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terça-feira, 3 de agosto de 2021

UMA COMBINAÇÃO SINISTRA - Percival Puggina

Neste último domingo, enquanto muitos acordavam de sua omissão e saíam às ruas para protestar contra a opacidade da apuração de votos, circulava no ambiente restrito das redes sociais a notícia de que a CPI queria bisbilhotar as contas de veículos ditos “bolsonaristas” e propagadores de “fake news” sobre tratamento precoce.

No Brasil orwelliano a estupidez zurra e distribui coices. Uma mídia que perdeu a noção de ridículo assiste às sessões da CPI serem dominadas por um grupo oposicionista escandalosamente majoritário, cuja soberba infla com o codinome G7, e no parágrafo seguinte diz que quatro dos sete são “independentes”. A razão fica à deriva num vazio moral.

No aparelho investigador instalado na Câmara Alta da República, opinião fora da narrativa esquerdista é motivo de grave suspeita. A moral de qualquer divergência é confrontada ante o mesmo espelho en que se miram os senadores Omar Aziz e Renan Calheiros. Depois das sessões de escárnio, os porcos de George Orwell falam a jornalistas sedentos de notas turvas. 

Mobilizam-se agora os senadores para quebrar o sigilo bancário de pessoas físicas responsáveis por alguns dos principais sites “de direita”, “conservadores”, que acusam de “fake news”, de promover “estratégia de confronto ideológico” e “radicalização dos ataques contra adversários”. As doces donzelas petistas e psolistas ficam escandalizadas, claro. No pacote de meios digitais que passa a ser perseguido pelo Estado se incluem veículos em que o talento, o aplauso social e o valor do trabalho prestado à nação fazem arder a inveja em grandes grupos de comunicação do país.

Como não ser assim? A sociedade aprendeu, nos últimos anos, que o veículo que lê, ouve ou assiste é perfeitamente capaz de silenciar perante a censura, bem como a ameaça e a prisão de jornalistas, se forem “de direita”. É capaz de emudecer enquanto o Supremo despedaça a Constituição, contanto que “a direita” seja atingida, o presidente obstado e a vontade social atropelada. Simultaneamente, o mesmo veículo usa vocabulário ardiloso para desqualificar as notáveis e pacíficas manifestações populares de ontem.

Não encontrei nesta segunda-feira, 2 de agosto, maior evidência daquilo que denunciei enquanto falava à multidão de bons cidadãos que lotaram a ágora porto-alegrense junto ao Parcão. Não é Bolsonaro que os incomoda; são nossos valores, nossos princípios, nossa fé, nosso amor à Pátria, nossa reverência à cultura e à Civilização Ocidental. 
É isso que não suportam. É isso que mobiliza os delfins, os ministros do TSE e do STF, os fascistas dos Antifas, os rabos presos da Câmara e do Senado, os grandes grupos de comunicação, os delfins da administração pública e os corruptos desmamados, que gemem saudades de tempos que não haverão de voltar.

O presidente da República não é odiado por si mesmo, mas por ser o escudo político-eleitoral que os contém e aparta de nós esse passado.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


quinta-feira, 28 de maio de 2020

Imprensa marrom - Carlos Alberto Sardenberg

Antigamente, era mais fácil. Havia muita diversificação entre os veículos de imprensa, mas com uma divisão principal: os independentes e os chapa-branca. Aliás, esta última expressão é ela mesma do tempo antigo. Hoje, as autoridades circulam em carros com placas de bronzeevoluíram, não é mesmo?  – ou com chapas frias. Sabem como é, o povo hoje sabe com quem está falando e muitas vezes não gosta.

[a imprensa livre, independente, investigativa é e sempre será necessária.
Se torna inconveniente, abusiva mesmo, que passa a ser repetitiva, cansativa, na tentativa - sempre vã - de impor o que pensa ser correto, de apresentar sua versão, sua interpretação, como fato.
Se necessário, procede até o fatiamento da noticia, esquartejamento mesmo, para enfiar goela abaixo, trecho por trecho, o que lhe convém.
Só que o povo, especialmente o brasileiro, não aceita - pode não saber votar, votando em coisas como lula e dilma - mas não aceita versões. Vota mal, mas interpreta fatos de versões.]

Mas voltemos ao que interessa, a imprensa. Os veículos chapa-branca eram aqueles que só existiam para fazer propaganda e/ou defender os interesses do governo, de políticos, de igrejas e de negócios setoriais. Viviam de verbas públicas ou de dinheiro colocado pelo patrocinador. A imprensa independente era aquela que vivia da notícia e, no caso da tevê, do entretenimento. Vivia no duplo sentido: tinha que ser reconhecida como tal pelo público (credibilidade) e tinha de ganhar dinheiro com venda em bancas, de assinaturas e de publicidade. A independência deveria ser editorial e econômica ao mesmo tempo. Aqui, essa imprensa independente amadureceu ao longo da vida democrática pós-1985.

Tem várias características, algumas boas, outras ruins, mas há um ponto essencial. A imprensa brasileira não é bem agressiva, é atrevida. Nem sempre foi. Tornou-se atrevida, especialmente a política,  em tempos relativamente recentes. Por exemplo: alguns anos atrás, repórteres políticos não se atreveriam a perguntar ao presidente se ele queria interferir na Polícia Federal ou melar uma investigação sobre atividades de seus filhos. Na verdade, não é que não se atreveriam, nem lhes ocorria perguntar esse tipo de coisa. Parecia normal que autoridades tivessem privilégios, incluindo as famosas mordomias.

Também não era um vício apenas nacional. Na Washington de John Kennedy, todo mundo sabia que o presidente gostava muito de mulheres e que as recebia na piscina da Casa Branca quando Jacqueline não estava por perto. Jornalistas sabiam, alguns até participavam das farras – e não publicavam nada. Ao contrário, publicava-se que se tratava de um feliz casal presidencial. Em Brasília dos anos 80 e 90, os jornalistas também sabiam das mazelas pessoais (amantes, rolos) e, digamos, profissionais dos políticos, tais como negócios paralelos. Não lhes ocorria publicar, mesmo porque muitos jornalistas desfrutavam de vantagens indevidas, como empregos no Congresso, em autarquias e estatais. Além de financiamentos especiais em bancos públicos.

A mudança forte começou a aparecer na passagem dos anos 80 para os 90. Repórteres mais novos começaram a publicar os privilégios, os bastidores, inclusive das casernas – ou seja, as informações não oficiais, não autorizadas, mas obtidas por apuração e investigação independente.
Ao mesmo tempo, desenvolveu-se o jornalismo opinativo – outro que tanto incomoda as autoridades. Para o presidente Bolsonaro e seus seguidores, ou a imprensa é a favor ou é mentirosa, canalha, lixo e tantas outras ofensas. Mas na democracia, quem decide se uma imprensa é boa ou não é o público, com sua audiência, sua leitura, seu respeito.

Essa imprensa está aí. Ainda bem. As redes sociais, claro, são uma novidade. Mas a divisão entre independência e militância de qualquer tipo é a mesma que se via na imprensa tradicional. Então, os principais veículos independentes, aqui e no mundo, estão migrando para as redes sociais. Continuam sendo a representação da imprensa livre e responsável.  Mas as redes também tornaram mais fácil o surgimento dos veículos “fake news”, que bem poderia ser a nova designação para imprensa marrom, aquela sem nenhum escrúpulo. Do mesmo modo que antes não se poderia fechar a imprensa para bloquear o lado marrom, também hoje não se pode bloquear as redes para afastar os provedores de fake news, ofensas e ameaças. Mas, atenção, liberdade de expressão não é um salvo conduto. Não pode haver censura prévia. Mas a publicação e seus autores podem ser processados, na devida forma da lei.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista