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domingo, 4 de junho de 2023

Zanin nunca vai tomar alguma decisão contra Lula, e o STF também não - O Estado de S. Paulo

J. R. Guzzo

Indicação de advogado é mais um deboche de um presidente que trata o Brasil como uma republiqueta bananeira qualquer

A indicação do advogado Cristiano Zanin para o Supremo Tribunal Federal é, além e acima de qualquer outra coisa, uma vergonha
 Deveria ser, logo de cara, uma vergonha para ele. 
Todo o mundinho oficial, parasita e subdesenvolvido que prospera em Brasília, às custas do erário público e em permanente estado de coma moral, vai fingir que não há nada de errado com mais essa aberração. Mas ele, Zanin, vai saber no fundo da alma, a cada minuto dos próximos 27 anos, que está no seu cargo unicamente porque é, ou foi, o advogado pessoal do presidente Lula e não por qualquer mérito de sua parte. 
Pode ser, é claro, que Zanin não sinta vergonha de nada e apenas diga para si próprio: “Me dei bem”. Para o Brasil e para os brasileiros, em todo caso, é uma humilhação. 
Em que país sério do mundo o presidente nomeia o seu próprio advogado para a Corte Suprema de Justiça? Em nenhum. Isso é coisa de Idi Amin, ou de alguma dessas ditaduras primitivas que desgraçam o quinto mundo, da Venezuela à Nicarágua, e que encantam cada vez mais o presidente da República.

É possível, humanamente, esperar que o novo ministro seja imparcial em alguma decisão que tome a respeito de quem até outro dia era o seu patrão? É claro que não. Se o Brasil tivesse um Senado, a quem cabe aprovar ou rejeitar a indicação, Zanin não iria resistir a quinze minutos de sabatina – seu nome, aliás, nem seria enviado para consideração

Mas o Brasil não tem Senado nenhum. O que tem é um escritório de despachantes a serviço do governo que aprova tudo o que Palácio do Planalto manda fazer. Vai ser apenas mais um espetáculo de hipocrisia, em que os senadores vão fingir que perguntam e o nomeado vai fingir que responde
Todo mundo, incluindo-se aí a maior parte da mídia e toda a elite que manda no País, vai fazer de conta que as “instituições” funcionaram mais uma vez e o caso fica resolvido. Pronto: Zanin estará no STF até o ano de 2050, quando não vão mais existir Lula, nem o seu governo e nem o mundo político como ele é hoje.
A influência de Zanin no conjunto do STF, em termos aritméticos, será de três vezes zero. Lula já tem ali, hoje, uma maioria infalível de 8 votos a 2; com Zanin, passará a ter de 9 a 2. 
Qual a diferença, na hora da votação? 
O STF já tirou Lula da cadeia, onde cumpria pena por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, alegando que o CEP do seu o processo estava errado. Anulou as quatro ações penais que havia contra ele – e, com isso, fez sumir a sua ficha suja. 
Mais que tudo, através dos serviços do TSE, colocou Lula na Presidência da República. 
Não foi preciso ter nenhum Zanin para isso. Também não será preciso daqui para a frente. O STF, há muito tempo, deixou de ser um tribunal de justiça e se transformou numa seita política que trabalha para Lula e para o sistema de interesses em torno dele atende a todas as suas exigências e persegue todos os seus adversários, numa espécie de sociedade de assistência mútua onde uma parte se serve da outra e, ao mesmo tempo, é servida por ela. 
O Congresso ou alguma lei estão atrapalhando o governo? Nenhum problema. Manda tudo para o Supremo, seja lá o que for, e os ministros resolvem. Zanin vai ser apenas um voto a mais nessa farsa.
 
O novo ministro, cujo escritório recebeu R$ 1,2 milhão do PT durante a campanha eleitoral de 2022, fora o que já havia ganho antes para cuidar da sua defesa, nunca vai tomar alguma decisão contra Lula.  
O STF também não – com ou sem Zanin no plenário. 
Sua nomeação, na verdade, acaba sendo apenas mais um deboche por parte de um presidente da República que trata o Brasil, cada vez mais, como uma republiqueta bananeira qualquer.

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo


sábado, 18 de fevereiro de 2023

Jogando no tumulto - J. R. Guzzo

Revista Oeste

 O Banco Central é a única coisa da administração federal em que Lula não manda, e ele não se conforma que seja assim

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central | Foto: Montagem Revista Oeste/Wikimedia Commons/Raphael Ribeiro/BCB 

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central | Foto: Montagem Revista Oeste/Wikimedia Commons/Raphael Ribeiro/BCB

A guerra enraivecida que o presidente Lula faz neste momento contra o Banco Central é um escândalo a céu aberto. 
Lula, para se falar português claro e na ordem direta, está agindo para destruir as instituições, essas mesmas instituições tão sagradas para o Supremo, o Congresso e tanta gente mais — pois, queiram ou não queiram, o Banco Central é uma instituição brasileira, encarregada de cuidar da estabilidade da moeda nacional e independente do Poder Executivo por força de lei. A moeda é um bem público; não pertence, como Lula está querendo, aos que mandam no governo, e muito menos a ele. 
Tem de estar protegida de interesses políticos, ideológicos e pessoais — de novo, tudo o que Lula não quer. A autonomia do Banco Central não é um capricho da “direita”, uma exigência do “mercado” ou uma invenção de Jair Bolsonaro para agradar os “ricos”. É uma peça institucional do Estado e uma conquista do povo brasileiro — em vez de ficar com o valor do seu dinheiro entregue aos desejos do presidente da República, o cidadão tem o seu patrimônio material resguardado por um órgão independente, que não presta obediência à política e nem serve à demagogia dos políticos
Lula, o PT e a esquerda querem acabar com isso.
O presidente, em sua ira, não está manifestando uma discordância quanto à política de juros, ou a outras questões de gestão econômica que fazem parte das tarefas legais do Banco Central. Também não está, como diz hipocritamente o seu Sistema, “propondo um debate” sobre o assunto. Está dizendo, simplesmente, que uma instituição brasileira deve ser eliminada — ou ser amputada de sua característica mais importante, o que dá exatamente na mesma. 
Segundo o Supremo, e segundo repetem todos os dias as diversas polícias ideológicas de seu governo, isso é proibido
não se pode agredir as “instituições”, nem pregar “animosidade” contra elas. Mas Lula não apenas faz as duas coisas, como espalha ódio e distribui insultos a quem discorda de sua posição. 
 
Acusa o Banco Central de causar a miséria no Brasil. Diz que a autonomia é “uma bobagem”. Chamou o presidente do banco, que jamais lhe fez mal algum, de “esse cidadão”. Que raio de “debate” existe nisso tudo? Seu Ministério da Verdade acusaria de espalhar fake news, ou no mínimo de “desinformação”, quem dissesse que o órgão encarregado da estabilidade da moeda é responsável pela pobreza — ou pela política econômica. 
E que tal dizer, por exemplo, que a autonomia da justiça é uma “bobagem”? Na mesma linha: por que Lula não chama a atual presidente do STF de “essa cidadã”?
Onde está a valentia que exibe contra adversários que não podem se defender?

Lula está pouco se lixando para os pobres. Quer um governo que distribua dinheiro barato para os amigos e compre a sua permanência no poder

O Banco Central, no momento, é a única coisa da administração federal que funciona com alguma racionalidade e competência; é por isso, e por nenhuma outra razão, que a inflação fechou 2022 abaixo dos 6% ao ano e continua sob controle. 
Também é a única em que Lula não manda, e ele não se conforma que seja assim. 
Como um sultão africano ou um ditadorzinho bananeiro, quer mandar em tudo. Mais: quer mandar já. O mandato do atual presidente termina daqui a dois anos, e aí Lula vai poder nomear quem quiser, mas ele não quer esperar até lá; exige um Banco Central que obedeça de imediato às suas ordens. Em condições normais, um chefe de governo sério estaria agradecendo a política monetária que mantém a taxa de juros em 13,75% ao ano — o que é muito impopular, mas contém a alta de preços e a degradação do real. 
Mas as condições não são normais, e nem o chefe de governo é sério. Lula e o seu entorno mais escuro acham que país sem inflação é “país de direita” ou de “ricos” algo tão estúpido quanto objetivamente falso. É o exato contrário
A maior vítima da inflação e a primeira a sentir os seus efeitos é a população pobre, que vê o pouco dinheiro que tem no bolso perder o valor e não dispõe de meios para se defender disso. E daí? Lula está pouco se lixando para os pobres. Quer um governo que distribua dinheiro barato para os amigos e compre a sua permanência no poder. O resto que se exploda. 
 
Lula e a esquerda insistem em dizer que o presidente do Banco Central não foi eleito por ninguém; não poderia, portanto, mandar em nada. É um argumento cretino. Os ministros do STF também não são eleitos, e ninguém está exigindo que eles deixem de ter autonomia. E então: Lula vai dizer que o ministro Alexandre de Moraes não pode tomar as decisões que toma? Ou vai se esconder alegando que o Supremo é “diferente?” 
O Supremo não é diferente — é o que a lei diz que ele deve ser. 
O Banco Central também não é diferente de coisa nenhuma. 
Tem independência em relação ao governo porque a lei brasileira diz que tem de ser assim. Essa lei foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República em 2021. Em agosto de 2021, por 8 votos a 2, o STF decidiu que ela é constitucional. 
 
