Somos cotidianamente assediados por organizações criminosas e por
operadores autônomos dessas atividades.
Já me ligaram pedindo dinheiro
para soltar familiar supostamente sequestrado e para mandar dinheiro a
outro que estava na estrada, sem cartão de crédito, precisando de
urgente socorro mecânico. Duas ricas senhoras indianas já morreram sem
herdeiros e me escolheram, por essas coisas do “karma”, para receber as
respectivas heranças mediante pequeno pagamento de custas. Bancos onde
não tenho conta me enviam mensagens pedindo que ligue para tal ou qual
número sobre um gasto que não fiz. Encomendas não solicitadas aguardam
pagamento de taxas que não existem.
Basta que eu procure por certas
mercadorias na internet para que inacreditável barganha surja,
tentadora, na minha palma da mão. Tudo obra de estelionatários,
profissionais da dissimulação e da mentira.
Os cuidados, a
prudência, os bloqueios, os “deletes” vão descartando tais incômodos,
mas os safados renovam suas estratégias, furam bloqueios e exigem
camadas adicionais de informação e prevenção.
Seus persuasivos truques
têm o objetivo de chegar ao dinheiro de suas vítimas através das
fissuras que encontrarem nos respectivos mecanismos de proteção.
São
exploradas fragilidades como a ganância, a imprudência, a ignorância e a
desatenção da vítima, bem como o susto ou medo que os criminosos
suscitam.
Agem por dinheiro e tudo que fazem está tipificado no Código
Penal, mas como incomodam à sociedade e não ao Estado, entram na cadeia
por uma porta e saem pela outra.
***
Agora, o tema
deste artigo, cuja simetria com o que acabei de escrever acima salta
aos olhos: há uma outra atividade, que também consiste em “passar os
outros para trás” de modo enganoso ou furtivo, tão corrente e frequente
quanto as que descrevi.
Ela se desenvolve no campo da política.
Neste
caso, os “estelionatários”, integram um projeto político.
Quem quer
passar os outros para trás nesse ramo não busca diretamente o dinheiro
de suas vítimas. Delas, o embusteiro quer o voto, o voto popular, que
faz com que seus golpes raramente possam ser tipificados como crimes.
Na
maior parte, suas ações são impróprias ou imorais, mas isentas de
cominação penal. Na política, enganar os outros, apresentar-se alguém
como o que não é, para seduzir e ludibriar os eleitores, não dá nada.
Os
votos recebidos pelos finórios da política são os objetivos de seus
estelionatos eleitorais.
Com tal produto, conquistam as cadeiras e as
desejadas fontes de receita obtida com a tarifação de seus próprios
votos em plenário. Quando apertam as teclas sim ou não, tilintam moedas
em suas registradoras. Os eleitores que caíram na conversa que se danem e
paguem o prejuízo que certamente virá.
Nem tudo,
claro, é sempre assim tão pouco sofisticado. Existem especialidades,
como as que envolvem a inserção de “jabutis” em projetos alheios ou a
venda do mandato inteiro, zero quilômetro, “in the box”, ao adversário combatido na campanha eleitoral. Estelionatários! (Coloquem o chapéu aqueles em quem servir).
Poucos meses
após a posse, os bons congressistas já se percebem minoritários...
Por
essas e por outras, eu digo e repito que não gosto de política.
É por
sabê-la necessária e ter tantas razões para meu desgosto com o que
observo ser feito em meu país que dedico muito de meu tempo a ela, a
seus mistérios e às lesões que nos causa.
Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas
contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A
Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia
Rio-Grandense de Letras.