Desde
quando Barroso declarou que desejava "empurrar a história" rumo à
"justiça racial", passei a me referir a ele como "o ungido", que habita a
Torre de Marfim onde o sol da Razão ilumina tudo. Barroso é um ativista
que quer legislar sem votos, e o motivo disso é sua extrema arrogância
como ser racional e do "lado certo" da história.
Em uma entrevista recente
sobre as urnas eletrônicas, essa empáfia salta aos olhos mesmo para os
menos atentos. E tamanha arrogância vem seguida de uma retórica de
humildade, sem que o "iluminado" perceba a incoerência. Barroso lança
mão de espantalhos para defender o que não merece muita defesa e para
rechaçar como absurda a demanda legítima de mais transparência na
auditoria dos votos. Eis um trecho:
"Como
presidente do TSE, estou à disposição para receber de qualquer pessoa
qualquer elemento de prova de que há fraude em nosso sistema. Meu
compromisso não é com um específico modelo de votação, mas com eleições
livres e limpas. Portanto, se alguém trouxer qualquer indício de fraude,
nós imediatamente apuraremos. Mas a volta do voto impresso, além de
todos os inconvenientes, seria inútil, relativamente ao discurso da
fraude. O discurso da fraude faz parte da retórica de certos segmentos
políticos. É a lógica do “se eu perder houve fraude”. [só o simples fato de ignorar que os cobradores de mais transparência estão entre os que ganharam as eleições, mostra que padece de excesso de empáfia, resultando no seu estilo empafioso - seus argumentos e sua vontade, por mais frágeis que sejam, devem sempre prevalecer.]
Ora, quem está cobrando mais transparência é quem venceu eleições!
O próprio presidente Bolsonaro é um exemplo, a deputada Bia Kicis
outro, entre tantos.
Sobre apresentar a prova da fraude, o ônus da prova
deveria ser o contrário: provar que ela não existiu. Mas eis exatamente
o ponto: não é possível sequer auditar para valer, como os tucanos
descobriram com especialistas em 2014. Os motivos que Barroso apresenta
para condenar a mudança são frágeis demais: Em
primeiro lugar, em razão do custo de sua implementação. Antes da
pandemia e da alta do dólar, nós já falávamos no custo de R$ 2 bilhões
para a introdução do voto impresso. Em segundo lugar, pelo risco ao
sigilo do voto, motivo que levou o STF a declarar a sua
inconstitucionalidade.
Dois bilhões de reais
para proteger a democracia parece pechincha, ainda mais diante do custo
para manter os luxos do Congresso e do próprio STF.
O sigilo do voto não
estaria ameaçado, pois como Barroso certamente sabe, ninguém teria
acesso ao pedaço de papel impresso em outra urna. Tudo que se deseja é
que cada eleitor tenha como verificar que o que apertou na urna foi
efetivamente computado, e permitir uma real checagem posterior. O
boletim da urna de hoje não faz isso, pois é um saldo total daquela
urna, onde já pode ter desvio.
Estamos falando de uma
tecnologia que tem 25 anos e que países bem mais avançados, como os
Estados Unidos, não adotam.
Seria por falta de capacidade?
Mas Barroso
não toca nessa questão e repete que temos um dos sistemas mais
confiáveis do mundo, o que causaria perplexidade em cidadãos de países
tão mais desenvolvidos que rejeitam esse mecanismo. Mas nessa passagem
Barroso deixa sua empáfia vir à tona:
"Acredito
que a defesa do voto impresso decorre do desconhecimento sobre como o
sistema funciona e em razão das campanhas de desinformação. Acho que
esses fatores também são determinantes para o movimento anti-vacina. A
verdade é que o desenvolvimento das vacinas erradicou ou controlou uma
série de doenças, muitas delas fatais. Isso faz com que muitas pessoas,
notadamente as mais jovens, nem sequer se deem conta da sua importância.
É por essas e outras que gosto de dizer que o país precisa de um choque
de Iluminismo. Iluminismo significa razão, ciência, humanismo e
progresso."
Ele
conseguiu misturar desconfiança com a urna sem impressão com vacinas em
geral, ignorando que a crítica de muitos era sobre o processo acelerado
de desenvolvimento dessas vacinas em particular contra o Covid. Barroso
deve se achar muito mais iluminado do que jornalistas como Guilherme
Fiuza, que tem feito perguntas incômodas - e sem respostas. Veja o caso
que Leonardo Coutinho, outro jornalista sério, trouxe: "Em
maio, o governo da Indonésia e a Sinovac, fabricante da Coronavac,
anunciaram que sua vacina era 98% eficaz para prevenção de mortes e 96%
para hospitalizações de entre profissionais de saúde. Apenas um mês
depois, a realidade que se apresenta é outra".
Mais
de 350 médicos e profissionais de saúde contraíram COVID-19 na
Indonésia, apesar de terem sido vacinados com Sinovac, e dezenas foram
hospitalizados. O Butantan não disse que era 100% de proteção? Queremos
respostas, não lacres! No entanto, lacrar é tudo que o Butantan tem
feito, pelo visto, como podemos observar:
A
politização do Butantan na atual gestão é lamentável. Em vez de chamar
de Fake News, que tal explicar?
Como o Butantan explica o aumento de
casos no Chile, justo o país que mais vacinou na região, e com a
Coronavac?
Ciência se faz com perguntas, mas Barroso e o Butantan devem
se julgar iluminados demais para dar respostas.
Não obstante, Barroso
se considera muito humilde:"Eu cumpro a missão da
minha vida, em defesa da democracia, da justiça, do bem e da verdade
possível. Nem crítica nem elogio me desviam desse caminho. A vida me deu
muitas oportunidades e procuro desfrutá-las sem arrogância, com compreensão pelas dificuldades alheias."
Se ele não fala ninguém saberia. Afinal, o que menos observamos
em Barroso é humildade. Basta ver como ele justifica seu evidente
ativismo judicial: "São poucas as decisões que eu considero ativistas:
uniões homoafetivas, aborto de feto anencefálico e criminalização da
homofobia. Todas essas decisões atuam em defesa de minorias e eu as
qualifico de iluministas". Ou seja, se ele as considera "iluministas",
então para o inferno com a Constituição, da qual ele deveria ser o
guardião! É aquele tal "empurrão na história"...
Talvez
o ápice do iluminismo de Barroso tenha sido quando elogiou o médium
João de Deus, encalacrado com a Justiça hoje, chamando de
"transcendente" seus dons;
Ou
talvez seu momento de maior grandeza iluminista tenha sido quando
"debateu" sobre política com o imitador de focas, mais raso do que um
pires convexo: Para
quem está fora da bolha, tudo que se espera de Barroso é que ele siga a
Constituição do país, sua missão no STF, e acate a mudança das urnas se
passar como PEC. Barroso, porém, considera seu papel muito maior do que
isso, que seria pequeno demais para um ser tão iluminado como ele.
Barroso, o ungido, pretende criar as leis, empurrar a história, trazer a luz para o povo ignorante. E é justamente aí que mora o perigo...