Ação no TSE é sobre a força do dinheiro
na vitória de Dilma e Temer na eleição de 2014. Numa época de desencanto com a
política, a Justiça também estará em julgamento
Começa
hoje, às 9h, em Brasília, um julgamento sobre o modo como se faz política e
justiça no Brasil. Aberto ao público, será um acontecimento ímpar, porque
vai permitir aos governados entender, avaliar e tirar conclusões sobre o
funcionamento das instituições.
O
processo é sobre a arquitetura e o poder do dinheiro na vitória da chapa Dilma
Rousseff-Michel Temer durante a disputa presidencial de 2014. Numa época de
desencanto com a política, a análise do comportamento
de governo, partidos e empresas vai incluir, também, a apreciação da qualidade
de atuação da cúpula do Judiciário. Agora, a Justiça também estará em
julgamento.
Pelo rito
do Tribunal Superior Eleitoral, a abertura será feita pelo juiz Herman Benjamin
com um resumo da investigação. A exumação das finanças eleitorais do PT-PMDB
deve durar quatro dias. O juiz-relator deve apresentar seu voto — determinar a existência ou não de crime de abuso de poder,
uso de dinheiro de origem ilícita e influência no resultado das urnas,
com prejuízo irreparável ao sistema político. As provas coletadas em dois
anos e três meses de inquérito demonstram ser falsa a declaração apresentada
pela chapa Dilma-Temer ao TSE com um gasto de R$ 420 milhões, em valores
atuais. Sobram evidências de que, no mínimo, a reeleição custou 25% mais.
Na
contabilidade oficial, a
vitória de Dilma-Temer foi obtida com uma despesa de R$
7,7 por cada voto (foram 54,5 milhões de votos no segundo turno). A
investigação do TSE mostra que o custo desse triunfo foi bem maior, de R$ 9,6 por cada voto recebido. A diferença
(R$ 1,9 por voto) foi paga de forma ilegal por um único grupo privado,
Odebrecht, com entregas de dinheiro vivo no Brasil e transferências bancárias
no exterior. Odebrecht afirma que 44,6% desse fluxo de capital para a
chapa Dilma-Temer tiveram origem na compra de uma
Medida Provisória (nº 470, conhecida como Refis da Crise) no fim do governo Lula.
“Foi uma contrapartida
específica”, confessou em juízo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da
empreiteira. Ele relatou pagamento de R$ 50 milhões para garantir
privilégios e isenções tributárias às suas empresas no Refis da Crise: “A
gente conseguiu algo que era pelo menos razoável para a gente.”
Odebrecht
não foi o único a encher o cofre da campanha de 2014 com dinheiro de propina, a
“contrapartida específica", no eufemismo engravatado. Os autos
estão repletos de exemplos sobre o milionário fluxo
ilegal de dinheiro de fornecedores do governo para pagamentos de
despesas de Dilma-Temer. Uma das características desse processo é sua
publicidade, como ocorre com as ações da Operação Lava-Jato. São 27 volumes,
com oito mil páginas, acessíveis ao público na página do TSE na internet. Ainda
existem partes ocultas, por causa do sigilo que o Supremo Tribunal Federal
insiste em manter sobre transações da Odebrecht e outros no financiamento de
políticos e partidos.
A longa
duração do sigilo judicial corrói a confiança na Justiça, porque só beneficia a minoria delinquente no poder. Como lembra o decano da Câmara,
deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), governos temem muito mais a revelação de
seus atos do que movimentos de tropas nas ruas.
Fonte: José Casado,
jornalista - O Globo
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