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segunda-feira, 29 de junho de 2020

Eleição deve ser adiada - Merval Pereira

Negociações estão avançadas

O adiamento das eleições municipais deve ser aprovado porque a orientação de médicos e especialistas ao TSE é adia-las o máximo que puder até dezembro, para não haver prorrogação de mandatos. Na Câmara dos Deputados é mais difícil, porque eles têm interesses regionais de eleger prefeitos e vereadores para depois fazer suas campanhas nacionais. Por isso os interesses são variados. 

[As eleições devem ser adiadas, precisam ser adiadas. Nada vai adiantar não adiar e não conseguir realizar em outubro próximo ou realizar só em alguns estados.
E por uma questão econômica o ideal é que o adiamento seja para outubro/2022, realizando eleições para TODOS os cargos na mesma data.

Eleição picadinha só aumenta dos gastos e sabemos que o Brasil vai enfrentar uma terrível crise econômica devido a pandemia - que não vai poupar nem a China, Estados Unidos e outros.

Uma única eleição a cada quatro anos o gasto é praticamente a metade do total gasto com duas eleições no mesmo período - os que são contra o adiamento apresentem os gastos e todos comprovarão o acima afirmado.]

Mas o presidente da Câmara está negociando com alguns prefeitos e acho que ao final vão chegar a um acordo, porque é preciso adiar mesmo. Não tem sentido arriscar fazer eleições em outubro, quando não se sabe como estará a pandemia, que varia de região para região. É mais prudente adiar o máximo, para que a situação do país fique mais homogênea.  Acredito que vá ser adiada para dezembro.

Merval Pereira, jornalista - O Globo




segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Uma conjuntura muito favorável ao poder, mas com aquele probleminha - Análise Política

Alon Feuerwerker

O modus operandi congressual do bolsonarismo vai ficando cada vez mais nítido. Não há obsessão por tratorar o Legislativo. No plano parlamentar, aceita-se o jogo. O que os parlamentares perderam em espaço político na Esplanada, ganharam em oportunidades de protagonismo. O governo manda os projetos, o Parlamento faz quase o que bem entende, depois o presidente veta, e o Legislativo também derruba os vetos que deseja.

Não sei se chega a ser uma nova política, mas tem boa dose de novidade, ao menos neste último meio século. Nos governos militares, o Congresso, quando estava aberto, era uma máquina carimbadora do Executivo, graças também ao bipartidarismo, aos atos institucionais e às cassações periódicas de mandatos. [as vezes surge uma curiosidade: para que serve o Congresso se só tumultua e onera os cofres públicos?] Quando nada disso era suficiente vinha o fechamento. Como por exemplo no Pacote de Abril de 1977.

Depois nasceu a Nova República, uma oportunidade do país aos políticos. 
[Nova República = a institucionalização da corrupção,  do maldito politicamente correto, do excesso de direitos e da judicialização de tudo.]  Mas Tancredo Neves morreu, José Sarney virou um presidente não tão forte, e sofreu a dualidade de poder imposta pela Constituinte e Ulysses Guimarães. E teve de escancarar a máquina aos políticos para sobreviver. Sucedeu-o Fernando Collor, que quis fazer uma nova política e acabou derrubado. Por questiúnculas, como Dilma Rousseff um quarto de século depois.

E surgiu Fernando Henrique Cardoso para derrotar o PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que estava forte depois da queda do seu antípoda, Collor. FHC governou à moda tradicional, e teve tranquilidade, também porque a nova política tinha dado errado. E graças à velha e boa política o tucano sobreviveu à debacle do Real na transição do primeiro para o segundo mandato. O país parecia vacinado contra impeachments. Parecia.

Lula governou conforme a cartilha da Nova República. Aprendendo com Sarney, Collor e Fernando Henrique, procurou montar uma base sólida no Congresso para evitar surpresas. Também por isso, escapou na crise do chamado mensalão, reelegeu-se e elegeu a sucessora. Que se sentiu num momento suficientemente forte para deixar os aliados na rua da amargura da Lava Jato. Deu no que deu. Agora Jair Bolsonaro propõe uma nova oportunidade para um modelo que falhou duas vezes.

Verdade que o atual presidente faz isso numa conjuntura excepcionalmente favorável. Para começar, dois terços do Congresso estão potencialmente alinhados com a agenda do Executivo. O governo acha, e tem uma dose de razão, que mesmo se nada fizer o Legislativo terá de andar na linha do Executivo, pois os deputados e senadores não  terão como explicar aos seus eleitores se fizerem diferente.

E o financiamento empresarial de campanhas está vetado, o que diminui a atratividade da ocupação de certos espaços ministeriais e nas estatais. Claro que sempre o olho pode crescer. Mas o mar não está pra peixe. E os partidos estão razoavelmente abastecidos pelos recursos públicos para sobreviver e fazer suas campanhas. Então, se o Planalto executa com competência o orçamento das emendas, tem combustível para navegar.

Para ajudar, o reinado absolutista da Lava Jato parece ter entrado no seu até agora pior inverno. E Bolsonaro tem assim facilitada a tarefa de recolocar o gênio dentro da garrafa, ou pelo menos tentar. Era previsível, e foi previsto, que o Bonaparte saído das urnas precisaria restabelecer o Poder Moderador do Executivo, tradicional desde que D. Pedro I fechou a Constituinte e outorgou a primeira Carta do Brasil independente.

Nisso, no essencial, Planalto, Congresso e Supremo vêm jogando juntos, pois interessa a todos acabar, ou pelo menos reduzir, a disfuncionalidade institucional em que o país foi atirado desde que Executivo e Legislativo ficaram acuados pela Lava Jato. E, enquanto esta permanece uma ameaça letal, seria pouco inteligente os três lugares geométricos da Praça dos Três Poderes ficarem de mimimi uns com os outros.

Sem contar que o PT não está propriamente infeliz com o esforço bolsonarista para controlar a fera. Sempre há a possibilidade, claro, de a Lava Jato voltar a se concentrar só no PT,
mas até isso teria um lado útil para o petismo: reforçaria a narrativa de vitimização, já bem nutrida pelas interessantes revelações do The Intercept e parceiros. Depois da VazaJato, a Lava Jato nunca mais será a mesma, apesar das juras de amor do novo PGR.

Então está tudo bem? Não, tem aquele probleminha: quase 13 milhões de desempregados, fora os subempregados e desalentados em geral. Eis a fenda na represa, fenda que se não for fechada embaralha bem esse jogo. Ninguém vai querer ser sócio do fracasso. Mas enquanto não chega o dia do juízo político o bolsonarismo aproveita o mar de almirante para radicalizar na guerra de posição, inclusive no campo cultural. Já que Gramsci está na moda. 


Análise Política - Alon Feuerwerker, jornalista



quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Nunca antes



As redes sociais podem ir para cima de qualquer sultão do STF e cobrar o seu impeachment de um Congresso com pouca estamina para enfrentar o ronco da rua


Quando o que era impossível começa a acontecer cada vez com mais frequência, é bom prestar atenção — pode acontecer de novo. A última demonstração concreta desse mundo em mutação radical foi a moagem, desmembramento e morte política de Renan Calheiros, tido como invencível (até cair morto) por 101% das pessoas que “entendem de política” neste país. E agora: alguém tem algum fato para sustentar que as surpresas, enfim, pararam aí — que este foi o último episódio de intocável que de repente vira farinha de rosca?

Renan foi liquidado pelas redes sociais, simplesmente — tenta-se desesperadamente demonstrar que não é “bem assim”, ou “nada assim”, mas não adianta nada, porque é isso mesmo. Ainda há pouco, em outro episódio de primeiríssima grandeza, Jair Bolsonaro foi eleito pelas redes sociais, com zero de ajuda da televisão, milhões de reais, jatinhos ou mídia; ocorreu o exato contrário do que diziam quase todos os comentaristas políticos e os “institutos de pesquisa”. 

Lembram-se? Os Ibopes e Datafolhas garantiam até o dia da eleição que Bolsonaro perderia para “qualquer adversário” no segundo turno. É difícil errar mais do que isso.
As redes calaram a pretensão do Congresso em “negociar pesado” na formação do ministério; os políticos, que iriam “dobrar o governo”, tiveram de engolir com casca e tudo o primeiro escalão que está aí inclusive com uma dúzia de generais dentro. As redes anularam qualquer possibilidade de soltar Lula no tapetão, com jogadinhas de advogado “garantista”. Podem levar o Congresso a cassar mandatos, autorizar processos penais contra seus próprios membros e permitir que gente habituada a viver acima da lei durante toda a vida acabe na cadeia. Podem aprovar reformas e novas leis que, de novo, toda a mídia sempre deu como “impossíveis”.

Diante disso, os ministros do STF bem que poderiam começar a pensar nos seus próprios couros. Desde que acabou o regime militar, transformaram-se numa espécie de orixás que nenhuma força do mundo é capaz de tirar do emprego; dois presidentes da República já foram para o saco, mas os toffolis, e gilmares, e lewandowskis etc. continuam agarrados no osso, mais firmes que o Pico da Bandeira na Serra do Caparaó. Mas e daqui para frente, com esse temporal que está ficando cada vez mais bravo — vão continuar fora da lei?

