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sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Nas ceias de fim de ano, cuidado ao falar da uva passa - VEJA

Coluna da Lucilia

A pequena notável

O cardápio das ceias de Natal e de Ano Novo não deveria ser alvo de polêmica. As ocasiões pedem conciliação, não desarmonia. Mas os pratos podem, de repente, virar o centro das atenções, provocando opiniões divergentes, para apreensão de quem pilotou o jantar – quem cozinha sabe o que estou falando. O chester costuma passar ileso pelos convivas. A farofa em geral faz figuração discreta. O arroz, se for soltinho, também não preocupa a anfitriã

Eliminados os candidatos do grupo principal, o pomo da discórdia é quase sempre a enrugadinha uva passa. Pomo, como se sabe, é aquela maçã que, segundo a mitologia grega, foi oferecida pela deusa Discórdia, dando início a uma acirrada disputa entre as divindades que orbitavam o rei de Troia. Pois da mesma maneira que a fruta da Antiguidade, a moderna e ressecada uva passa tem potencial desagregador.

Tão pequena e tão polêmica! Com presença clássica em pratos como panetone, manjar, arroz e farofa, ela pode causar sérios problemas durante a ceia. Geralmente, quem abomina a frutinha não se contenta com a possibilidade de ciscá-la discretamente, empurrando-a para um canto do prato, como se a colocasse no “cantinho da reflexão”. O pessoal que vota contra a uva passa quer bani-la definitivamente de qualquer menu desta época do ano – e até do ano inteiro. Fora da mesa e diante da tela do smartphone, alguns se comportam como verdadeiros haters de uva passas, como se elas representassem o que há de pior na culinária.

Os comensais, da direita esclarecida à esquerda democrática, podem aparar arestas partidárias. Veganos e carnívoros podem se tolerar momentaneamente. Se a religião surgir como um tópico de conversa, crentes e descrentes, movidos pelo espírito de confraternização das festas de fim de ano, podem se dar as mãos. O que parecem irreconciliáveis são os pareceres discrepantes sobre a uva passa. Quem gosta, adora. Quem não gosta, odeia. E não se fala mais nisso!

Diante dos mais radicais, não adianta argumentar com base nos benefícios que a uva passa traz para a saúdeela é antioxidante, rica em fibras e tem alto teor de vitaminas e minerais. Nada disso, no entanto, é suficiente para convencer quem quer se livrar da frutinha. A uva passa pode ser feinha, coitada, mas, como diz o sábio provérbio, “beleza não se põe à mesa”. Mais importante do que a aparência é a fartura, algo que, segundo a tradição, a uva passa atrai para aqueles que a consomem em dias de festa. O aspecto ritualístico não pode ser simplesmente descartado, mesmo que hoje em dia não seja mais levado ao pé da letra.

A uva passa, em vez de desagregadora, deveria ser vista como um pequeno monumento à tolerância. Nos próximos dias, portanto, antes de criar caso por causa da uva passa, pense na sua saúde e no espírito de paz e concórdia que, sobretudo nestes tempos de provação, deve prevalecer no período natalino.

Lucilia Diniz - Coluna da Lucilia - VEJA


terça-feira, 27 de outubro de 2020

O golpismo disfarçado - Nas Entrelinhas

Nossa Constituição é fruto de um amplo processo de mobilização da sociedade e de um pacto de transição à democracia como os militares, derrotados com a eleição de Tancredo Neves

O Chile decidiu em plebiscito convocar uma Constituinte formada por homens e mulheres, meio a meio, e sem a participação dos atuais mandatários, somente cidadãos. Foi o desfecho de um processo de insatisfação popular com o “Estado mínimo” chileno, uma herança do ditador Augusto Pinochet, consagrada na Constituição de 1980. Muita coisa mudou desde então, com sucessivas reformas constitucionais, mas o  estigma de uma Carta pinochetista, ou seja, de inspiração fascista, havia permanecido, assim como o caráter privatista de uma legislação que não contemplava os direitos sociais. A convocação da Constituinte chilena, portanto, era uma questão de tempo e representará o fim de um ciclo político de 40 anos de transição do autoritarismo para a democracia plena.

[o Chile está caçando, no popular, 'sarna para se coçar'; 
considerar que o Chile vive sob autoritarismo e precisa de democracia plena, é um grande erro - especialmente se decidirem seguir o modelo da 'constituição cidadã' vigente no Brasil.

A grande falha da Constituição Federal do Brasil é o detalhamento excessivo, absurdo, imposto pelos competentes constituintes, e tudo se agrava quando as minúcias complicam e a Carta tem  que ser interpretada (ou adaptada) pelo seu guardião supremo.]

É uma situação completamente diferente da nossa. Temos uma Constituição social-liberal, cujo preâmbulo diz que o nosso Estado democrático é “destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. [lindo texto; é integralmente cumprido? o texto do preâmbulo e o que é por ele apresentado.]  Nossa Constituição é fruto, simultaneamente, de um amplo processo de mobilização da sociedade e de um pacto de transição à democracia como os militares, que haviam sido derrotados com a eleição de Tancredo Neves, no colégio eleitoral, em 1985, mas se retiraram do poder em ordem.

Entretanto, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), ontem, no embalo das notícias sobre o Chile, propôs um plebiscito para elaborar uma nova Constituição para o nosso país. Não é uma tese nova. A ex-presidente Dilma Rousseff, após as manifestações de junho de 2013, por exemplo, namorou essa ideia, que foi prontamente rechaçada pelos políticos e pelos juristas. Agora, a proposta vem do outro lado do espectro político, com propósitos igualmente suspeitos, porque sabemos que o presidente Jair Bolsonaro gostaria de uma Constituição que lhe desse mais poderes em relação ao Judiciário e ao próprio Legislativo.

Muitos criticam a Constituição de 1988 porque é social-liberal. O pomo da discórdia é o seu artigo 3º, segundo o qual “constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (I) construir uma sociedade livre, justa e solidária; (II) garantir o desenvolvimento nacional; (III) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; (IV) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A existência desses dispositivos, principalmente quanto à economia e aos direitos sociais — ou seja, exatamente aquilo que os chilenos, ao aprovar a convocação da sua Constituinte, pleiteiam —, sempre incomodou os setores mais conservadores da nossa sociedade. [com todas as vênias,  não são os dispositivos e sim a concessão indiscriminada de direitos - alguns de dificil convívio com outros, contraditórios e o pior = direitos demais sem a contra partida de deveres.]

Mais poderes
No nosso caso, muitos podem achar que papel aceita tudo e que as coisas não funcionam por causa da Constituição de 1988. Não é verdade. Como diz o ex-deputado Miro Teixeira, um dos constituintes, nosso problema é cumpri-la. O que vem acontecendo ao longo dos anos é que o Supremo Tribunal Federal (STF), cuja missão é zelar pelo respeito à Constituição, vem sistematicamente tomando decisões que obrigam ao cumprimento de diversos dispositivos desse artigo, sobretudo em relação às liberdades e à igualdade de direitos. Uma parte das críticas à “judicialização da política” e às decisões do Supremo resulta do exercício desse papel, como “poder moderador”, [felizmente, a citação está entre aspas - são elas que impedem que o texto contrarie a própria Constituição.

Saiba mais: Cabe às Forças Armadas moderar os conflitos entre os Poderes - Ives Gandra da Silva Martins.

Por favor, leiam e encontrem uma contestação plausível - vejam também a LC 97/99. , editada em cumprimento ao determinado no art. 142 da CF.] 

Pode ser que Ricardo Barros tenha anunciado a proposta para agradar ao chefe, mas é ilusão imaginar que o líder do governo é um bobo da corte. Parlamentar experiente, que há muitos anos lidera setores conservadores do Congresso, viu no plebiscito chileno uma oportunidade. Muitos gostariam de mudar a Constituição por maioria simples, como acontece nas constituintes. Hoje, essas mudanças só podem ser feitas por três quintos dos membros da Câmara e do Senado, em duas votações, sendo que são cláusulas pétreas, ou seja, que não podem ser alteradas: (I) A forma federativa de estado; (II) O voto secreto, direto e universal; (III) A separação dos poderes; (IV) os direitos e garantias individuais.

Agora mesmo, a propósito da polêmica sobre a obrigatoriedade da vacina contra o novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro investiu contra o Judiciário, com o argumento de que a Justiça não pode decidir sobre esse assunto, embora esteja diretamente relacionado à teoria do dano direto e imediato, consagrada no nosso Código de Processo Civil. Bolsonaro, por diversas vezes, investiu contra o Supremo por acreditar que o fato de ter sido eleito presidente da República lhe dá poderes maiores do que aquele que a Constituição lhe atribuiu. Mudar a Constituição, inclusive para alterar a composição da Suprema Corte e amordaçar a imprensa, reprimir a oposição e se reeleger sucessivas vezes foi o estratagema de muitos mandatários eleitos que governam seus países autoritariamente.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


sexta-feira, 1 de março de 2019

O malefício da dúvida

“A proposta de benefício continuado apresentado pela equipe econômica é realmente polêmica e estava na bandeja das negociações com o Congresso

O presidente Jair Bolsonaro, na entrevista coletiva que deu ontem a jornalistas em Brasília, sinalizou para o mercado que não está tão afinado com a proposta de nova Previdência enviada pelo governo ao Congresso como deveria. O pomo da discórdia é a proposta do chamado Benefício de Prestação Continuada (BPC) para os idosos carentes, que hoje é de um salário mínimo para aqueles que tem mais de 65 anos. Na proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, o benefício seria pago para idosos com mais de 70 anos, antecipada por um benefício de R$ 400 reais a partir dos 60 anos. Bolsonaro também admitiu reduzir de 62 para 60 anos a idade mínima para aposentadoria das mulheres, que a equipe queria que fosse igual à dos homens, 65 anos.

Como sempre acontece nessas situações, a Bolsa de São Paulo fechou em queda de 1,77%, influenciada também pela divulgação do PIB do ano passado, que cresceu apenas 1,1%, e pelo fato de que os indicadores econômicos dão sinais de desaceleração. Os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram, em valores correntes, que o PIB em 2018 totalizou R$ 6,8 trilhões, riqueza equivalente a de 2012. Ou seja, o país está estagnado há 7 anos. Não é culpa de Bolsonaro, mas o problema agora é do novo presidente.
Os números são frustrantes em relação ao desemprego, que mantém o patamar do começo de 2018 e teve uma queda do ritmo de geração de vagas. Também caíram as expectativas do comércio e dos serviços. O chamado “instinto animal” dos empresários, para usar uma expressão famosa do ex-ministro Delfim Neto, diante do atual cenário, continua recomendando mais cautela do que audácia na tomada das decisões, o que frustra um pouco as expectativas da equipe econômica. Na prática, o principal sinal de mudança precisa vir da política, com aprovação da reforma da Previdência.

A proposta de benefício continuado apresentado pela equipe econômica é realmente polêmica e estava na bandeja das negociações com o Congresso. Dificilmente seria aprovada, mas a declaração de Bolsonaro tirou o “bode” de sala antes da hora. Ou seja, o governo perdeu poder de barganha nas negociações da reforma de graça, antes mesmo de a comissão especial encarregada de examiná-la ser instalada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Populismo
Análise feita pelo economista Felipe Salto, do Instituto Fiscal Independente, ligado ao Senado, estima que a nova regra de concessão do BPC elevaria as despesas nos primeiros anos (aumento de R$ 2,1 bilhões em quatro anos), mas geraria economias crescentes no período seguinte (somando R$ 28,7 bilhões em 10 anos). “Para que a regra proposta, em 10 anos, fosse neutra em termos fiscais na comparação com a regra atual, o benefício mensal pago aos idosos entre 60 e 69 anos deveria ser de R$ 520,00”, calcula.

A proposta era vista como um ponto fraco da nova Previdência pela oposição, que logo construiu a narrativa de que o governo estava jogando o ônus da reforma sobre os ombros dos mais necessitados, os idosos carentes e portadores de deficiência. Bolsonaro não aguentou a pressão, ainda mais depois da divulgação de pesquisa na qual o índice de aprovação do governo estava abaixo de suas próprias expectativas. O presidente da República tem uma avaliação positiva de 57,5% da população, mas seu governo conta com a confiança de 38,9%, segundo o instituto MDA. A distância entre seu desempenho pessoal e o do governo é de 18,6%. Avaliaram o governo como regular 29% dos entrevistados; como ruim ou péssimo, 19%.

Político com quase 30 anos de experiência na Câmara, Bolsonaro sabe muitíssimo bem o que é uma causa perdida no parlamento, mas era de se esperar mais sangue-frio no tratamento do assunto, porque a forma como sinalizou o recuo, perante o mercado, reforça o perfil de um político populista, com dificuldades para enfrentar temas que possam afetar sua popularidade. Também mostra um tipo de negociador sem estratégia de chegada, o que não costuma ser bom para o governo no Congresso. Entra governo, sai governo, os agentes econômicos são os mesmos, têm interesses permanentes e costumam reagir de acordo com as expectativas criadas pela relação/governo. Como a base governista ainda não se estruturou para a reforma, declarações como as de ontem servem para organizar a oposição.

 Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB