Bloquear bolsonaristas na rede não ajudará o STF a desmontar engrenagem que sabota democracia
Não há dúvida de que o presidente Jair Bolsonaro conta com uma ampla
rede de seguidores que usam a internet para espalhar desinformação,
incitar o ódio contra seus adversários e fomentar o descrédito nas
instituições democráticas. Se a existência dessa rede e sua relevância para a sustentação do
governo são incontroversas, resta muito a esclarecer acerca de sua
articulação com grupos empresariais, da origem dos recursos que a
financiam e dos mecanismos que amplificam seu alcance.
O Supremo Tribunal Federal tomou a iniciativa de examinar essas questões
há mais de um ano, quando abriu inquérito para investigar a
disseminação de notícias falsas, ofensas e ameaças contra os integrantes
da corte nas redes sociais. Conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes, a investigação tem caráter
sigiloso, mas fez barulho nos últimos meses, com buscas nas casas de
aliados de Bolsonaro, apreensão de computadores e o início de uma
devassa financeira.
Na última sexta-feira (24), cumprindo determinação do magistrado, o
Facebook e o Twitter bloquearam as contas de dezenas de investigados,
impedindo que continuem a se manifestar nas plataformas e barrando até o
acesso a mensagens inofensivas do passado. Claramente desproporcional, a censura imposta aos bolsonaristas mostra
que Moraes escolheu um caminho arriscado e contraproducente para atacar o
problema. Basta ler o despacho que ordenou o bloqueio das contas para perceber que
várias mensagens apontadas como ofensivas são críticas legítimas, ainda
que grosseiras ou injustas, a que todos estão sujeitos num regime em
que a liberdade de expressão é garantida.
Ao tentar silenciar os investigados de forma tão ampla e indiscriminada,
a decisão de Moraes abre caminho para estreitar os limites em que esse
direito fundamental pode ser exercido —criando assim insegurança para
toda a sociedade. Além disso, a medida se revelou pouco eficaz porque foi facilmente
contornada pelos bolsonaristas, que passaram a usar contas de amigos e
parentes para se manifestar e a ensinar aos seguidores como encontrar o
material bloqueado visitando sites no exterior.
Logo tornou-se evidente que o bloqueio contribuiu mais para mobilizar as
hostes do presidente do que para silenciá-las. O próprio Bolsonaro
apresentou ao STF petição esdrúxula em defesa dos apoiadores, como se o
assunto fosse seu. Se o objetivo do Supremo é impedir a rede bolsonarista de usar a
liberdade de expressão para sabotar a democracia, a melhor maneira de
fazê-lo será desvendar sua engrenagem, concluir o inquérito e submeter
os aliados do presidente a julgamento o quanto antes. [para que um julgamento ocorra é necessário que supostos crimes sejam denunciados e denúncias necessitam de fundamentos, que só provas propiciam.
Mesmo todo o processo investigatório, das primeiras investigação a eventuais condenações, estejam a cargo de uma única instituição - STF - em algum momento terão que apresentar provas = exceto se apelaram para julgamentos secretos, condenações secretas e cumprimento de penas em local incerto e não sabido.]
Editorial – Folha de S. Paulo
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