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sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Nunca subestime a política - Alon Feuerwerker

Análise Política

Pergunte a qualquer especialista digno do nome se a pandemia acabou. E se chegou a hora do liberou geral.  
Duvido que algum responda “sim” e “sim”. 
E por que não se nota uma grita generalizada contra a reabertura ampla, geral e irrestrita das atividades? 
Pois o patamar de mortes/dia por Covid-19 ainda bate as centenas.

A explicação está mais no âmbito da ciência política que da infectologia, da imunologia ou da epidemiologia. O liberou geral decorre da crescente péssima relação custo/benefício, para os políticos, de continuar tentando impor as antes celebradas medidas de distanciamento social para redução da circulação do SARS-CoV-2.

A real é que o pessoal se cansou e decidiu virar a página. E os políticos, de olho nas urnas do ano que vem, resolveram que não é o caso de dar murro em ponta de faca. Fim. Poderiam, pelo menos, reforçar a necessidade do uso de máscaras quando a circulação volta ao normal. Mas nem isso. 
É verdade que chegamos a bons níveis de vacinação e estamos batendo no número mágico de 60% de vacinados com duas doses, ou única
Mas outros países bem vacinados vêm assistindo a repiques de casos e mortes por novas variantes, e o conceito de “completamente vacinado” sofre mutações em velocidade viral.

A aplicação de doses de reforço espalha-se pelo planeta. Ou melhor, pela parte rica do planeta. Os países pobres continuam comendo poeira. Não chega a ser novidade. Sim, não parece, mas o Brasil ainda convive com milhares de casos e centenas de mortes no registro diário. Uma atenuante, dirão, é os números estarem declinando já faz algum tempo. Eles vêm caindo desde março/abril, quando a taxa de vacinados ainda era pequena. Eis outro “por quê?” à espera de resposta.

E outra: se estamos abrindo agora porque os números estão caindo, por que não abrimos antes?  Uma boa hipótese para o declínio de casos e mortes desde março/abril é a variante Gama (“de Manaus”) ter “vacinado” em massa a população brasileira, mas isso ainda aguarda comprovação. [comprovação que jamais será reconhecida - reconhecer que a variante Gama - "vacinou"  em massa a população brasileira é reconhecer a imunidade de rebanho = admitir que o presidente Bolsonaro sempre esteve certo.l 
É muita coisa para os inimigos do Brasil admitirem.]

Outra hipótese a pesquisar é se vacinas de vírus inativado não seriam mesmo mais eficazes contra variantes. Mas não tem sido elegante tocar nessa possibilidade em certos círculos, dado que a CoronaVac é chinesa.

Mudando de assunto, os Estados Unidos reabrem o turismo a vacinados, inclusive com as vacinas chinesas da Sinovac (nossa CoronaVac) e Sinopharm. E Israel, pioneiro na vacinação em massa, aceita, além dessas, também a russa Sputnik V, apesar de o imunizante não estar chancelado pela Organização Mundial da Saúde.

E no Brasil? Por que a CoronaVac ainda não tem aqui o registro definitivo e a Sputnik V continua bloqueada?  As respostas deveriam estar sendo cobradas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Mas esta corre em raia mais ou menos livre desde que conseguiu transmitir a impressão de não estar alinhada a Jair Messias Bolsonaro. Parece ter recebido, por causa disso, um amplo passe livre.

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

Publicado na revista Veja de 27 de outubro de 2023, edição nº 2.763


quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Anvisa determina recolhimento de 12,1 milhões de doses da CoronaVac

Os lotes interditados "não correspondem ao produto aprovado pela Anvisa os termos da Autorização Temporária de Uso Emergencial 
(AUE) da vacina CoronaVac"

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou o recolhimento de alguns lotes da vacina CoronaVac, contra a covid-19, que foram interditados após constatação de que "dados apresentados pelo laboratório não comprovam a realização do envase da vacina em condições satisfatórias de boas práticas de fabricação".


A determinação foi anunciada hoje (22) por meio da Resolução (RE) 3.609, que determinou o recolhimento dos lotes da CoronaVac que já haviam sido interditados de forma cautelar pela Resolução (RE) 3.425, de 4 de setembro de 2021. No dia 3 de setembro, a agência foi comunicada pelo Instituto Butantan que o parceiro na fabricação vacina CoronaVac, o laboratório Sinovac, havia enviado para o Brasil 25 lotes na apresentação frasco-ampola (monodose e duas doses), totalizando 12.113.934 doses, que foram envasados em instalações não inspecionadas pela Anvisa.

Diante da situação, e "considerando as características do produto e a complexidade do processo fabril, já que vacinas são produtos estéreis (injetáveis) que devem ser fabricados em rigorosas condições assépticas", a Anvisa adotou medida cautelar com o objetivo de mitigar um potencial risco sanitário.

Em nota divulgada há pouco, a agência informa que, desde a interdição cautelar, avaliou todos os documentos encaminhados pelo Instituto Butantan, "dentre os quais os emitidos pela autoridade?sanitária chinesa".
"Os documentos encaminhados consistiram em formulários de não conformidades que reforçaram as preocupações quanto às práticas assépticas e à rastreabilidade dos lotes",
detalha a nota.

A Anvisa acrescenta que também fez a análise das documentações referentes à análise de risco e à inspeção remota realizadas pelo Instituto Butantan, "e concluiu que permaneciam as incertezas sobre o novo local de fabricação, diante das não conformidades apontadas".  Os lotes interditados "não correspondem ao produto aprovado pela Anvisa nos termos da Autorização Temporária de Uso Emergencial (AUE) da vacina CoronaVac", uma vez que foram fabricados em local não aprovado pela agência e, conforme informado pelo próprio Instituto Butantan, "nunca inspecionado por autoridade com sistema regulatório equivalente ao da Anvisa".   "Portanto, considerando que os dados apresentados sobre a planta da empresa? Sinovac localizada no número 41?  Yong da Road, Pequim, não comprovam a realização do envase da vacina CoronaVac em condições satisfatórias de boas práticas de fabricação, a Anvisa concluiu, com base no princípio da precaução, que não seria possível realizar a desinterdição dos lotes", completa a nota.

A Anvisa concluiu também que a realização de inspeção presencial na China não afastaria a motivação que levou à interdição cautelar dos lotes, por se tratar de produtos irregulares, uma vez que não correspondem ao produto aprovado pela Anvisa, por terem sido envasados em local não aprovado pela agência.

Diante a situação, ficará a cargo dos importadores adotar os procedimentos necessários para o recolhimento das vacinas restantes de todos os lotes que foram interditados.

A agência enfatiza que "a vacina CoronaVac permanece autorizada no país e possui relação benefício-risco favorável ao seu uso no país", desde que produzida nos termos aprovados pela autoridade sanitária. 

Saber mais, clique aqui

Confira os lotes impactados
Segundo a Anvisa, 12.113.934 doses de lotes cujo recolhimento foi determinado pela Anvisa já foram distribuídos. São eles: IB: 202107101H, 202107102H, 202107103H, 202107104H, 202108108H, 202108109H, 202108110H, 202108111H, 202108112H, 202108113H, 202108114H, 202108115H, 202108116H e L202106038.

Brasil - Correio Braziliense

 

sábado, 4 de setembro de 2021

Anvisa proíbe uso de doses da vacina CoronaVac envasadas em fábrica que não passou por inspeção - O Globo

Cerca de 12,1 milhões de doses já enviadas ao Programa Nacional de Imunizações tiveram parte do processo em local não autorizado; em ofício enviado à Anvisa e obtido pelo GLOBO, Butantan argumenta que doses não apresentam riscos à população

Cerca de 12 milhões de doses da vacina Coronavac produzidas na China, e já enviadas ao governo brasileiro, foram envasadas por um laboratório que não tem autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para atuar no processo. O problema foi constatado pelo Butantan, responsável pela distribuição do produto em território nacional, e comunicado na noite desta sexta-feira à agência reguladora. Diante do fato, a Anvisa determinou, neste sábado, a interdição cautelar dos lotes da vacina, proibindo a distribuição e uso dos imunizantes que foram envasados em local não autorizado. Após ser procurada pelo GLOBO, a agência soltou uma nota à imprensa informando sobre o fato.
[é joãozinho seus ex-amigos da Covidão já estão avaliando  te convocar para depor na Covidão - governador não pode, mas se tratando de vacina envasada  ilegalmente, eles vão conseguir te convocar. tu tá ...
os três senadores que mandam na CPI já estão preparando uma notícia-crime contra você, joãozinho, que entregarão no STF dia 8 - data em que os ministros do STF pretendem retornar ao DF.]

Todos os imunizantes utilizados no país devem atender aos critérios estabelecidos pela Anvisa, sob risco de comprometimento da eficácia e segurança das doses. Essas 12,1 milhões de unidades já foram encaminhadas ao Plano Nacional de Imunização (PNI). Não se sabe, porém, quantas foram aplicadas Brasil afora.  "Nesses termos, a vacina envasada em local não aprovado na Autorização de Uso Emergencial configura-se em produto não regularizado junto à Anvisa. Desta feita, torna-se essencial a atuação da Anvisa com o intuito de mitigar um possível risco sanitário", diz nota da agência divulgada após ser questionada pela reportagem.

A agência disse ainda que avaliou a documentação apresentada pelo Butantan e "consultou as bases de dados internacionais em busca de informações acerca das condições de boas práticas de fabricação da empresa responsável pelo envase desses lotes e até o momento não localizou nenhum relatório de inspeção emitido por outras autoridades de referência".

Mais doses devem chegar com o mesmo problema, diz Butantan

O GLOBO teve acesso com exclusividade ao ofício enviado pelo presidente do Butantan, Dimas Covas, à Anvisa, na noite desta sexta-feira. Além de relatar o ocorrido, Dimas alerta que devem chegar ao Brasil em breve outras 9 milhões de vacinas na mesma situação e solicita à agência autorização para usar ambos os lotes em caráter excepcional. De acordo com o comunicado, técnicos do Butantan analisaram as informações disponíveis nos lotes e constataram que, apesar de terem sido acondicionados por uma unidade que não recebeu chancela da Anvisa, eles não apresentam riscos à população.[o Butantan entre em seara alheia = quem avalia risco sanitário de fármacos, incluindo vacinas, é a ANVISA.]  "Para dar suporte a esta solicitação de excepcionalidade, a equipe de Assuntos Regulatórios e Qualidade do Instituto avaliaram as documentações relacionadas ao produto envasado neste novo site, e entendem que os resultados são satisfatórios quanto aos aspectos de segurança e qualidade da referida vacina", diz o documento, que pede urgência por parte da Anvisa.

No documento, Dimas Covas detalha que, no dia 1º de setembro, o departamento de assuntos regulatórios do instituto identificou que o laboratório chinês Sinovac, onde é fabricada a matéria-prima da Coronavac, havia enviado lotes de vacinas envasadas em uma fábrica não aprovada pela Anvisa. Ele acrescenta ainda que comunicaria o Ministério da Saúde sobre o caso. Covas destaca, porém, que o ingrediente farmacêutico ativo (IFA) usado para a fabricação foi feito em fábrica certificada pela agência. "Estamos enviando à Coordenação do Programa Nacional de Imunização (PNI do Ministério da Saúde) este mesmo comunicado, para que as devidas providências sejam tomadas em relação aos lotes envasados no novo site, que já foram distribuídos", diz um trecho do ofício.

No caso em questão, o próprio Butantan informou à Anvisa que vacinas foram envasadas numa "unidade fabril não inspecionada e aprovada pela Anvisa", ou seja, o estabelecimento responsável pela última etapa do processo nem sequer passou pelo escrutínio da agência. O ofício traz em anexo uma declaração da Sinovac afirmando que o produto biológico a granel para produção da vacina foi produzidos na fábrica Tianfu, em Pequim, que tem autorização da Anvisa, mas que o envase foi feito na planta fabril de Yongda, também em Pequim. Esta última não passou pela inspeção da agência.

Como procedimento padrão, antes de conceder registro para uma vacina a ser distribuída no Brasil, a agência reguladora envia uma missão de técnicos ao país de origem para verificar se todas as unidades que participam da escala de produção atendem às exigência a autoridade sanitária brasileira.

No ano passado, a Anvisa enviou uma comitiva à China para realizar a inspeção das plantas fabris envolvidas no processo de produção de vacina. Na missão, os técnicos da Anvisa verificaram a estrutura da área de produção, armazenamento e dos laboratórios de controle de qualidade e analisaram se a fábrica atendia aos padrões da legislação brasileira.

O fato de a Anvisa não ter inspecionado a fábrica que atuou no processo de envase  impossibilita a agência de garantir que essa parte da produção foi executada com segurança. Nesse trecho do processo, as vacinas podem ficar suscetíveis à contaminação, a erros no volume e proporções das doses, entre outros fatores.

Em nota anterior enviado ao GLOBO na manhã deste sábado, antes da decisão cautelar, a Anvisa confirmou que o tema foi tratado em reunião da agência e disse que "as equipes técnicas da Anvisa estão trabalhando na análise de todas as informações para entender o caso e as medidas a serem tomadas."

O GLOBO questionou o Butantan e o Ministério da Saúde sobre o tema, mas ainda não obteve resposta.

Veja o número dos lotes retidos

Lotes já distribuídos (12.113.934 doses):

• IB: 202107101H, 202107102H, 202107103H, 202107104H, 202108108H, 202108109H, 202108110H, 202108111H, 202108112H, 202108113H, 202108114H, 202108115H, 202108116H e L202106038.

• SES/SP: J202106025, J202106029, J202106030, J202106031, J202106032, J202106033, H202106042, H202106043, H202106044, J202106039, L202106048.

Lotes em tramitação de envio e liberação ao Brasil (9.000.000 doses):

• IB: 202108116H, 202108117H, 202108125H, 202108126H, 202108127H, 202108128H, 202108129H, 202108168H, 202108169H, 202108170H, 2021081701K, 202108130H, 202108131H, 202108171K, 202108132H, 202108133H, 202108134H

Saúde - Medicina - O Globo

 

sábado, 3 de julho de 2021

Precisamos falar sobre a CoronaVac - Revista Oeste

Paula Leal

A vacina recebida pela maioria dos brasileiros enfrenta um surto de perguntas sem resposta

O que esperar de uma cidade que já vacinou mais de 95% da população contra a covid-19? Comércio e escolas abertos, bares e restaurantes funcionando normalmente, gente praticando esportes e andando nas ruas sem máscara. Aquela vida normal que tínhamos até sermos atingidos pela maior e mais devastadora pandemia do século. Em boa parte dos Estados Unidos, Israel e nações do continente europeu, esse é o cenário real desde que o ritmo da vacinação acelerou-se. Mas a pacata Serrana, no interior paulista, mesmo depois de imunizar quase toda a população, continua na mesma. O município segue estritamente as regras do Plano São Paulo estabelecidas pelo governador João Doria (PSDB) e seu conselho de “especialistas em ciência” que formam o Centro de Contingência. Por lá, a vida permanece no “modo pandêmico”: comércio, bares e restaurantes com horários restritos, controle de ocupação, uso de máscara obrigatório até mesmo ao ar livre, nada de eventos, festas, comemorações. A ordem é manter as orientações de quem ainda não recebeu nenhuma dose de vacina.

O estudo clínico, batizado de Projeto S pelo Instituto Butantan, foi estruturado de maneira sigilosa ainda no ano passado e implementado entre fevereiro e abril de 2021. Ao longo de oito semanas, pouco mais de 27 mil moradores foram imunizados com a CoronaVac, a vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Butantan — o equivalente a 95% da população-alvo da pesquisa e aproximadamente 60% da população total de Serrana, de quase 46 mil habitantes. Os resultados do experimento foram divulgados numa coletiva de imprensa mais de um mês depois do término da vacinação: as mortes por covid-19 caíram 95%, as internações recuaram 86% e os casos sintomáticos foram reduzidos em 80%. Até agora, no entanto, o Butantan não apresentou os dados brutos da pesquisa nem informações sobre faixa etária. A justificativa é que eles serão publicados num artigo científico — futuramente. Segundo especialistas, a prática de não divulgar os detalhes de um estudo científico numa coletiva de imprensa é comum, mas ajuda a engrossar o caldo de desconfiança que ronda a CoronaVac desde a sua origem.

Um festival de erros
Primeiro, o relacionamento do governo paulista com o gigante farmacêutico chinês Sinovac continua um mistério. O contrato firmado envolve cláusulas sigilosas que não podem ser compartilhadas com a comunidade médica. Pela parceria, o governo do Estado diz que pagou R$ 85 milhões em junho do ano passado. Em setembro, foram US$ 90 milhões — o governador João Doria não esclareceu se esse valor se soma ao que foi pago anteriormente. No último dia 23, a presidente do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo solicitou os termos da negociação entre o Butantan e o fabricante. Em relatório elaborado pelo órgão de controle, o instituto é criticado pela falta de transparência no fornecimento de informações ao tribunal.

Depois, a divulgação de dados sobre a vacina foi um show de tropeços. Após três adiamentos, coletivas que forneciam números incompletos e cálculos questionáveis, a população brasileira ficou sabendo que a CoronaVac atingiu 50,38% de eficácia global, no limite exigido para aprovação pela Organização Mundial da Saúde e pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa). A demora em divulgar o estudo completo e a frustrante repercussão dos resultados deram a impressão de que o governo do Estado já sabia da baixa eficácia da vacina e represava informações, ou, pior, tentava omitir dados.

Para além de uma vacina que bateu na trave nos critérios da Anvisa, são poucos os países que fazem companhia ao Brasil na escolha da CoronaVac: além da China,  Turquia, Indonésia, Chile e Uruguai apostaram no laboratório Sinovac. No mês passado, a Costa Rica recusou a compra do imunizante chinês sob alegação de que o produto não atingiu os 60% de eficácia mínima exigida pelo Ministério da Saúde local. Por fim, ainda não há notícia de que alguma autoridade científica da comunidade internacional tenha respaldado os estudos do fabricante chinês.

Largada da vacinação no Brasil
Com a autorização do uso emergencial de duas vacinas — a CoronaVac e o imunizante do laboratório anglo-sueco AstraZeneca, em 17 de janeiro, foi dada a largada para a vacinação no país. Pouco mais de cinco meses depois, já foram aplicados mais de 100 milhões de doses de vacinas contra a covid-19. Dos 100 milhões de CoronaVac adquiridos pelo Ministério da Saúde (MS) ao custo unitário de R$ 58,20, 43 milhões já foram aplicados. Valor total da negociação: R$ 5,8 bilhões. Por algumas semanas, a vacina chinesa foi a única opção dos brasileiros, e boa parte dos grupos prioritários recebeu as duas doses do imunizante. Agora, resta saber se quem já gastou sua vez na fila com o produto chinês está realmente imunizado. Como escreveu o jornalista Augusto Nunes, colunista de Oeste, num artigo recente, “ninguém torce tanto pelo sucesso da CoronaVac quanto os que receberam duas doses do maior trunfo eleitoral do governador João Doria.” Só que torcida, em ciência, não funciona. Os fatos são teimosos.

O estudo final sobre a CoronaVac, divulgado em abril deste ano, mostrou que a eficácia da vacina para casos sintomáticos de covid-19 atingiu 50,7%, ante os 50,38% divulgados anteriormente. Os resultados foram enviados à revista científica Lancet para revisão por pares, mas ainda não foram publicados. Entretanto, outra pesquisa realizada pela Vebra Covid-19 (sigla para Vaccine Effectiveness in Brazil against covid-19), grupo que reúne pesquisadores brasileiros e estrangeiros, avaliou o desempenho da vacina em pessoas de 70 anos ou mais vacinadas no Estado de São Paulo. A média de efetividade foi de 42% na totalidade do grupo e de apenas 28% nos idosos acima dos 80 anos. O trabalho envolveu 15,9 mil voluntários e foi o maior já feito nessa faixa etária. Questionado sobre a diferença nos resultados, o Instituto Butantan respondeu a Oeste: “O estudo em questão não fala em eficácia. Com dados secundários, ele mediu a positividade de casos nessa população, sem, no entanto, esclarecer quantos dos infectados evoluem para quadros graves ou óbitos, que é justamente o que a vacina visa a prevenir.”

Independentemente de paixões políticas, o resultado do estudo da Vebra contestado pelo Butantan indica uma realidade que precisa ser encarada pelas autoridades de saúde no país: a CoronaVac tem baixa eficácia e, ao que parece, não tem se mostrado capaz de frear a transmissão da doença.

A realidade em outros países
O dilema de quem confiou em imunizantes chineses não é exclusividade do Brasil. Uma reportagem recente publicada pelo jornal The New York Times mostra que outros países que também compraram vacinas produzidas na China enfrentam novos surtos de contaminação. Na Mongólia, Bahrein, Chile e nas pequenas Ilhas Seychelles, entre 50% e cerca de 70% da população foi totalmente vacinada, ultrapassando inclusive os Estados Unidos, segundo o site Our World in Data. Entretanto, todos eles foram parar na lista dos dez países com os piores surtos de covid-19 registrados na terceira semana de junho, de acordo com levantamento de dados feito pelo jornal norte-americano. Mongólia, Bahrein e Seychelles escolheram majoritariamente a fabricante Sinopharm. Já o Chile aderiu à vacina do laboratório Sinovac Biotech, o mesmo que produz a CoronaVac envasada pelo Butantan.

O caso do país sul-americano é emblemático. Com 54% da população totalmente imunizada e 65% vacinada com a primeira dose (dados do Our World in Data), o Chile segue com medidas rígidas de isolamento. No mês passado, a capital Santiago e outros municípios entraram novamente em lockdown para conter o avanço da contaminação. O confinamento restrito se estendeu até ontem, quinta-feira 1º de julho, quando se iniciou um programa gradual de flexibilização. No Chile, a CoronaVac corresponde a 77% do total das doses aplicadas até agora. Em fevereiro, quando o programa de vacinação começou, foram registrados 515 novos casos por 100 mil habitantes. Em junho, a taxa de novas contaminações atingiu a marca de 922 por 100 mil. A ocupação de leitos de UTI segue acima de 90% no país.

Pessoas ligavam para amigos e parentes para avisar: “É Pfizer, pode vir”

Em nota publicada no site da instituição em 18 de junho, o Butantan nega que o aumento de casos de covid-19 no Chile esteja relacionado à vacinação com a CoronaVac. Segundo Dimas Covas, presidente do instituto, dois relatórios divulgados pelo Ministério da Saúde chileno sobre o desempenho da vacina mostraram alta eficiência. Covas também ressaltou que “os novos casos que têm aparecido no Chile afetam majoritariamente as populações que não receberam a vacina, principalmente os mais jovens”. A nota informa ainda que, apesar do alcance da cobertura vacinal com as duas doses de 50%, “é necessário ter ao menos uma parcela de 70% das pessoas imunizadas para que se tenha um efeito indireto da vacinação”.

No começo, atribuiu-se a culpa ao relaxamento das medidas de proteção, à chegada de novas variantes e ao início do outono. Mas o conjunto de evidências só reforça o fato de que as vacinas chinesas, embora apresentem eficácia na redução de internações e de mortes, não conseguiram reduzir a transmissão do vírus.

A CoronaVac no Brasil
Se os gestores públicos não querem enfrentar o assunto, muitos brasileiros já estão tomando providências por conta própria. Em visita a um posto de saúde na Bela Vista, bairro no centro de São Paulo, no último dia 21 de junho, a reportagem de Oeste conversou com mais de 15 pessoas que aguardavam sua vez na fila para se vacinar com a Pfizer, marca do imunizante oferecido naquele dia. Roberto Andrade, administrador, 56 anos, disse ter ido a três postos de saúde perguntar qual era a vacina disponível. Ao saber tratar-se da AstraZeneca, virou as costas e foi embora. “A CoronaVac também não quero tomar. A taxa de eficácia ficou abaixo das outras duas [Pfizer e AstraZeneca]”, afirmou. “Resolvi esperar para tomar a Pfizer, tenho mais confiança no laboratório.” No fim da fila, por volta das 10h30, Cristian Vieira da Silva, 38, desempregado, disse não se importar de esperar, já que a vacina era a da Pfizer. “Já fui a cinco postos. Não tomo AstraZeneca. Tenho medo porque sou portador de comorbidade. E a CoronaVac é fraca.” Enfileiradas à espera de uma picada, pessoas ligavam para amigos e parentes para avisar: “É Pfizer, pode vir”.

