Ruth de Moraes - Silvio Navarro
O senador Hamilton
Mourão afirma que Cortes superiores promovem insegurança jurídica no
país e avalia que Jair Bolsonaro pode liderar a oposição, mesmo
inelegível
Senador Hamilton Mourão | Foto: Isac Nóbrega/PR
“Qualquer professor universitário de Direito Constitucional tem de fazer um malabarismo para explicar aos alunos o que está acontecendo no Brasil”, afirma.
Ao contrário de muitos parlamentares conservadores eleitos no ano passado, Mourão não aposta no sucesso da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro.
Mourão conversou com a reportagem de Oeste em seu gabinete, em Brasília. Confira os principais trechos da entrevista.
Como o senhor vê o papel dos Poderes da República atualmente?
Isso não é de hoje. A questão da harmonia e do equilíbrio entre os Poderes vem se esgarçando desde os antigos governos do PT. O esgarçamento é a invasão das competências de um Poder pelos outros. Especificamente, o Executivo está espremido por ações do Judiciário e do Legislativo. Notamos isso principalmente na questão orçamentária. Sou crítico da ação do Congresso Nacional em indicar onde deve ser gasta determinada verba.
E o Judiciário tem interferido constantemente em decisões do Legislativo.
O Judiciário resolveu fazer uma legislação propositiva e legislar. Isso gera uma insegurança jurídica muito grande. Temos uma total inversão do processo legal. A Suprema Corte tem inquéritos onde o relator é investigador, acusador e vítima. É um absurdo. Essa situação precisa ser solucionada com um acerto entre os três Poderes para que cada um volte a atuar em suas áreas.
Qual é a sua avaliação sobre a relação do atual governo com o Congresso?
Esse governo tem uma dicotomia política, pois assumiu sem nenhum plano de gestão. Parece que eles nem esperavam ganhar a eleição. Não havia um planejamento. O governo também é velho, porque o presidente está olhando 20 anos para o passado.
O grupo que queria instalar inicialmente a CPMI, a oposição, não conseguiu assumir o controle da comissão.
Menos de seis meses depois de assumir o governo, o presidente Lula recebeu o ditador Nicolás Maduro em solo brasileiro. O senhor foi vice-presidente da República num governo que rompeu relações diplomáticas com a Venezuela. Fez um duro discurso sobre isso na tribuna do Senado.
Um dos erros do governo Jair Bolsonaro foi ter rompido relações com a Venezuela. Era importante ter deixado um encarregado de negócios ou alguns militares em Caracas. Agora, ficar batendo palma para o Maduro e dizer que o que acontece na Venezuela é uma narrativa é inversão dos valores.
“A indicação de Cristiano Zanin feriu os princípios da impessoalidade. Além disso, não acho que ele possua um notório saber jurídico, que a Constituição prevê como sendo uma qualificação de um ministro do Supremo”
Não foi só essa a mudança nas relações exteriores. Houve manifestação do presidente a favor da Rússia na guerra contra a Ucrânia, críticas ao dólar como moeda corrente internacional, a questão no Oriente Médio a favor da Palestina contra Israel.
Isso ocorre porque temos dois chanceleres: o Celso Amorim, que é o chanceler de fato, e o Mauro Vieira, que é o chanceler de direito.
O advogado Cristiano Zanin deve ser sabatinado na próxima semana pelo Senado para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Como a oposição pretende agir nessa sabatina?
Pelos corredores, podemos ver que o pessoal já se rendeu. Para mim, o Zanin é um excelente advogado, com uma excelente reputação, mas não considero a escolha dele boa.
Ainda sobre o Judiciário, o ministro Dias Toffoli afirmou que o país tem um Poder Moderador — ainda que isso estivesse previsto na extinta Constituição Imperial de 1824.
A Suprema Corte está navegando na inconstitucionalidade.
O senhor acredita que o ex-presidente Jair Bolsonaro pode se tornar inelegível no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na próxima semana?
Podem até deixá-lo inelegível, mas aí ele pode recorrer da decisão anos depois e conseguir a liberdade para se eleger. Igual fizeram com o atual presidente. Condenaram o Lula e, depois, o “lavaram” para que ele pudesse concorrer à Presidência da República.
Muitos políticos e analistas afirmam que, mesmo inelegível, Bolsonaro poderá seguir como líder da oposição no Brasil. O senhor está de acordo?
Atualmente, Bolsonaro está em uma situação difícil, na defensiva. Ele não está se pronunciando politicamente, nem mesmo pelas redes sociais. Ele precisa vencer esses processos dele e, ainda que se torne inelegível, ele pode, como presidente de honra do PL, percorrer o Brasil, mobilizar os apoiadores e participar da próxima eleição presidencial escolhendo um nome para apoiar.
Depois de todo o processo que o Brasil passou pós-eleição, a imagem das Forças Armadas ficou arranhada para o eleitor conservador. Como o senhor avalia isso?
É um processo, assim como aconteceu no pós-regime militar. A Marinha e a Força Aérea nunca entraram nesse pacote, mas o Exército, sim.
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