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sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Eletrobras é uma empresa privada? Governo e Judiciário parecem achar que não - O Estado de S. Paulo

Elena Landau

Decisão sobre limite do poder de voto do governo e suspensão de assembleia de acionistas foram interferências recentes na companhia

A Eletrobras é uma empresa privada. 
O governo e o Judiciário parecem não querer entender isso. 
Ela foi privatizada via capitalização em uma operação de diluição da participação acionária da União, aprovada pelo Congresso
O governo vendeu o controle e os novos acionistas pagaram por isso. Assim, a atual administração tem direito de decidir incorporação de subsidiárias e demissão de funcionários, com ou sem PDV. 
A limitação do poder de voto não importa, porque o governo continuaria com menos representantes no Conselho que o setor privado. 
 
A interferência do Judiciário nas decisões da empresa tem sido uma constante. Primeiro, o ministro Nunes Marques deu prosseguimento à absurda Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada pela AGU que questiona o limite do poder de voto.  
Mais absurda ainda foi a decisão do ministro de entregar uma matéria que, teoricamente, seria sobre constitucionalidade para uma arbitragem na Câmara da própria AGU. Difícil entender para que serve o STF se não for para decisões sobre uma ADI. 
 
Agora veio a suspensão de uma assembleia de acionistas para votar a incorporação de Furnas por conta de uma liminar de tribunal trabalhista! E, de novo, vai parar no STF. 
Espero que dessa vez a Corte não lave as mãos. 
 
A reação contra a incorporação de Furnas é essencialmente política
É da área de influência do senador Rodrigo Pacheco e do seu aliado Alexandre Silveira, o ministro de Minas e Energia. Sempre foi. 
As subsidiárias da empresa têm o apelido de descontroladas, e não é por acaso. 
Como ex-conselheira da Eletrobras, tenho certeza de que a incorporação trará enormes ganhos de eficiência, a começar pela eliminação de camadas administrativas desnecessárias, como diretorias executivas e Conselho de Administração, carregando juntos cargos comissionados. [é sabido que nas empresas ligadas à energia tem vários cargos comissionados, com salários altíssimos, ocupados por     sumidades em NADA, que ocupam vagas ministeriais no amontoado de inúteis que o presidente Da Silva chama de ministério.]
 
A medida não deverá ter impacto significativo sobre trabalhadores que estão ligados à operação de usinas nem na sua importante participação na construção da inteligência do setor. 
A holding não arriscaria perder esse grande ativo. Isso os tribunais trabalhistas ignoram. 
E é somente a perda da possibilidade de indicar cargos que incomoda o governo e seus aliados.  
O STF poderia aproveitar para cassar a liminar que suspendeu a Lei das Estatais. 
Se em empresa privada tem olho gordo, imagine nas públicas.
O ministro de Minas e Energia deveria estar mais preocupado com Itaipu. A empresa é pública e ainda assim se recusa a repassar para tarifas os ganhos decorrentes do fim do pagamento da dívida
Prefere gastar em obras no Paraná. É tudo politicagem, e só.
 
Elena Landau - O Estado de S. Paulo
 
 

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

A nova privatização - Nas Entrelinhas

Luiz Carlos Azedo 

“A ‘malaise’ das estatais não é só consequência da incompetência na gestão, mas do fato de que desvia o foco dos partidos de sua principal missão: promover o bem comum”

O governo anunciou ontem seu programa de privatizações, no qual foram incluídas nove estatais, após reunião da secretária de Parcerias Público-Privadas, Martha Seiller, e do secretário de Desestatização, Salim Mattar, com o presidente Jair Bolsonaro. Telecomunicações Brasileiras S/A (Telebras), Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Correios), Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev), Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Empresa Gestora de Ativos (Emgea), Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) e Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF) serão vendidas.

Ao apresentar o programa, Mattar revelou a intenção de promover a maior queima de ativos da União possível, privatizando creches, presídios e parques, mas não explicitou qual será a forma de privatização. Caberá ao BNDES elaborar o programa, examinando as condições de mercado e as possibilidades reais na atual conjuntura econômica. Há privatizações e privatizações. Os argumentos a favor da venda de ativos são verdadeiros. O país não tem como financiar investimentos na modernização de nossa infraestrutura sem a venda de ativos e a entrega de serviços à exploração das empresas privadas. Além disso, a maioria das empresas estatais esteve a serviço dos partidos políticos, que miram seus próprios interesses e não os da sociedade. O problema é como isso será feito.

A narrativa ultraliberal do governo, ao apresentar o programa, tende a reproduzir a velha polarização esquerda versus direita, ou seja, o embate entre um projeto nacional desenvolvimentista e o modelo neoliberal. É a mesma narrativa dos anos 1980, quando Margaret Tatcher, a primeira-ministra conservadora, reformou a economia britânica. Essa polêmica parecia ultrapassada depois das privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso, mesmo assim pautou as eleições presidenciais até 2014. É muito provável que seja um assunto vencido, como foi o caso da reforma da Previdência, mas seu marco regulatório, ainda não. Esse é o debate aberto na comissão especial da Câmara que discutirá o modelo de concessões, parcerias público-privadas e privatizações, cujo relator é o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP).

Governança
O Estado de bem-estar social e o sistema político representativo entraram em crise a partir da terceira revolução industrial, já estamos na quarta. O problema é que isso pôs em risco a democracia. A ligação entre liberalismo econômico e democracia liberal nunca foi automática. Muito menos a globalização é sinônimo de avanço da democracia. A ideia de que a democracia é um credo universal associado ao capitalismo também é falsa. Há uma corrida mundial entre o Ocidente e o Oriente para reinventar o Estado, cujo objetivo é modernizar a economia e não necessariamente aperfeiçoar a democracia. Não se pode dizer, por exemplo, que os Estados Unidos (uma democracia liberal) estão se saindo melhor nessa corrida do que a China (uma ditadura comunista).

A  “malaise” das estatais não é só consequência da incompetência dos políticos na sua gestão, mas do fato de que a administração de empresas e de serviços desvia o foco dos partidos de sua principal missão: promover o bem comum. O resto é consequência. A gestão da nossa riqueza pública estará no centro desse debate sobre as privatizações. A esquerda demoniza o uso de mecanismos de mercado para melhorar a situação do Estado. A direita demoniza o uso do Estado para lidar com as falhas do mercado. Enquanto isso, as empresas de tecnologia estão reinventando o mundo.

A solução adotada pela Suécia é um “case” das privatizações: retirar a governança dos ativos públicos das mãos dos políticos e passá-los à gestão de profissionais gabaritados. A criação de holdings para administrar os ativos públicos é uma experiência bem-sucedida em países como Finlândia, Áustria, Reino Unido e Alemanha. A Suécia adotou um modelo fragmentado, no qual os donos originais mantiveram seus ativos em várias holdings; a Finlândia optou por centralizar os ativos numa só holding. Em ambos os casos, a gestão foi confiada a profissionais de mercado, sem interferência política, com um modelo de gestão semelhante aos modelos dos bancos centrais e dos fundos de pensão.

O caso do Deutsche Bundespost da Alemanha é dos mais emblemáticos. Em 1995, a empresa foi transformada em três sociedades anônimas. Hoje, o Deutsche Post atua em 220 países, emprega 480 mil pessoas e movimenta 55 bilhões de euros. A nossa riqueza pública é muito maior do que a dívida pública; administrá-la melhor poderia ajudar a resolver o problema do endividamento, ao mesmo tempo em que financiaria o crescimento econômico. O mais importante não é necessariamente a propriedade, é o rendimento dos ativos públicos. Melhorar a gestão desses recursos é fundamental para o equilíbrio fiscal. Mais ainda para combater a corrupção e fortalecer a democracia.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB 


sábado, 26 de maio de 2018

Empresário afirma ser dono dos R$ 51 milhões de apartamento em Salvador

Valor é parte de um montante de R$ 65 milhões pagos como propina, segundo o empresário baiano

Se até hoje, quase nove meses depois da apreensão pela Polícia Federal de mais de R$ 51 milhões em dinheiro em um apartamento em Salvador, os irmãos Geddel e Lúcio Vieira Lima não reivindicaram a propriedade nem deram explicações sobre a origem da fortuna, tem quem o faça. Diferentemente da Procuradoria-Geral da República, que afirma em denúncia que o dinheiro tem origem em propinas da construtora Odebrecht, o empresário baiano Carmerino Conceição de Souza acha que é dele.
Bunker - A Lava-Jato continuou produzindo cenas impressionantes em 2017: a Polícia Federal apreendeu 51 milhões de reais escondidos em um apartamento usado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima, que está preso em Brasília (Policia Federal/Divulgação)


E diz mais: os R$ 51 milhões apreendidos no âmbito da operação Tesouro Perdido, em setembro, seriam parte de um montante de R$ 65 milhões que ele afirma ter repassado em dinheiro a um intermediário de Geddel – e do qual não recebeu a contrapartida acertada com o ex-ministro, uma carta-fiança da Caixa Econômica Federal para fundamentar um pedido de financiamento no valor de R$ 110 milhões junto ao BNDES. “Até hoje, não houve a aplicação”, disse.  Segundo Carmerino, a negociação foi acertada pessoalmente com Geddel “no final de 2012 ou início de 2013”, quando o ex-ministro era vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa.

Ele relata que o dinheiro foi entregue por um de seus sócios entre os meses de outubro e dezembro de 2015 na superintendência de Pessoa Jurídica na Bahia. À época, Geddel não estava mais na Caixa. Ele foi exonerado em dezembro de 2013.  Segundo o empresário, foram “mais de dez” entregas. “No total, foram 225 envelopes cheios de notas de R$ 50 e R$ 100, guardados em 19 malotes”, disse, citando as mesmas características do dinheiro apreendido pela Polícia Federal.

Carmerino afirma “acreditar” que tenha os recibos dessa transação. “De qualquer forma, deve ter imagem de câmeras de segurança mostrando as entregas dos malotes. Já pedi isso à Caixa, mas eles não me atendem. Quando chego lá, parece que sou um fantasma.”
Ele nega que a transação com Geddel tenha sido pagamento de propina. “Não tem por que pagar propina. Dei o dinheiro para receber a aplicação”, disse. Afirmando conhecer Geddel há pelo menos 20 anos, Carmerino disse não acreditar que o ex-ministro tenha agido de má-fé. “Se ele guardou esse dinheiro, é porque não tinha nenhuma maldade”, afirmou.

Segundo ele, os pagamentos “à Caixa” foram feitos em dinheiro porque é assim que suas empresas recebem da maioria de seus clientes. “Tratamos com muita gente ‘negativada’, que não podem usar a conta bancária. Por isso recebíamos muito em dinheiro. Mas estamos mudando isso”, disse.  O empresário se apresenta como presidente do grupo Polocal, holding que reúne mais de 30 empresas em 19 Estados, com cerca de 300 funcionários. As atividades do grupo vão da manutenção predial à venda parcelada de veículos. O faturamento anual, segundo ele, é de cerca de R$ 300 milhões.

Busca
Carmerino disse que após a apreensão dos R$ 51 milhões e a posterior prisão de Geddel, iniciou uma verdadeira peregrinação atrás do dinheiro. Procurou a PF em Salvador e pediu para visitar o ex-ministro, que está preso desde setembro no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.  A PF o orientou a procurar a defesa de Geddel, o que foi feito diversas vezes e insistentemente, segundo o advogado Gamil Foppel. Em petição enviada à PF, cujo conteúdo foi revelado pela coluna Satélite, do jornal Correio, de Salvador, Foppel informa que o empresário “tem insistido em buscar contato com este peticionário e demais advogados do escritório, passando a proferir expressas ameaças contra a defesa técnica”.
“A insistência do referido senhor já tem causado estorvo ao normal funcionamento do escritório diante do número absolutamente elevado de ligações diárias (que superam o total de duas dezenas)”, escreveu o advogado.

Em resposta, Foppel orientou o empresário a procurar a PF “para que, perante a autoridade policial, ele pudesse esclarecer os fatos que julgasse pertinentes, notadamente sobre a sua alegada propriedade”. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o advogado disse que as alegações do empresário, “são absurdamente mentirosas”.

Carmerino diz que também tem procurado o deputado Lúcio Vieira Lima (MDB-BA) e a Caixa, igualmente sem resposta. Sua intenção, diz, é apenas reaver o dinheiro ou receber a carta-fiança. “Só preciso que Geddel diga: ‘foi fulano de tal que pegou e, se esse dinheiro não aparecer na Caixa, esse cidadão vai ter de explicar o que fez com ele”.
“Com relação à denúncia apresentada, a Caixa Econômica Federal esclarece que irá apurar internamente as declarações do empresário e, se necessário, acionará os órgãos competentes”, afirmou a Caixa em nota. Procurado pela reportagem, o deputado Lúcio Vieira Lima não retornou os contatos.

O Estado de S. Paulo - Veja