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sábado, 7 de março de 2020
ABIN paralela - "Isso aí acabou" - Merval Pereira
O Globo
É preciso investigar o suposto grampo bolsonarista
Foi assim que o ministro Augusto Heleno,
chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da presidência da
República, tranquilizou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em relação
ao temor de que alguns deputados estariam sendo monitorados pelo governo. No início do governo Bolsonaro, quando a relação com o Congresso
estava em momento crítico, deputados procuraram o presidente da Câmara
com uma apreensão: acreditavam que estavam sendo gravados. Os relatos não foram conjuntos, mas individuais, em diversas
circunstâncias, uns consideravam que seus telefonemas estavam sendo
grampeados, outros “sentiam” que estavam sendo gravados em suas
conversas no Palácio do Planalto. Eram mais percepções e temores do que fatos concretos que motivassem
uma reclamação formal do presidente da Câmara. Até que um deputado com
patente militar, ligado à comunidade de tecnologia de segurança de
informação, disse a Maia que tinha certeza de que fora grampeado, e deu
detalhes técnicos sobre o que poderia ter acontecido ao seu celular
Android. Segundo relatos de deputados, o presidente da Câmara aproveitou uma
conversa com o General Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança
Institucional (GSI) para abordar o tema delicado. Revelou a preocupação
de diversos deputados, e recebeu a resposta tranquilizadora, que foi
repassada aos deputados queixosos. O assunto morreu. A revelação do ex-ministro Gustavo Bebianno de que o filho 02 Carlos
Bolsonaro pensara em montar um esquema não oficial paralelo de
monitoramento de políticos e jornalistas trouxe o assunto de volta ao
noticiário e gerou desdobramentos. [convenhamos que a declaração de um ex-ministro, o Gustavo Bebbiano, sobre Bolsonaro e familiares, merece tanta credibilidade quanto fosse Lula o autor.] Ontem, a revista Crusoé publicou em sua capa um amplo material sobre o
tema, detalhando como o esquema teria sido montado. Não há dúvida de
que o atual diretor da Agência Brasileira de Informações (ABIN),
delegado Alexandre Ramagem foi quem incialmente discutiu com Carlos e
mais três agentes da Polícia Federal a estruturação de uma equipe que
seria responsável por essa atividade. Mas não é possível afirmar,
(apenas intuir), que ele sabia que o trabalho seria clandestino, embora
patrocinado pelo novo grupo que ocupava o Palácio do Planalto. Há o antecedente histórico do ex-presidente dos Estados Unidos
Richard Nixon, político paranóico que procurou se proteger gravando
clandestinamente as conversas no Salão Oval e grampeando seus
“inimigos”. Também objetivava impedir que vazamentos de documentos oficiais
voltassem a acontecer como no caso dos Pentagon Papers, que revelou
atuação ilegal do Departamento de Estado na Guerra do Vietnã. Essa
equipe clandestina era conhecida como “plumbers” (bombeiros), e foi
descoberta a partir da prisão de um grupo que invadiu a sede do Partido
Democrata no prédio Watergate em Washington. A descoberta dos esquemas
clandestinos levou à renúncia de Nixon ante a possibilidade de sofrer um
impeachment. O que é certo é que o General Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro,
conversou com o General Heleno sobre o assunto, e também Gustavo
Bebianno, o primeiro a revelar formalmente essa tentativa do filho do
presidente de montar um serviço de segurança paralelo ao já disponível
pela presidência da República. Houve o aconselhamento ao presidente da República, por parte dos dois
ex-ministros, de que seria uma temeridade acobertar tal tipo de
atividade, que poderia motivar um impeachment. O ministro Augusto Heleno mais uma vez ontem negou a veracidade da
tentativa de criar-se uma “ABIN paralela”. Mas não se referiu em nenhum
momento ao filho do presidente, talvez indiretamente citado na definição
de “devaneio de amadores”, como classificou a informação. De fato, é tecnicamente equivocado chamar-se de“ABIN paralela” uma
equipe clandestina de rastreamento de pessoas em posições “sensíveis”,
embora seja jornalisticamente oportuno. Mas as indicações são claras de que esse movimento foi feito. Se o
esquema chegou a ser implementado a ponto de os deputados “sentirem” sua
presença nas conversas políticas, é um tema para ser investigado mais a
fundo. Pode ser até mesmo que não tenha nem sido instalado, diante das
advertências aos “amadores”. Ou, o que seria uma tragédia institucional,
pode ser que tal esquema continue em plena vigência. Só uma
investigação independente poderá esclarecer a situação. Merval Pereira, jornalista - O Globo
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