Confirmada a delação premiada do senador Delcídio do Amaral, que a
reportagem do Globo em Brasília tem razões fortes para bancar, a
investigação da Lava-Jato ganhará um fôlego ainda maior diante da gama
de relações que o ex-líder do governo petista cultivou em sua trajetória
política.
Estranho mesmo vai ser ver um Senador da República
comparecendo ao plenário todos os dias portando uma tornozeleira
eletrônica e tendo hora para sair do trabalho e voltar para casa.
Delcídio não poderá participar de reuniões noturnas, por exemplo, e nem
será mais um parlamentar que gere confiança em seus interlocutores, pois
pode tê-lo delatado ou estar disposto a fazê-lo em alguma oportunidade.
Houve
um caso recente no escândalo da Fifa em que um empresário esportivo fez
delação premiada em segredo e passou a gravar suas conversas com os
parceiros de crime para abastecer de informações o FBI. Delcídio, que
foi vítima de gravação do filho de Nestor Cerveró, agora pode ser vítima
de uma desconfiança. Isso por que o senador também estará
respondendo a denúncias graves, feitas pelo menos por um dos que fizeram
a delação premiada, o lobista Fernando Baiano, que o acusa de ter
recebido propina em negócios da Petrobras. Para atenuar sua pena, uma
delação premiada viria a calhar.
A presença de Delcídio no plenário
do Senado servirá para piorar ainda mais a imagem do Congresso, que
assim atingirá o ápice da desmoralização: terá entre seus pares um
senador em prisão domiciliar. Essa situação esdrúxula servirá para
apressar a análise do processo para a cassação do senador Delcídio do
Amaral, que passará a ser uma incômoda presença.
Se não acertou em
definitivo sua delação premiada, negociada com a Procuradoria-Geral da
República, Delcídio terá razões para fazê-lo diante da nova rotina que
enfrentará no seu dia a dia de senador em prisão domiciliar. O caso do
senador Delcídio é mais uma entre as muitas excentricidades que já
ocorreram desde que políticos passaram a ser condenados pelo Supremo
Tribunal Federal, coisa que é bastante recente por essas plagas.
No
caso do mensalão, houve uma discussão sobre a perda de mandato dos
parlamentares condenados. Com nova composição, o plenário, no caso do
senador Ivo Cassol, decidiu que a cassação de mandato deveria ser do
plenário, e não automática, como na deliberação anterior. Seria
preciso também tomar uma decisão com relação ao caso dos mensaleiros
condenados a perder seus direitos políticos. Um dos votos que mudaram a
jurisprudência anterior, o do ministro Luís Roberto Barroso, ganhou
adendo posterior em liminar de sua autoria: todo condenado em regime
fechado que tenha de permanecer detido por prazo superior ao que lhe
resta de mandato não pode exercer cargo político.
Os cinco ministros
que votaram pela cassação automática viam a mesma impossibilidade para
os condenados no semiaberto, pois seriam parlamentares que teriam de
dormir na cadeia após trabalhar durante o dia como congressistas, uma
situação esdrúxula. Não foi preciso decidir diante de fatos
concretos, pois os deputados condenados, como José Genoíno e João Paulo
Cunha, renunciaram aos mandatos diante da situação no mínimo estranha em
que se encontravam.
O senador Delcídio do Amaral não perdeu o
mandato nem tampouco foi condenado, mas está de todo modo em prisão
domiciliar, o que configura uma situação do mesmo modo esdrúxula, pois
terá hora marcada para estar em casa à noite, e nos fim de semana e
feriados não poderá sair para passear. Vai para sua prisão domiciliar,
não para a cadeia, mas continuará sendo um senador cumprindo prisão,
mesmo que domiciliar.
Fonte: O Globo - Merval Pereira
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