Seis idosos vacinados com duas doses da CoronaVac morreram de covid-19 num asilo em Arapongas

Segundo especialistas, as taxas de eficácia divulgadas pelas desenvolvedoras das vacinas não podem ser comparadas diretamente porque cada estudo tem sua metodologia própria e, principalmente, um período de desenvolvimento do ensaio clínico distinto. Mesmo assim, quem manifesta preferência por determinado imunizante já ganhou o apelido desommelier de vacinas” e, embora a prática seja criticada por atrasar o avanço da vacinação, é bastante comum em vários postos de saúde.

Outra situação frequente nesta fase da pandemia é recorrer a exames sorológicos para saber se o organismo desenvolveu anticorpos contra a covid-19 após duas doses de vacina. “Não existe até agora uma validação de exame contra o Sars-Cov-2 sorológico que possa confirmar que uma pessoa está imunizada”, explica a médica infectologista Patrícia Rady Muller. Entretanto, seja por curiosidade ou recomendação médica, um dos testes mais recorrentes é o de anticorpos neutralizantes, que avalia se houve produção de anticorpos contra a covid-19 no organismo e mostra o porcentual deles com capacidade de neutralizar o vírus. Oeste teve acesso ao exame de anticorpos neutralizantes do oftalmologista Luiz Roberto Colombo Barboza, vacinado com duas doses da CoronaVac. O resultado: reagente 21%. Entre várias observações constantes no laudo laboratorial, uma delas chama atenção: “resultados entre 20% e 30% de inibição são considerados reagentes fracos e devem ser interpretados com cautela”.

“Desde o início, era sabido que a CoronaVac era uma vacina que não tinha grande eficácia, principalmente em idosos”, diz o médico-cirurgião oncológico com pós-doutorado em epidemiologia estatística, Luiz Bevilacqua. “Só que era o que tinha no momento, a gente não pode se arrepender.” Diante da realidade que se impõe, ele defende uma reavaliação no plano de imunização para priorizar a proteção da população de risco com vacinas mais eficazes. Outro fator importante, apontado pela médica infectologista Patrícia Rady Muller, é que a taxa de eficácia de uma vacina interfere em políticas públicas para definir a extensão da cobertura vacinal. “Quanto menor a eficácia, mais pessoas precisamos vacinar para evitar transmissão de uma pessoa a outra.”

Em junho, seis idosos vacinados com duas doses da CoronaVac morreram de covid-19 num asilo em Arapongas, no Paraná, em meio a um surto que atingiu 32 dos 43 residentes do Lar São Vicente de Paulo. Além disso, oito dos 16 funcionários que trabalham na instituição, todos com imunização completa com a vacina chinesa, foram diagnosticados com a covid-19 no mês passado — até o momento, nenhum deles desenvolveu quadro grave da doença. A Revista Oeste questionou o Instituto Butantan a respeito do caso, e obteve, por e-mail, a seguinte resposta: “É prematura e temerária qualquer afirmação sobre hospitalizações ou óbito pela covid-19 de pessoas vacinadas contra a doença, uma vez que cada caso, individualmente, deve passar obrigatoriamente pelo processo de investigação, que não considera apenas a imunização de forma isolada, e sim o conjunto de aspectos clínicos, como comorbidades e outros fatores não relacionados à vacinação”.

De volta ao caso de Serrana, a cidade paulista com 95% dos moradores vacinados com a CoronaVac, os números indicam que o vírus continua se espalhando. “Quem eu conheço, mesmo vacinado, ainda tem medo do vírus”, disse a comerciante Eliana Maria Máximo, dona de uma lanchonete no centro da cidade. A vacinação em massa terminou em 11 de abril. Em maio, registraram-se 333 casos, um aumento de cerca de 42% em relação ao mês anterior (235). Em junho foram 299 casos. O pico de mortes relacionadas à covid-19 ocorreu em março deste ano, quando se verificaram 18 óbitos. Em abril foram oito; em maio, sete; e em junho, seis.

Oeste também solicitou ao Ministério da Saúde informações sobre o número de mortos em razão da covid-19 por faixa etária para cruzar com os dados de pessoas imunizadas com duas doses de vacinas. Em resposta, por e-mail, o MS informou “que ainda é precoce fazer esse tipo de análise e cruzamentos de dados". O pedido foi feito em 19 de abril.

Ao cenário de incertezas, soma-se o fato de que os imunizados com a CoronaVac continuam proibidos de entrar nos Estados Unidos ou cruzar as fronteiras dos principais países da Europa. Isso porque algumas autoridades sanitárias ainda não chancelaram a fabricante Sinovac. A situação não mudou com a inclusão do imunizante chinês na lista dos liberados pela OMS para uso emergencial. Enquanto as principais agências regulatórias do mundo não aprovam o uso da CoronaVac, a vacina segue em aplicação no Brasil com autorização de uso emergencial pela Anvisa. Os imunizantes da AstraZeneca/Oxford e Pfizer já possuem o registro definitivo. O Butantan informou que “está encaminhando as informações ao órgão, dentro do processo de submissão contínua”, mas, segundo a Anvisa, o instituto ainda não fez o requerimento para registro do produto.

Outra questão que intriga é entender por que o Butantan resolveu apostar em outra vacina, a ButanVac, quando já envasa quase 1 milhão de doses da CoronaVac por dia e investiu em nova fábrica para produzir o IFA (insumo farmacêutico ativo) nacional. Por certo, a iniciativa de ter uma vacina desenvolvida no Brasil (sem depender de insumos importados) para ampliar o cardápio vacinal aumenta a segurança. Mas é possível que a pressa em produzir um imunizante em três meses, como prometido pelo Butantan, seja justificada pela preocupação em ter na manga uma alternativa caso a CoronaVac se mostre ineficaz.

A polêmica da terceira dose e a combinação de vacinas
Há meses discute-se a necessidade de uma dose extra da CoronaVac para quem já tomou duas injeções. Alguns fabricantes, como a Pfizer, anunciaram a possibilidade de uma dose anual de reforço. Afinal, é bem provável que a imunização contra a covid-19 repita o esquema vacinal contra a gripe. O que incomoda é a falta de clareza e transparência no caso da CoronaVac. Ainda em abril, o diretor médico de pesquisa clínica do Instituto Butantan, Ricardo Palacios, confirmou que havia estudos sobre uma eventual terceira dose. “Existem grandes preocupações sobre como melhorar a duração da resposta imune, e uma das alternativas que têm sido consideradas é uma dose de reforço, seja com a própria CoronaVac, seja com outros imunizantes." No mês passado, Dimas Covas disse, primeiro, que não havia motivo para preocupação. “A vacina é eficiente e, neste momento, não existe necessidade de se preocupar com uma terceira dose, como foi propalado recentemente.” No dia seguinte, voltou atrás e admitiu que a entidade trabalha com a possibilidade de um reforço vacinal para ser aplicado anualmente em todas as faixas populacionais.

Em entrevista a Oeste no ano passado, quando as vacinas ainda eram uma promessa no meio científico, o médico pediatra e toxicologista Anthony Wong, falecido em janeiro de 2021, explicou que a tecnologia do vírus inativo utilizada na produção da vacina chinesa requer três ou até mesmo quatro doses para produzir efeito. Segundo  Wong, a oferta de apenas duas injeções teria relação com o encurtamento das etapas de estudo da CoronaVac. “Eles não completaram a fase 2”, disse. “Então, não sabem se será necessária ou não uma terceira dose. E garanto que precisa. Não existe uma única vacina de vírus inativo que não exija três doses. A única explicação para oferecer apenas duas doses é a pressa.” O diretor do Centro Chinês para Controle e Prevenção de Doenças (CDC), Gao Fu, chegou a admitir que as vacinas chinesas contra a covid-19 têm baixa eficácia e que o governo chinês estuda misturar diferentes vacinas de modo a aumentar a proteção. Já o diretor do laboratório Sinovac, Ying Weidong, afirmou que uma terceira dose da vacina depois de três ou seis meses poderia multiplicar por dez a resposta de anticorpos em uma semana e por vinte em 15 dias, mas os resultados ainda precisam de mais estudos.

Outros países estão alerta. O governo do Chile avalia a aplicação de uma terceira dose da CoronaVac. Bahrein e os Emirados Árabes Unidos já anunciaram que vão oferecer uma dose de reforço. Na Turquia, a revacinação da população inicia-se em julho. No Brasil, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que o governo federal ainda analisa a necessidade de nova vacinação contra a covid-19 no ano que vem — ou se bastará apenas uma dose de reforço para a população brasileira.

