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sábado, 14 de outubro de 2017

As escutas ilegais na Procuradoria Geral da República

Como foi montado um esquema de escutas clandestinas dentro do Ministério Público Federal idealizado por Rodrigo Janot e comandado por Lauro Pinto Cardoso Neto, um colaborador do Centro de Inteligência do Exército nos anos de chumbo

Antes de ser procurador-geral da República, entre 2003 e 2005, Rodrigo Janot fez estágio no posto de secretário-geral da PGR. Àquela altura, Cláudio Fonteles ocupava a cadeira mais importante do Ministério Público Federal. Foi ali que Janot começou a tomar intimidade com os métodos pouco ortodoxos de investigação. Quando era subprocurador, Janot foi um dos responsáveis por incorporar ao patrimônio do MPF sofisticados equipamentos de escuta telefônica, a exemplo do Sistema Guardião empregado pela Polícia Federal em investigações especiais. Para justificar o alto investimento, ele afirmava que o aparato tecnológico ajudaria a interceptar as tramóias dos agentes do crime, entre eles, políticos que transgrediam a lei. Ao assumir a chefia da PGR, em 2013, Janot incrementou o serviço de espionagem já existente. E ampliou os alvos de seu monitoramento: passou a usar a estrutura para bisbilhotar os passos de procuradores que ocupavam gabinetes vizinhos ao seu na Procuradoria-Geral.


“Outro dia, comentei com colegas sobre uma reportagem que dizia
respeito à PGR. Em seguida, recebi um aviso estranho do Eduardo Pelella
(ex-chefe de gabinete de Janot), como se ele soubesse do conteúdo da conversa”
Augusto Aras, procurador da República

O responsável pela grampolândia, termo adotado pelos procuradores ouvidos por ISTOÉ, era o ex-secretário-geral Lauro Pinto Cardoso Neto. Um procurador conhecido como homem de pouca fala, educado e ao mesmo tempo muito misterioso. Cardoso Neto foi um dos poucos nomes que Rodrigo Janot aproveitou da equipe do antecessor Roberto Gurgel. A permanência dele não foi à toa. Ele havia acumulado muita informação adquirida no mandato de Gurgel. Além disso, era qualificado para a função. Tinha experiência no Exército Brasileiro como oficial. Lá, era apontado como colaborador do Centro de Inteligência do Exército (CIE) nos anos de chumbo da ditadura militar, com a atribuição de investigar opositores do regime.



MÉTODOS OBSCUROS
Tão logo recebeu a missão em 2013, Lauro tratou de montar uma espécie de aparelho de inteligência na PGR. Experiente e bem relacionado com especialistas no submundo da espionagem de Brasília, o procurador convenceu Janot a requisitar a cessão de 15 policiais militares do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar do Distrito Federal. Para camuflar a verdadeira missão dos militares dentro da PGR, Lauro usou o pretexto de que eles dariam curso de capacitação para os 850 agentes de segurança do MPF. Em quatro anos no MPF, eles só realizaram um treinamento de tiro, assim mesmo, para cerca de 30 agentes do ministério. Na verdade, o serviço dos PMs nada tinha a ver com aprendizagem: eles eram arapongas da PGR.


Ao apurar detalhes sobre o esquema, ISTOÉ ouviu subprocuradores e teve acesso a documentos sigilosos. As fontes trouxeram à luz os métodos obscuros e ilegais. Métodos esses que extrapolaram o limite de atuação de um procurador, que deveria seguir apenas a letra fria da lei, e não usar a estrutura que dispunha para alcançar seus interesses pessoais. Eles revelaram que os alvos dos grampos clandestinos de Janot não eram somente políticos ou outros implicados em operação de combate à corrupção. Mas, principalmente, seus adversários na PGR.


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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

A nova xerife do Brasil






Acusadora com desassombro e coragem, Raquel Dodge assume a PGR com menos espuma, mais trabalho e sem a intenção de contemporizar com malfeitos de quem quer que seja. O primeiro alvo será a delação da JBS

A nova Procuradora-geral da República, Raquel Dodge, não tem medo de cara feia nem do perigo. Durante seus trinta anos de carreira ela mostrou coragem e que não tem por hábito contemporizar. Ela assume a PGR na segunda-feira 18, e seus auxiliares garantem que uma de suas primeiras iniciativas será realizar um rigoroso pente fino na delação de Joesley Batista, da JBS. Fará esta revisão para limpar o terreno e corrigir os equívocos que tanta polêmica tem provocado nas últimas semanas. Segundo aliados, Dodge se diferencia do antecessor por se importar menos com a espuma do que com o conteúdo dos processos.

A futura procuradora-geral da República, Raquel Dodge (Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo)  


Enganam-se, no entanto, aqueles que imaginam que ela passará a mão na cabeça dos envolvidos na Lava Jato ou facilitará a blindagem de quem quer que seja. Juristas e advogados que a conheceram, ao longo da carreira, alertam que ninguém deve se iludir com a nova procuradora. A visita que fez à noite, no Palácio do Jaburu, ao presidente Michel Temer, passou uma imagem errada de como ela será no exercício do cargo e diante das tarefas jurídicas e criminais que terá pela frente.

Uma procuradora implacável
O ministro Marco Aurélio Mello, para quem Dodge trabalhou durante muitos anos quando este era ministro do Trabalho, avisa que “as pessoas têm o direito de pensar o que quiserem, mas ela atua como acusadora com desassombro e coragem”. O ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, ao mesmo tempo em que declara não integrar sua patota, afirma que: “Não é controlável. E não dará mole ao Executivo Federal”. E diz que Dodge não faz negócios obscuros à noite e muito menos aceitaria abraço de afogados.


Se alguém duvida do que ela seja capaz, seus aliados citam também, como exemplo, a Operação Caixa de Pandora (2009). Ela custou o mandato de um governador, José Roberto Arruda, do Distrito Federal, que teve sua prisão decretada e ordem executada por uma força-tarefa sob seu comando. O caso estava nas mãos do STJ, onde ela era subprocuradora e assumiu a investigação. Foi nessa condição que ela reivindicou para o então procurador geral, Roberto Gurgel, a criação de uma força-tarefa. Esta teria como missão investigar o governador da época, o vice Paulo Octávio, secretários de estados e servidores . No final do processo, Arruda terminou perdendo seu mandato. Está com seus direitos políticos suspensos desde então.

A escalação do time de Dodge indica que ela não irá transigir com desvios de qualquer natureza
Dodge também teve atuação num caso de repercussão nacional: o que envolvia um esquadrão da morte, tráfico de drogas e corrupção. Ela foi voluntária para integrar a força-tarefa, criada pelo então procurador-geral, Geraldo Brindeiro, e ir a Rio Branco, no Acre, ao lado de outros dois procuradores (José Roberto Santoro e Marcelo Serra Azul), a fim de investigar a atuação criminosa do deputado Hildebrando Pascoal, o “Deputado Motoserra”. A organização criminosa tinha tentáculos no Judiciário local, na polícia militar e no governo do Acre. A investigação, da qual Dodge participou, terminou com a prisão de 80 pessoas que, pela quantidade, foram transportados num Buffalo da FAB para Brasília.
 Divulgação

A equipe convocada para trabalhar no seu mandato também revela como será sua conduta. Para o Grupo de Trabalho da Lava Jato escalou Alexandre Espinosa e José Alfredo de Paula Silva, que trazem no currículo terem participado da equipe do ex-procurador Antonio Fernando de Souza, que denunciou os integrantes do governo Lula envolvidos no escândalo do mensalão. Também é deste time sua secretária de Função Penal, Raquel Branquinho. Esta, além disso, é conhecida pelo rigor com que cobra seus colegas.

Entre os políticos a expectativa é a de que ela não vire refém da jovem guarda do Ministério Público, como Janot. Acreditam que ela será capaz de conter excessos, como o vazamento de informações que não foram processadas e verificadas. Os que a conhecem avaliam que ela vetará a divulgação de fatos de investigações ainda não encerradas. Um passo à frente, sem dúvida.
Correção de rumos As dúvidas que pairam sobre a nova gestão:
JBS e Marcelo Miller
O que será feito com as delações dos executivos da JBS? Benefícios serão revistos, o acordo será renegociado ou rompido? Joesley Batista e Ricardo Saud serão denunciados pelas omissões e mentiras nos depoimentos das colaborações? O ex-procurador Marcelo Miller será alvo de novos procedimentos?

Temer
Janot ofereceu denúncia contra o presidente Michel Temer por corrupção passiva, já rejeitada pela Câmara. No apagar das luzes de seu mandato, denunciou o presidente também por obstrução de Justiça e organização criminosa, com base em delações, como a de Funaro. Há possibilidade de uma terceira denúncia, que vinha sendo prometida por Janot, sair do papel?

Aécio Neves
O caso de Aécio Neves decorrente das delações da JBS ainda não avançou o suficiente. Janot insistiu na prisão do senador, sempre rejeitada pelo STF. O que Raquel Dodge fará com relação ao tucano? Insistirá na prisão? Vai oferecer denúncia? Revisará o caso por se tratar de gravações feitas pelos “fanfarrões” da JBS?

Revisão de delações
Nos bastidores, é forte a informação de que Raquel Dodge vai revisar alguns acordos de colaboração firmados por Janot e considerados fracos, como os de Sérgio Machado. São colaborações com poucas provas. No caso de Machado, muitos procedimentos foram arquivados e a própria Polícia Federal reconheceu que a delação careceu de substância. Dodge vai fazer uma espécie de “recall” em acordos negociados por seu antecessor? Quais serão os critérios adotados?

Saída pelos fundos
A despedida do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não poderia ter sido mais melancólica. Na última semana, ele e o advogado Pierpaolo Bottini, que defende o empresário Joesley Batista, um dos sócios da J&F, foram flagrados nos fundos de um bar de Brasília. A foto tirada por um frequentador do estabelecimento, localizado próximo à residência de Janot, foi publicada pelo site O Antagonista. O cliente do bar contou que o procurador-geral e o advogado conversaram por mais de 20 minutos. Para não atrair atenção, ficaram em uma mesa ao lado de uma pilha de caixas de cerveja. De óculos escuros, Janot estava fantasiado de Rodrigo Janot. Mais inspetor Clouseau impossível.

Fonte: Ilimar Franco - Isto É 

 

domingo, 17 de setembro de 2017

Janot não vai comparecer à posse de Raquel Dodge


Procurador-geral da República disse que convite, feito por e-mail, foi impessoal

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, decidiu não comparecer à posse de sua sucessora Raquel Dodge, marcada para a manhã desta segunda-feira. Ele considerou uma descortesia ter sido convidado apenas por e-mail. Segundo disse a interlocutores, a mensagem era impessoal e assinada pelo Ministério Público Federal. A cerimônia contará com a presença do presidente Michel Temer. Quando Janot assumiu, em 2013, seu antecessor Roberto Gurgel, foi à posse. 

Janot e Raquel pertencem a grupos distintos dentro da Procuradoria-Geral da República e rivalizaram em vários temas nos últimos meses. No sábado, a equipe de Raquel comunicou a dois procuradores que eles não devem continuar na força-tarefa que auxilia nos inquéritos da Lava-Jato montada por Janot. 

Na última quinta-feira, ele denunciou o presidente Temer pela segunda vez. A nova denúncia foi pelos crimes de organização criminosa e obstrução de Justiça. A decisão do procurador-geral foi por oferecer uma única denúncia, envolvendo fatos relacionados aos dois crimes, e não duas, como se cogitou até esta reta final do mandato do procurador-geral.

Fonte: O Globo

sábado, 9 de abril de 2016

"Moro cometeu um erro grave", diz ex-procurador do mensalão sobre grampos

Quando assumiu a PGR (Procuradoria-Geral da República), em 2009, Roberto Gurgel, 61, se viu comandando as investigações do até então mais rumoroso escândalo de corrupção do país: o mensalão. Durante os quatro anos em que ficou no cargo (2009-2013), ele foi um dos principais personagens daquele julgamento.

Atualmente, aposentado há quase três anos e a quatro meses de terminar sua quarentena obrigatória, Gurgel avalia com conhecimento de causa os episódios da Operação Lava Jato que, na avaliação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, transformou o mensalão em "crime de pequenas causas".

Em entrevista ao UOL, Gurgel diz que o juiz federal Sérgio Moro cometeu um "erro grave" ao divulgar conversas telefônicas entre a presidente Dilma Rousseff (PT) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "Foi um erro grave", afirmou. Gurgel declara ainda que sempre ficou "perplexo" com as alegações de que Lula não sabia do mensalão e que não se surpreende com as indicações feitas pela Lava Jato de que o ex-presidente, de fato, tinha conhecimento tanto do mensalão quanto do petrolão. O ex-procurador-geral da República afirma ainda ter suspeitas quanto ao processo de impeachment contra a presidente Dilma e admite que, no Brasil, é difícil responsabilizar poderosos. "O poder fala muito", afirmou. Confira os principais trechos da entrevista.

UOL - A Operação Lava Jato vem colhendo informações preliminares que indicam que o esquema do mensalão e o chamado petrolão existiam na mesma época e que o ex-presidente Luiz Inácio Lula tinha conhecimento de ambos. O que faltou, na época do mensalão, para se chegar ao ex-presidente?

Roberto Gurgel - Quando eu assumi a PGR, a denúncia do mensalão, a ação penal 470, já havia sido oferecida pelo meu colega, Antônio Fernando de Souza. O Antônio Fernando, no momento do oferecimento da denúncia, entendeu que não havia elementos mínimos que possibilitassem a inclusão do presidente Lula naquela peça acusatória. Naquele momento já não caberia a inclusão do presidente Lula porque, repito, a denúncia já havia sido oferecida.

O senhor fica surpreso hoje ao ter conhecimento de evidências que apontam que o ex-presidente Lula tinha conhecimento tanto do mensalão quanto do petrolão?
Na verdade, sempre causou perplexidade o fato de o presidente não ter conhecimento daquilo.
Mas nós, no Ministério Público, trabalhamos em cima de provas. Eu trabalhava a partir das provas e essas provas não justificavam que o presidente Lula fosse incluído na acusação. Agora, acho que é preciso ainda que essas provas sejam dissecadas adequadamente para que possa firmar um juízo condenatório do presidente.

Informações coletadas pela Lava Jato apontam que pessoas condenadas durante o mensalão continuavam a cometer crimes no âmbito do petrolão. Isso lhe causou algum espanto?
Não, nenhuma. Já na época do mensalão, nós dizíamos que o que foi objeto da denúncia apresentada pela PGR era a ponta do iceberg. Na verdade, o mensalão, isso era intuitivo, era algo muito maior. Mas as provas reunidas até aquele momento fizeram com que a acusação fosse oferecida naqueles termos. Mas acho que as investigações feitas no âmbito da Lava Jato só reforçam aquilo que o MP se cansou de dizer no mensalão: que havia um gigantesco esquema criminoso e que o ministro José Dirceu tinha papel de liderança naquela verdadeira quadrilha que havia sido montada.

Pelo menos dois procuradores da Lava Jato disseram que era muito difícil investigar crimes no governo durante as gestões do PSDB. Era realmente mais difícil em gestões anteriores?
Eu posso falar sobre a experiência que eu vivi. Durante os quatro anos em que fui procurador-geral, eu jamais tive ou sofri qualquer tipo de pressão, seja do presidente Lula, seja da presidente Dilma, no sentido de não investigar determinado fato ou de dirigir as investigações e a atuação do Ministério Público neste ou naquele sentido. Quanto a este aspecto específico, os dois tiveram atitude de estadista. Agora, no período do governo do PSDB, eu tinha outras funções aqui na casa e não poderia avaliar isso.

Mas o senhor já estava dentro da instituição durante o governo do PSDB. Durante esse período, era difícil investigar crimes dentro do governo?
Na verdade, como eu lhe disse, eu não tinha conhecimento direto disso. Nós tínhamos um outro procurador-geral que tinha uma maneira diferente de trabalhar. Não poderia dizer se a dificuldade que acontecia estava no governo Fernando Henrique ou se estava na própria cúpula do Ministério Público em razão de uma visão diferente.

O senhor acha que o estilo do ministro Gilmar Mendes, dado o cargo que ele ocupa, é prejudicial?
Acho que na verdade e não me limito ao ministro Gilmar Mendes, acho que o ideal é que os juízes, seja quem forem, falem o mínimo possível fora dos autos. Eu diria que é uma recomendação da prudência que se exige dos integrantes do Judiciário. Não tenho dúvida de que ultimamente muitos juízes, sejam de primeiro grau ou de tribunais, têm falado muito fora dos tribunais. É algo que não deveria acontecer. Quanto menos um juiz falar, melhor. O local de juiz falar é nos autos do processo.

Como o senhor avalia a conduta do juiz Sérgio Moro no episódio dos grampos envolvendo conversas entre a presidente Dilma e o ex-presidente Lula?
O juiz Moro tem se conduzido de modo geral, de uma maneira extremamente elogiável.
Mas como qualquer pessoa, está sujeito a erros e a equívocos. E, na minha visão, aquele foi um equívoco grave que foi cometido a requerimento segundo eu soube, do Ministério Público, pelo juiz Moro.
Não consigo vislumbrar utilidade ou finalidade processual naquela divulgação. Qual a utilidade e qual a finalidade de se fazer aquela divulgação para aquela investigação em curso? Não vejo. E se não houve utilidade, não houve finalidade, a meu ver, essa divulgação não poderia ter acontecido e acho insuficiente o argumento de que a população teria o direito de saber quem são os seus governantes.
Claro que a população tem o direito de saber quem são e o que fazem os seus governantes, mas o Judiciário não tem essa função de proporcionar acesso a conversações protegidas pelo sigilo.

O pedido de desculpas que ele fez adianta alguma coisa?
Absolutamente nada. O prejuízo já estava feito e esse prejuízo e foi que, nitidamente, a decisão de revelação daquele diálogo produziu e surtiu efeitos de natureza estritamente política e este não é nem pode ser o papel do Judiciário.

Os três integrantes da linha sucessória* ou são citados ou são investigados ou são réus da Operação Lava Jato. O senhor fica tranquilo se a República ficar a cargo de qualquer um desses?
Não há dúvidas de que essa é uma situação peculiar. É uma situação que não seria desejável para qualquer país e não é desejável para o Brasil.

No Brasil, se discute muito se o processo de impeachment contra a presidente é golpe ou não. Na sua avaliação, o processo do de impeachment contra Dilma é legítimo e legal?
Eu acho que se coloca em relação ao impeachment uma falsa questão. Fica essa discussão no contraste entre se é golpe ou não é golpe e a discussão fica, como o ministro Ayres Britto (ex-ministro do STF) disse numa entrevista recente, meio infantilizada. Evidentemente, há uma previsão constitucional sobre o impeachment.
Então dizem: "ah, se está na Constituição, então não é golpe". Sim... Mas resta saber a utilização que se faz desse instrumento. Devo dizer o seguinte: a mim impressiona muito mal que começou-se a falar de impeachment imediatamente após a reeleição da presidente Dilma.

Essa é a sua impressão hoje?
Acho que hoje surgiram outros fatos e o panorama mudou um pouco, mas esse vício de origem continua me impressionando e continua me colocando em dúvida se realmente estamos perseguindo um meio de corrigir crimes de responsabilidade e de responsabilizar a presidente por crimes de responsabilidade ou se estamos utilizando esse instrumento legal e constitucional com a finalidade de tentar reverter um resultado desfavorável na eleição.
Colocando de uma outra forma, é que me parece que não se pode aceitar que num Estado democrático de Direito, que o impeachment seja utilizado sempre que haja um descontentamento com os rumos de um governo, seja que governo for. Então, mal passada a eleição, insatisfeitos com os rumos do governo, já se começa a falar em impeachment?
Por mais que sejam graves e são gravíssimos todos esses fatos que estão surgindo, relacionados entre outros ao PT, até agora não há nada que se atribua diretamente a ela, salvo a questão das pedaladas.

No mensalão, o núcleo financeiro e empresarial foi o que recebeu as maiores penas. Agora, com o petrolão, o senhor acredita que a história pode ser diferente e o núcleo político sofra penas maiores?
É algo que eu desejaria, mas é algo que me preocupa porque, até o momento, contra o núcleo político não há nada ou há muito pouco em relação a eles. Por enquanto, temos um grande número de pessoas condenadas em Curitiba, mas basicamente são empresários. O núcleo político ainda está digamos, se não a salvo, mas quase a salvo de medidas.
Há mais de um ano que foram aceitos os pedidos de investigação feitos pela PGR contra pelo menos 50 políticos e poucos deles viraram réus. Por que o senhor acha que existe essa demora?

Não é fácil responsabilizar poderosos pelos seus atos. Dou um exemplo: ainda como procurador-geral, eu apresentei em 2013 uma denúncia contra o presidente (do Senado), Renan Calheiros, naquele episódio de que despesas de uma filha que o senador Renan teria com uma jornalista, Mônica Veloso, seriam pagas por um lobista.
Pra se defender no Conselho de Ética do Senado, ele arguiu que teria determinadas rendas em razão de propriedades rurais. E apresentou documentos que comprovariam isso. Esses documentos foram periciados e comprovou-se que era tudo falso. Não havia atividade rural que pudesse lastrear aqueles pagamentos. Do ponto de vista técnico, é dos crimes muito fáceis de provar. Foi ele próprio quem forneceu as provas. Eu ofereci a denúncia em janeiro de 2013 e até hoje a denúncia não foi sequer recebida pelo STF.
Esse processo está pronto para julgamento. Portanto, já se está há três anos apenas para tão somente se examinar a admissibilidade da ação penal. Isso dá uma ideia de como é difícil, às vezes, esse tipo de atuação em relação a pessoas que detém uma parcela importante de poder.

Quando o senhor ofereceu essa denúncia, sabia que iria se indispor com uma das pessoas mais poderosas do Brasil. Na medida em que o senhor faz isso, se expõe e, uma vez que essa denúncia demora três anos para ser apreciada, o senhor se sente frustrado?
Eu me sinto imensamente frustrado porque não é um caso que demande grande complexidade. A prova está toda nos autos.

O poder fala mais alto nessas horas?
Não fala mais alto, mas fala muito.
É curioso que mesmo entre pessoas no mesmo nível de poder, há pessoas que são particularmente protegidas. O presidente Renan Calheiros é um deles.

O senhor acha que a Lava Jato acaba se um outro governo que não o PT assumir o poder?
Acho que as instituições do Estado brasileiro, o Ministério Público, a magistratura, já atingiram um certo nível de amadurecimento tal que a Lava Jato aconteceria em qualquer governo. Ela realmente aconteceria seja num governo do PSDB, ou outro [...] Eu diria que é praticamente impossível evitar a continuidade e prosseguimento de investigações como a Lava Jato.

Fonte: UOL/Notícias


 

domingo, 6 de março de 2016

As vedações dos membros do MPF segundo a vontade do legislador constituinte

A propósito da decisão da Juíza Solange Salgado da 1ª Vara Federal de Brasília, que suspendeu o ato de posse do Ministro da Justiça por ser membro efetivo do Ministério Público, é oportuno lembrar a elaboração do texto constitucional sobre o assunto.

Legislador Constituinte cuidei com especial atenção do texto que dizia respeito ao Ministério Público Federal por várias razões. A uma por que entendia forçosa a separação entre advogado da União e fiscal da lei; a duas por que considerava fundamental e indispensável, assegurar a autonomia administrativa e financeira, corolários da independência outorgada pelo novo texto constitucional. Embora vencido, defendi e votei pela escolha em eleição direta dentre os seus membros para a chefia do Ministério Público.

Aprovado o texto constitucional da Comissão de Sistematização da qual eu fazia parte, foi submetido a Plenário. Fui, então, procurado pelos Procuradores Álvaro Ribeiro da Costa, Roberto Gurgel e Ítalo Fioravante que manifestavam a preocupação do Parquet com as vedações estatuídas no inciso II do art. 128, dentre elas a de exercer qualquer outra função pública, salvo uma de magistério e de exercer atividade político-partidária, vez que vários de seus membros eram detentores de mandato eletivo e de cargos na administração pública.

Após várias reuniões, permaneci irredutível na convicção de que as vedações impostas na Constituição eram pressupostos indispensáveis ao exercício da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, mas considerava relevante a realidade da situação dos membros do Ministério Público que estavam no exercício de cargos e mandatos permitidos pela Constituição vigente à época.

Nesse passo, propus uma solução conciliatória: eram mantidas as vedações mas fazia-se a ressalva para os integrantes da carreira admitidos até a data da promulgação da nova Constituição. Apresentei, então, uma emenda aglutinativa que resultou no texto do § 3º do art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que dispõe: poderá optar pelo regime anterior, no que respeita as garantias e vantagens, o membro do Ministério Público admitido antes da promulgação da Constituição, observando-se, quanto as vedações, a situação jurídica na data desta.

Essa portanto a vontade do legislador constituinte, muitas vezes relegada e desprezada nas decisões pretorianas, mas indispensável de cotejo na vigência do Estado Democrático de Direito.

Com o devido respeito ao Conselho Nacional do Ministério Público, suas Resoluções permitindo o exercício de função pública foram editadas ao arrepio da Constituição vigente. Daí, lúcida e incontrastável a decisão da Juíza Solange Salgado que nos faz lembrar a estória do moleiro de Sans-Souci que, ao enfrentar o Rei da Prússia que pretendia expropriar o seu Moinho, bradou: Há Juízes em Berlim! Agora, digo eu: Há Juízes no Brasil

Fonte: João Agripino Maia é advogado. Foi deputado federal constituinte e consultor legislativo do Senado Federal

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Dilma indica o preferido do MST para o STF - indicado, pediu votos para a petista


Se a lei não mudar, ela ainda poderá escolher o preferido do MTST, o da CUT, o do Jean Wyllys, o das abortistas, o da esquadrilha da fumaça… Aí é só importar o Nicolás Maduro!


Vamos dizer tudo para aborrecer um monte de gente? Vamos. O Brasil cobra de nós essa clareza. A presidente Dilma Rousseff indicou mesmo o nome do jurista Luiz Edson Fachin para a vaga aberta no Supremo. Ele tem de ser agora sabatinado pelo Senado. Se acontecer, e deve acontecer, o que se deu das outras vezes, trata-se de mera formalidade, e um Poder da República deixa de exercer a sua prerrogativa, alheio aos destinos do Judiciário e aos interesses do país.

Só para que vocês saibam: o Planalto usou táticas de despiste. Dilma fez essa escolha há mais de um mês. Outros nomes que andaram frequentando a lista eram puro jogo de cena. Nem os candidatos sabiam que estavam sendo enganados. E isso é uma informação, não um chute. Fachin pode chegar lá e fazer um belo trabalho? Até pode. Se acontecer, farei o óbvio: vou elogiá-lo aqui. Militância política, contexto e circunstâncias, no entanto, nos levam a ficar com um pé atrás. Vamos ver.

Fachin é o candidato de João Pedro Stedile — sim, eu estou me referindo ao chefão do MST. O próprio Lula pensou em indicar o professor em 2010, com a vaga aberta com a aposentadoria de Eros Grau. Desistiu depois de uma conversa com ele. Considerou-o, na linguagem sindical, “basista demais”. Traduzo: deixava-se levar excessivamente pelo alarido dos movimentos de esquerda.

Há uma semana, escrevi aqui que o coração de Dilma pulsava por Fachin. Destaquei naquele texto um artigo pavoroso que ele escreveu para o site Consultor Jurídico. Num dado momento, afirma ele: “Se o conselho que se dava aos juízes antigos da Itália era ‘não use a testa, use o texto’, hoje a máxima pode ser reinventada para ‘use a testa, não esquecendo do texto e seu contexto’”. É ruim. Se alguém invade a minha propriedade, por exemplo, da qual sou dono legítimo, o texto — que ou está em primeiro lugar ou se abre a chance para o arbítrio diz que o invasor tem de sair. Segundo Fachin, um juiz deve, claro, levar isso em conta, mas, em primeiro lugar, ele tem de usar a “testa” isto é, a opinião idiossincrática que, originalmente, independe do texto — para, só então, voltar-se ao que está escrito. E isso ainda não será o bastante. Haverá que ver também o contexto. Mais: Fachin se mostra excessivamente preocupado em criticar o juiz do “Estado Liberal” — sim, ele fala do liberalismo propriamente, com o sotaque de quem considera tratar-se de uma etapa superada da história da humanidade.

De resto, como lembrei num post de ontem, Fachin se transformou também no candidato de Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo, mas enfrentava a resistência do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que agora se comprometeu a trabalhar em favor do seu nome no Senado. Cumpre-me, então, lembrar:
1. Renan foi denunciado ao Supremo por Roberto Gurgel, então procurador-geral da República, em 2013, por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. A investigação deriva de 2007. Ele é acusado de ter comprado notas frias para provar que tinha renda para arcar com a pensão de um filho que teve fora do casamento.
2. O relator do caso no Supremo é o ministro Lewandowski, que, até agora, não se pronunciou sobre o caso.  Nem aceitou nem rejeitou a denúncia. E Lewandowski é aquele que passou a fazer lobby escancarado em favor de Fachin.
3. Quando ministros chegam à presidência do Supremo, costumam deixar casos dessa natureza. Lewandowski manteve com ele o de Renan.
4. O que estou inferindo? Estou apenas dizendo que assim são as coisas.

Caso o indicado de Dilma seja aprovado pelo Senado e se torne ministro do Supremo, a ponta esquerda do tribunal deixa de ser ocupada por Roberto Barroso. A toga rubra passa para os ombros de Fachin. Se a lei não mudar, Dilma tem mais cinco indicações para fazer até o fim de seu mandato, se ela chegar lá. Huuummm… Ainda falta indicar o preferido de Guilherme Boulos, do MTST; o de Vagner de Freitas, presidente da CUT; o de Jean Wyllys, do movimento LGBTXYZ,  o de alguma líder aborteira ensandecida e o dos “coletivos”, como eles se denominam, em favor da descriminação das drogas. 

Aí é só importar o Nicolás Maduro…

Pode ser inútil, mas digo mesmo assim: que os senadores tenham juízo. Depois não adianta ficar choramingando quando o Supremo decidir legislar. Sabem como é…O ativismo judicial costuma ser fruto do passivismo legislativo, entendem? É aquele papo de côncavo e convexo…


Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo