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sábado, 3 de junho de 2023

Um ‘Pibão’ desconfortável - Carlos Alberto Sardenberg

Em qualquer país, o governo, seja de direita ou de esquerda, comemora quando há crescimento do Produto Interno Bruto. Lógico. É tudo de bom — emprego, renda, oportunidades. 
Pois, nesta semana, o IBGE informou que o PIB brasileiro cresceu 1,9% no primeiro trimestre em relação ao período anterior, resultado expressivo e bem acima das expectativas. Tanto que os analistas elevaram a perspectiva de expansão neste ano para acima dos 2%, o dobro do que se calculava no início de 2023.

O governo e seus aliados não comemoraram. Em alguns setores, notou-se até mesmo um certo desconforto. Há um motivo técnico. O resultado do primeiro trimestre foi puxado pela agropecuária, com uma surpreendente e espantosa expansão de 21,6%, sempre na comparação com o último trimestre do ano passado.

Os demais setores mostraram números modestos (expansão de 0,6% em serviços e estabilidade na indústria). 
Além disso, o agronegócio flutua bastante no ano, conforme o andamento das safras. 
Não é possível crescer assim em todos os trimestres. De todo modo, continua sendo bom. O agro brasileiro hoje é alta tecnologia em genética, máquinas, fertilizantes.  
Puxa crescimento em vários segmentos industriais e de serviços.

Qual o problema?
Simples. O agro está no rol dos adversários da esquerda dominante no governo Lula. Incluindo o presidente.

Um baita equívoco.
O pensamento conservador ou de direita é dominante no pessoal da agropecuária. 
Tem bolsonaristas e desmatadores. 
Tem uma bancada ruralista no Congresso que é, na maioria, oposição a Lula
Mas a maior parte da produção brasileira — e bota maior nisso — é correta e sustentável pelos padrões internacionais. Tanto que exporta para o mundo todo. 
 
Um governo, digamos, normal trataria de apoiar esse setor
Politicamente, o correto seria separar líderes políticos da extrema direita de toda uma área da economia que gera benefícios para todo o país. 
Mas não aqui, não neste governo. E aí dá o “azar” de ver o agro estourando. Difícil comemorar. 
 
Há outro motivo subjacente para o desconforto com o PIB forte: a batalha com o Banco Central. O Comitê de Política Monetária do BC (Copom) tem mantido a taxa básica de juros no nível, elevado, de 13,75% ao ano. Segundo o presidente do BC e do Copom, Roberto Campos Neto, a inflação brasileira mostra-se resiliente por causa, entre outras coisas, de uma demanda geral aquecida. Entram aqui os gastos do governo e o consumo das famílias.

Os ministros Haddad e Simone Tebet têm repetido que não há inflação de demanda e que o governo promove ajuste fiscal. Logo, arrematam, o BC deveria reduzir os juros imediatamente.

E aí vem um Pibão.

Foi o agro — dos inimigos! Vá lá, mas, mesmo retirando da conta esse setor, continua havendo crescimento — e da demanda. 
Segundo analistas de fora do governo, o nível de emprego é bom para o momento, e os programas de transferência de renda sustentam o consumo de bens e serviços. 
E tudo isso a três semanas da próxima reunião do Copom. Daí o desconforto. 
 
Uma bobagem. No terreno específico da política econômica, há argumentos para defender uma redução da taxa de juros mais rápida do que o BC tem indicado. 
No mercado financeiro, muita gente já antecipa essa queda da taxa básica. 
Nas transações com papéis de vencimento mais longo, o mercado já reduziu os juros — os “juros futuros” — acentuadamente. 
 
Em resumo, o governo tem um aliado de fato em boa parte do mercado. Assim como no agro. Mas o mercado é tão ou mais inimigo que o agro. 
Essa distorção ideológica aparece em toda parte. 
Ainda ontem, em evento na Universidade Federal do ABC, Lula disse que a educação é base do desenvolvimento, devendo receber muito investimento público.

Óbvio.
Mas a questão não é essa. É esta: por que o ensino público, sobretudo nos níveis fundamental e médio, falha tão escandalosamente? 
Mesmo tendo recebido investimentos? 
Sistema de ensino equivocado? 
Professores mal remunerados? Não, diz Lula. É porque as elites não querem que os pobres aprendam.

Aí fica difícil.

Carlos Alberto Sardenberg, colunista - O Globo


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