Mais uma possibilidade na mesa é a mistura de imunizantes. Nesta semana, o Rio de Janeiro foi a primeira cidade brasileira a oficialmente autorizar a combinação de vacinas para grávidas. Segundo a prefeitura, gestantes e mulheres que acabaram de ter filhos e tomaram a primeira dose da AstraZeneca estão autorizadas a receber a segunda aplicação da Pfizer. Na Coreia do Sul, a decisão de adotar o “mix” de vacinas deu-se em razão dos atrasos no envio das doses pelo consórcio global Covax Facility. Medidas semelhantes já foram adotadas por países como Dinamarca, Canadá, Finlândia, França, Alemanha, Noruega, Espanha e Suécia.

A vacinação em massa tem se mostrado a melhor saída para emergir da pandemia. Mas, se no início da campanha de imunização a melhor vacina era aquela que chegava logo ao braço, agora os números mostram que a disparidade de resultados em razão do uso de diferentes fórmulas no mundo tem consequências. Enquanto alguns países já deram adeus às máscaras e estão livres de restrições, outras nações, com os mesmos índices de vacinação, amargam medidas de isolamento e enfrentam novos surtos de contaminação. O Brasil dispõe hoje de quatro vacinas em aplicação: AstraZeneca/Oxford, CoronaVac, Pfizer e Janssen — o que minimiza os riscos de depender de um único produto. Mesmo assim, cerca de 34% da população já vacinada recebeu a CoronaVac e quer respostas. Detalhe: esse porcentual é formado em sua maioria por idosos, que têm mais risco de desenvolver formas graves da doença, e por profissionais da saúde, altamente expostos à carga viral.

Essa é mais uma discussão para a ciência. “Na medicina, somos treinados. Se o tratamento B é melhor que o A, tenho que oferecer o B, porque senão corro o risco de fazer um tratamento inadequado”, afirma o médico Luiz Bevilacqua. “Antes não tinha vacina, agora tem. Por que insistir em algo menos eficaz?” Empurrar o problema para a frente só vai arrastar ainda mais os efeitos da pandemia, que já ceifou tantas vidas, sobrecarregou o sistema de saúde e devastou a economia. Se perdermos a capacidade de questionar fatos sob risco de ser tachados de partidários, negacionistas e antivacina, então estaremos todos correndo risco. Não há vacina para a dúvida. Por isso, precisamos falar sobre a CoronaVac.

Com reportagem de Artur Piva

Leia também "Crachá de cobaia"

Revista Oeste 

domingo, 20 de junho de 2021

O iluminado Barroso - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino

Desde quando Barroso declarou que desejava "empurrar a história" rumo à "justiça racial", passei a me referir a ele como "o ungido", que habita a Torre de Marfim onde o sol da Razão ilumina tudo. Barroso é um ativista que quer legislar sem votos, e o motivo disso é sua extrema arrogância como ser racional e do "lado certo" da história.

Em uma entrevista recente sobre as urnas eletrônicas, essa empáfia salta aos olhos mesmo para os menos atentos. E tamanha arrogância vem seguida de uma retórica de humildade, sem que o "iluminado" perceba a incoerência. Barroso lança mão de espantalhos para defender o que não merece muita defesa e para rechaçar como absurda a demanda legítima de mais transparência na auditoria dos votos. Eis um trecho:

"Como presidente do TSE, estou à disposição para receber de qualquer pessoa qualquer elemento de prova de que há fraude em nosso sistema. Meu compromisso não é com um específico modelo de votação, mas com eleições livres e limpas. Portanto, se alguém trouxer qualquer indício de fraude, nós imediatamente apuraremos. Mas a volta do voto impresso, além de todos os inconvenientes, seria inútil, relativamente ao discurso da fraude. O discurso da fraude faz parte da retórica de certos segmentos políticos. É a lógica do “se eu perder houve fraude”. [só o simples fato de ignorar que os cobradores de mais transparência estão entre os que ganharam as eleições, mostra que padece de excesso de empáfia, resultando no seu estilo empafioso  - seus argumentos e sua vontade, por mais frágeis que sejam, devem sempre prevalecer.]

Ora, quem está cobrando mais transparência é quem venceu eleições! O próprio presidente Bolsonaro é um exemplo, a deputada Bia Kicis outro, entre tantos.  
Sobre apresentar a prova da fraude, o ônus da prova deveria ser o contrário: provar que ela não existiu. Mas eis exatamente o ponto: não é possível sequer auditar para valer, como os tucanos descobriram com especialistas em 2014. Os motivos que Barroso apresenta para condenar a mudança são frágeis demais: Em primeiro lugar, em razão do custo de sua implementação. Antes da pandemia e da alta do dólar, nós já falávamos no custo de R$ 2 bilhões para a introdução do voto impresso. Em segundo lugar, pelo risco ao sigilo do voto, motivo que levou o STF a declarar a sua inconstitucionalidade.
Dois bilhões de reais para proteger a democracia parece pechincha, ainda mais diante do custo para manter os luxos do Congresso e do próprio STF
O sigilo do voto não estaria ameaçado, pois como Barroso certamente sabe, ninguém teria acesso ao pedaço de papel impresso em outra urna. Tudo que se deseja é que cada eleitor tenha como verificar que o que apertou na urna foi efetivamente computado, e permitir uma real checagem posterior. O boletim da urna de hoje não faz isso, pois é um saldo total daquela urna, onde já pode ter desvio.
Estamos falando de uma tecnologia que tem 25 anos e que países bem mais avançados, como os Estados Unidos, não adotam. 
Seria por falta de capacidade? 
Mas Barroso não toca nessa questão e repete que temos um dos sistemas mais confiáveis do mundo, o que causaria perplexidade em cidadãos de países tão mais desenvolvidos que rejeitam esse mecanismo. Mas nessa passagem Barroso deixa sua empáfia vir à tona:

"Acredito que a defesa do voto impresso decorre do desconhecimento sobre como o sistema funciona e em razão das campanhas de desinformação. Acho que esses fatores também são determinantes para o movimento anti-vacina. A verdade é que o desenvolvimento das vacinas erradicou ou controlou uma série de doenças, muitas delas fatais. Isso faz com que muitas pessoas, notadamente as mais jovens, nem sequer se deem conta da sua importância. É por essas e outras que gosto de dizer que o país precisa de um choque de Iluminismo. Iluminismo significa razão, ciência, humanismo e progresso."

Ele conseguiu misturar desconfiança com a urna sem impressão com vacinas em geral, ignorando que a crítica de muitos era sobre o processo acelerado de desenvolvimento dessas vacinas em particular contra o Covid. Barroso deve se achar muito mais iluminado do que jornalistas como Guilherme Fiuza, que tem feito perguntas incômodas - e sem respostas. Veja o caso que Leonardo Coutinho, outro jornalista sério, trouxe:  "Em maio, o governo da Indonésia e a Sinovac, fabricante da Coronavac, anunciaram que sua vacina era 98% eficaz para prevenção de mortes e 96% para hospitalizações de entre profissionais de saúde. Apenas um mês depois, a realidade que se apresenta é outra".

Mais de 350 médicos e profissionais de saúde contraíram COVID-19 na Indonésia, apesar de terem sido vacinados com Sinovac, e dezenas foram hospitalizados. O Butantan não disse que era 100% de proteção? Queremos respostas, não lacres! No entanto, lacrar é tudo que o Butantan tem feito, pelo visto, como podemos observar:

A politização do Butantan na atual gestão é lamentável. Em vez de chamar de Fake News, que tal explicar? 
Como o Butantan explica o aumento de casos no Chile, justo o país que mais vacinou na região, e com a Coronavac? 
Ciência se faz com perguntas, mas Barroso e o Butantan devem se julgar iluminados demais para dar respostas. 
Não obstante, Barroso se considera muito humilde:"Eu cumpro a missão da minha vida, em defesa da democracia, da justiça, do bem e da verdade possível. Nem crítica nem elogio me desviam desse caminho. A vida me deu muitas oportunidades e procuro desfrutá-las sem arrogância, com compreensão pelas dificuldades alheias."