Coisas que nunca aconteceram antes sempre podem, por definição, acontecer uma primeira vez. As redes sociais, que estão construindo realidades brutalmente inéditas neste país, podem, muito bem, ir para cima de qualquer sultão do STF e cobrar o seu impeachment de um Congresso com pouca estamina para enfrentar o ronco da rua. Era impossível. Não é mais.
A batata de Suas Excelências já pode estar sendo assada por aí.

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Tragédia sem ideologia

Em Brumadinho, setores público e privado destruíram famílias e atingiram o futuro

Em entrevista à Rádio Eldorado, o ministro Ricardo Salles disse que o meio ambiente “não é questão de direita e esquerda” e “não pode ser capturado por barreiras ideológicas”. Quem haveria de discordar? O ministro tem toda razão, mas nem por isso deixou de jogar pesadas críticas sobre a esquerda. Segundo ele, a esquerda tem mania de se apossar da defesa do ambiente como se fosse a única preocupada com a preservação do planeta, mas, ora, ora, tanto a tragédia de Mariana quanto a de Brumadinho ocorreram ou durante ou em seguida aos governos da petista Dilma Rousseff em Brasília e Fernando Pimentel em Minas.
Logo, o ministro não quer que a discussão seja entre esquerda e direita, mas ele bem que deu um empurrãozinho para que assim seja. [o ministro comentou um fato, agora se o fato compromete a esquerda já não é da alçada do ministro.] E lembrou que, logo no início, o presidente Jair Bolsonaro sobrevoou a região mineira e sete ministros foram pessoalmente lá. Tomara que esse empenho no calor dos acontecimentos decante em medidas realmente eficazes. Já imaginaram uma terceira Mariana?

Quem também foi pessoalmente a Brumadinho foi ex-ministra Marina Silva, que é uma das principais referências brasileiras do setor no cenário internacional, mas foi bastante criticada por omissão no desastre de Mariana e desta vez ficou esperta. Em outras palavras, ela também disse à Rádio Eldorado que a questão não é de direita ou esquerda e apontou o dedo em várias direções. Segundo Marina, “é um erro demonizar os agentes ambientalistas” e há três culpados no rompimento de represas: a ganância do setor privado, a falta de ética na política e a flexibilização oportunista de regras pelo setor público.
Como ministra de Lula, e ainda no PT, Marina vivenciou intensos debates e embates com Dilma, chefe da Casa Civil. Uma exigia rigor nos licenciamentos e na fiscalização. A outra, pretendendo-se mais pragmática, queria apressar licenças e agilizar empreendimentos. A questão central, portanto, não é ideológica, é o velho embate entre ambientalistas, chamados de “puristas” (ou “sonháticos”?), e os que defendem “passar o trator” e dar toda a prioridade a represas, plantações, pecuária. O “desenvolvimento” a qualquer custo.
Como novo ingrediente, o governo Bolsonaro demonstra desdém pelo meio ambiente, quase empurrou a pasta para a Agricultura e abriga um chanceler que acusa o “ambientalismo” de ser uma espécie de facção da esquerda mundial para destruir o Ocidente. Para Marina, [Marina, inteligência e tua capacidade de pensar não se entendem, mas, faça um esforço e lembre-se que estamos no 30º dia do governo Bolsonaro = mesmo que ele se esforçasse ao máximo, te convidasse e ao Cirito para ajudar, não haveria tempo para sucatear nada.].] Brumadinho é um alerta para o governo Bolsonaro, que “sucateou e diminuiu o ministério de alto a baixo”. Ela exemplificou: a Agência Nacional de Águas e o Serviço Florestal saíram da pasta e os contratos com ONGs ambientalistas foram suspensos. E cutucou: “Pela primeira vez um ministro do Meio Ambiente assumiu com discurso de interesse dos ruralistas”.
Para Salles, o alerta é “para toda a sociedade”. Mas, com tantos mortos e centenas de desaparecidos, que Brumadinho sacuda os poderosos, provoque debates, gere punições e, sobretudo, relembre a todos, principalmente ao novo governo, sim, que Meio Ambiente não é uma questão supérflua, diletante nem coisa de esquerdopatas. Assim como mata pessoas e destrói famílias inteiras, ameaça o próprio futuro do planeta e da humanidade. Discutam muito senhores e senhoras de esquerda e de direita, mas que o setor privado não privilegie a ganância em detrimento da vida, os governos não flexibilizem regras para favorecer negócios e os políticos tenham ética e respeitem seus mandatos e seus eleitores.  Utopia? Pode ser. Mas não há alternativa: é salvar ou salvar o futuro da humanidade. Quem ameaçá-lo e quem for culpado por tragédias e mortes não apenas deve, mas tem de ser punido pesadamente. Aliás, e os culpados por Mariana, por onde andam?
 
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo