Encenação de combate à crise
Salta aos olhos que faltam ao governo convicção, credibilidade e apoio político para levar adiante as medidas
Sem
condições de tomar as medidas que se fazem necessárias para debelar a
avassaladora crise econômica em que meteu o país, o governo vem tentando
dissimular suas limitações com uma patética encenação de combate.
A dimensão mais alarmante do desastroso quadro econômico que hoje enfrenta o Brasil não é propriamente a recessão e a inflação de dois dígitos e, sim, a paralisante falta de perspectiva com que se debatem investidores, empresas e famílias, descrentes da capacidade do governo de restabelecer controle sobre as contas públicas. Para que o país vislumbre uma saída ordenada da crise e rompa a paralisia decisória que a vem agravando, o governo tem de ser capaz de sinalizar uma mudança crível de regime fiscal, que permita entrever evolução sustentável das contas públicas no futuro.
É aqui que a coisa pega. Salta aos olhos que faltam ao governo convicção, credibilidade e apoio político para levar adiante as medidas que seriam necessárias para sinalizar essa mudança crível de regime fiscal. Mas, no aperto em que se encontra, o governo decidiu agora ensaiar novo discurso, em que se permite vagas menções ao controle da expansão do gasto público e alusões perfunctórias à necessidade de uma reforma “exequível e justa” da Previdência.
Aos incrédulos, o que se pede é que acreditem que, de repente — 11 anos após ter liderado, com grande estardalhaço, o torpedeamento da proposta de contenção da expansão do gasto público feita pelo então ministro Antonio Palocci —, Dilma Rousseff estaria, afinal, convencida de que a contenção de gastos faz todo o sentido. E que também acreditem que a mesma equipe econômica que por tanto tempo festejou o expansionismo fiscal irresponsável, sob a bandeira da nova matriz macroeconômica, estaria de repente imbuída da necessidade de medidas severas de contenção de gastos.
Credibilidade à parte, o próprio governo não esconde sua preocupação com os efeitos colaterais desse tímido ensaio de mudança de discurso. O Planalto e a Fazenda têm feito das tripas coração para tentar conciliar o inconciliável. Bem sabem que, por vagas que sejam, as menções a medidas de contenção de gastos e as alusões à reforma da Previdência foram muito mal recebidas no PT e nos chamados movimentos sociais, de cujo apoio a presidente não pode prescindir na difícil quadra que atravessa.
Sem ir mais longe, basta ter em conta a reação do atual ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto. Se a presidente estivesse de fato empenhada em promover reformas na Previdência, não teria entregue o ministério da área, há pouco mais de três meses, a figura tão insensível à assustadora aritmética adversa que vem determinando a evolução das contas previdenciárias.
Espertamente, partidos que compõem a base aliada já fizeram ver ao Planalto que só terão condições de apoiar esforços de contenção de gastos e alterações de regras de acesso a benefícios previdenciários se as medidas contempladas pelo governo puderem contar com respaldo explícito e inequívoco do PT. É pouco provável que isso venha a ocorrer. Às voltas com o desgaste político imposto pela operação Lava-Jato e pelos desastrosos cinco anos de governo Dilma, o PT já tem razões de sobra para se alarmar com o que as eleições municipais de outubro lhe reservam. É difícil que, a esta altura, se disponha a se desgastar ainda mais com o minguado eleitorado fiel que lhe restou, abandonando de repente seu velho discurso de resistência à contenção de gasto público e à reforma da Previdência.
O governo está cansado de saber disso. E não é por outra razão que tem mantido um discurso tão vago sobre as medidas fiscais com que acena, escorado em promessas evasivas de envio de propostas concretas ao Congresso “nos próximos meses”. É o que lhe basta para ganhar tempo e, na medida do possível, tentar prolongar a encenação de combate à crise até que o Congresso, afinal, decida se a presidente deve ou não ser afastada.
Por: Rogério Furquim Werneck, economista e professor da PUC-Rio - O Globo
A dimensão mais alarmante do desastroso quadro econômico que hoje enfrenta o Brasil não é propriamente a recessão e a inflação de dois dígitos e, sim, a paralisante falta de perspectiva com que se debatem investidores, empresas e famílias, descrentes da capacidade do governo de restabelecer controle sobre as contas públicas. Para que o país vislumbre uma saída ordenada da crise e rompa a paralisia decisória que a vem agravando, o governo tem de ser capaz de sinalizar uma mudança crível de regime fiscal, que permita entrever evolução sustentável das contas públicas no futuro.
É aqui que a coisa pega. Salta aos olhos que faltam ao governo convicção, credibilidade e apoio político para levar adiante as medidas que seriam necessárias para sinalizar essa mudança crível de regime fiscal. Mas, no aperto em que se encontra, o governo decidiu agora ensaiar novo discurso, em que se permite vagas menções ao controle da expansão do gasto público e alusões perfunctórias à necessidade de uma reforma “exequível e justa” da Previdência.
Aos incrédulos, o que se pede é que acreditem que, de repente — 11 anos após ter liderado, com grande estardalhaço, o torpedeamento da proposta de contenção da expansão do gasto público feita pelo então ministro Antonio Palocci —, Dilma Rousseff estaria, afinal, convencida de que a contenção de gastos faz todo o sentido. E que também acreditem que a mesma equipe econômica que por tanto tempo festejou o expansionismo fiscal irresponsável, sob a bandeira da nova matriz macroeconômica, estaria de repente imbuída da necessidade de medidas severas de contenção de gastos.
Credibilidade à parte, o próprio governo não esconde sua preocupação com os efeitos colaterais desse tímido ensaio de mudança de discurso. O Planalto e a Fazenda têm feito das tripas coração para tentar conciliar o inconciliável. Bem sabem que, por vagas que sejam, as menções a medidas de contenção de gastos e as alusões à reforma da Previdência foram muito mal recebidas no PT e nos chamados movimentos sociais, de cujo apoio a presidente não pode prescindir na difícil quadra que atravessa.
Sem ir mais longe, basta ter em conta a reação do atual ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto. Se a presidente estivesse de fato empenhada em promover reformas na Previdência, não teria entregue o ministério da área, há pouco mais de três meses, a figura tão insensível à assustadora aritmética adversa que vem determinando a evolução das contas previdenciárias.
Espertamente, partidos que compõem a base aliada já fizeram ver ao Planalto que só terão condições de apoiar esforços de contenção de gastos e alterações de regras de acesso a benefícios previdenciários se as medidas contempladas pelo governo puderem contar com respaldo explícito e inequívoco do PT. É pouco provável que isso venha a ocorrer. Às voltas com o desgaste político imposto pela operação Lava-Jato e pelos desastrosos cinco anos de governo Dilma, o PT já tem razões de sobra para se alarmar com o que as eleições municipais de outubro lhe reservam. É difícil que, a esta altura, se disponha a se desgastar ainda mais com o minguado eleitorado fiel que lhe restou, abandonando de repente seu velho discurso de resistência à contenção de gasto público e à reforma da Previdência.
O governo está cansado de saber disso. E não é por outra razão que tem mantido um discurso tão vago sobre as medidas fiscais com que acena, escorado em promessas evasivas de envio de propostas concretas ao Congresso “nos próximos meses”. É o que lhe basta para ganhar tempo e, na medida do possível, tentar prolongar a encenação de combate à crise até que o Congresso, afinal, decida se a presidente deve ou não ser afastada.
Por: Rogério Furquim Werneck, economista e professor da PUC-Rio - O Globo
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