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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Cuba: agonia de uma revolução

Na ilha houve uma tentativa, uma esperança e uma pretensão que não devem ser esquecidas. Mas o sonho que encarnou a chegada do Fidel Castro ao poder há 60 anos agoniza irremediavelmente

Muitos estrangeiros compraram propriedades em nome de cubanos nos últimos anos em Havana porque ainda não é permitido que façam isso por conta própria. Os preços se multiplicaram. No bairro de Vedado, abundam as mansões e departamentos em restauração. Na zona de Miramar, existem pubs onde os únicos negros que há dentro são os seguranças: tipos grandes e musculosos como os que guardam as discotecas nova-iorquinas ou parisienses. Meses atrás fui a um desses − o Mio & Tuyo − e, quando quis chegar à área onde estavam as mulheres mais admiráveis, um desses porteiros me deteve pondo seu braço em meu ombro: “Daqui para lá é VIP”, disse-me. “Para passar, você precisa comprar uma garrafa de uísque Chivas Regal ou ser sócio do clube”, acrescentou. E eu pensei: terminou a revolução.

Pelo menos 30 movimentos guerrilheiros surgiram na América Latina desde que triunfou a revolução cubana até o fim dos anos oitenta. Hoje não resta nenhum, salvo o ELN da Colômbia, transformado em organização criminosa. A revolução − esse fantasma que hoje parece abandonar o continente − cativou os melhores políticos, artistas e intelectuais de sua época, e uma literatura esplendorosa brotou sob sua sombra. Até o cristianismo participou de seu feitiço justiceiro com a teologia da liberação. Mas essa fé hoje parece encerrar seu reinado. Dela restam, quando muito, discursos vazios, promessas e slogans que, de tanto ser repetidos sem nunca ser realizados, perderam seu sentido.


Para esses que sempre combateram a revolução, porque desde o início ela atentou contra seus interesses e os teve como inimigos declarados, sua morte é motivo de celebração. Mas lhes convém manter viva a ideia de sua ameaça, para que assim possam se apresentar como guardiães das maiorias e conservar o poder. Para aqueles que, por outro lado, acreditaram que outro mundo era possível e que a fraternidade poderia vencer o egoísmo, constatar que seus desejos alimentaram a intolerância, o abuso e a pobreza dói e tira a fala. Deve ser por isso que hoje a esquerda honesta está muda.

Os cubanos costumam discutir sobre quando a revolução perdeu seu encanto. Alguns dizem que foi no começo dos anos setenta, depois do caso Padilla, com a sovietização do chamado Quinquênio Cinza, quando até os edifícios foram projetados conforme os planos de Kruschev e se instalou o conceito de “diversionismo ideológico” para todo aquele que pensasse ou desejasse algo fora da norma estabelecida. Segundo outros, foi em 1989, com a Causa Número 1 − que terminou com o fuzilamento do general Ochoa, uma das figuras mais respeitadas da revolução − e a queda da URSS. O que veio depois, o Período Especial, os cubanos não esqueceram mais. O petróleo desapareceu e era tão curto o tempo que tinham luz elétrica que, em lugar de falar de apagões, eles falavam de alumbrones (“acesões”). Até gatos saíam à caça para comer.

Leia mais   em El Pais

 

 

sexta-feira, 2 de março de 2018

Não devemos encarar o Exército com os olhos do passado

A luta contra fantasmas
Existem várias comissões para fiscalizar a intervenção e poucas articulações para cooperar com o Exército

Outro dia, chamaram-me de general num desses blogs. Não me importo: são os mesmos de sempre, como diria um personagem de Beckett, depois de apanhar. O ponto de partida é minha visão positiva sobre o papel do Exército no Haiti. O que fazer? Estive lá duas vezes, vi com os meus olhos e ainda assim sempre consulto o maior conhecedor brasileiro do tema, Ricardo Seitenfus. Não estive com o Exército apenas no Haiti. Visitei postos avançados de fronteira da Venezuela, junto aos yanomamis, em plena selva perto da Colômbia. Vi seu trabalho na Cabeça do Cachorro, no Rio Negro, cobri o sistema de distribuição de água para milhões de pessoas no sertão do Nordeste.


Não tenho o direito de encarar o Exército com os olhos do passado, fixado no espelho retrovisor. Além de seu trabalho, conheci também as pessoas que o realizam.

Nesse momento de intervenção federal, pergunto-me se o Exercito para algumas pessoas da esquerda e mesmo alguns liberais na imprensa, ainda não é uma espécie de fantasma que marchou dos anos de chumbo até aqui, como se nada tivesse acontecido no caminho.

Alguns o identificam com o Bolsonaro. Outro engano. Certamente existem eleitores de Bolsonaro nas Forças Armadas como existem na igreja, nos bancos e universidades. Mas Bolsonaro e o Exército não são a mesma coisa. 

Existem várias comissões para fiscalizar o intervenção. Ótimo. Isso é democracia. Mas existem poucas articulações para cooperar com o Exército: isso é miopia.

Houve um certo drama porque os pobres foram fotografados por soldados. Quem dramatiza são pessoas da classe media que vivem sendo fotografadas, na portaria de prédios, na entrada de empresas. Por toda a parte alguém nos filma. Há uma lei especifica sobre identificação. É razoável discutir com base nela. Mas é inegável também que os tempos mudaram. Na Europa e nos EUA por causa do terrorismo, aqui por causa da violência urbana.

Não se trata de dizer sorria, você está sendo filmado. É desagradável e representa uma perda de liberdade em relação ao passado. Mas expressa um novo momento. O Ministro Raul Jungman tomou posse afirmando que a sociedade do Rio pede segurança durante o dia e à noite consome drogas. É uma frase muito eficaz em debates e artigos. Creio que apareceu até no filme Tropa de Elite. Na boca de um ministro, que considero competente, merece uma pequena análise. Parisienses, londrinos, paulistas e novairorquinos também consomem droga, suponho. No entanto não existem grupos armados dominando o território urbano.

Se isso é verdade não é propriamente a abstinência que tem um peso decisivo, mas sim a presença do Estado que garante uma relativa paz, apesar do consumo de drogas. Núcleos de traficantes deslocaram-se para o roubo de cargas porque o acham mais rentável. É impossivel culpar os consumidores de geladeiras e eletrodomésticos não só porque é uma prática legal. [Gabeira até que sempre vai bem - exceto em um passado já distante - mas, agora exagerou, comparar maconheiro com compradores de eletrodomésticos... ofendeu ... rsrs.] As milícias pouco se dedicam ao tráfico de drogas. Vendem segurança, botijões de gás e controlam o transporte alternativo. São forças de ocupação.

Campanhas contra o consumo de drogas, nessa emergência, têm uma eficácia limitada, apesar de suas boas intenções. Mas assim como há gente que vê um exercito fantasma, perdido nas brumas do século passado, pode ser um erro mirar no consumo de droga e perder de vista a ocupação armada do território. Uma das frases mais interessantes no Terra em Transe de Glauber Rocha é quando o personagem diz que não sabe mais quem é o inimigo. Há tantos combatendo exércitos fantasmas ou investindo contra moinhos que é sempre bom perguntar: afinal, qual é o foco?

Fernando Gabeira é jornalista e ex-deputado federal


quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

O longo braço da intolerância e da barbárie



Atentado contra jornalistas em Paris mostra que desafio é prevenir ações terroristas sem prescindir das liberdades que caracterizam o regime democrático ocidental
De um lado, a democracia ocidental, com os direitos e garantias individuais, o Estado laico, a liberdade de expressão e de imprensa capazes de produzir textos e charges críticas, irônicas, satíricas, bem-humoradas ou não.

E quem se sentir atingido tem respaldo legal para obter reparação na Justiça, se for o caso. De outro, o fundamentalismo islâmico, que se alimenta das trevas, do ódio, da barbárie, da intolerância. Quem se opuser pode ser morto impiedosamente.

Foi o que fizeram ontem atacantes encapuzados ao disparar rifles Kalashnikov numa reunião de pauta do jornal satírico “Charlie Hebdo”, em Paris, matando 12 pessoas, entre elas dez funcionários da publicação — quatro delas chargistas de renome nacional e até mundial, como Georges Wolinski, de 80 anos, e Stéphane Charbonnier, “Charb”, o editor. Pelos antecedentes — o jornal já publicou várias charges sobre o profeta Maomé, e por este motivo sua sede anterior foi destruída por uma bomba em 2011 — conclui-se que os terroristas são ligados ao fundamentalismo islâmico.

É um atentado cheio de simbolismos. Executado em Paris, coração da França, pátria das liberdades e dos direitos humanos. Contra um ícone da liberdade de imprensa, o “Charlie Hebdo”, que ousa desafiar, com a sátira e o bom humor, o fanatismo homicida do fundamentalismo islâmico. Confirma também que, a partir do Oriente Médio, o longo braço do terror pode atingir qualquer ponto do globo.

Não se trata apenas de uma questão de segurança, embora ela seja cada vez mais importante. A grande questão é como as sociedades ocidentais vão se resguardar dessa ameaça sem perder as características democráticas.  O risco é irem se fechando e acabarem também intolerantes e xenófobas. Esta será, se ocorrer, uma vitória do terrorismo. É necessário gerar instrumentos que permitam combater o extremismo, sem prejuízo das liberdades. Há algo errado quando 3 mil europeus, descendentes de muçulmanos, aderem ao Estado Islâmico (EI), maior expressão do fundamentalismo sunita, que prega o retorno à era de ouro do califado e a destruição dos valores ocidentais. Cerca de mil são franceses e muitos já voltaram ao país.

É evidente a incapacidade de a Europa Ocidental, sobretudo da França, integrar os imigrantes e descendentes à sociedade. Eles em boa parte vivem segregados, nos banlieus (subúrbios) parisienses. E constituem alvos fáceis para cooptação pelo EI e outros grupos extremistas. É preciso, portanto, que os governos convençam esses imigrantes das vantagens dos valores ocidentais sobre o fundamentalismo. Será necessário também persuadir as populações nacionais a substituir o preconceito por tolerância e acolhimento. Será mais fácil lidar com os radicais se eles estiverem isolados.

 Fonte: Editorial – O Globo