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sexta-feira, 11 de junho de 2021

Resgate de alunos - O Estado de S. Paulo

Entre os desafios que o Brasil terá de enfrentar, após a pandemia, está o de recolocar na escola 5,1 milhões de crianças e adolescentes que desistiram de estudar. Por falta de condições financeiras para comprar equipamentos eletrônicos, eles não puderam acompanhar as aulas virtuais enquanto as escolas ficaram fechadas. Isso fez com que o País regredisse duas décadas no acesso ao ensino básico. Esse é o número de crianças e de adolescentes que estavam fora da escola no início da década de 2000.

Essa é uma das conclusões de um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), realizado com base em estatísticas da última Pnad Contínua, concluída em novembro de 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Desses 5 milhões de crianças e adolescentes, mais de 40% tinham entre 6 e 10 anos – idade em que a escolarização estava quase universalizada antes da pandemia. 

Em outras palavras, a evasão escolar causada pelo coronavírus acabou atingindo meninos e meninas para quem o acesso às salas de aula já não era mais um problema. Com isso, parte dos recursos aplicados pelo poder público na universalização do ensino fundamental ao longo dos últimos 20 anos acabou sendo desperdiçada, em decorrência do fechamento das escolas por causa da covid-19. 

Segundo a representante do Unicef no Brasil, Florence Bauer, crianças de 6 a 10 anos sem acesso à educação eram exceção no Brasil antes da pandemia. “Essa mudança observada em 2020 pode ter impactos em toda uma geração. São crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, fase de alfabetização e outras aprendizagens essenciais às demais etapas escolares. Ciclos de alfabetização incompletos podem acarretar reprovações e abandono escolar”, diz ela, após chamar a atenção para a importância da reabertura das escolas. 

Como as crianças e adolescentes que desistiram dos estudos pertencem a famílias de baixa renda, na prática isso significa que elas se tornarão ainda mais vulneráveis. O estudo revela que a evasão escolar se concentrou mais no Norte (28,4%) e Nordeste (18,3%) do que nas Regiões Sudeste (10,3%), Centro-Oeste (8,5%) e Sul (5,1%). Também mostra que a evasão foi maior entre crianças e adolescentes pretos, pardos e indígenas. Além de deixar de aprender, ao abandonar a escola essas crianças e adolescentes perderam a merenda escolar e ficaram expostos à violência familiar. 

São números alarmantes, o que obriga o poder público, gestores escolares e entidades da área educacional “a ir atrás de cada criança e cada adolescente que está com seu direito à educação negado”, afirma a representante do Unicef no Brasil. O estudo aponta que, para reverter essa exclusão, será necessário garantir acesso à internet para todos, promover campanhas de comunicação comunitária em todos os municípios, mobilizar as escolas e criar condições para que as crianças e adolescentes retomem os estudos. E, para impedir o aprofundamento das desigualdades na formação dos alunos, será preciso desenvolver instrumentos pedagógicos para a recuperação do aprendizado perdido”, afirma Priscila Cruz, presidente executiva do Todos pela Educação, uma ONG que também vem desenvolvendo programas para resgatar alunos que desistiram de estudar. 

Muitas dessas medidas podem ser implementadas pelos municípios e pelos Estados, com apoio técnico de entidades como essas. Mas, para que possam dar os resultados esperados, é preciso que elas sejam articuladas pelo governo federal. É aí, justamente, onde está o problema. Se antes da pandemia o Ministério da Educação já primava pela inépcia, depois dela a pasta se omitiu ainda mais, limitando-se a cuidar de temas menores, mas que interessam por razões eleitorais ao presidente Jair Bolsonaro.  Ao se negar a ajudar os esforços dos Estados e municípios para reverter o problema da evasão e avançar em direção a um ensino público de qualidade e com equidade, essa omissão é um crime contra as novas gerações.

Opinião - O Estado de S. Paulo

 

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