– Vacinei quem?
– Você?
– Ah, tá perguntando se eu ME vacinei.
– Isso.
– Não, porque você perguntou “já vacinou”, achei que fosse pra saber se eu estava vacinando alguém.
– Só se você fosse enfermeiro.
– Pois é, não sou.
– Então: já vacinou?
– Não vacinei ninguém.
– Não tô perguntando isso.
– Vou te ajudar: já SE vacinou?
– Já! Quer ver a foto?
– Não, obrigado.
– Mas vou te mostrar. Olha aqui: nem chorei.
– Parabéns.
– A enfermeira disse que eu suportei bem. Ela era bonitinha, acho que pintou até um clima.
– Acha?
– É, não tenho certeza. Mas vou voltar lá.
– Pra pedir o telefone dela?
– Não, pra tomar a outra vacina. Aquela de Primeiro Mundo.
– Vai tomar outra?!
– É, acho melhor. Porque depois de vacinar acabei pegando covid. Então quero tomar logo essa poderosa aí pra não me preocupar mais.
– Sei.
– Chato é esse negócio da miocardite.
– Que negócio?
– Nos Estados Unidos e em Israel eles estão estudando inflamação cardíaca em vacinados. Não sabem ainda o porcentual.
– Aí complica.
– Não acho. Você não ouviu todo mundo dizer que as vacinas são boas e seguras?
– É, tenho ouvido.
– Então? Quando todo mundo diz é porque é.
– Todo mundo é muita gente.
– Muita. Aí ficam esses negacionistas falando em coágulo. Que mané coágulo?!
– Pois é, de fato descobriram que vacina contra covid pode provocar coagulação e trombose. Mas não tem estatística.
– Eu sou a favor da ciência. Quem fica duvidando de vacina é contra a ciência.
– É tudo muito confuso.
– Não tem nada confuso. Confuso é ficar fazendo pergunta no meio de uma pandemia. Eu sou iluminista. Vacina e fim de papo. O resto é coisa de seita.
– Tá parecendo seita mesmo esse negócio de não deixar ninguém falar.
– Não tem que deixar mesmo não. Pra falar contra a ciência é melhor calar a boca.
– Você sabe quantos…
– Cala a boca.
– Por quê? Só ia perguntar se você sabe quantos dias faltam pra Olimpíada do Japão.
– Não sei e não quero saber. Bando de negacionista.
– Os japoneses?
– Completamente irresponsáveis. E não querem se vacinar! É um dos países menos vacinados do mundo.
– E ainda assim parece que o número de óbitos lá é bem baixo.
– Se tivessem vacinado direito seria zero!
– Será?
– Cala a boca.
– Por quê?
– Porque eu quero.
– Posso falar só mais uma coisa?
– Se for contra a ciência, não.
– Não é contra a ciência.
– Tá bom. Fala.
– Esse passaporte da vacina…
– Que que tem?
– Pra poder ter acesso aos lugares, circular livremente…
– Eu sei o que é, porra. Fala logo.
– Não, só ia te perguntar se você não acha que obrigar as pessoas a tomarem vacinas que ainda estão sendo estudadas pode dar cadeia pra quem obriga.
– Vou fingir que não ouvi esse absurdo. Senão o preso seria você.
– Obrigado por não me ouvir.
Leia também “A tirania dos passaportes de vacina”
Guilherme Fiuza, colunista - Revista Época
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