Jerônimo Teixeira
Por que a CPI da Covid acertou ao criar esta semana uma frente para investigar declarações contrárias à ciência
Amparado em falsidades e distorções, sustentado por autoridades públicas e disseminado pelas redes sociais, o negacionismo é o vírus informativo que atrapalha o combate à Covid-19
O negacionismo agrupa boatos e fake news, companheiros históricos de todas as epidemias, em um sistema de crenças infundadas, abrangendo de medicações milagrosas comprovadamente ineficientes — como a cloroquina, que o presidente Jair Bolsonaro parece afinal ter abandonado em prol da proxalutamida, droga ainda em fase inicial de testes — a ideias conspiratórias sobre o “controle social” exercido por meio do lockdown. Alguns postulados negacionistas são besteiras folclóricas, como a ideia de que a vacina emite sinal de wi-fi. Em suas formas mais sofisticadas, porém, pretende se amparar naquilo que ele nega — a ciência. — Negacionista é aquele que afirma uma hipótese sem evidências suficientes e sem métodos rigorosos — diz a cientista política Lorena Barberia, da Universidade de São Paulo (USP), coordenadora científica da Rede de Políticas Públicas e Sociedade, grupo interdisciplinar que estuda questões relacionadas à pandemia.
É ciência, “sqn”Por vezes, o negacionista debruça-se sobre os mesmos dados brutos estudados por cientistas sérios, mas seleciona (e distorce) só aqueles que servem a sua visão particular. [a mídia militante, ou adestrada, é quem mais distorce os fatos, manipula, omite, faz narrativas - a explicação veiculada na matéria sob comento é um exemplo de narrativa criativa.
A partir do chão da realidade, o negacionista dá saltos conspiratórios. É fato documentado que, no início da pandemia, em Wuhan, autoridades chinesas reprimiram e censuraram médicos que tentaram soar o alarme sobre o perigo da nova epidemia, o que retardou a resposta global à nova ameaça. Essas circunstâncias serviram de base para teorias delirantes sobre agentes patogênicos criados em laboratórios chineses e espalhados de forma intencional. A hostilidade em relação à China, por sua vez, alimentou a rejeição da CoronaVac, vacina que o Instituto Butantan desenvolveu, no Brasil, em parceria com o laboratório chinês Sinovac.
O elemento político é nítido: o negacionismo tornou-se mais uma arma na “guerra cultural”, a disputa ideológica binária entre a extrema-direita e a centro-esquerda. Não é por acaso que o negacionismo vem sendo um tema central da CPI da Covid. Ainda que as suspeitas de corrupção na compra de vacinas tenham tomado o centro dos debates, um dos sete núcleos em que a CPI recentemente se dividiu será dedicado às “ações anticiência” do governo.
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