Qual é, então, o problema? O problema é que Lula, desde o seu primeiro dia no governo, joga tudo na promoção do tumulto — e dos seus interesses pessoais, que ele julga favorecidos pelo tumulto que cria. Essa desordem, por sinal, é um dos principais motivos para que os juros não baixem. Lula, de propósito, faz declarações abertamente irresponsáveis sobre a economia — quando não são feitas por ele, essas agressões vêm da incompetência primitiva da sua “equipe econômica”, ou da treva pura hoje instalada na direção do PT.  
A inflação, naturalmente, já estaria a caminho da disparada, com a campanha destrutiva feita pelo presidente e por seu Sistema contra a estabilidade da economia brasileira. 
É para segurar, na medida do possível, a alta de preços e a desvalorização do real que “esse cidadão” mantém os juros nos 13,75%. (Outro dos seus graves delitos, para o PT e a mídia, é a suspeita de que votou nas últimas eleições vestindo uma camiseta com as cores verde e amarela da bandeira nacional.)
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante sessão
solene do Congresso Nacional que comemorou os 130 anos 
de atividade do Tribunal de Contas da União, 
Brasília (DF), 15/2/2023 | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Lula não tem um projeto de governo para o Brasil. Tem um plano de destruição de tudo aquilo que veio antes dele — não só do governo Bolsonaro, mas também do governo Michel Temer e do que sobrou dos governos de Fernando Henrique.  

O Banco Central faz parte desse plano, mesmo porque uma de suas funções é cuidar dos US$ 320 bilhões das reservas internacionais do Brasil. Eis aí uma questão-chave do projeto de demolição geral — Lula quer doar parte desses bilhões para as suas ditaduras amigas de Cuba, Venezuela, Nicarágua etc., e para isso precisa de algum haddad ou mercadante prestando obediência a ele no comando do Banco Central.  
O presidente parece não se importar com o que a opinião pública acha disso, ou do fato de que a única obra do seu governo é um gasoduto na Argentina, ou de morar com dinheiro do pagador de impostos num hotel de luxo, porque acha que o Palácio da Alvorada não é adequado para as exigências do seu conforto. 
Por razões ancoradas nos julgamentos políticos que faz hoje, Lula acredita que só tem a ganhar com um Brasil em estado de desmanche; fica mais agressivo sempre que se formam situações difíceis, e estima que a agressividade joga a favor da sua manutenção no poder
O Banco Central é um elemento fundamental para um país que queira viver em ordem, dentro da normalidade e com respeito à lei. 
Não serve para o plano-mestre do presidente da República — ou para algo que dá toda a impressão de ser isso.

Leia também “Um governo de más notícias”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste


sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Como levar a sério quem diz que vai acabar com a fome - J. R. Guzzo

 VOZES - Gazeta do Povo

Uma das principais características da eleição presidencial de 2022 é a ausência absoluta, por parte dos políticos e das suas aglomerações, de qualquer coisa que possa parecer com uma ideia. Tudo bem: política, como é do conhecimento geral, sempre tem muito mais a ver com interesses do que com princípios. Não dá para exigir seriedade de ninguém numa campanha eleitoral, não é mesmo? Mas dessa vez a politicalha brasileira está indo ainda mais longe do que costuma ir em matéria de descaso pelo eleitor. É uma genuína história de superação.

A menos de um ano da eleição, não existe o mais remoto vestígio de que algum dos candidatos saiba responder à pergunta mais simples que o eleitor tem para fazer: por que você quer ser o próximo presidente da República? 
Há alguma razão lógica para eu votar em você? 
O que eu vou ganhar de útil se você for eleito presidente? É claro que eles têm na ponta da língua um palavrório que não acaba mais para dizer qual o Brasil que querem – só que, na prática, não adianta nada, pois é tudo mentira.

O único Brasil que os políticos brasileiros querem é o Brasil que seja melhor para eles – ou, mais exatamente, para eles, seus amigos e os amigos dos amigos. Dá para levar a sério um cidadão que diz que o seu grande propósito, como futuro presidente, é “acabar com a fome” no país? E os que prometem “democracia”? Ou “progresso”, “honestidade”, “justiça”, etc.? Ou levar o Brasil para “o centro?” A coisa vai daí para baixo. Não é que os candidatos não tenham um programa de governo que faça algum sentido. Eles não têm sequer uma sugestão decente a respeito do que deve ser feito.

No fim vai acabar sendo um torneio entre governo e gente que quer ir para o governo. O resto é conversa para encher noticiário político.

J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES