Escolha do ministro da Educação não surpreende ninguém, Bolsonaro foi eleito porque pensa assim
Uma escolha técnica seria mais adequada, devido aos problemas que temos na educação, maiores do que a questão ideológica, que sem dúvida interfere na qualidade, mas apenas lateralmente. Não pode ser surpresa para ninguém que Bolsonaro escolha um ministro que tenha uma ideologia de direita tão marcada quanto a de Ricardo Velez. É o que o Bolsonaro pensa e o que defendeu na campanha presidencial. Assim como a indicação do chanceler do Itamaraty, que ele escolheu dentro da carreira, mas não entre embaixadores seniores, como era a expectativa. Escolheu um jovem embaixador, recentemente promovido, que pensa como ele. As duas nomeações foram indicadas pelo filósofo Olavo de Carvalho, que é o pensador desse grupo. [o Brasil precisa de um ministro da Educação que antes de tudo seja favorável à verdade - ou não se omita e combata a mentira - só a mentira permitiu que uma escola tivesse sua denominação alterada de "Escola Presidente Emilio Médici" para 'escola Carlos Marighella' - escola está grafada em minúsculos, visto que a mudança de nome apequenou a escola;
- a famigerada 'ideologia de gênero' é algo que precisar ser extirpado das nossas escolas e a Educação precisa de um ministro que faça o necessário para a extirpação;
- é inaceitável que um professor dedique tempo de sua aula para comentar sobre política- o que torna essencial um ministro favorável à Escola sem Partido.
O fato, adequadamente destacado pelo colunista, que Bolsonaro foi eleito exatamente por pensar da forma como está agindo, obriga que Bolsonaro aja conforme demonstrou durante toda a campanha e mesmo antes dela.
Presidente Bolsonaro, uma pergunta que não quer calar:
- para tratar de direitos humanos é necessário um ministério? nos parece que uma secretaria incluída no organograma do Ministério da Justiça e Segurança Pública, resolverá a contento eventual necessidade;
o mesmo vale para ministérios da igualdade disso e daquilo - a substituição por subsecretarias que podem ser incluídas no organograma da 'secretaria dos direitos humanos', é mais que suficiente.
O passo inicial para qualquer redução do número de ministérios, impõe a extinção dos que são desnecessários.]
Não surpreende ninguém, Bolsonaro foi eleito porque pensa assim, porque disse as coisas que disse durante a campanha. Pode-se discordar dessa linha, muita gente votou no Bolsonaro por causa disso, muita gente votou no Bolsonaro apesar disso, achando que a volta do PT seria pior. Muita gente votou no Haddad para evitar o Bolsonaro e o que ele pensa, mesmo sem ser petista. Mas a grande maioria do eleitorado que elegeu Bolsonaro, tenho a impressão, concorda com ele, e comunga dessas ideias. Não há, portanto, estelionato eleitoral, é um fato anunciado. O que vamos ver agora é como as decisões de governo vão se dar.
Se acontecer na educação o mesmo aparelhamento colocado em prática nos governos petistas, com o sinal trocado, levando o sistema educacional a uma direção ideológica de direita, em detrimento dos aspectos técnicos que necessitam ser atacados para que a educação brasileira deixe de ser tão ruim quanto é, o governo Bolsonaro será criticado, assim como os governos petistas foram. O novo ministro da educação defende em uma postagem do facebook que existam comissões em salas de aulas em universidades e escolas públicas para ver se as boas normas estão sendo cumpridas, ou coisa semelhante.
O PT tentou fazer comitês em tudo quanto foi lugar, e nunca conseguiu porque a reação da opinião pública foi muito forte. Tentou fazer comitês populares para a distribuição do Bolsa Família, ou comitês nos órgãos de imprensa a pretexto de um “controle social da mídia”, que continuou no seu programa de governo na recente campanha presidencial. Essas iniciativas foram vetadas, quando apresentadas ao Congresso, e a maioria nem foi apresentada, depois que os balões de ensaio foram rejeitados pela opinião pública. Nesse caso da educação no governo Bolsonaro vai ser a mesma coisa. Fazer comissões dentro de salas de aula para investigar posturas de professores e alunos é um absurdo, inaceitável, e certamente a ideia será barrada não apenas pela opinião pública que, mesmo minoritária se for o caso, tem capacidade de obstruir medidas abusivas, como também por reação dos professores e alunos.
Assim como o chanceler Ernesto Araújo terá que enfrentar questões práticas para levar adiante seus pensamentos sobre política exterior, como a reação dos países árabes à transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, ou os incômodos causados pelas críticas à China, nosso maior parceiro no comércio internacional. É mais importante melhorar a performance dos alunos no teste internacional Pisa, onde nossa colocação em matemática, português e ciência é vergonhosa em comparação com outros países em estágio semelhante ao nosso, e às vezes inferior, do que instituir o programa Escola sem Partido.
Essa disputa ideológica dentro das universidades e escolas públicas tem que ser resolvida na discussão normal de ideias, e caberá ao governo proporcionar um ambiente plural para tanto. O que não acontece hoje, com a ideologia esquerdista que não abre espaços para outros pensamentos. As provas do Enem, por exemplo, serão completamente diferentes das que são feitas nos últimos 13 anos, e o que será analisada é a qualidade da prova, se há intenções políticas atrás de certas perguntas. Os métodos adotados têm que levar em conta sempre a liberdade de pensamento, a liberdade de expressão. Até o ponto em que o governo não interfira nos direitos individuais dos cidadãos, alunos e professores, de se informar e pensar por conta própria. O que conta, no fim das contas, é a melhoria da qualidade do ensino.
Merval Pereira - O Globo