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quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Um Brasil politicamente incorreto




A agenda do século XXI cai mal num país que não resolveu a do XX e, em alguns aspectos, nem a do XIX


Duas informações trazidas pelo Datafolha podem ser úteis para que se conheça melhor o país que neste ano elegerá o presidente da República, 27 governadores, a Câmara dos Deputados e dois terços do Senado.  Mais da metade dos entrevistados (57%) disseram que as mulheres que fazem aborto devem ir para a cadeia e dois terços (66%) são contra a legalização do consumo de maconha.

Outra pesquisa, do Ibope, informa que 49% de seus entrevistados declararam-se a favor da pena de morte. (Enquanto nos dois outros itens a pesquisa indica que a oposição caiu, neste os defensores da pena de morte aumentaram, pois em 2011 estavam em 31%.)
De pouco adianta adjetivar essas opiniões. A questão é substantiva: a banda do país que ainda vive os problemas do século XX e, em certos casos, os do XIX, está blindada em relação a alguns temas da agenda do XXI. Não faz o gênero politicamente correto. [a maioria do povo brasileiro repudia o maldito politicamente correto.]
 
A descriminalização da maconha é um tema da agenda do XXI. Já o direito das mulheres ao aborto foi tema do XX, ainda divide a sociedade americana e prevaleceu em dezenas de países.
E os temas do XIX?
Estão diante dos olhos de todos os brasileiros quando leem ou ouvem que a polícia subiu um morro e matou “dois suspeitos”. Suspeitos de quê? Em 1835 o ministro da Justiça falava de “uma população sempre perigosa”. Eram os negros livres. Há um Brasil que é pouco ouvido e mal entendido, mas que está aí, não poderá se mudar para Miami, e em outubro irá às urnas. 53% dos entrevistados com renda superior a dez salários mínimos defendem a legalização da maconha e 70% querem a descriminalização do aborto.

Na turma que anda de ônibus (até dois salários mínimos), o quadro inverte-se e só 26% concordam com as duas propostas. Moralista, essa faixa da população é a mais afetada pelo que resta da agenda do XIX. [nesta ocasião temos que dizer, FELIZMENTE, a turma que anda de ônibus é bem mais numerosa, portanto, o aborto continuará sendo crime - a sociedade de bem esperado que com penas mais severas para a mãe assassina e para todos que de alguma forma contribuam para o crime hediondo que é matar um ser humano inocente e indefeso e ainda na barriga da mãe (?) - e a maconha continuará sendo ilegal e se espera que não só tráfico seja punido com penas mais severas e sim também o chamado usuário - que é o responsável maior pelo tráfico e deve ser punida com todo o rigor.]
 
Ela associa o cheiro da maconha à bandidagem e quer a sua ordem porque mal consegue viver na desordem que lhe é imposta. Veja-se o caso do teleférico do Morro do Alemão, no Rio. Foi vendido como se fosse uma obra do século XXI. A doutora Christine Lagarde, do FMI, andou nele e sentiu-se nos Alpes.  Se o bondinho do Pão de Açúcar ficar parado um só dia, o Brasil do XXI gritará. O teleférico do Alemão está parado há mais de um ano, mas sua clientela está na agenda do XIX. (Em 2012, o teleférico transportava 10 mil passageiros por dia, o bondinho transporta 2.500).

Nos últimos meses o Rio teve mais manifestações a favor da liberação da maconha do que pela liberação do teleférico. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas as duas querem dizer alguma coisa. No mínimo, que é mais confortável batalhar pela agenda do XXI do que reconhecer que a do XIX continua aí.  Os números do Datafolha e do Ibope apontam para um país que é de bom tom fingir-se que não existe. É a síndrome da Passeata dos Cem Mil, cujo cinquentenário comemora-se em junho. Foi um momento de esplendor da vontade popular, mas deu em rigorosamente nada. Uma imagem da multidão que marchou pela Avenida Rio Branco tinha uma peculiaridade. Nela só havia um negro, o petroleiro Twist. (Fora da lente do fotógrafo Evandro Teixeira, havia outros. Gilberto Gil, por exemplo, na comissão de frente.)

Elio Gaspari, jornalista - Blog do Noblat - O Globo
 

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Balança comercial fecha 2017 com saldo recorde de US$ 67 bilhões



É o melhor resultado desde o início da série histórica, em 1989. Em dezembro, superávit foi de US$ 4,998

A balança comercial brasileira fechou 2017 com saldo recorde de US$ 67,001 bilhões. No ano passado, o país importou US$ 150,745 bilhões e exportou US$ 217,746 bilhões. Em dezembro, o comércio exterior registrou saldo positivo de US$ 4,998 bilhões, quando as compras externas somaram US$ 12,598 bilhões e as vendas, US$ 17,595 bilhões, segundo dados consolidados divulgados pelo Indústria, Comércio Exterior e Serviços nesta terça-feira. Esse é o melhor resultado desde o início da série histórica, em 1989.



Porto do Rio de Janeiro - Importação e exportação de produtos - balança comercial - Fábio Rossi / Agência O Globo


A nova meta do governo para o saldo da balança comercial em 2018 é de um superávit de US$ 50 bilhões — abaixo do valor obtido em 2017, porque a expectativa é que a retomada da atividade econômica vá resultar em aumento das importações superior às exportações.  Em 2016, o saldo da balança foi de US$ 47,683 bilhões (de acordo com dados ajustados). A estimativa do governo era atingir um saldo entre US$ 65 bilhões e US$ 70 bilhões em 2017.

O resultado do comércio exterior brasileiro foi favorecido principalmente pela exportação de produtos básicos, que subiram 35,5% na comparação com o ano anterior (especialmente milho, soja, petróleo e carne bovina). Os manufaturados responderam por uma alta de 14,7% e os semimanufaturados, por 8,8%. Segundo o secretário de Comércio Exterior, Abrão Neto, a expectativa é que esse desempenho se repita em 2018, sobretudo as commodities minerais. Abrão, no entanto, explicou que os produtos manufaturados e semimanufaturados ainda representam a maioria da pauta exportadora (51%), enquanto os básicos tem uma participação de 46,4%. Em 2017, as exportações subiram 18,5% na comparação com o registrado em 2016 e as importações tiveram alta de 10,5%. Com isso, a corrente de comércio atingiu US$ 368,5 bilhões — cifra 15,1% acima do obtido no ano anterior.

‘CRESCIMENTO EXTRAORDINÁRIO’, DIZ MINISTRO
Ao divulgar os dados do comércio exterior, o ministro da Indústria, Marcos Pereira, destacou que as exportações cresceram em 2017 após cinco anos de resultados ruins. O mesmo ocorreu com as importações que voltaram a subir, depois de três anos de queda. Segundo o ministro, o desempenho reforça a retomada da atividade econômica. — É um crescimento extraordinário e mostra a retomada da economia — disse o ministro, acrescentando que houve aumento do volume exportado e também dos preços dos produtos.

O secretário de Comércio Exterior disse que o o saldo da balança comercial projetado para este ano será o segundo melhor resultado da série histórica - abaixo apenas do valor registrado em 2017. — Nós esperamos um crescimento pelo segundo ano consecutivo da corrente de comércio, com aumento das exportações e das importações, em valores superiores aos obtidos nos últimos três anos — avaliou Abrão Neto.

O Globo

 

Presídio em GO: 5 agentes faziam segurança de 768 detentos na hora do motim

Nove presos morreram, sendo que dois foram decapitados e, os demais, carbonizados; 14 ficaram feridos e as forças de segurança procuram 99 foragidos

 

No momento em que ocorreu a rebelião no presídio de Aparecida de Goiânia (GO)na segunda-feira (1º/1), apenas cinco agentes penitenciários faziam a segurança de 768 detentos. O Superintendente Executivo de Administração Penitenciária, tenente-coronel Newton Castilho afirmou, em coletiva de imprensa, que o número é baixo, mas "era o que tinha". Segundo ele, o ideal seria um profissional para cada cinco presos. Um projeto que convoca 1,6 mil vigilantes temporários estava parado na justiça, mas devido à situação emergencial deve ser liberado nas próximas semanas. "Os problemas existem e precisam ser enfrentados."
 
Na ocasião, presos que estavam na ala C invadiram as alas A, B e D, e houve confronto. Nove pessoas morreram, sendo que dois presos foram decapitados e os demais, carbonizados. Outros 14 ficaram feridos. As forças de segurança ainda procuram  99 detentos foragidos, e 153 presos foram transferidos para outras unidades do estado. "O que ja deu uma desafogada na questão da superlotação carcerária", apontou Newton. A penitenciária tem capacidade para 530. 

A barbárie ainda poderia ser maior, uma vez que encarcerados que trabalham fora estavam em horário de serviço. Os que se encontravam na unidade no momento da rebelião são chamados de bloqueados, pois progrediram do regime fechado para o semiaberto, mas não comprovaram vínculo empregatício e, por isso, não possuem permissão para sair. Segundo informações iniciais, motivo da rebelião seria a má condição que os detentos vivem, incluindo problemas na qualidade da comida, falta de água e de luz. Newton Castilho desmentiu a situação. "O que eles comem é um serviço terceirizado e tem um cardápio previsto por nutricionistas. Às vezes não tem aquela variedade".

Os corpos dos detentos que morreram ainda não foram liberados, nem identificados, pois muitos foram carbonizados. De acordo com Castilho, a identificação dos foragidos deve ser concluída ainda nesta terça-feira (2/1). 
 
 
Correio Braziliense

 

O ano da indefinição

A diferença técnica entre a eleição deste ano e a de 1989 é que a de agora será “casada”, isto é, estarão em jogo, além da Presidência da República, todos os governos estaduais, 2/3 do Senado e a totalidade da Câmara. Em 1989, disputava-se apenas a Presidência da República, numa eleição “solteira”, o que dava mais força às individualidades dos candidatos do que ao esquema partidário que os apoiava.

Há ainda uma diferença fundamental, como destacou o cientista político Bolívar Lamounier em entrevista à edição brasileira do “El País”: a mediocridade dos candidatos à vista. Na eleição que acabou elegendo Collor à Presidência, praticamente todas as grandes lideranças políticas do país estavam na disputa.  Collor acabou derrotando todos eles, numa disputa entre o populismo de direita que representava e o populismo de esquerda com Brizola e Lula, que terminou indo para o segundo turno. Hoje, pelas pesquisas de opinião, continuam polarizando a disputa presidencial os populismo de esquerda, na figura do ex-presidente Lula, e o de direita com o deputado federal Jair Bolsonaro.

O momento de decadência moral e crise econômica que vivemos é propício a candidatos populistas e radicais, e, além de não termos material humano, é por isso que está difícil surgir um candidato centrista que empolgue o eleitorado. O último exemplo que tivemos de um presidente eleito sem ser populista e derrotando um populista foi Fernando Henrique Cardoso, que venceu Lula duas vezes no primeiro turno. Mas o que o transformou em um candidato vencedor não foi seu estilo de fazer política, mas o Plano Real, que acabou com a hiperinflação e deu ao eleitor de todas as classes o alívio no bolso e o orgulho de ser brasileiro, diante do fato de que o real passou a valer mais do que o dólar. Nada mais popular do que permitir ao povo ter uma melhoria imediata de vida e uma moeda valorizada. Não foi à toa que o povo abanava cédulas de real nos comícios, festejando aquele identificado como seu criador.

Uma melhoria de vida tão imediata geralmente acontece com medidas populistas, como o Bolsa Família que alavancou o lulismo. Também o Plano Cruzado permitiu que o então grupo político do presidente Sarney vencesse as eleições em 1986 na maioria dos estados brasileiros, quando o PMDB elegeu quase todos os governadores, a maioria dos senadores e dos 260 deputados (53,3% da Câmara na época). Ao contrário do Plano Real, que cuidou também do equilíbrio fiscal, tanto que criou a Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000, o cruzado explodiu logo depois da vitória na eleição, pois o governo Sarney não quis fazer os ajustes necessários, mas impopulares.

Há um comentário registrado na História de que, num país tão desigual quanto o Brasil, Getulio sempre vencerá o Brigadeiro, referência às duas derrotas que Eduardo Gomes sofreu, uma para Dutra, candidato de Getulio, e outra para o próprio Getulio. Um dos desafios do presidente Michel Temer será chegar à eleição deste ano sem ser o grande alvo de todos os candidatos, como aconteceu com Sarney em 1989. Ele joga tudo na melhora da economia, com as pessoas sentindo o efeito no bolso, o desemprego menor, para ter um candidato que defenda o governo.

Alguns dizem até que ele mesmo pode ser o candidato, o que é muito mais difícil. Nada indica que a melhoria da economia, prevista pelos analistas, seja tão forte que transforme o governo impopular de Temer num ativo eleitoral capaz de neutralizar a ânsia da população por um presidente “salvador da pátria”, que Lula e Bolsonaro hoje representam, por razões distintas.  O ex-presidente promete a volta dos bons tempos de prosperidade, que nem foram tão prósperos assim, mas, diante do crescimento medíocre dos governos anteriores do PSDB e da catástrofe que foi o governo Dilma, parecem uma miragem. Mas, como toda miragem, esta promessa de “volta para o futuro” é apenas uma retórica populista. Já Bolsonaro, populista de direita, promete resolver a questão da Segurança Pública, uma praga de nossos tempos, se apresenta como um raro político não envolvido na Lava-Jato e alimenta a volta dos militares ao poder, desta vez por meio do voto popular, como se essa fosse a solução para nossos males.

O mais grave de tudo é que, a essa altura, não se sabe quem será mesmo candidato à Presidência. Dia 24 começa a se definir a situação de Lula. O PT, depois de uma batalha jurídica, terá de indicar outro candidato ou, menos provável, apoiar alguém já lançado, como Ciro Gomes do PDT. As pesquisas mostram que, com a saída de Lula, quem ganha mais é Marina Silva e o próprio Bolsonaro. Geraldo Alckmin terá de mostrar força nas pesquisas, com o risco de ser superado dentro do próprio partido por incapacidade eleitoral. Não é à toa que Luciano Huck parece querer voltar ao páreo. Até abril o cenário pode mudar, com a entrada de nomes como o do ex-ministro do STF Joaquim Barbosa ou outro qualquer. [Joaquim Barbosa, o homem dos pré: pré-candidato a pré-candidato já entra derrotado.
 
Merval Pereira, jornalista - O Globo

Achamos que foi FHC quem induziu Dilma a “fazer o diabo” para ganhar uma eleição, já que ele “fez o diabo” para aprovar a reeleição; mas, concordamos quando ele coloca Lula no seu devido e insignificante lugar

País não vai tremer se Lula for condenado, avalia FHC


A seguir, parte da entrevista do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso concedida ao jornal O Estado de S. Paulo.

[a qualidade que não podemos deixar de reconhecer em FHC é a de ter vencido Lula duas vezes e no primeiro turno.]

Como o sr. explica o fato de o Lula liderar as pesquisas?
Pega o caso do Peru, que nós citamos. O fujimorismo é a força predominante até hoje, e o Fujimori está na cadeia (estava até o dia 24, quando recebeu indulto humanitário do atual presidente Pedro Pablo Kuczynski). O próprio Perón teve um momento assim. É curioso ver que em países como os nossos, com um nível educacional relativamente pouco desenvolvido, as pessoas têm muitas carências. Aqueles que dão às pessoas a sensação de que atenderam às suas carências ganham uma certa permissão para se desviar da ética. É pavoroso, mas é assim. É populismo. É a cultura que prevalece nesses países. A nossa está em fase de mudança. Aqui a sociedade já tem mais informação. Nos regimes parlamentaristas têm menos chance de que isso aconteça. Tem mais filtros. A emoção global não leva de roldão. Pode alguém irromper, mas difícil é governar depois.

O senhor disse que o PSDB precisa fazer autocrítica. Qual seria?
Acho que o PSDB está, à sua maneira, fazendo. Mudou a direção e, ao mudar, escolheu pessoas com responsabilidade. Não que os outros não tivessem. Aécio (Neves, senador por Minas Gerais e ex-presidente do PSDB) não é um irresponsável. Fez coisas positivas para o PSDB. Mas o partido tem que dizer que, se houve erro de algum peessedebista, problema dele. O partido não tem que se solidarizar com o erro de seus filiados. A Lava Jato foi um marco importante na vida brasileira, o que não quer dizer que não tenha excessos aqui e ali. Acho um pouco exagerada essa vontade de vingança que existe hoje.

Além do caso da JBS, que envolve o Aécio, o partido ainda enfrenta, mais recentemente, os impactos do acordo de leniência da Camargo Corrêa e da Odebrecht, na qual ambas as empresas reconhecem cartel em obras nos governos tucanos em São Paulo. Qual o tamanho da avaria no caso do PSDB?
Esse é o ponto. A Lava Jato demonstrou ao País, e isso deixou todo mundo horrorizado, que aqui se montou um sistema de poder político baseado na propina. Não é só uma questão de fulano ou beltrano roubou. É muito mais grave do que isso. As instituições ficaram comprometidas. O PSDB não participou desse sistema nem em São Paulo. No caso de São Paulo, se houve algum malfeito no Rodoanel (uma das obras em investigação – teria havido cartel para linhas de metrô também), não foi o PSDB que fez ou o governador que organizou.
Aqui não se organizou esquema. Não tem um tesoureiro do PSDB que pegou dinheiro. Houve um cartel, mas contra o governo.

Há uma crítica recorrente que as denúncias de corrupção em São Paulo não recebem o mesmo tratamento do que em outros Estados ou no plano federal.
Teve processo em São Paulo. Talvez não tenha produzido o mesmo auê, ou escândalo, talvez por isso: não conseguem envolver o núcleo político e porque não tem a bênção do governo. 

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Lula é o establishment

Leio com perplexidade análises que projetam no dia 24 de janeirodata estabelecida para o julgamento de Lula em segunda instância a solução do problema em que consiste o ex-presidente. Problema que, diga-se, a parcela do Brasil que, por exemplo, beatificou Cármen Lúcia criou (recriou) para todo o país, ao endossar bovinamente o enredo — escrito por Janot e seus meninos, e editado por Fachin — que criminalizou a atividade política e que, afinal, igualou a ação corrupta de grupos em busca de enriquecimento individual ao projeto autoritário de assalto ao Estado para permanência no poder, de captura da máquina pública para financiar a estrutura do partido, promovido pelo PT. Deu no que deu. Se rastejam todos os políticos na mesma lama, ora: aí se revitaliza aquele do qual o brasileiro se lembra, aquele experimentado, sob cujo governo dane-se que origem da crise em que ainda nos afogamos havia emprego e crédito fartos etc. 

Se são todos igualmente bandidos, Lula é o mais antigo e conhecido espécie de segurança na hora de escolher um entre os marginais. Para ele, a lama é medicinal. E aí? O homem, carta fora do baralho em 2016, é hoje o melhor produto do jacobinismo de extração janotista, reerguido pela sanha dos justiceiros cuja estupidez agora faz de um Roberto Barroso — o Gilmar do mensalão — o herói na luta contra a impunidade. Parabéns! Essa é a caça às bruxas em decorrência da qual Lula ganhou de presente um discurso até para falar novamente em golpe: o de que derrubaram o governo popular para pôr no lugar um — segundo a narrativa da facção mais influente do Ministério Público — ainda mais criminoso.

Com esse texto sob medida para palanque, e com a fibra político-eleitoral que a ideia de resistência vende, ademais num ambiente conflagrado por tática desenhada pelo próprio “perseguido”, como supor que mais um julgamento — não importa em que instância — possa frear uma campanha que há meses testa limites e prospera? Como, aliás, não supor que a provável nova condenação não seja mais combustível à estratégia — fundamentada em vitimização e politização das ações judiciais — que o ex-presidente concebeu para si?

Faz tempo que o “problema Lula” deixou de ser matéria de tribunal. Daí meu assombro ante a expectativa de que a decisão de 24 de janeiro possa significar revés para o ex-presidente; de que a chancela do TRF-4 à sua condenação por Moro tenha a mais mínima chance de tirá-lo do jogo e clarear o tabuleiro de 2018. É como se não fosse talvez mesmo o oposto: mais uma etapa no projeto de judicialização do processo eleitoral, esse em que Lula investe para tentar se impor formalização de candidatura adentro, mas do qual sairá candidato mesmo que não possa ser.

Alguém duvida de que já nos confinamos a um pleito em que porção relevante do eleitoradotanto maior quanto mais próximo do dia 7 de outubro Lula for impedido de disputar — votará em desagravo a um cidadão legalmente culpado? [ menos de 20% pode sere considerada parcela relevante do eleitorado? NUNCA.] De que a eleição do próximo presidente será em parte um plebiscito sobre a tal injustiça cometida contra Lula?

Este é o Brasil: país em que um indivíduo condenado pela Justiça lidera todas as pesquisas, sujeito cuja eventual (improvável) prisão representaria força eleitoral poderosa a ponto de lhe recuperar a capacidade de transferir votos como para Dilma Rousseff. [lidera com um percentual bem inferior ao dos que o rejeitam; já o, por enquanto, segundo, tem um percentual de rejeição bem inferior ao do coisa ruim de Garanhuns.] Eis um ponto relevante — a força de Lula para levantar outro poste. As mesmas pesquisas indicam que — embora ainda considerável — já não é a mesma. É verdade. Mas verdadeiro também é que, uma vez sem Lula, o PT não terá candidato — a ser de todo construído — como Dilma. Jaques Wagner, por exemplo. Um político profissional, que governou a Bahia por dois mandatos e cuja proeminência eleitoral no Nordeste pode compensar fração da perda de alcance do ex-presidente para terceirizar votos. Que o leitor não se iluda: o candidato do PT — Lula ou não — estará no segundo turno. Lula ou não, Lula será.

Há mais a ser considerado.  Não são poucos os agentes políticos inclusive adversários — que torcem (trabalham) por Lula em 2018. Não para que vença a eleição (se acontecer, porém, paciência); mas a que chegue a outubro livre para disputá-la. O que está na mesa é a conservação do sistema; circunstância em que pouco interessará a saúde do país. Convém atentar para a agenda tanto do STF — principal garantidor da insegurança jurídica no Brasil — quanto do TSE. Não é só a presumível revisão da jurisprudência que hoje autoriza o cumprimento de pena após condenação em segunda instância; mas também a possibilidade de que se afrouxem os critérios de inelegibilidade definidos na lei da Ficha Limpa. [tudo é possível; mas, a mais recente decisão do Supremo sobre a Lei da Ficha Limpa foi a de que a mesma retroaja, o que não combina com afrouxamento de critérios. 

E a revisão da jurisprudência sobre o cumprimento da pena após confirmada em segunda instância é por enquanto apenas uma hipótese.]

Lula é a força em função da qual todos os atores políticos se organizam: a âncora de previsibilidade eleitoral, que confere memória à disputa e interdita brechas à ascensão de outsiders. Mas não somente; pois também é o termômetro que afere a temperatura da Lava-Jato. O cálculo sobre sua sobrevivência é ciência exata: se, com tudo que corre contra si, condenado em primeira instância, sentença virtualmente confirmada em segunda, sujeito a ser ainda (provavelmente neste ano) apenado no processo relativo ao sítio de Atibaia, conseguir concorrer à Presidência, terá sido porque a operação fracassou. O raciocínio consequente é óbvio: se ele — ainda que derrotado nas urnas — vencer, ninguém mais cairá. [o SE que segue aos dois pontos acima e o SE que antecede o ele, são a garantia de que Lula está morto e sepultado politicamente.]

Lula é o indulto de Natal do establishment projetado para 2018.


Carlos Andreazza - O Globo