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quinta-feira, 5 de maio de 2016

Tem jeito

    Para voltar a crescer de maneira sustentada, ou seja, por vários anos seguidos, o Brasil não escapa de uma série de reformas estruturais. Pois esse é o problema, dizem. A cultura política brasileira não favorece esse tipo de reformas, ao contrário, bloqueia. 

Isso é verdade em muitos momentos, mas a sociedade brasileira já passou por mudanças intensas, todas votadas e aprovadas no Congresso Nacional. E muitas das chamadas impopulares. Nos dois governos FHC (1995/2002), essa mudança foi vertiginosa. A gente nem acredita quando se faz a lista.

Eis aqui:

  • Lei e instituto da Responsabilidade Fiscal, com superávit primário
  • Metas de inflação com BC autônomo na prática
  • Câmbio flutuante
  • Solução da dívida dos Estados e Municípios, que passam a ter orçamentos equilibrados
  • Quebra do monopólio da Petrobras e lei das concessões de exploração de petróleo
  • Fator previdenciário
  • Lei da suspensão temporária do contrato de trabalho
  • Reforma administrativa (agências reguladoras e profissionalização na gestão de estatais)
  • Programa de saneamento do sistema financeiro privado
  • Capitalização e profissionalização da gestão do BB e Caixa
  • Fechamento e privatização de bancos estaduais
  • Privatizações (mineração, siderurgia, transportes, energia elétrica, telecom)
Reparem, são reformas que atingem todos os setores sensíveis: previdência, legislação trabalhista, funcionalismo público e privatizações. No nível macro, foi renegociada e pacificada a dívida externa.  Houve ainda mudanças microeconômicas, como a criação do mercado atacadista de energia e a criação do sistema tributário Simples para pequenas e médias empresas. Também começaram os programas sociais, como o Bolsa Escola. Isso criou as bases da estabilidade que Lula manteve em seu primeiro mandato e a elas acrescentou um extenso programa de melhoria no ambiente de negócios, pró-mercado. Tudo tocado por uma equipe econômica ortodoxa.
        
Eis as principais:

  • Conta corrente e poupança simplificadas
  • Crédito consignado
  • Alienação fiduciária para imóveis e patrimônio de afetação para empresas, regras que turbinaram o crédito imobiliário
  • Contribuição previdenciária para funcionários aposentados
  • Nova lei de falências
  • Portabilidade do crédito
  • Super-simples
  • Lei das SAs
Foi longe e, de novo, em pontos considerados sensíveis. Toda essa construçãoque, com a ajuda da China,  permitiu os anos dourados de crescimento com inflação perto da meta - começou a ser demolida a partir do segundo mandato de Lula. Foi quando o ex-presidente, sentindo-se seguro, resolveu fazer do “jeito do PT”.  Dilma foi meticulosa nesse desmonte, a tal ponto que hoje é preciso fazer tudo de novo: restabelecer a responsabilidade fiscal; sanear os bancos públicos; reformas previdenciária e trabalhista; desaparelhar a administração pública e as estatais;  recuperar a credibilidade do Banco Central; voltar a privatizar; salvar as estatais, quebradas de novo; destravar o ambiente de negócios.

Ainda assim, a situação hoje é melhor do que a verificada logo após o impeachment de Collor. Verdade que a recessão atual é mais profunda e mais longa, mas a economia é maior, mais diversificada e, pois, com boa capacidade de recuperação. A inflação, embora ainda alta, é um problema muito menor. As contas externas voltam ao equilíbrio. Reparem aqui: em 1993, o Brasil exportou menos de US$ 40 bilhões. No ano passado, mesmo com a queda de preços das commodities, foram US$ 200 bilhões. Já batemos US$ 250 bilhões (2011). Ou seja, a capacidade de recuperação via comércio externo é superior.

E, finalmente, no pós-Collor não tínhamos moeda
. Hoje, o Real está meio atacado, mas sobrevive, assim como os instrumentos de gestão econômica. Foram esquecidos, quebrados, mas estão aí.   Na política, muita gente pergunta quem seria o FHC de Temer. Na verdade, não precisa. A tarefa hoje é restabelecer a confiança e retomar políticas econômicas conhecidas, o que é mais simples do que criar uma nova moeda e todas suas bases. Antes de FHC, Itamar teve três ministros da Fazenda em menos de um ano. Hoje, Henrique Meirelles assume o comando em condições melhores.

Resumo da ópera: não é verdade que as reformas são impossíveis. O Brasil tem jeito.

Mas vai dar trabalho. E depende de Michel Temer conquistar credibilidade para encaminhar as reformas e um governo mais eficiente. Não vai conseguir isso com um governo parecido com o de Dilma e vulnerável à Lava Jato.
 

Fonte: Carlos Alberto Sardenberg


 

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