Imposto
sobre movimentação financeira não é regra, mas exceção ao redor do planeta,
porque distorce a atividade produtiva. E faria o país
andar para trás
Para eliminar imprevidentes subsídios bilionários que vinham sendo
bancados pelo Tesouro, as tarifas de energia
elétrica subiram mais de 50%. Embora discutível, o Congresso acabou
aprovando novos percentuais para recolhimento da contribuição patronal à
previdência social incidente sobre o faturamento, que representa desoneração
tributária, mas também gera obrigações para o Tesouro.
Nivelamento
de juros, mudanças de regras para o seguro-desemprego e o abono salarial,
redução de benefícios na previdência, aumento da alíquota de IOF sobre certas
operações financeiras etc. São iniciativas que podem não ter apoio
unânime, mas que foram entendidas pela sociedade diante da urgência do
ajuste fiscal.
O que não faz o menor sentido,
sob qualquer prisma, é que a recriação da CPMF esteja
sendo cogitada pelo governo para recompor as finanças públicas em 2016. A equipe econômica corre o risco de jogar
por terra a credibilidade, até aqui quase um oásis dentro de um governo que
reluta em executar o óbvio, como reduzir o tamanho da
máquina burocrática formada por 39 diferentes ministérios, aos quais estão atrelados cerca de 22 mil cargos de confiança. Anunciou, mas nada anda com
rapidez. E os cortes estão a léguas da necessidade.
A CPMF é mais que uma aberração. Trata-se de uma estupidez econômica. De fácil arrecadação (pois esse papel é exercido pelos próprios bancos, que automaticamente
retêm o percentual do tributo sobre qualquer movimentação financeira), esse
tipo de imposto é uma exceção e não a regra ao redor do planeta. E por que
então não se recorre usualmente a esse “ovo
de Colombo”?
A explicação é só uma: a tributação linear
sobre qualquer movimentação financeira, por mais baixa que seja, distorce completamente a
atividade produtiva. Quanto mais
complexa a economia, pior, pois aquele percentual ínfimo, aparentemente
insignificante, terá um impacto de alguns pontos percentuais nos preços dos
produtos. Resultado: perda de competitividade da produção nacional e inflação. Um tiro certeiro no pé.
A
recriação da CPMF seria uma estupidez depois de o país ter feito um enorme
esforço de “bancarização” nos últimos anos. Há 400 milhões de cartões de crédito e
débito ativos hoje no país. Pelo menos, metade da população tem acesso
direto a bancos. E a tendência é que as transações financeiras por via
eletrônica sejam predominantes, proporcionando mais agilidade e redução de
custos para todos.
Um tributo sobre movimentação
financeira faria o país andar para trás. Ou seja, haveria uma “desbancarização”. As riquezas circulariam mais devagar. E o pior: o aumento de arrecadação no
primeiro momento causaria a ilusão de que está tudo bem com as finanças
públicas. Para quebrar resistências políticas à recriação do tributo, o governo
federal se proporia a dividir a receita com estados e municípios. Puro oportunismo.
Fonte: Editorial – O Globo