Veja
Em artigo anterior (“Não entre. É um livro de receitas”, Blog do Noblat, 04.07.19), destaquei as vítimas da PEC 45/2019, autodesignada reforma tributária. Agora, cuido de dimensionar perdas.Admitida uma alíquota de 25%, que alguns
entendem subestimada, as perdas dos optantes do lucro presumido (mais
de 850 mil contribuintes) podem implicar um absurdo aumento de 684% na
carga tributária de prestadores de serviço, conforme avaliou o
tributarista Hamilton Dias de Souza.
Não se diga que essa elevação de carga é
compensada por transferência de crédito a terceiros, porque os serviços,
em boa medida, são prestados a pessoas físicas, que não têm como
aproveitar créditos.
Uma escola, por exemplo, hoje tributada
no regime do lucro presumido, inevitavelmente teria que elevar a
mensalidade dos alunos, do que resultaria mais receita e,
subsequentemente, mais imposto, gerando uma perversa espiral tributária.
Por igual razão, haveria aumento no valor
das consultas médicas, mensalidades de planos de saúde, serviços
advocatícios e contábeis, etc. Receio que os prestadores de serviços,
contra os quais há uma pouco disfarçada má vontade, e seus usuários não
iriam apreciar essas mudanças. Os setores agrícola, imobiliário e de
construção civil não se queixam dos seus regimes tributários especiais. A
PEC 45, todavia, lhes traria aumento de carga tributária e de
complexidade, em nome de uma visão fundamentalista.
Mantida a arrecadação atual, como se propala, a quem aproveitaria o aumento de tributação desses setores?
De pronto, constata-se que as
instituições financeiras seriam claramente beneficiadas, porque seriam
desoneradas da vigente tributação do PIS/Cofins (arrecadação estimada de
R$ 25 bilhões, em 2019). Ainda que não se possa precisar, alguma
desoneração também alcançaria grandes empresas. Assim, haveria uma elevação na tributação das pequenas e médias empresas e redução das grandes. É Robin Hood às avessas.
Não se alegue que o novo modelo de
tributação promoveria um crescimento de dez pontos percentuais no PIB. É
uma simplificação caricata da realidade, típica dos sacerdotes do
método do “suponhamos que”, na feliz definição do economista Delfim
Netto.
Outra bandeira é a pretensão de acabar
com a guerra fiscal. Para tal cogita-se da vedação a incentivos na
tributação do consumo, sem conseguir distinguir competição fiscal
lícita, comum a todos os países e sem preferência por tipo de tributo, e
guerra fiscal, presumidamente contrária à lei. É verdade que se instalou uma guerra fiscal no ICMS, cujas causas não são exploradas neste artigo. Não se pode esquecer, entretanto, a
máxima do direito de que o abuso não impede o uso. Deficiências
normativas e administrativas são sanáveis.
É implausível, ademais, admitir-se a
substituição de incentivos fiscais por subsídios a empreendimentos,
consignados em dotações constantes dos orçamentos anuais e competindo
com despesas tradicionais, como educação, saúde e segurança pública.
Alguém faria investimentos de médio ou longo prazo confiante nessas
dotações anuais? Não haverá, entretanto, correção das desigualdades regionais sem a participação efetiva da iniciativa privada.
A pretensão de neutralidade, assentada em
velhos preconceitos contra as regiões mais pobres, não pode se
contrapor aos objetivos de correção das desigualdades regionais de
renda, previstos na Constituição.São José do Belmonte é uma cidade com 30
mil habitantes no sertão pernambucano. Uma empresa espanhola escolheu-a
para implantar a mais importante usina de energia solar do Brasil. O empreendimento vai gerar, no período de
implantação, mil empregos, inclusive para técnicos de alta renda. Após a
implantação vai abastecer um milhão de domicílios.
A energia solar, conquanto limpa, não é
ainda competitiva com a energia convencional. Para viabilizar o
empreendimento, o governo de Pernambuco pretende conceder-lhe um
incentivo fiscal. À luz da PEC 45, isso não seria possível. Não consigo
enxergar uma réstia de razão nessa tese.
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