Na
manhã da última segunda-feira, depois de repetir que era vítima de um
golpe e de excitar barulhentos militantes do PT reunidos para ouvi-la no
Palácio do Planalto, a presidente Dilma disse que tinha um importante
comunicado a fazer: Waldir Maranhão (PP-MA), presidente em exercício da
Câmara dos Deputados, acabara de anular o resultado da votação que ali,
em 17 de abril, aprovara o impeachment. “EU SOUBE AGORA, da mesma forma
que vocês souberam”, comentou Dilma. “Apareceu nos celulares de todo
mundo que o recurso foi aceito e o processo suspenso. Eu não tenho essa
informação oficial. Estou falando porque eu não podia fingir não saber
da mesma coisa que vocês estão sabendo. Mas não é oficial. Não sei as
consequências. Por favor, tenham cautela.”
O RECURSO QUE ELA mencionou,
assinado por José Eduardo Cardozo, Advogado-Geral da União, pediu a
suspensão do processo de impeachment na Câmara, acusando-o de estar
repleto de erros. Ignorado por Eduardo Cunha, então presidente da
Câmara, o recurso acabara aceito por Maranhão. Com isso, ficava ameaçada
a votação do impeachment pelo Senado naquele mesmo dia.
DILMA MENTIU AOS militantes
do PT e aos que a escutaram país afora. Ela não soube pelo celular do
que fizera Maranhão — soubera antes. A informação que ela tinha era
oficial, ao contrário do que afirmou. Ela estava farta de saber, sim,
quais seriam suas consequências. E tudo por um motivo muito simples: a
tentativa de golpe contra o impeachment era comandada diretamente por
ela.
EM TROCA DE TRÊS cargos, um deles a presidência da
Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco, e de apoio à sua
candidatura ao Senado em 2018, Maranhão votara contra o impeachment.
Assumiu a presidência da Câmara quando dali foi retirado Cunha por ordem
do Supremo Tribunal Federal. Desde então, passara a ser assediado para
ajudar o governo ainda mais.
A IDEIA DE ACATAR o recurso de
Cardozo foi levada a Maranhão pelo deputado Sílvio Costa (PTdoB-PE), o
mais feroz pitbull do governo na Câmara. Ele admitiu examiná-lo. No
sábado 7, Maranhão voou ao seu estado e discutiu a ideia com o
governador Flávio Dino (PCdoB). No domingo, acompanhado por Dino, voltou
a Brasília e jantou com ele e Cardozo no apartamento de Costa.
ENQUANTO JANTAVAM, o
vice-presidente Michel Temer telefonou três vezes para Maranhão. Os
dois haviam combinado encontrar-se naquela noite. A cada ligação de
Temer, Maranhão mostrava o celular a Cardozo como prova de que seu
passe, doravante, valeria ouro. O jantar terminou quando Maranhão
assentiu em anular o impeachment. Em seguida, foi levado à presença de
Dilma.
NO PALÁCIO DA ALVORADA, durante animada conversa regada
a vinho chileno, Maranhão ouviu Dilma perguntar a Cardozo: “E Renan?
Ele sabe?” Cardozo respondeu que sim. De Renan, como presidente do
Senado, dependeria o êxito do golpe. Se ele referendasse o ato de
Maranhão, ou se pelos menos o acolhesse para futura decisão a respeito, o
impeachment empacaria.
AO DESPEDIR-SE DE DILMA, Maranhão
pensou que iria para casa. Não deixaram. Com receio de que ele fosse
localizado por Temer e cedesse à tentação de aderir a ele, Cardozo, Dino
e Costa convenceram no a passar a noite no Hotel Golden Tulip, onde Lula
costumava hospedar-se. Foi lá que ele assinou o ato redigido por
Cardozo, e recusado por Renan, de anulação do impeachment.
Fonte: Blog do Noblat - Ricardo Noblat