Num de seus últimos votos antes de se aposentar do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello escreveu:— O fato inquestionável é que a corrupção deforma o sentido republicano
da prática política, afeta a integridade dos valores que informam e dão
significado à própria ideia de República, frustra a consolidação das
instituições, compromete a execução de políticas públicas em áreas
sensíveis como as da saúde, da educação, da segurança pública e do
próprio desenvolvimento do país, além de vulnerar o princípio
democrático.
Entretanto não há uma palavra sequer sobre corrupção na nova “Carta aos
Brasileiros”, a ser lida no dia 11 de agosto na Faculdade de Direito do
Largo São Francisco, em São Paulo. Celso de Mello, que se formou
naquela escola, deverá ser o porta-voz do documento.Se ele está certo no seu voto, como acreditamos que está, há aí uma
contradição. A corrupção não é “apenas” uma questão moral, mas política,
social e econômica. Sua prática destrói fundamentos da democracia.
Logo, a condenação à roubalheira do dinheiro público deveria constar num
manifesto em defesa do Estado Democrático de Direito. [importante lembrar o interesse maior de grande parte - não a totalidade devido alguns terem assinado por impulso, por teres sido - é trazer o maior corrupto do Brasil, em todos os tempos, de volta a cena do crime (a frase é de autoria do candidato a vice do maior corrupto, assim deve saber o que fala) = ele foi descondenado, NÃO FOI inocentado.]
Há, entretanto, argumentos para que esse tema não apareça. O principal:
a defesa da democracia e do sistema eleitoral é universal e, portanto,
não partidária. Logo, um documento centrado nesse princípio pode receber
o apoio das diversas correntes políticas, como está ocorrendo.
Na prática, porém, a Carta é contra o presidente Bolsonaro. Óbvio. É
ele que vem ameaçando a democracia, no geral, e o sistema eleitoral
brasileiro, em particular. Por isso, mesmo que o nome de Bolsonaro não
tenha sido citado na Carta, parece claro que nenhum bolsonarista vai
assiná-la. O autoritarismo, o pleito pró-ditadura está na essência do
bolsonarismo.[no Brasil é fácil acusar o presidente Bolsonaro e seu milhões e milhões de apoiadores (e eleitores) de atos antidemocráticos = qualquer comentário que não se enquadre no maldito politicamente correto do establishment, especialmente quando proferido por um bolsonarista, é ato antidemocrático.
A propósito, o Brasil além das jabuticabas, das justiças eleitoral e trabalhista, da prisão preventiva com características de perpétua, possui também uma democracia ímpar, que para ser preservada precisa ser destruída, pois no processo de preservação, principios democráticos são violados.]
Vai daí que o documento favorece Lula — tanto que já foi assinado por
partidários do ex-presidente. [inclusive o Alckmin, candidato a vice do Lula, que proferiu a já famosa frase em relação aos que votarem em Lula: querem trazer o criminoso de volta à cena do crime.] E que não o fariam se ali constassem
menções, ainda que indiretas, sobre os dois maiores episódios de
corrupção que abalaram a democracia: o mensalão e o petrolão.
De novo, faz sentido argumentar que a questão do momento é defesa da
eleição e das urnas. Está certo, e é importante essa ampla movimentação
da sociedade civil. Então, por que estamos colocando o tema da corrupção? Não é para
estragar a festa, mas para tentar deixar em evidência uma questão que
parece banalizada.
A última pesquisa Datafolha registra que 73% dos entrevistados acham
que há corrupção no governo Bolsonaro. [vamos aguardar pesquisas amplas e o inicio para valer da campanha.
Não esqueçamos que antes mesmo de tomar posse no cargo máximo do Brasil, que tentam - sem sucesso - impor a pecha de corrupto, de ladrão em Bolsonaro, seus familiares e até auxiliares.
Alguém em sã consciência acredita que se houvesse provas de corrupção praticada por Bolsonaro, seus familiares e auxiliares diretos, Bolsonaro já teria sido impedido, derrubado, preso e seus auxiliares estariam encarcerados.] apontar o dedo para essa
prática danosa não é embaraçoso apenas para o PT. Atinge um amplo
espectro de lideranças políticas — a maioria absoluta das quais tem
escapado da cadeia com incrível facilidade.[o que além de embaraçar os petistas tem impedido o descondenado de ir as ruas, por estar sendo obrigado a evitar o povo - exceto em plateia selecionadas e formadas por convertidos.É ele quem mais embaraça o 'perda total'.].
O problema está aí. Na mesma pesquisa Datafolha, a corrupção aparece,
digamos, como um problema menor, atrás de saúde, economia, desemprego,
fome, inflação. De novo, faz sentido: estão aí os problemas que afligem o
dia a dia da população.
Outras pesquisas mostram que os brasileiros, na maioria, sabem da
Operação Lava-Jato, sabem que Lula foi preso e que suas condenações
foram anuladas. No mínimo, há dúvidas quanto a sua inocência.
Mas isso não parece ser argumento para tirar votos do ex-presidente.
Como os bolsonaristas não se afastam de seu líder quando percebem a
corrupção no atual governo.
Banalizou.
Se todo mundo rouba, qual é o problema? Nesse ponto, os lulistas dizem mesmo que seu líder foi especialmente perseguido. Por que só ele foi em cana?
Lembram-se de um personagem de
Jô Soares que era sempre apanhado pela Receita?
Tentava se defender com os argumentos mais ridículos, e engraçados, mas sempre terminando com o mesmo mote:
“Só eu? E os outros?”. Assim caímos no
“rouba, mas faz”, da velha política.
Trata-se de enorme equívoco. Como mostram estudos coordenados pela
professora Maria Cristina Pinotti, a corrupção reduz a eficiência da
economia, tolhe o crescimento, aumenta a desigualdade e bloqueia as boas
políticas sociais. [a volta do descondenado à cena do crime trará de volta todas as mazelas destacadas e outras não citadas.] Acrescente aí o voto de Celso de Mello, e temos a
conclusão completa: a corrupção mata a economia e derruba a democracia.