Se ele não fala ninguém saberia. Afinal, o que menos observamos em Barroso é humildade. Basta ver como ele justifica seu evidente ativismo judicial: "São poucas as decisões que eu considero ativistas: uniões homoafetivas, aborto de feto anencefálico e criminalização da homofobia. Todas essas decisões atuam em defesa de minorias e eu as qualifico de iluministas". Ou seja, se ele as considera "iluministas", então para o inferno com a Constituição, da qual ele deveria ser o guardião! É aquele tal "empurrão na história"...

Talvez o ápice do iluminismo de Barroso tenha sido quando elogiou o médium João de Deus, encalacrado com a Justiça hoje, chamando de "transcendente" seus dons;

   Ou talvez seu momento de maior grandeza iluminista tenha sido quando "debateu" sobre política com o imitador de focas, mais raso do que um pires convexo:  Para quem está fora da bolha, tudo que se espera de Barroso é que ele siga a Constituição do país, sua missão no STF, e acate a mudança das urnas se passar como PEC.  
Barroso, porém, considera seu papel muito maior do que isso, que seria pequeno demais para um ser tão iluminado como ele. 
Barroso, o ungido, pretende criar as leis, empurrar a história, trazer a luz para o povo ignorante. E é justamente aí que mora o perigo...
 
Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 

sábado, 6 de fevereiro de 2021

China aprova uso geral da CoronaVac no país

Com a autorização, o imunizante poderá ser aplicado em toda a população chinesa, não apenas nos grupos prioritários

 As autoridades sanitárias da China aprovaram neste sábado, 6, o uso geral da vacina CoronaVac no país. O imunizante contra a Covid-19 produzido pelo laboratório Sinovac já tinha sido autorizado de forma emergencial em julho. A vacina é a segunda que recebe o aval para uso geral na China, depois da autorização concedida ao antígeno da farmacêutica Sinopharm no fim de dezembro.
[Sabedoria milenar chinesa: primeiro testa nos brasileiros e em outros países de espertos - após aplicação de alguns milhões de doses, sem notícias de intercorrência grave, libera para uso na China.]

Com o uso geral aprovado, a CoronaVac poderá ser aplicada em toda a população do país, não apenas nos grupos prioritários. A CoronaVac é uma das duas vacinas utilizadas atualmente no Brasil. A outra é a de Oxford-AstraZeneca. Ambas foram aprovadas no fim de janeiro pela Anvisa para uso emergencial. No Brasil, a CoronaVac é fabricada em parceria com o Instituto Butantan.

O imunizante da Sinovac também é utilizado emergencialmente na Turquia, Indonésia e Chile. Nos ensaios no Brasil, a vacina teve eficácia geral de 50,38% e de 78% para casos leves. A Sinovac ainda não divulgou os resultados finais dos testes com o imunizante no mundo.

Saúde - VEJA Online


sábado, 16 de janeiro de 2021

Covid-19 - Vejam só a má sorte, ou falta de previsibilidade, de Manaus - Alexandre Garcia

Gazeta do Povo - Vozes

No início da pandemia não era possível examinar a coleta de testes de Covid-19, era preciso enviar as amostras para Brasília ou São Paulo para obter os resultados. Isso demorava em torno de três a quatro dias, o suficiente para a pessoa ter complicações pulmonares causadas pelo vírus. Essa doença precisa ser tratada o mais rápido possível. A espera pode levar as pessoas à UTI ou até a morte, e foi o que aconteceu.

 Vista da área reservada para víticas da Covid-19 no cemitério de Nossa Senhora Aparecida, em Manaus, no dia 5 de janeiro de 2021

Vista da área reservada para vítimas da Covid-19 no cemitério de Nossa Senhora Aparecida, em Manaus, no dia 5 de janeiro de 2021| Foto: MICHAEL DANTAS /AFP

Olha a má sorte, ou falta de previsibilidade, em Manaus. Está faltando oxigênio nos hospitais da cidade.


Esse foi um dos maiores problemas no início da pandemia, resolveram a situação e agora é possível processar os testes no município. Agora, eles têm mais um problema, a falta de oxigênio.

Veja Também:
A candidatura de Simone Tebet ao Senado está bombando

Lewandowski está atrapalhando
O ministro Lewandowski continua sobrecarregando pessoas que já estão ocupadas com a pandemia. Ele determinou um prazo de cinco dias para que os estados informem qual o estoque de seringas e agulhas. Parece uma tentativa de atrapalhar o trabalho.
 
A Anvisa precisa de todas as informações antes de liberar a vacina
A Anvisa alertou a Fiocruz e ao Instituto Butantan que ainda há informações faltando para que a aprovação emergencial das vacinas da AstraZeneca e da Sinovac sejam processadas. O objetivo é que a decisão do órgão regulamentador seja divulgada no domingo (17), prazo que pode não ser cumprido caso essas informações pendentes não sejam enviadas a tempo.

A Associação Médica Brasileira apelou a população pedindo que as pessoas confiem na vacina. Me chamou atenção que a AMB não tenha citado a cloroquina, ivermectina, etc, como uma alternativa para tratar casos de Covid-19. Quando as pessoas vão ao hospital infectadas pelo coronavírus, eu acho que os médicos deveriam perguntar se a pessoa fez uso do tratamento precoce. Isso daria informações preciosas sobre o resultado do uso desses medicamentos.

Obras recuperadas pela Lava Jato estão em museu
Aquelas cem obras apreendidas na Operação Vernissage, na 79ª fase da Lava Jato, foram enviadas para o museu curitibano Oscar Niemeyer (MON). Diversas obras são de pintores brasileiros. Todos serão periciados para autenticar a veracidade. Certamente eles são autênticos, não teria sentido lavar dinheiro com obras de arte falsas.

Esses cem quadros estão se somando aos outros 230 quadros apreendidos na Lava Jato que foram doados ao MON. Em breve, essa será uma grande atração em Curitiba por lembrar de um período da história brasileira em que as pessoas usaram o poder e a política para roubar o povo.
 
Alexandre Garcia, jornalista - Gazeta do Povo - Vozes
 

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Lição de Brasil - Alon Feuerwerker

Análise Política

De vez em quando é preciso ser otimista. E hoje é um dia assim. Depois da espera, não um, mas dois registros de vacinas contra a Covid-19 foram pedidos à Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa. Da CoronaVac, parceria entre a chinesa Sinovac e o Butantan, e da AstraZeneca/Oxford, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, a Fiocruz. A primeira é a aposta do governo de São Paulo (João Doria).[o pedido da primeira já começou a apresentar defeitos - os que tem sido a regra desde os primeiros passos = documentação incompleta.] A segunda é a aposta principal do governo federal (Jair Bolsonaro).

Está instalada a competição, começou a corrida. Em disputa, não apenas os imunizantes, mas a estrutura e os instrumentos, principalmente as seringas. Quem vai ganhar ao final? Quem mais eficazmente realizar a missão nos próximos meses. E a vacina que se provar mais efetiva no essencial: imunizar a população contra o SARS-CoV-2, inclusive suas novas variantes. Restam dúvidas? Que sejam esclarecidas pela Anvisa, perfeitamente equipada para tanto.

O episódio é mais uma lição de Brasil. Sobre nosso país, nunca convém otimismo excessivo sobre as possibilidades, mas tampouco é conveniente ceder ao catastrofismo. É o caso agora. A Covid-19 não vai desaparecer num passe de mágica por aqui, mas não seria sensato supor que ficaríamos para trás enquanto o mundo todo já estivesse se vacinando em massa.

 Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

 


sábado, 9 de janeiro de 2021

Vacina para ontem – Folha de S. Paulo

Opinião

Após 200 mil mortos, Anvisa tem teste de fogo com licença para a Coronavac

O pedido de licença emergencial para a vacina Coronavac representa um teste de fogo para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Qualquer delonga manchará gravemente a reputação técnica da Anvisa enquanto durar a administração de Jair Bolsonaro —cuja irresponsabilidade contribuiu para que o país alcançasse na quinta-feira (7) a marca tenebrosa de 200 mil mortos pela Covid-19. Por mais que a cautela mande tomar com um grão de sal a divulgação de resultados científicos em entrevista coletiva, sem o crivo de especialistas não envolvidos, não há como deixar de regozijar-se com uma vacina capaz de impedir o desenvolvimento preocupante da doença em 78% dos inoculados.

[a cada dia que passa, mais inteligentes ficamos; 
agora estamos até adivinhando: - já tínhamos a certeza de que a vacina chinesa for barrada pela Anvisa - por razões técnicas - atribuirão a 'pretextos burocráticos', que buscam atender interesses políticos do presidente Bolsonaro, a motivação do atraso - esquecerão que a vacina chinesa tem se destacado por adiamentos, não apresentação de resultados, etc.
Destacamos dois pontos: 
- a competência técnica e isenção da Anvisa precisam ser respeitadas, acatadas e cumpridas  - ainda que implique na negativa de registro/autorização  para a Coronovac, a Astra Zenêca ou qualquer outro imunizante;
- considerando que o Pretório Excelso é formado por onze possuidores de notório saber jurídico, não tem sentido que interfira em um processo que precisa de notório saber científico medicinal, que nenhum dos ONZE possui.]

O Instituto Butantan e o governo paulista merecem cumprimentos por tornar o produto disponível [??? mesmo estando sob exame da Anvisa? Sem ser aprovada/autorizada o medicamento não existe.] em apenas oito meses de trabalho. Seu próximo passo deve ser a publicação de dados detalhados para escrutínio de cientistas.

Não se desconhece que o governador João Doria (PSDB) recorre à façanha do Butantan para projetar-se na cena nacional. Seria estranho se não o fizesse, embora se exijam cuidados no trato de questão tão crucial para a saúde pública. Sua administração apoiou de modo decidido o teste clínico com 12.476 profissionais de saúde em oito estados que atestou a eficácia do imunizante da Sinovac, do qual já se encontram em São Paulo 10,9 milhões de doses.

Deplorável tem sido a conduta de seu adversário político, o presidente Jair Bolsonaro, que só há poucos dias se curvou ao imperativo da vacinação. Seu errático ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, correu à TV para tentar desfazer a imagem de incompetência que angariou em quase oito meses de omissão diante do negacionismo sanitário do chefe.

A dupla inepta agora se atabalhoa na busca desesperada para importar da Índia 2 milhões de doses da vacina AstraZeneca/Oxford, para a qual a Anvisa recebeu pedido de autorização nesta sexta (8). Na falta do produto, Pazuello finalmente anunciou contrato para sua pasta adquirir 100 milhões de doses da Coronavac —aquela que o presidente jurou jamais comprar.

Importa verificar se, nos próximos dias, a Anvisa cederá aos interesses políticos do presidente, atrasando a vacina do Butantan sob pretextos burocráticos. Nem ela nem o Ministério da Saúde cometerão a indecência, espera-se, de impedir o governo paulista de exercer o direito — já confirmado pelo Supremo Tribunal Federal— de deslanchar seu próprio programa de imunização.

Opinião - Folha de S.Paulo

 

quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

CoronaVac tem 78% de eficácia em pesquisa no Brasil

Butantan já havia comprovado a segurança do imunizante

O tão aguardado anúncio final da CoronaVac enfim foi revelado. A vacina, que é produzida pela fabricante chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, apresentou 78% de eficácia nos testes feitos em mais de 13.000 pessoas no Brasil. A informação foi confirmada pelo governo de São Paulo.

Com esse dado, o Instituto Butantan já pode pedir o registro emergencial da vacina à Anvisa, o que deve ocorrer ainda nesta quinta-feira, dia 07.  A agência havia informado que, para uma vacina ser aprovada, ela precisaria ter pelo menos 50% de eficácia. Antes, o Instituto já comprovara que a vacina é segura – ou seja, que não provocou nenhum efeito adverso entre os voluntários.

[A Anvisa, por imposição legal, fará todas verificações cabíveis e possíveis para garantir que a CoronaVac  seja segura no uso e eficaz na imunização.

O aval do Instituto Butantan - instituição centenária e que goza da confiança de milhões de brasileiros - tem sua importância, mas todo o processo precisa ser devidamente examinado. 

Informações do governo de São Paulo, da Turquia e Indonésia, não devem ser consideradas na decisão da Anvisa. Lembrete: até o presente momento,  não foi solicitado o registro emergencial.]

O porcentual de 78% vale para os casos leves da doença. Casos graves e moderados foram 100% evitados pelo imunizante, conforme informações do governo de São Paulo que serão melhor detalhadas em anúncio no Instituto Butantan.

Os dados foram compilados na Europa pelo Comitê Internacional Independente que monitora desde o início os estudos e repassados ao Butantan. O anúncio ocorre depois de dois adiamentos por parte do governo de São Paulo. O último ocorreu a pedido do laboratório chinês que queria uniformizar os dados da vacina entre os países que participam dos testes, entre eles Indonésia e Turquia.

VEJA - Brasil


 

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

História de sucessos – e de fracassos também – das vacinas chinesas - Blog Mundialista

Com avanços espetaculares no campo de novos produtos médicos e farmacêuticos, a China ainda enfrenta problemas do passado em matéria de imunizantes

“A história de propinas provocou preocupações entre investidores”. Com esta frase, o Washington Post resumiu a parte indesejada do currículo da Sinovac, a arrojada empresa que está à frente da vacina chinesa dirigida a países de desenvolvimento médio como Brasil, Turquia e Indonésia.

O passado ficou maior diante da projeção mundial que a CoronaVac – o melhor nome entre todas as vacinas para o novo vírus –  ganhou. A ascensão da Sinovac, criada por Yin Weidong, seu presidente e CEO, aconteceu “com a ajuda de projetos prioritários de Pequim e subornos a funcionários envolvidos na área de vigilância sanitária e de aprovação dos acordos de venda”, diz a reportagem do Washington Post.

A empresa cooperou com a investigação. Yin Weidong disse em seu depoimento à Justiça que “não podia recusar pedidos de dinheiro feitos por um funcionário da área de vigilância”. O funcionário que recebeu as propinas para apressar as certificações entre 2002 e 2011 foi condenado a dez anos de prisão.

Obviamente, não foi um caso único. “Pelo menos 20 funcionários do governo e administradores hospitalares de cinco províncias admitiram na Justiça terem recebido propinas da Sinovac entre 2008 e 2016”.

Blog Mundialista - Vilma Gryzinski -  VEJA


 

 

 

domingo, 27 de dezembro de 2020

Na guerra da vacina, Doria injetou veneno de descrédito na testa - Folha de S. Paulo

Vinicius Torres Freire 

Governador exagerou no show e ameaça programa de imunização

Ao fim da guerra da vacina, João Doria poderia parecer um líder mais nacional e um contraponto da razão a Jair Bolsonaro. O governador paulista decerto fez o bom serviço de cutucar a inoperância federal. Mas, depois dos vexames recentes, Doria pode parecer apenas um destrambelhado provinciano. Pior, lançou desconfiança sobre a própria vacina que comprou, grave em termos sanitários e econômicos.

Por duas vezes, o governo de São Paulo adiou a publicação da eficácia da Coronavac. Na quarta-feira (23), o país foi induzido a esperar boas notícias. Em vez disso, ouviu uma conversa palerma de que os dados precisariam ser antes mastigados pela Sinovac, por uma obrigação contratual, e de que a eficácia da vacina era diferente daquela verificada em outros países, no limite de apenas 50%.

Descobriu-se que Doria estava em Miami, o que pareceu fuga do fiasco. Para piorar, soube-se na sexta (25) que a Turquia não teria “obrigação contratual”, pois divulgou, de modo mambembe, que a Coronavac seria eficaz em 91,25% dos casos. O governo Doria suscitou desconfiança sobre os números que virão sobre a vacina, já objeto de propaganda negativa criminosa de Bolsonaro.

Quanto menos confiança, menos gente tende a aderir ao programa de vacinação. Quanto menos vacinados, menor a possibilidade de a vacina evitar mortes, aliviar hospitais e atenuar as restrições obrigatórias ou autoimpostas de contato social, o que tem óbvio impacto econômico também. Mesmo com uma vacina eficaz em 85% dos casos, a campanha contra a Covid teria de atingir adesão do nível de vacinações contra a gripe (uns 95%) para propiciar um alívio notável apenas a partir lá de maio. A vida, porém, ainda teria restrições sérias, em especial para negócios e empregos que dependem de aglomerações e circulação livre pelas cidades.

Na reunião dos governadores com o capacho do ministério da Saúde, dia 8, Doria já trocara as mãos pelos pés. Em vez de vencedor generoso e agregador, pareceu um “mauricinho metido e exibido”, como disse a este jornalista um governador ainda simpático ao colega paulista. Depois, houve duas negaças dos resultados da vacina. Doria blefava, com confiança temerária?

No mundo político, ficou a impressão de que Doria não sabia bem o que estava fazendo, o que sublinhou sua imagem de pouco confiável, um tipo obstinado que faz qualquer negócio, de atropelar aliados a apoiar Bolsonaro em um dia para sair de fininho pouco depois.[Doria foi eleito graças ao apoio do presidente Bolsonaro - pela dependência ao Bolsonaro passou a ser chamado de 'bolsodoria' - apoio que agradeceu traindo o capitão = algo parecido com a  conduta daquele ex-juiz, que pensou ter luz própria, passou a fazer oposição ao presidente e se acabou politicamente.
Doria caminha para o mesmo fim].

O governo paulista poderia simplesmente apresentar a situação tal como ela é, dando publicidade e explicações racionais para a atos e processos, o que seria um contraponto confiável ao desvario bolsonarista. Tem gente para fazê-lo. Doria nomeia muitos bons quadros para seus governos. Não se trata de ser “transparente”. Apenas na fantasia juvenil ou anarquista um governo pode ser um BBB ao vivo. É política, administrativa e tecnicamente inviável. Mas, claro, em qualquer tempo e lugar, gente com poder sonega informação do público, o que é autoritário.

A fim de recuperar terreno, Doria terá de abafar seu caráter espetaculoso, parar com segredinhos, com vazamentos de notinhas publicitárias e mostrar que pode ser alternativa de racionalidade mínima à pura monstruosidade bolsonarista. Já tem um passivo grande, até pelo Bolsodoria de 2018, relembrado nestes dias de vexame. Terá de contar com sorte também, que a vacina seja eficaz em nível relevante, uns 75% ao menos, e fazer a mais bem-sucedida campanha de vacinação da história. [antes ele vai precisar de sorte, e muita, para que os resultados da FASE 3 de testes da Coronavac apareçam e sejam entregues à Anvisa,para que possa se cogitar de autorização = a da Turquia não vale e a da China não inspira confiança.]

Vinicius Torres Freire, jornalista - Folha de S. Paulo


domingo, 13 de dezembro de 2020

Guerra grosseira - J. R. Guzzo [apesar de todos os esforços, continua sendo necessário a existência física da vacina para efetiva vacinação]

O Estado de S. Paulo

Vacina contra a covid deveria ser um tema de concórdia, mas no Brasil é o oposto

A aplicação da vacina contra a covid-19 tornou-se um escândalo no Brasil. É inevitável. Há dez meses a tragédia do vírus tem sido objeto de uma deslavada, ininterrupta e maciça campanha de exploração política por parte de governantes obcecados pelas vantagens materiais que podem tirar da desgraça comum. Não são apenas os homens públicos. É também o sistema de interesses que vive em torno deles – e todo o bloco de militantes e de bem intencionados que, como de costume, se aproveita ou se deixa conduzir pelos ruídos que combinam melhor com os seus desejos e com aquilo que imaginam ser as suas ideias.

A vacinação contra a covid, obviamente, deveria ser um tema de concórdia, de harmonia e de cooperação entre todos os que têm alguma responsabilidade em relação às questões mais elementares da saúde pública. No Brasil, até este momento, tem ocorrido exatamente o oposto – o que deveria ser um alívio virou uma guerra. A rixa se resume, para encurtar essa conversa, à “vacina federal” e a “vacina do Doria”. Uma e outra são boas, ou ruins, dependendo de que lado o sujeito está: quem está a favor do presidente Jair Bolsonaro é a favor da primeira vacina e contra a segunda: quem está contra o presidente acha precisamente o contrário. [um esclarecimento: somos antes de tudo a favor de que a população do planta Terra, se possível dando prioridade aos mais de 210.000.000 de brasileiros, tenha acesso imediato a uma vacina segura no uso e eficaz na imunização - as duas características comprovadas pela Anvisa ou por órgão de renome e credibilidade igual ou superior ao FDA.     

A coronovac temos que colocar em último lugar não por ser chinesa e sim por não ter sido autorizada em nenhum país - eventual autorização conferida por um órgão do governo chinês, estabelecido em solo chinês, não conta - estar ainda na FASE 3 de testes.]

A “vacina federal”, até agora, pode ser qualquer uma, menos “a do Doria”. A vacina do governador de São Paulo também pode  ser qualquer uma, desde que seja a chinesa – a “coronavac”, fruto de um acordo entre ele, via Instituto Butantan, e o laboratório Sinovac, da China. A partir daí, está valendo tudo. Que os departamentos de marketing pessoal do presidente e do governador tenham uma briga de foice em torno da covid não é novidade para ninguém. Mas também é fato que qualquer medicamento, pela lei, só pode ser aplicado no Brasil se for aprovado pela Anvisa e o governo federal exige que a “coronavac”, ou qualquer outra vacina, receba essa licença para ser utilizada. Não há, realmente, divergências sérias sobre a necessidade legal e científica da autorização da Anvisa. O problema é que ela não licenciou até agora nenhuma das três vacinas que solicitaram a homologação a americana da Pfizer, a britânica da AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, e a chinesa da Sinovac.   [atualizando: ocorreu uma interpretação equivocada dos dados da Fase 3 da vacina da AstraZeneca/Oxford, que gerou um pequeno atraso; 
- a vacina da Pfizer foi aprovada pelo FDA - o que, conforme a legislação vigente, dispensa sua aprovação imediata pela Anvisa - mas para que a utilização emergencial seja autorizada,  é necessário que Pfizer requeira à Anvisa - juntando, por óbvio, o laudo do FDA;                                            - - a vacina chinesa é que além de não ter concluída a FASE 3, não teve seu uso emergencial autorizado pelo FDA ou qualquer um dos órgãos autorizados pelo governo brasileiro - LEI Nº 14.006, DE 28 DE MAIO DE 2020, art. 3º, alínea a, inciso VIII:

"Art. 3º  ...........................................................................................................................

.................................................................................................................................................

VIII – autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, desde que:

a)  registrados por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países:

1.  Food and Drug Administration (FDA);

2.  European Medicines Agency (EMA);

3.  Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA);

4.  National Medical Products Administration (NMPA);"]

Não é uma atitude isolada. A mais bem reputada das agências de controle de remédios em todo o mundo, a FDA americana, só autorizou até agora a utilização de um imunizante: na sexta-feira, o órgão permitiu o uso emergencial da vacina desenvolvida pela Pfizer – ou seja, temporário, gratuito e sujeito a ser cancelado a qualquer momento.

 Governo entrega plano de vacinação ao STF sem prever data para começar a imunizar

[A leitura da matéria linkada, acima,  é conveniente. Entre outras informações deixa claro que apesar do plano cobrado pela oposição,  ter sido entregue para o sábio escrutínio do ministro Lewandowski, ainda não resolve o impasse: qualquer plano  de vacinação exige a disponibilidade física da vacina. O governo não tem  condições de prever data, por desconhecer quando a vacina estará disponível fisicamente no Brasil.]
O único país que começou a vacinação em massa, a Inglaterra, está utilizando a vacina da Pfizer, que foi licenciada pela agência de controle britânica. O certo é que a vacina chinesa, fora a própria China e o governador Doria, não interessou a mais ninguém no planeta. 
Não recebeu a homologação de nenhum país com um mínimo de tradição em saúde pública. 
Seu desenvolvimento não foi acompanhado por qualquer organismo científico independente. É, certo, enfim, que a Sinovac já confessou em juízo a prática de crimes de corrupção e que suas ações foram excluídas em 2019 da Bolsa de Nova York.
O governador, apoiado pela oposição, a esquerda e os inimigos de Bolsonaro, já começou a envasar a vacina chinesa, e quer que ela seja aplicada sem a aprovação da Anvisa
Bastaria, para tal, que fosse liberada pelas agências de controle dos Estados Unidos, da Europa, do Japão, que até agora não homologaram vacina nenhuma – e, é claro, da China, a única que aceita a “vacina do Doria”. Como se vê, é guerra, e guerra grosseira.

J. R. Guzzo, jornalista  - O Estado de S. Paulo