seja, dois anos e alguma coisa depois, quase três anos, o Supremo resolveu reabrir essa discussão. Perceba: não há nenhum problema que um juiz revise o seu ponto de vista. As pessoas evoluem, as pessoas alteram as suas compreensões. Mas, eu acredito que esse último julgamento, ele não estava maduro para acontecer. E a prova disso: o tribunal é composto por 11 ministros – cinco se mantiveram fiéis a decisão de 2009 e cinco fiéis a decisão de 2016. Como o tribunal é composto por 11 ministros, o presidente tinha que dar o voto de desempate. Teoricamente, quando você tem cinco para um lado, cinco para o outro, o desempate ou adere a uma posição ou outra, mas o presidente saiu por uma terceira via. O presidente disse assim: ‘não, essa questão não é de natureza constitucional. Isso é um problema do Congresso’. E daí começou a confusão.

Hoje, nós temos alguns deputados e senadores entendendo que tem que ser feito um projeto de lei para alterar o Código de Processo Penal, no artigo 283. E outros deputados e senadores entendendo que tem que ser feita uma proposta de emenda à Constituição para alterar o artigo 5.°. Durma-se com um barulho desse, não é? Essa questão está entregue pelo voto do ministro presidente do Supremo Tribunal Federal ao Congresso Nacional. Nós já recebemos habeas corpus da ministra Cármen Lúcia, por exemplo, mandando colocar em liberdade todos os presos que desde a aprovação da nossa súmula 122 estão cumprindo pena. Nós já demos cumprimento a essa decisão e isso está acontecendo em vários tribunais do país. O Congresso Nacional tem que tomar uma decisão: ou bem ele altera o Código de Processo Penal ou bem ele altera a Constituição. É esse o estado da arte, digamos assim.

O senhor acha que é esse o caminho mais correto ou definitivo, a via legislativa?
Na realidade, quem pode garantir que se o Congresso Nacional vier alterar o Código de Processo Penal não haverá um novo questionamento no Supremo e o tribunal novamente se divida como se dividiu? Porque o grande debate está, a meu juízo parece, no artigo 5º da Constituição, a devida interpretação a ser dada ao artigo quinto. E essa interpretação não pode ser feita isoladamente ao que prevê os artigos 102 e 105 da Constituição – são três artigos da Constituição. “Ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória”. O artigo não diz ninguém poderá ser preso, diz ninguém será culpado. O artigo 102 e o artigo 105, cada um respectivamente, estabelecem recurso extraordinário, é dirigido ao Supremo, recurso especial, é dirigido ao STJ, não se presta reexame de prova. Esse é o debate.

Se os tribunais superiores, ordinariamente, não reexaminam provas, a prova se esgota com a decisão de segundo grau. Se a prova se esgota com a decisão de segundo grau, é no segundo grau que se reconhece se alguém é culpado ou não. Então, esse é o grande debate. Ou seja: por que aguardar o último recurso se esses recursos não examinam prova? Me parece que pode o Congresso Nacional alterar o Código Processo Penal, mas, amanhã ou depois, nós poderíamos ter um quarto julgamento para novamente enfrentar essa questão. O bom seria que pacificasse.

Decisões da Justiça vêm sendo mais questionadas pela população e há um debate sobre a insegurança jurídica gerada por algumas delas. Qual sua opinião?
 É natural que, de tempo em tempo, as questões sejam reexaminadas. Não há nada de errado nisso. O que me parece importante é tentar entender o porquê isso acontece. Tem várias razões: razões sociológicas, antropológicas, filosóficas, tem várias questões. Mas, talvez, uma delas esteja em certa parte na nossa Constituição. A nossa Constituição é um diploma muito extenso. Em 1988, o ano da Assembleia Nacional Constituinte, os deputados e senadores que participaram daquela Assembleia chegaram à conclusão de que algumas questões deveriam ficar abertas, não poderiam ser fechadas. É por isso que se diz que a nossa Constituição é uma Constituição aberta.

Toda Constituição aberta, que não é clara em sua redação, abre uma grande margem de interpretação. E a interpretação da Constituição no nosso modelo é assegurada a todo e qualquer juiz desse país – desde o juiz mais novo, com um minuto de carreira, até o ministro do Supremo mais antigo. Todo e qualquer juiz nesse país pode decidir sobre a interpretação da Constituição.

É óbvio que quando o Supremo Tribunal Federal decide, a expectativa é que a decisão dele sinalize, oriente, todas as outras instâncias. Mas o que nós temos visto, e você há de convir comigo, é que as últimas decisões do Supremo decidem, mas não decidem. A Corte chega a uma conclusão, mas na hora de enunciar essa conclusão, na hora de proclamar, fica para um segundo momento. Ou seja, está havendo um debate muito grande dentro da própria Suprema Corte. Eu acredito que a hora que esse debate na Suprema Corte se pacificar, todo o poder Judiciário por tabela, vamos dizer assim, vai alcançar uma maior pacificação.

Na sua opinião, a pressão popular influencia o comportamento do Judiciário brasileiro?
Eu acredito que em função desse conteúdo acentuadamente vago da nossa Constituição, no Brasil se tornou corriqueiro se debater. Alguns chamam isso de polarização. Na realidade, existe um grande esgarçamento na sociedade, alguns chamam de discurso de ódio. As pessoas entram numa rede social, estabelecem discussões sem fim, que ninguém sabe como começou e nem como vai terminar de debater.

As pessoas debaterem faz parte, é do dia a dia. As pessoas irem para rua reivindicar é uma expressão da cidadania. É bom, isso é bom. Mas seria melhor se as pessoas fossem para rua com um objetivo. Porque, senão, fica uma manifestação sem rumo e com o tempo isso enfraquece essa manifestação. As pessoas cansam.

O brasileiro é um cidadão que com o tempo ele se desinteressa por algumas coisas, ele tem fases: hoje eu vou focar nisso, amanhã eu vou focar naquilo. E de galho em galho, as pessoas vão mudando e a vida segue. Mas, quando se envolve uma manifestação, uma expressão da cidadania, isso é uma coisa importante. Eu penso que essas reivindicações têm que ter foco, objetivo. E para isso, você tem que ter um debate prévio.

Na realidade, nós temos que aprimorar o funcionamento das instituições de modo que as pessoas tenham essa oportunidade do debate prévio, porque senão fica debater por debater. Ou seja: colégio, universidades, família, sociedade, empresas, política... A política não precisa ser necessariamente execrada, a política é boa, por isso que faz parte da sociedade, constrói a sociedade. Temos que apostar em bons políticos. O sistema está passando por um processo de reoxigenação, então quando se fala também no Judiciário é porque o Judiciário também tem a sua mea culpa.

O discurso jurídico, o nosso jargão jurídico é muito fechado, é muito hermético. É um juridiquês. Nós, juízes, temos que aprender a nos comunicar para a sociedade. Nós temos que falar de uma forma que as pessoas entendam sobre o que nós estamos falando. A partir do momento em que o Judiciário fizer isso, que a política fizer isso, que a empresa fizer isso, que na academia, na universidade, os professores fizerem isso as pessoas vão entender melhor as coisas e daí o diálogo vai fluir. Discordar do outro nunca foi um problema. Mas você tem que saber do que você está discordando e porque você está discordando.

Gazeta do Povo, República - Vídeo da entrevista