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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Encontro de poderes

A presidente Dilma fez bem em ir ao Congresso apresentar sua mensagem para o novo ano legislativo. Aliás, o que não faz sentido é o ritual brasileiro em que o ministro da Casa Civil entrega um discurso do presidente. Muito melhor é o do presidencialismo americano, em que o chefe do governo vai ao Congresso, faz seu balanço e fala de projetos.

As vaias contra a CPMF foram menos importante do que o ato em si de a presidente ir ao Congresso, que foi a proposta do ex-ministro Delfim Netto. Ela foi e falou sobre algumas reformas necessárias, mas gastou muito mais tempo em, de novo, elogiar o próprio governo com fatos e números que se distanciam da realidade. A oportunidade poderia ter sido mais bem aproveitada.

Este vai ser um ano difícil no conflito entre os dois poderes, como foi o ano passado. O governo está contando com receitas que dependem de aprovação de medidas controversas, como a CPMF. E o mais importante, este será o ano da tramitação do pedido de impeachment, o que vai elevar muito a tensão entre Congresso e executivo. Isso é mais um motivo que prova o acerto da presidente de ter ido ler a sua mensagem neste segundo ano da 55ª legislatura.

Nesta época de aperto de todos os cofres, ela lembrou que a CPMF terá uma parte para os estados. E para contornar a dificuldade de aprovar a DRU (Desvinculação de Receitas da União) ela disse que o governo proporá a mesma desvinculação para estados e municípios. Não chegou a sugerir acabar com as vinculações, mas tentou ter mais flexibilidade.

Ela levou adiante a proposta de flexibilizar a meta fiscal. Em má hora o governo pensa nisso. A ideia é criar limite para os gastos, mas ter metas mutantes, que acomodem perda de receita. Dilma continua afirmando que no ano passado foi feito um grande esforço fiscal. 

Alguém precisa apresentá-la ao resultado divulgado pelo Tesouro: 2015 terminou com um rombo de proporções olímpicas, R$ 115 bilhões. Na hora de apresentar a suposta diminuição das despesas, ela propôs que fosse excluído o que o governo gastou com a conta de energia. Se isso fosse possível, os brasileiros adorariam usar o mesmo truque e provar que estão com os orçamentos equilibrados. O que pesou no ano passado foi realmente a conta de luz, e o tarifaço foi ela que fez, com sua contraditória política energética.

A presidente quis convencer também que reduziu a carga tributária. Foi quando ouviu outras vaias. Excluiu as receitas obtidas com a Previdência, FGTS e o Sistema S para dizer que carga tributária federal caiu de 16% para 13,5% do PIB. O governo está, na verdade, elevando os impostos. A arrecadação está caindo por causa da recessão.

Ela exaltou vários programas que na verdade encolheram em 2015 como o Minha Casa, Minha Vida e o Pronatec. E apresentou como vitória o Programa de Proteção ao Emprego que teria preservado 41 mil empregos, no ano em que o número de desempregados aumentou em um milhão e meio.

Dilma defendeu a reforma da Previdência, mas o projeto ainda não está pronto. Ela tem razão quando diz que a reforma não reduzirá os gastos no atual governo, mas sim nos próximos, porque seu efeito é sempre prolongado no tempo. Tempo que se perdeu nos últimos 13 anos em que o tema não foi tratado, ou até mais tempo ainda. O ex-presidente Fernando Henrique encaminhou uma reforma que teve a feroz oposição do PT e acabou descaracterizada no Congresso, que derrubou a idade mínima.

Na melhor frase do discurso, a presidente disse que “crise é um momento muito doloroso para ser desperdiçado”. E desta forma ela fez a defesa de reformas que equilibrem as contas públicas. Faltou na sua fala a capacidade de mobilização e convencimento para enfrentar a crise grave como é e transformá-la em uma oportunidade de mudança. Até quando falou na tragédia do vírus zika faltaram à presidente palavras que ajudassem a superar o enorme fosso que existe hoje no sistema político brasileiro.

Quem fez um apelo pela união em torno de projetos de interesse nacional foi o presidente do Senado, Renan Calheiros, que, em poucos minutos, defendeu a independência do Banco Central e mudança da regulação que hoje paralisa o investimento no setor de petróleo.

Fonte: Coluna Míriam Leitão - Com Alvaro Gribel, de São Paulo

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