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terça-feira, 9 de maio de 2023

Licença para gastar - Revista Oeste

Branca Nunes


O arcabouço fiscal de Lula e Fernando Haddad permite ao governo esbanjar dinheiro público sem risco de punição 

 

 Ministro da Fazenda, Fernando Haddad | Foto: Montagem Revista Oeste/Lula Marques/ Agência Brasil/Shutterstock


Enquanto o PL 2630, também conhecido como Lei da Censura, espera na Câmara o momento de votação, outra ameaça acampada no Congresso espreita o bolso dos brasileiros. Batizado de arcabouço fiscal, o protótipo de projeto econômico apresentado por Fernando Haddad em 30 de março tem mais de 3 mil palavras, centenas delas rigorosamente incompreensíveis, que em resumo conferem ao governo federal licença para gastar — muito, e sem nenhum risco de punição.

A maior inovação do texto é de ordem linguística. Se quisesse facilitar a vida do brasileiro comum, o governo batizaria a novidade de plano fiscal, ou sistema fiscal
A opção por arcabouço confirma que governantes em dúvida não estão aí para explicar. Preferem confundir. 
Fundamentalmente, a lei de Haddad aposenta duas regras essenciais para manter a economia do país no rumo certo. Uma é a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), aprovada em maio de 2000, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. A segunda é o teto de gastos, que começou a vigorar em 2016, na gestão Michel Temer.

“A LRF criou regras mais duras de como os governos deveriam lidar com as contas públicas e tornou ilegal a irresponsabilidade fiscal”, explica o economista Hélio Beltrão. “Com essa lei, o governo ficou obrigado a estabelecer com antecedência — e a respeitar — a meta de gastos para os três anos seguintes.” O desrespeito à LRF pode custar uma série de punições, que incluem o impeachment ou a prisão de prefeitos, governadores e do presidente. Ignorar esses riscos foi um dos erros que encurtaram o mandato de Dilma Rousseff, por exemplo. Ministro da Fazenda, Fernando Haddad | Foto: Agência Brasil

O teto de gastos criou outra regra essencial para o equilíbrio das contas: o aumento das despesas para o ano seguinte deve limitar-se à inflação do ano corrente. “Antes do teto, os governos costumavam aumentar as despesas em média 6% acima da inflação”, lembra Beltrão. “O argumento de que tal limite compromete gastos com educação e segurança, por exemplo, é mentiroso”, complementa a economista Marina Helena, que ocupou a Diretoria de Desestatização do Ministério da Economia. “O problema do Brasil nunca foi falta de dinheiro, mas dinheiro gasto da forma errada. O teto obriga o governo a gastar melhor.”
 

De acordo com uma pesquisa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil gasta 5,6% do PIB em educação, perdendo apenas para Suécia, Bélgica, Islândia, Finlândia e Noruega. O valor médio dos demais países fica em 4,4%. Ao mesmo tempo, o Brasil é um dos 20 piores entre os 80 países que participam do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa).

O projeto de Haddad substitui o teto de gastos por um “piso de gastos”, permitindo o aumento das despesas em no mínimo 0,6% e no máximo 2,5% acima da inflação

Em contraponto ao argumento de que o teto de gastos já foi ultrapassado em outras ocasiões, como ocorreu durante a pandemia de covid-19, Beltrão pondera: “Para que o teto fosse furado, foi preciso aprovar uma emenda constitucional no Congresso. Houve uma longa discussão. O teto já sofreu reformas, mas nunca ocorreu a derrubada completa, como Lula e Haddad querem agora”.
 
Irresponsabilidade fiscal
Depois de atravessar a campanha presidencial sem divulgar um único projeto econômico, Lula conseguiu, em dezembro de 2022, que o Congresso aprovasse uma Proposta de Emenda à Constituição aumentando o limite do Orçamento em quase R$ 200 bilhões. Duas das “justificativas sociais” apresentadas pelo governo eleito: o aumento do salário mínimo e a manutenção em R$ 600 do Auxílio Brasil, novamente rebatizado de Bolsa Família.Foto: Reprodução/Google

A proposta da vez provocará um rombo ainda maior no Orçamento. Com o codinome Lei de Responsabilidade Fiscal 2.0, o arcabouço autoriza o governo a gastar mais e elevar o peso dos impostos. Embora limite a despesa a 70% do aumento da arrecadação, o projeto substitui o teto de gastos por um “piso de gastos”, permitindo o aumento das despesas em no mínimo 0,6% e no máximo 2,5% acima da inflação.

“O plano de Haddad é focado na arrecadação”, resume o economista Alan Ghani. “O governo pretende aumentar a arrecadação seja via impostos, seja via endividamento, seja via inflação”, acrescenta Marina Helena. “Caso a arrecadação cresça, gasta-se mais. Caso não cresça, gasta-se menos. Mas sempre se gasta. Assim, o dinheiro das famílias e das empresas, que deveria ser investido, vai para o governo.”Economista Alan Ghani | Foto: Reprodução Rumble

Entre os impostos já criados está a taxação, a partir de 2024, de brasileiros com investimentos no exterior. Para rendimentos entre R$ 6 mil e R$ 50 mil, a tributação será de 15%. Acima desse valor, o imposto alcançará 22,5%. Rendimentos de até R$ 6 mil estão isentos. Outra proposta que não avançou nos moldes originais taxava empresas varejistas como Shopee e Shein.

Apesar dos novos impostos, todos os economistas ouvidos por Oeste consideraram inatingívela arrecadação prevista pelo governo. “A projeção de crescimento de despesas e receitas é incompatível com a realidade”, conclui Marina Helena. “Para cumprir uma, não conseguirá cumprir a outra.”

O futuro do atraso

O plano econômico de Haddad ignora qualquer tipo de punição para o governo federal. “Na prática, o governo revoga o crime de responsabilidade”, afirma Beltrão. Marina Helena emenda: “O arcabouço fiscal se resume a entregar ao governo um cheque em branco para ele gastar à vontade, sem a menor responsabilidade”.

O medo de sofrer penalidades favoreceu a aprovação de projetos importantes cujo objetivo era o controle dos gastos públicos, caso da Reforma da Previdência e da minirreforma administrativa. “O principal problema do Brasil é a organização das contas públicas”, reitera Beltrão. “O governo tem muitos gastos e não quer parar de gastar. Cortar despesas nunca é uma opção.” O excesso de gasto público e o gigantismo do Estado sempre bloquearam o crescimento sustentável da economia brasileira.

Segundo Beltrão, o arcabouço é uma guinada que pode aproximar o Brasil da Argentina. Para o economista, é decepcionante ver o país destruir normas que vinham tentando corrigir as contas públicas há mais de 20 anos. “Voltar à gastança de antes é catastrófico, decepcionante, perigoso e irresponsável.” Ubiratan Jorge Iorio, colunista econômico de Oeste, sintetiza o sentimento em seis palavras: “O Brasil está andando para trás”. 
O arcabouço é uma guinada que pode aproximar o Brasil da Argentina  - [caso isto venha a ocorrer, os brasileiros estão f ...; ]-  Foto: Ricardo Stuckert/PR

Confrontado com tais horizontes, as bolsas de valores caíram e os investidores aguardam apreensivos a votação no Congresso, que pode acontecer a qualquer momento. A proposta do governo confirma o que Fernando Haddad confessou, em tom de brincadeira, num vídeo que circulou pelas redes sociais antes de assumir o Ministério da Fazenda: “Apesar de dar uns pitacos, eu estudei dois meses de economia”. Tradução: Haddad acabou de assumir a chefia do exército federal num tipo de batalha que nunca travou. 

Leia também “O Brasil visto pelos arqueólogos do futuro”
 
 

sexta-feira, 7 de abril de 2023

Brasil pode integrar a Otan? Entenda se o país tem chances de entrar para a aliança militar

Militares do Exército Brasileiro durante treinamento
Militares do Exército Brasileiro durante treinamento - Ailton de Freitas

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) cresceu nesta semana. Com a adesão da Finlândia, a aliança militar chegou a 31 países-membro, unindo quase todo o território da América do Norte ao Leste Europeu sob um compromisso de defesa coletivo em caso de agressão externa. O ingresso dos finlandeses no bloco reacendeu uma pergunta antiga: o Brasil pode se tornar um membro da Otan?

A última vez em que o assunto esteve em alta foi em 2019, quando Donald Trump e Jair Bolsonaro ainda ocupavam as presidências de Estados Unidos e Brasil, respectivamente. Após um encontro dos dois mandatários em Washington, os EUA reconheceram o Brasil como um aliado prioritário extra-Otan. À época, Bolsonaro afirmou em Brasília:— Nós tratamos disso na última viagem que eu fiz aos EUA. Conversei com o Trump. A ideia dele era até nos colocar, mas teria que mexer no estatuto dentro da Otan —, disse o então presidente em frente ao Alvorada um dia depois da confirmação.

O limite estatutário ao qual o ex-presidente se referiu em 2019 é o Artigo 10° do tratado fundador da aliança, que dispõe sobre a inclusão de novos membros ao acordo. O texto diz: "As partes podem, por acordo unânime, convidar qualquer outro Estado europeu em posição de promover os princípios deste Tratado e contribuir para a segurança da área do Atlântico Norte a aderir a este Tratado".

A limitação a Estados europeus tem a ver com a própria fundação da aliança. Criada em 1949 para conter a influência da União Soviética no Ocidente, o acordo previa a defesa de um grupo de países muito específico. De acordo com o professor de Relações Internacionais Vinicius Rodrigues Vieira, do Centro Universitário FAAP, aspectos culturais foram e são definidores para a própria existência da organização.

"A Otan não é apenas uma aliança militar para a defesa de Estados. Muitos analisam que ela é a defesa do coração da chamada civilização ocidental. Ela possui um contexto civilizacional, lembrando que, aos olhos da política internacional, o Brasil não é parte do Ocidente, mas sim da América Latina", disse o professor em entrevista a O GLOBO.

A outra aliança
Se apenas uma mudança profunda no centro da Otan poderia fazer o Brasil entrar na organização, não significa dizer que o país fica sem nenhuma possibilidade de defesa coletiva diante de uma ameaça estrangeira. Vieira aponta que o Brasil já é parte de um tratado — visto por alguns como uma aliança, ao menos em sua concepção — de defesa coletiva com os EUA anterior a própria Otan, o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), criado pelo presidente americano Harry Truman, em 1947.

"O Brasil já tem um tratado de assistência mútua com os EUA. No campo dos estudos estratégicos, o TIAR é considerado uma aliança, porque é um tratado de assistência recíproca. Ou seja, se há um ataque a qualquer um dos territórios, os EUA teriam a obrigação de nos defender. E nós teríamos a obrigação de defender os americanos", explicou o professor.

Apesar de propor uma garantia coletiva de segurança, o histórico de aplicação (ou não aplicação) do tratado e o peso político perante sua principal potência militar, põem em dúvida o que ele realmente tem a oferecer."Quando ocorreu a Guerra das Malvinas, convenientemente esse tratado não foi invocado, porque envolvia o Reino Unido, um aliado americano de longa data, e a Argentina, integrante do TIAR", disse Vieira, apontando a diferença de prioridades.

Aspectos operacionais também limitam um aprofundamento do TIAR. "Ele é um tratado e não uma organização como a Otan, que tem autonomia, burocracia e comando próprios."

Aliado prioritário extra-Otan [nenhum valor prático,] 
Embora não seja uma etapa prévia para a entrada na Otan, o status concedido pelos EUA possui serventia prática, funcionando como uma espécie de selo de verificação para a interação militar dos dois países.

O benefício, no entanto, não é exclusivo do Brasil.
O mesmo status é concedido a um grupo de cerca de 20 países da América Latina, África, Oriente Médio, Ásia e Oceania, como Austrália, Japão, Argentina, Israel e Egito.

Mundo - O Globo

[*REALIZAÇÕES DO governo Lula:

- aumento de R$ 18, no salário mínimo; 
- apresentação do rascunho, melhor dizendo MINUTA, do que pretendem que seja um 'arcabouço fiscal' - não passa no Congresso;e,

- inauguração de uma placa de identificação/localização da sede do 'ministério da cultura' - uma repartição que ele denominou 'ministério', que seria substituída com vantagens  por uma subsecretaria pendurada no Ministério da Educação.]

 

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Crianças trans: o alerta de duas psicanalistas francesas - Luciano Trigo

Vozes - Luciano Trigo

Céline Masson é psicanalista, professora universitária e coordenadora da coleção de livros “Questões sensíveis” sobre psicologia e ideologia, com ênfase em temas relacionados a sexo e gênero. 
É também diretora do Observatório de Discursos Ideológicos sobre Crianças e Adolescentes e de uma rede de pesquisa sobre antissemitismo. Colabora regularmente na imprensa francesa.
 
Carolina Eliacheff é médica especializada em psiquiatria infantil, pesquisadora de transtornos psicológicos que afetam o corpo e autora de diversos livros sobre psicologia familiar. É também psicanalista e coautora do livro O tempo das vítimas (2009).
Reconhecidas em suas áreas como profissionais de prestígio, as duas se uniram para escrever um livro que contesta duramente certa narrativa da ideologia de gênero, que parte da grande mídia vem se empenhando em apoiar: A fábrica de crianças transgênero: Como proteger nossos filhos da moda trans
Lançado na França em 2022, a obra acaba de ser traduzida na Espanha, com grande repercussão.

Naturalmente, antes mesmo de se inteirar do conteúdo do livro, as milícias progressistas do ódio do bem acusaram as duas psicanalistas de transfobia. Em uma entrevista à revista “L’Express”, Céline foi cirúrgica: “A acusação de transfobia é um método de intimidação”, usado por aqueles que “fogem do debate e não aceitam contestação”. Conhecemos bem esse método no Brasil.

Masson e Eliacheff não são moralistas nem preconceituosas. Elas não negam, evidentemente, a existência da disforia de gênero: sempre existiram pessoas que não se identificam com seu sexo biológico, desde a Grécia antiga e provavelmente antes disso.

Elas admitem mesmo que, em alguns casos, podem ser indicados, em indivíduos adultos, procedimentos hormonais e mesmo cirúrgicos para aliviar o sofrimento mental dessas pessoas. “Adultos são livres para fazer o que quiserem. O que nos preocupa são as crianças e adolescentes, que vêm sendo colocados a serviço de uma bandeira ideológica”.

Acrescento: nenhum adulto pode sofrer discriminação por suas escolhas, se feitas de maneira responsável, consciente dos riscos e sem prejudicar ninguém. Ninguém, de forma alguma, pode ser prejudicado em função de sua orientação sexual (o que implica dizer, também, que ninguém, de forma alguma, pode ser beneficiado em função de sua orientação sexual: a aspiração à verdadeira igualdade é diferente da aspiração a trocar de lugar com o opressor - vício que parece presente em certas agendas identitárias).

O problema não está nas escolhas dos adultos, o problema são as crianças. Aliás, esta é uma fronteira que a imensa maioria dos brasileiros não admite que seja ultrapassada – o que parte da militância progressista parece ter dificuldade para compreender.

Céline e Caroline decidiram escrever A fábrica de crianças transgênero após assistirem ao documentário Petite fille (“Menina”), de Sébastien Lifshitz, exibido na televisão francesa. “O que nos chamou a atenção foi a forma como o filme retratou Sasha, um menino de 8 anos que, segundo a mãe, manifestou desde muito cedo o desejo de ser menina”.

“O documentário promove a identidade trans em crianças. Trata-se de um filme militante, de propaganda de identidade trans mesmo, uma ‘brilhante ode à liberdade de ser você mesmo’, como escreveu o crítico da ‘Télérama’”, afirmam Céline e Caroline. “Mas qual é o recado do cineasta ao dar a entender que um menino de 8 anos pode virar menina desde que seja esse o seu desejo, e com aprovação de médicos?” (Isso sem mencionar o fato de que todos os adultos envolvidos no filme, incluindo os médicos, não tiveram o menor pudor em expor uma criança de 8 anos para defender uma bandeira.)
O que as duas autoras criticam, e de forma fundamentada, é a prática crescente de transformar crianças em cobaias de um experimento social cujas consequências só aparecerão lá na frente. Elas prosseguem: “Nós distinguimos a verdadeira disforia de gênero - extremamente rara - do que chamo de ‘utopia de gênero’, que decorre de uma influência ideológica exercida por meio das redes sociais”.

Muitos jovens, afirmam as autoras, são levados a “acreditar em maravilhas”, em sua busca de identidade e de superação de um mal-estar em relação ao seus corpos que pode ser natural e passageiro na adolescência: “São muitos os influenciadores trans que narram no Instagram, no YouTube e no Tiktok as delícias da mudança de sexo, quando não incentivam diretamente a mutilação”.

Aliás, como elas lembram, diversos países, como a Suécia e a Finlândia, já estão voltando atrás nesse experimento, proibindo, por exemplo, o uso de bloqueadores de hormônios sexuais em menores de 16 anos – ainda permitido em muitos países, incluindo a França.

Parece óbvio – mas vivemos em uma época na qual o óbvio precisa ser dito – que crianças e adolescentes costumam atravessar períodos de angústia que fazem parte do processo de amadurecimento e de afirmação de sua identidade (de sua identidade sexual, inclusive). Igualmente óbvio é o fato de crianças e adolescentes não terem o discernimento necessário para decidir fazer tratamentos químicos e cirúrgicos irreversíveis para “trocar de sexo”.

A febre da transição de gênero entre crianças e adolescentes só é possível em um ambiente no qual adultos – incluindo médicos, pais e professores – aderem ao projeto de naturalização da ideia de que a biologia não importa, de que tudo não passa de uma construção cultural, sendo portanto normal e até desejável que crianças e adolescentes experimentem de tudo, antes de decidir a qual sexo pertencerão, e qual será sua orientação de gênero.

Apoiada por parte da grande mídia e da academia sabe-se lá com que interesses, essa agenda é extremamente perigosa, segundo as autoras de “A fábrica de crianças transgênero”. Não se sabe quais serão os efeitos a longo prazo, em termos de saúde mental inclusive, para os milhares de crianças e adolescentes que vêm sendo estimulados a acreditar que a solução para os seus problemas está em mudar de sexo. “São experimentos em jovens perfeitamente saudáveis ​​que não se baseiam em critérios científicos, afirmam Céline e Caroline. “Existem dois sexos, e não 36. E não é verdade que você pode mudar de sexo. Só podemos mudar nossa aparência, graças aos hormônios e à cirurgia”.

Isso sem falar na tentativa de impor à sociedade, na marra, mudanças na própria linguagem: "O ativismo trans busca impor a ideia de que as chamadas mulheres 'cis' são apenas uma subcategoria do feminino. Estamos assistindo a uma eliminação da palavra 'mulher' do vocabulário, para não ofender a sensibilidade de uma pequena minoria".[comentário: no Brasil, um ministro do STF, Edson Fachin - mesmo integrante da Corte Suprema, que é a GUARDIÃ da Constituição -  em recente decisão ignorou o artigo 13 da CF que determina que a LÍNGUA PORTUGUESA É O IDIOMA OFICIAL DO BRASIL.] "Em dezembro de 2020, a Secretaria de Planejamento Familiar ousou chamá-las de 'pessoas que têm útero'. Nos Estados Unidos, esse apagamento vai ainda mais longe: não devemos mais dizer 'pregnant woman' ('mulher grávida'), mas apenas ‘grávida’."

Luciano Trigo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


domingo, 3 de julho de 2022

Defesa - Quem são os adversários da OTAN? - Luis Kawaguti

Vozes - Jogos de Guerra

 Cúpula da OTAN em Madri, nesta semana: declaração feita pelos países da aliança deixa claro que o mundo caminha para uma escalada de confrontação - Foto: EFE/EPA/LUKAS COCH

A OTAN (aliança militar ocidental) realizou nesta semana uma reunião de cúpula histórica, que formalizou a nova realidade da política mundial provocada pela guerra na Ucrânia. Nela, a Rússia não é mais vista pelo Ocidente como uma parceira em potencial, mas sim como a maior ameaça à aliança.

A China foi classificada, por sua vez, como um “desafio” à segurança, aos interesses e aos valores da ordem internacional. A Declaração da Cúpula de Madri também relevou que a OTAN permanece preocupada com a ameaça do terrorismo global e com a mudança climática. A cúpula foi uma tentativa do Ocidente de demonstrar força e coesão. Mas ainda não está claro se essa união vai se manter em meio às crises energética e de alimentos, que foram drasticamente agravadas pela guerra na Ucrânia.

Veja Também: Guerra Fria 2.0: qual será o impacto de uma nova expansão da OTAN?

Brasileiro conta os segredos da Legião Estrangeira

O ponto de vista que aparenta predominar entre os países da aliança é o de lideranças como os Estados Unidos e a Grã-Bretanha. Eles defendem um reforço de tropas na frente oriental da OTAN, o aumento dos gastos militares na Europa e o apoio à Ucrânia até a expulsão completa das tropas de seu território. [irrealizável - prevalecendo essa posição a Ucrânia se acaba. Essa postura só interessa aos mercadores de armas.]

A ideia é fazer com que a Rússia não seja mais capaz de invadir militarmente outro país vizinho, segundo afirmou a chanceler britânica Liss Truss à BBC. Londres disse, durante a reunião, que enviará mil combatentes para defender a Estônia. [mil combatentes? cada um deles com uma arma nuclear tática, será mais que suficiente para resolver a questão = será iniciada uma guerra nuclear.]

Os Estados Unidos disseram que mandarão dois esquadrões de caças F35 (que são alguns dos mais avançados do Ocidente) para a Grã-Bretanha, dois navios contratorpedeiros para a Espanha e milhares de tropas para a Romênia.

A ideia é que essa mobilização continue até que, no ano que vem, as tropas na frente oriental da OTAN (próxima da Rússia) passem de 40 mil para 300 mil. Para se ter ideia dessa dimensão, Moscou usou cerca de 200 mil tropas para invadir a Ucrânia em 24 de fevereiro.  As tropas da OTAN na Europa também vão passar a se organizar não mais em grupos de batalha, mas em brigadas e divisões de exército - unidades maiores e mais adequadas para fazer frente a guerras de alta intensidade. Em paralelo, Finlândia e Suécia, países historicamente neutros, devem entrar na aliança.

Estrategicamente, o objetivo é que a Europa passe a gastar mais com armas para que sua defesa dependa menos dos EUA - liberando Washington para se voltar mais para a região do Indo-Pacífico (por causa da expansão chinesa). A recente Declaração da Cúpula de Madri diz que “a Federação Russa é a ameaça mais significativa e direta para a segurança dos aliados e para a paz e estabilidade na área euro-atlântica”.

A Rússia, por sua vez, vem afirmando que foi a OTAN quem adotou uma postura agressiva, com seu movimento de expansão para leste desde o fim da Guerra Fria. O motivo geoestratégico da Rússia para invadir a Ucrânia foi criar uma área neutra entre a aliança militar ocidental e o território russo.

Na cúpula de Madri, não surgiram vozes dissidentes da postura da aliança de armar a Ucrânia e reforçar as capacidades militares dos europeus. Seus maiores defensores, além de EUA e Grã-Bretanha, são os países mais próximos da Rússia, que já sofreram com invasões e dominação durante o período soviético - como a Polônia, a República Tcheca, os países bálticos e a própria Ucrânia.

Quando visitei um centro de recrutamento de civis na Ucrânia, em março deste ano, me impressionei com as colocações dos voluntários. Eles disseram preferir morrer no campo de batalha a ver suas famílias assassinadas ou passando fome nas mãos dos russos. Essas atrocidades cometidas pelos russos estão na história e na cultura desses países.

Mas, em nações mais distantes da fronteira russa, começam a surgir críticas à abordagem de confrontação, que foi oficializada na cúpula de Madri. Seu argumento é que a Ucrânia deveria ceder parte de seu território à Rússia em troca de um cessar-fogo. Em tese, isso evitaria uma matança maior tanto para ucranianos como para russos. Estima-se que a Ucrânia perde cerca de 200 militares por dia na Batalha de Donbas.

Contudo, as críticas à postura da OTAN não são motivadas apenas por razões humanitárias. As sanções econômicas à Rússia vêm causando uma alta no preço dos derivados de petróleo e o bloqueio do Mar Negro - por onde era escoada a produção de grãos da Ucrânia, impasse que elevou o custo global dos alimentos.  Na prática, a maioria dos países vem experimentando insatisfação da população, provocada pelas seguidas altas de preços nos postos de gasolina e nas lojas e supermercados.

Segundo analistas, isso pode levar ao fortalecimento de políticos ou partidos populistas e de tendência isolacionista no Ocidente. Em teoria, a ascensão deles pode, no futuro, diminuir o apetite da OTAN para confrontar a Rússia. O maior exemplo é a política de “América primeiro”, do governo de Donald Trump. O ex-presidente americano chegou a cogitar retirar os EUA da OTAN em 2018.

Porém, mesmo que um governo isolacionista seja eleito em 2024 nos EUA, é pouco provável que o país se retire da OTAN. Em 2018, Trump levantou essa possibilidade em um cenário de descontentamento com seus aliados europeus que não estavam cumprindo o estabelecido na aliança de investir anualmente 2% de seu PIB (Produto Interno Bruto) em defesa.

A vontade do Ocidente em apoiar a Ucrânia contra a Rússia por ora não parece abalada, mas a situação pode mudar. Com a chegada do inverno no hemisfério norte, pode faltar gás para aquecer as casas. Além disso, as empresas do Ocidente já começam a sentir o efeito de competição de empresas asiáticas - que vêm comprando petróleo e derivados da Rússia a preços mais baixos que os do resto do mercado.

Sabe-se,
por exemplo, que a Rússia já está entre os maiores fornecedores de petróleo da China e da Índia. Esse tipo de negociação de preços é sigilosa, mas já foi confirmado que refinarias indianas estão comprando petróleo russo com ao menos US$ 30 de desconto por barril. Elas refinam o petróleo e revendem seus derivados com preços mais altos para o mercado do Ocidente, burlando o embargo a Moscou.

Países industrializados da Europa, como a Alemanha e a Itália, já estão sentindo os efeitos da concorrência e também buscam alternativas ao gás russo. Porém, mesmo contrariados, continuam apoiando a resolução dos colegas da OTAN. [até quando?]  A principal resposta do governo do americano Joe Biden deve ser uma tentativa inédita de congelar globalmente os preços do petróleo russo. Mas analistas estão céticos sobre a viabilidade do projeto, pois os EUA não controlam a maioria da produção de petróleo mundial.

China
“Nós nos defrontamos com competição sistemática daqueles, incluindo a República Popular da China, que desafiam nossos interesses, segurança e valores, à procura de minar a ordem mundial baseada em leis”, diz o texto da declaração dos chefes de Estado da OTAN.

A China é a única nação citada nominalmente quando a aliança descreve no documento estar sendo confrontada por ameaças cibernéticas, espaciais, híbridas e assimétricas. A declaração conjunta também cita o “uso malicioso de tecnologias disruptivas”. A OTAN não diz exatamente quais são as ameaças específicas relacionadas a Pequim. Mas sabe-se que a China usou espionagem cibernética para roubar tecnologia do Ocidente e agora trava uma guerra comercial com os Estados Unidos.

Como cenário de fundo, Pequim também vem desenvolvendo tecnologia militar disruptiva, como os chamados mísseis hipersônicos - que não podem ser abatidos por defesas antiaéreas - e armas capazes de destruir satélites no espaço. A OTAN não relacionou no documento a questão nuclear e a China, mas a inteligência ocidental identificou em 2021 que os chineses estão construindo ao menos 230 silos de mísseis balísticos intercontinentais (ICBM, na sigla em inglês) no deserto de Gobi e na província de Xinjiang.

Não é novidade que a China tem armas nucleares. Mas a inteligência americana afirmou que o objetivo do país é quadruplicar seu arsenal, atingindo a marca de mil armas nucleares. Se isso acontecer, o equilíbrio bipolar do poder nuclear global, exercido por Estados Unidos e Rússia (que têm 1.550 armas ativas cada), será abalado.  O crescimento do arsenal chinês tem potencial para criar um sistema tripolar e assim anular os efeitos da atual paridade de armamentos e o conceito de MAD (sigla em inglês para destruição mútua assegurada), instrumentos que por cerca de 70 anos vêm impedindo uma guerra nuclear.

Assim, a escalada chinesa poderia deflagrar, por um período de alguns anos, uma nova corrida armamentista nuclear - até o sistema se reequilibrar em um novo sistema bipolar. Além disso, antes do início da guerra na Ucrânia, China e Rússia anunciaram uma parceria estratégica irrestrita.Analistas se dividem sobre a consistência e a possível duração dessa aproximação. A única certeza é que o Ocidente fará o que estiver ao seu alcance para tentar afastar as duas potências, como ocorreu na década de 1960 durante a Guerra Fria.

Mudança climática
A mudança climática é definida pela OTAN como o “desafio do nosso tempo”. A aliança diz que o assunto terá um impacto profundo na segurança dos países aliados. O assunto também não é especificado na declaração, mas parece apontar para o esforço do Ocidente para diminuir o uso de combustíveis fósseis - não só para preservar o meio ambiente, mas para diminuir a influência da Rússia no cenário energético global.

Mas uma parte da declaração preocupou alguns analistas brasileiros: “Nós vamos integrar considerações sobre mudança climática em todas as funções principais da OTAN”, afirma a Declaração de Madri. O temor desses analistas é que a OTAN use esse argumento para intervir na região amazônica no futuro. A possibilidade não pode ser descartada, embora seja pouco provável. Os recursos e a atenção da aliança militar ocidental estão voltados para a Europa, a região do Indo-Pacífico e para o Oriente Médio.

O argumento do clima pode ser usado para tentar criar barreiras comerciais para produtos agrícolas brasileiros, mas isso também é pouco provável em um contexto de possível crise mundial de alimentos. Porém, uma alegada invasão da Amazônia pode ser usada em campanhas cibernéticas de desinformação para gerar polarização na América Latina e eventual sentimento de repulsa às ações globais da OTAN. [se tentarem invadir a Amazônia e for impossível evitar, receberão uma Amazônia a qual não poderão ter acesso por séculos.] 

Esse tipo de campanha já está em curso na Europa, mas envolvendo o tema dos refugiados. Segundo relatório recente da Microsoft, a Rússia tem lançado campanhas de desinformação para tentar explorar eventuais divisões entre os governos ocidentais ou incentivar distúrbios sociais. Hackers russos teriam criado, por exemplo, grupos e perfis falsos no aplicativo de mensagens Telegram, para difundir mensagens reais e falsas. Seu objetivo é incentivar o ódio contra refugiados ucranianos em nações europeias - ressaltando aumento de despesas dos governos locais e aumento do desemprego. Ação dessa natureza já teria sido descoberta na Polônia.

Como fica o Brasil?
A OTAN aponta como seus adversários a Rússia, a China, o terrorismo e as mudanças climáticas, entre outros desafios. Nos bastidores, a guerra econômica, a vulnerabilidade das democracias liberais a campanhas de desinformação e a polarização política ameaçam os objetivos atuais da aliança. No início da guerra da Ucrânia, analistas levantaram a possibilidade de que Moscou poderia fazer um ataque restrito a um dos países da OTAN, para pôr à prova o artigo quinto da aliança - que diz que um ataque a um membro é um ataque a todo o grupo.

Uma eventual falta de reação do Ocidente, com o objetivo de não deflagrar a Terceira Guerra Mundial, poderia fazer a OTAN ruir. Mas o governo de Vladimir Putin também não arriscou estratégia tão ousada e parece agora apostar em uma nova crise do petróleo para enfraquecer a aliança.  Nesse contexto, o Brasil vem sendo cortejado por meio do bloco econômico dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e depende da importação de fertilizantes produzidos na Rússia. A chancelaria brasileira vê o Brics como uma boa oportunidade econômica, mas se sente desconfortável com a atual tentativa chinesa de ampliar o grupo, para transformá-lo em bloco de oposição política ao Ocidente.

Por outro lado, durante o governo Trump, o Brasil foi aceito como “aliado extra-OTAN”. Isso abriu oportunidades de comprar armamentos ocidentais com restrições, mas que são importantes para o Brasil. Trump costurava com o governo de Jair Bolsonaro uma aproximação ainda maior com a OTAN, mas a ideia não avançou devido à derrota eleitoral do americano.

O governo brasileiro quer agora permanecer em uma posição de equilíbrio, tentando não pender para nenhum dos dois lados. Mas a Declaração da Cúpula de Madri mostra que isso vai ser cada vez mais difícil em um mundo que tende para uma escalada de confrontação.

  Luis Kawaguti, colunista - Gazeta do Povo - Jogos de Guerra 

 

segunda-feira, 16 de maio de 2022

Putin ameaça com 'resposta' se Finlândia e Suécia entrarem na Otan

O presidente russo, Vladimir Putin, disse nesta segunda-feira (16) que haverá uma "resposta" caso a Finlândia e a Suécia entrem na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). "A expansão da infraestrutura militar para este território certamente causará nossa resposta", disse Putin, segundo a agência russa Tass. "Vamos analisar o que será [a resposta] com base nas ameaças que serão criadas para nós."

Suécia e Finlândia já indicaram que pretendem ingressar na aliança militar, que tem os Estados Unidos como sua principal liderança, em meio à invasão russa do território da Ucrânia. Hoje, a guerra da Rússia entrou em seu 82º dia.[o ingresso da Finlândia e Suécia não chega a ser suficiente para aumentar o risco de um conflito nuclear; o complicador é que a ser verdade o que diz a mídia esquerdista progressista, logo as tropas ucranianas estarão desfilando na Praça Vermelha - pelo noticiário daquela mídia a Ucrânia já está em solo russo. A ser verdade - o que sinceramente duvidamos - a Rússia não aceitará sair desse conflito como derrotada e a tentação do uso de uma arma tática nuclear, a pretexto dissuasório, se torna possível.]

Putin, porém, disse que a Rússia "não tem problemas" com Finlândia e Suécia, e que eles não representariam uma "ameaça direta". Para o presidente russo, a expansão da Otan é artificial, indo além de seu propósito geográfico. Na avaliação de Putin, a aliança militar poderia não influenciar da melhor maneira outras regiões.

Na Finlândia, a primeira-ministra do país, Sanna Marin, fez uma apresentação nesta segunda-feira (16) ao Parlamento sobre o relatório para a adesão à Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). "Se o Parlamento aprovar as conclusões do relatório, o governo está equipado para tomar as decisões necessárias para lançar rapidamente as negociações de adesão", disse. Uma sessão plenária é realizada hoje sobre a questão.

A Rússia tem visto como ameaça a possível entrada da Finlândia na Otan, um movimento em consequência da invasão russa ao território ucraniano. Os dois países compartilham uma fronteira de cerca de 1.300 quilômetros de extensão. A entrada na Otan também é avaliada na Suécia, que hoje tem um debate em seu Parlamento sobre deliberações de política de segurança.

Em seu discurso, a primeira-ministra da Finlândia disse que "ocorreram mudanças fundamentais em nosso ambiente de segurança", ao tratar, no Parlamento do país, sobre a entrada na Otan. "A alegação da Rússia de que é alvo de ameaças externas não tem fundamento algum. O único país que está ameaçando a segurança da Europa e travando abertamente uma guerra de agressão é a Rússia", completou Marin.

Segundo ela, "cada país tem o direito de tomar suas próprias decisões sobre política externa e de segurança". "Nenhum outro ator pode infringir esse direito. As exigências da Rússia significam que, em sua opinião, a Rússia tem o direito de definir uma esfera de influência para si mesma."

Marin pontuou aos parlamentares que, como membro da aliança militar, "a Finlândia se tornaria parte da defesa coletiva da Otan e das garantias de segurança que a acompanham". "Se a Finlândia for alvo de um ataque, receberemos ajuda. E, inversamente, se outro país da Otan for alvo de um ataque, nós o ajudaremos."

Em comunicado distribuído pelo Ministério de Relações Exteriores da Rússia, o vice-ministro Sergey Riabkov disse que Finlândia e Suécia não "devem ter ilusões de que vamos simplesmente tolerar isso", em referência à possível entrada dos países na Otan.

"Ou seja, o nível geral de tensão militar aumentará e haverá menos previsibilidade nessa área. É uma pena que o bom senso seja sacrificado a algumas ideias fantasmas sobre o que deve ser feito na situação atual", completou, mencionando que o movimento é "outro erro grave com consequências de longo alcance".

Mundo - Folha de S. Paulo

 

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

A Ucrânia balança o mundo - Revista Oeste

Flavio Morgenstern e Artur Piva

Os alertas sobre o expansionismo russo sempre foram interpretados como uma espécie de teoria da conspiração de radicais da direita 

Tanque de tropas do Exército ucraniano | Foto: Milan Sommer/Shutterstock
Tanque de tropas do Exército ucraniano -  Foto: Milan Sommer/Shutterstock

Quando era candidata a vice-presidente na chapa de John McCain em 2008, uma pouco destacada Sarah Palin foi entrevistada sobre seu conhecimento de geopolítica, já que era vista apenas como a governadora de um Estado pouco relevante como o Alasca. A resposta de Palin virou piada nacional: lembrando que o Alasca faz fronteira com a Rússia, afirmou poder ver de seu Estado natal Putin invadindo a Ucrânia. Até hoje há quem creia que a governadora tenha afirmado que podia ver fisicamente a Rússia de sua casa (home), mas quase ninguém se lembrou de sua declaração quando Putin anexou a Crimeia seis anos depois.

Em um debate com o então presidente, Barack Obama, em 2012, Mitt Romney havia dito que a maior ameaça geopolítica que a América enfrentava era a Rússia. Obama soube ganhar apoio midiático e votos rindo da declaração, gracejando que seu adversário republicano queria uma política externa “dos anos 1980” de volta. Seu vice-presidente era um certo Joe Biden, então pouco conhecido no Brasil.

Quatro anos depois, Donald Trump surpreenderia o mundo com sua campanha de amplo apoio popular e violentíssima reação da mídia — afirmando, já na abertura do seu livro América Debilitada, que Vladimir Putin era um perigo para os Estados Unidos da América e para o mundo livre — e que a política democrata estava enfraquecendo a América e favorecendo os planos expansionistas do novo autocrata russo. Putin foi considerado o homem mais poderoso do mundo durante quase todos os anos da administração Obama, que tinha em Hillary Clinton seu braço internacional e em Joe Biden a conexão e o apoio político com o establishment norte-americano.

Desta vez, além de virar alvo de galhofa da mídia, seguiram-se pelo menos dois anos de uma teoria da conspiração que é tratada até hoje como se tivesse sido provada: que Trump havia ganhado as eleições com ajuda da manipulação russa — logo de Putin, que era alvo do então candidato. Seria pedir muito que a maioria dos jornalistas da grande mídia lesse duas ou três páginas de um livro antes de emitir opiniões tão fanatizadas. Foram apenas alguns exemplos de constantes críticas pela direita norte-americana ao expansionismo russo, enquanto o Partido Democrata, o complexo midiático internacional e as instituições acadêmicas que formam a opinião pública faziam troça de tais acusações — tal como Obama, geralmente afirmando que era uma “retórica de Guerra Fria”.

A Ucrânia, país pobre e debilitado, mas ao mesmo tempo muito importante no projeto geopolítico e cultural russo, era vista como o próximo alvo dos planos de Vladimir Putin, tal como Taiwan é a menina dos olhos da China de Xi Jinping. Mas os alertas constantes sobre o imperialismo russo sempre foram ouvidos pelo estamento como uma espécie de teoria da conspiração de extrema direita ultranacionalista — exatamente a chuva de adjetivos de forte impacto psicológico e nenhuma clareza conceitual que foi esquecida na última semana, tão logo Putin cumpriu suas ameaças. A concretização da geopolítica russa, afinal, é resultado do fracasso constante da política externa democrata — de Obama, Hillary e Biden.

O fracasso da “contenção” tardia
O ex-presidente Donald Trump adotou uma política aplicando conceitos mais próximos da administração do que da geopolítica. Apesar das críticas ao seu desconhecimento em geopolítica, ele cuidou de favorecer os amigos do Ocidente, no que ficou conhecido como a política da América em primeiro lugar (America First). Assumindo quando o Estado Islâmico parecia trazer o fim dos tempos, conseguiu manter-se por quatro anos sem nenhum incidente internacional digno de nota. Conseguiu inclusive trazer Kim Jong-un para a mesa de negociações e colocou fim à guerra civil síria, além de ter levado mais paz ao Oriente Médio com os Acordos de Abraão.

Com a vitória de Biden, não demorou até outras potências e grupos opositores colocarem à prova a força do novo governo. Quando isso ocorreu com o Trump, ele respondeu rapidamente com um bombardeio contra bases sírias. Com Biden, o oposto tomou forma: sua política fracassou no Afeganistão e perdeu uma guerra custosa de 20 anos. O caminho estava aberto para que a China, a Rússia, o Irã e outros países voltassem a avançar contra a estabilidade mundial.

Biden também tem culpa por colocar a ideologia acima dos interesses nacionais norte-americanos. O presidente norte-americano é um dos grandes responsáveis por não ter Índia e Brasil alinhados de modo mais claro à posição norte-americana, já que escolheu esnobar Narendra Modi e Bolsonaro por serem conservadores. Ele também fez o mesmo com os países do Golfo, cancelando vendas de produtos de defesa para a Arábia Saudita e para os Emirados, ambos desafetos do Irã, principal aliado russo no Oriente Médio.

Com o atual expansionismo de Putin na Ucrânia, temos um dos mais fortes erros geopolíticos da história norte-americana (e foram muitos recentes). Putin faz suas mobilizações para provocar, e sempre ganha sem precisar disparar um tiro
A Rússia, que faz fronteira com a Turquia e o Japão, com a Finlândia e a Coreia do Norte, com a Polônia e a China, de certa forma com o Japão e os Estados Unidos, pode realizar constantes mobilizações militares e exercícios fronteiriços. 
Afinal, ainda está em seu próprio território. Assim o fez recentemente com a Bielorrússia e a Geórgia, com o Cazaquistão e a própria Ucrânia.

Para o Ocidente poder mostrar seu poder de fogo de volta, precisa passar pela via burocrática: pedidos da Otan, destacamento caríssimo de tropas, passagem por países —  não raro ditaduras —, culminando em exercícios diminuídos e que nunca poderiam assustar alguém como Putin. Até tal resposta aparecer, os russos já puderam fazer novos exercícios, em outros pontos da fronteira russa que envolvem países diferentes — e todo o processo recomeça do zero, a altíssimo custo, enquanto Putin apenas movimenta tropas alguns quilômetros acima ou abaixo.

O que foi testemunhado nas últimas semanas foram constantes provocações militares, que teriam sido contidas caso houvesse um presidente forte na Casa Branca. Joe Biden, depois de Putin já tomar cidades ucranianas com ataques por terra, mar e ar, afirma que irá impor… sanções econômicas às regiões separatistas da República Popular de Donetsk e da República Popular de Luhansk
Algo para o qual Putin já estava se preparando havia anos — e trata suas tropas na região como “mantenedoras da paz” (sic). O seu ethos é guerreiro, coletivista, não se importa com sacrifícios de indivíduos ou tempo pensando no longo prazo. Não há como comparar uma ameaça de “medidas econômicas severas” com Putin falando em tons militares das “consequências nunca antes vistas” (com armas nunca testadas em campo) do apoio à entrada da Ucrânia na Otan.

Vladimir Putin sonha em criar algo digno dos grandes conquistadores da Antiguidade

Seria preciso que os Estados Unidos tivessem realizado uma política de contenção mais robusta, como as sanções impostas por Trump ao oleoduto Nord Stream 2 Biden simplesmente desistiu das sanções em maio último, o que levantou suspeitas sobre os interesses de seu filho — e também da família Clinton — nos sistemas de energia dos países mais corruptos do Leste Europeu. Putin logo entendeu que podia se preparar para atacar. Medidas como esta, no tempo correto, teriam sido suficientes para evitar o atoleiro no qual Biden se vê: todas as desvantagens de um conflito militar, que agora é quase inevitável, sem nenhuma vantagem da contenção diplomática.

O curioso é que a propaganda de Biden era justamente de que Putin tinha “medo” dele (e não de Trump), porque ele seria “muito duro” com o autocrata russo. Palavras sem espada são apenas tinta no papel. Ou no Twitter. Hoje, tudo o que resta a Biden é prometer sanções econômicas, que poucos dos seus aliados europeus levarão a sério, se são tão dependentes da energia russa.

A Ucrânia no xadrez geopolítico
Vladimir Putin sonha em criar algo digno dos grandes conquistadores da Antiguidade: a recriação da grandeza do antigo Império Russo, mas com a tecnologia moderna e o poder autocrata herdado da União Soviética. Este plano busca recriar o Império original, a grande Rus, o nome original da Rússia. A Ucrânia, ou “Pequena Rússia”, como é chamada pelos russos, é peça-chave para o plano de Putin. Além de muitos ucranianos serem etnicamente russos, e identificarem-se mais com o grande e glorioso país do que com seu decadente e corrupto Estado moderno, o antigo Império tinha em Kiev o seu centro cultural — o que é uma questão séria para Putin.

Sem ter uma ideologia muito precisa que unifique a sociedade a favor do seu projeto de poder como os ditadores comunistas possuíam com o bolchevismo comunista, seu apelo atual é para um “nacionalismo” expansionista, no qual os antigos territórios do Império Russo serão retomados um a um. A hegemonia cultural, militar e econômica do globo deixará de ter na América e na Inglaterra o seu centro irradiador, e a Grande Mãe Rússia ressurgirá como a nação capaz de salvar os pobres e aflitos do planeta. Foi neste contexto que vimos a Ucrânia querer uma aproximação com o Ocidente: cogitando mais um modelo liberal, pró-União Europeia e sendo apoiada até militarmente pelo mundo livre. Cogitou se filiar à Otan, a Organização do Tratado do Atlântico Norte, o bloco de países que se uniu justamente para frear o expansionismo militar russo durante a Guerra Fria. Para um autocrata com um plano global como Putin, é muito mais do que uma provokatsiya: é praticamente uma declaração de guerra. Afinal, a “Pequena Rússia” é parte da Rússia, segundo pensa Putin.

Memes começaram a aparecer nas redes sociais minutos depois da invasão:

 

A despeito das ideologias, as fronteiras atuais da Ucrânia foram definidas pelos tratados do fim da Guerra Fria. Como os países menores eram controlados por governos “satélites” de Moscou pela União Soviética, o mapa atual da Ucrânia possui fronteiras artificialmente maiores do que seu desenho histórico — o que é martelado dia e noite pela propaganda oficial de Putin. Entre os principais alvos estão Odessa e Sevastopol, importantes portos para a economia russa. Quando a Ucrânia se declarou independente de Moscou de vez, em 2014, essas regiões tornaram-se zonas de extrema tensão e conflito. E é neste ponto em que a política externa de Biden, desastrosa em tudo, se tornou verdadeiramente mortífera.

A política da provokatsiya e da desinformatsiya
Putin, homem forte da KGB e especialista em desinformatsiya, sempre soube fazer intensa propaganda separatista na Ucrânia, sobretudo na fronteira leste, financiando milícias, apoiando grupos rebeldes e prometendo mundos e fundos para quem pretendesse anexar-se à Rússia. Ao mesmo tempo, também destaca como grupos “neonazistas” aparecem no país vizinho, passando a tratar qualquer um que se oponha ao seu projeto de poder como um “nazista” ou um “racista”. Como palavras importam em uma guerra travada antes na mídia do que no campo de batalha, países ocidentais pisam em ovos para apoiar governos legítimos, como o da Ucrânia. Mesmo no Brasil, até sua bandeira já foi acusada de ser um “símbolo neonazista”, exigindo que o embaixador ucraniano no Brasil viesse a público explicar que o símbolo do país não é “neonazista”
Ou seja, a desinformatsiya russa é eficiente e transcontinental. Determina até os termos usados por jornalistas brasileiros. Enquanto isso, Putin constantemente ganha mais espaço de manobra para destruir grupos rivais. Tal como virou moda em republiquetas, acusa seus adversários de nazistas, e então trata-os como se merecessem um eterno Estado de exceção. E políticos como Obama e Biden, em vez de defender o mundo livre, sempre pisam em ovos para lidar com as manobras do expansionismo russo. Para eles, importa muito mais não ser chamados de “apoiadores de nazistas” pelo complexo midiático norte-americano — e, logo, mundial — do que lutar pelo mundo livre. Infelizmente, este modelo de política já foi exportado para o mundo ocidental. [o mais importante é que a consolidação de Putin, controlando a Ucrânia - ou mesmo anexando - reduz em muito o ímpeto do Biden e da sua vice na propagação, quase imposição, do maldito progressismo esquerdista. Putin não discute, nem dá sinais que discutirá o comunismo - que não considera tema importante. 
Para ele o conservadorismo que o domina é bem mais importante. Uma brecada na propagação do maldito progressismo esquerdista, que tem como meta destruir todos os valores do mundo - entre eles, sem limitar: BONS COSTUMES, FAMÍLIA, MORAL, PROPRIEDADE, RELIGIÃO, TRADIÇÃO, LIBERDADE, PATRIOTISMO é importante para que o mundo seja um lugar digno das pessoas de BEM continuarem nele.]
As possíveis consequências para o Brasil
Em um mundo interligado, um conflito na Ucrânia não é mais assunto distante, como a última Guerra da Bósnia. O Brasil está em uma situação bastante peculiar: sua agropecuária alimenta boa parte do mundo, mas é extremamente dependente de fertilizantes russos e 49% das exportações de gado têm como destino a China. Por isso, uma negociação com os russos é necessária e delicada.

Além de uma possível alta no preço dos combustíveis e do gás, em caso de um embargo, como proposto por Biden, a Rússia provavelmente irá triangular com a China para furar o bloqueio. A manobra aumentaria ainda mais o poder de Xi Jinping sobre o comércio internacional. Mais um desastre da atual política norte-americana é forçar sanções nas regiões pró-Rússia em dólar, euro e iene. Em vez de enfraquecer o inimigo, todas essas áreas separatistas passam a recorrer ao iuane chinês, aumentando o poder de barganha de Pequim. O Brasil também sofre com uma China controlando ainda mais territórios com sua moeda.

O cenário tem tudo para ser, no mínimo, péssimo para a economia.

Leia também “A fraqueza ocidental”

Flavio Morgenstern e Artur Piva, Revista - Oeste 
 

sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

A revelação do eucalipto - Revista Oeste

Evaristo de Miranda

Poucos consumidores sabem da presença de celulose de eucalipto em sorvetes, biscoitos, hambúrgueres, queijos, ketchup e sopas

Vista aérea de uma floresta de eucalipto no Brasil -  Foto: Paulo Vilela/Shutterstock 

Todo dia comemos e consumimos eucalipto. E ninguém se dá conta. O eucalipto reina entre as árvores cultivadas no Brasil. São mais de 5,5 milhões de hectares de eucalipto, de um total de cerca de 9 milhões de hectares de florestas plantadas, segundo a Indústria Brasileira de Árvores. A produtividade média de 39 metros cúbicos por hectare por ano (m³/ha/ano) do eucalipto brasileiro é cerca de duas vezes superior à das florestas do Chile e da África do Sul. Ela supera em três vezes a de Portugal e Espanha e em quase dez vezes a produtividade de Suécia e Finlândia.  
As florestas de eucalipto atendem à demanda por lenha, carvão, madeira e, sobretudo, celulose. 
Entre as aplicações da celulose, a produção de papel e papelão são as maiores e mais conhecidas. Não é só. As florestas de eucalipto participam da alimentação, do vestuário, do conforto do lar e até dos cuidados de saúde de todos os brasileiros.

A palavra eucalipto foi criada por um botânico francês, Charles Louis L’Héritier de Brutelle, em 1788. Ela se compõe do prefixo grego eu (bem, bom, agradável, verdadeiro) e de κάλυπτο, kályptos (coberto). Esse gênero botânico foi denominado assim pela característica de sua inflorescência. Nela, o limbo do cálice se mantém fechado, até depois da floração. Vale relacionar o significado de eucalipto (eu kaliptos) com apocalipse (apo kalipse), apo significando ação contrária ao coberto e, portanto, revelação.

O prefixo eu prolifera entre plantas e humanos, em palavras como Eugenia (bem gerada, nascida), Eunice (boa vitória), Eustáquio (boa espiga, bom fruto), Eulália (boa fala), Eusébio (bem venera — Deus), Euterpe (boa alegria, doçura), eufórbia (bom alimento), euforia (bem suportar), eutanásia (boa morte) e eutrofia (bom crescimento, até demais). E transforma-se em ev, em evangelho (bom anúncio, boa-nova) ou Evaristo (bom grado, muito amado).

Os eucaliptos são originários da Austrália e pertencem à generosa família das mirtáceas, com cerca de 3.000 espécies, dentre as quais: goiaba, araçá, cravo-da-índia, jaboticaba, jambo, pitanga, murta, uvaia, grumixama, guabiroba, camu-camu, cambuci, cambuí, cambucá e muitas outras.

Além da madeira, da lenha e do carvão, um produto excepcional extraído do eucalipto é a chamada polpa de celulose solúvel (dissolving pulp). Trata-se de um material com alto teor de celulose (> 92%-97%) quando comparado ao teor encontrado nas polpas kraft convencionais (85%-90%), destinadas à produção de papel e papelão. A polpa de celulose solúvel tem alta pureza e baixo nível de contaminantes inorgânicos. Dada sua alvura e viscosidade, ela pode ser aplicada nos mais diversos produtos, sobretudo em alimentação, saúde e cosmética.

Ela entra na produção de tripa de celulose para confecção de embutidos (salsichas, linguiças, mortadelas etc.). A celulose solúvel é um excelente estabilizante, emulsificante e espessante, capaz de integrar grande número de alimentos industrializados e processados, como sorvetes, iogurtes, biscoitos, doces, hambúrgueres, queijos, molhos, ketchup e sopas. Poucos consumidores sabem da presença celulose de eucalipto nesses produtos.

Além dos alimentos, a celulose solúvel entra na composição do revestimento de comprimidos e cápsulas de medicamentos, das pastas de dente e em formulações odontológicas (gel dental e soluções orais). Na indústria de cosméticos, há derivados da celulose utilizados para a confecção de gel, um veículo excelente para diversos princípios ativos dermatológicos e terapêuticos, e em diversos produtos de higiene pessoal, maquiagem, cremes cosméticos, fraldas e até em preservativos.

A celulose participa também na composição dos filtros de cigarros, nas lentes de contato, máscaras e tecidos cirúrgicos e até em telas de LCD. Em tudo isso há eucalipto. O processamento dos eucaliptos permite a produção de outros insumos para fabricar vernizes, esmaltes, tintas, óleos essenciais, celofane, filamentos para pneus, filmes fotográficos etc. Na construção civil, a celulose é utilizada na confecção de painéis e divisórias de ambiente (dry wall). No setor energético e petroquímico, a celulose é usada na produção de bioprodutos e biocombustíveis, inclusive o etanol celulósico.

A introdução do eucalipto no Brasil e seu plantio em escala comercial se devem ao agrônomo paulista Edmundo Navarro de Andrade (1881-1941), um plantador de florestas. Ele estudou na Escola Nacional de Agricultura, em Portugal. Ao retornar ao Brasil, em 1904, foi contratado pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Sua missão era encontrar a melhor espécie florestal para reflorestar áreas desmatadas na construção das ferrovias, para fornecer madeira para dormentes e carvão às locomotivas.

Em 1914, Edmundo Navarro buscou na Austrália 144 espécies de eucalipto e testou sua aclimatação. Das espécies trazidas, 64 se adaptaram muito bem ao clima do país. Navarro criou 18 hortos florestais ao longo das ferrovias. Neles, estudou 95 espécies florestais, até confirmar sua escolha pelo eucalipto.

Navarro instalou a sede do Serviço Florestal em Rio Claro. Publicou mais de dez obras sobre suas viagens e o eucalipto, incluindo o livro Cultura do Eucalipto. Ele também foi pioneiro na utilização do eucalipto para produção de papel e papelão. Em 1925, viajou aos Estados Unidos para conhecer a fabricação de papel a partir da madeira. E levou para serem testadas algumas toras de eucalipto. Os testes foram satisfatórios, e o eucalipto serviu à produção de quatro tipos de papel.

A produção florestal total do Brasil aproxima-se de 200 milhões de m³/ano, uma liderança mundial

Navarro foi secretário da Agricultura do Estado de São Paulo de 1930 a 1931. Criou o Museu do Eucalipto, o único do gênero no mundo. O Horto Florestal de Rio Claro, onde fica o museu, leva o nome do pesquisador. São 2.230 hectares abertos à visitação, com acesso às trilhas e ao Solar Navarro de Andrade, residência do pesquisador, tombada pelo patrimônio histórico.

Vista da entrada do Museu do Eucalipto | Foto: Divulgação

Vista da entrada do Museu do Eucalipto | Foto: Divulgação

Em 1941, ano da morte de Navarro, quase 100 milhões de eucaliptos, de espécies diferentes, cresciam nos hortos florestais ao longo das ferrovias. A sorte estava lançada. As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas pelo crescimento da produção de celulose no mercado brasileiro graças à incorporação constante de inovações tecnológicas na produção florestal e nos processos industriais. Nas décadas de 1980 e 1990, houve grande expansão das áreas cultivadas com eucaliptos.

A produção florestal total do Brasil aproxima-se de 200 milhões de m³/ano, uma liderança mundial. Desse total, cerca de 70 milhões de m³/ano são de florestas energéticas: 53 milhões de m³/ano em lenha industrial (presentes também em padarias e pizzarias, para a glória da gastronomia) e cerca de 17 milhões de m³/ano em carvão. A produção de carvão vegetal de eucalipto posiciona o Brasil como principal produtor no mundo (12%). Ele substitui insumos de origem fóssil (carvão mineral) e diminui a emissão de gases de efeito estufa na siderurgia. A maioria das 180 unidades de ferro-gusa, ferro liga e aço no Brasil utiliza carvão vegetal no processo de produção.

Em 2020, a indústria florestal produziu 10 milhões de metros cúbicos de madeira serrada. O crescimento da produção de celulose é constante. Em 2020, o Brasil produziu cerca de 21 milhões de toneladas de celulose, alta de 6,4% em relação a 2019. No último trimestre de 2021, foram 4 milhões de toneladas exportadas, avanço de 12,7% no comparativo anual. As exportações em 2020 totalizaram 15,6 milhões de toneladas, alta de 6,1% em relação a 2019.

Segundo a Indústria Brasileira de Árvores, mais de 75% das exportações do Brasil vão para dez principais destinos. A China está no topo, com 48,1% do total (US$ 2,9 bilhões), seguida por União Europeia (12,6%), Estados Unidos (5%), Turquia (2%), Tailândia (1,9%), Coreia do Sul (1,7%), Irã (1,7%), México (1,7%), Vietnã (1,6%) e Bangladesh (1,5%). Além dos US$ 6 bilhões alcançados em exportações de celulose, os produtos da indústria de base florestal embarcaram US$ 1,7 bilhão em papéis e US$ 276 milhões em painéis de madeira no ano de 2020.

[a leitura da presente matéria mostra a importância do agronegócio para o Brasil e da dependência do mundo aos produtos brasileiros, especialmente da agricultura e pecuária.
Os interesses estrangeiros em atrapalhar o crescimento do Brasil e do agronegócio é de tal ordem que muitas ONGs alienígenas, sebosas, movidas por interesses escusos,  compram maus brasileiros, que se dizem especialistas ambientais - ou como tal são apresentados - quando não passam de especialistas de m... ,  (há raras exceções)... ,  para criticarem o fantástico desenvolvimento do Brasil em tão importante campo.] 

São mais de mil municípios na área da indústria florestal. A receita bruta total do setor foi de R$ 97,4 bilhões em 2019 e representa 1,2% do PIB brasileiro. Graças ao eucalipto, a celulose é, de longe, a fibra vegetal mais produzida e consumida no país. Desde os tempos de Navarro, os críticos do eucalipto, em geral, não têm ideia da sua real dimensão na economia e na vida dos brasileiros. Bom apetite!

Leia também “A fibra da agricultura”

Evaristo de Miranda, colunista - Revista Oeste