Embora Planalto diga que governo Temer é ameaça a iniciativas no setor, dez ações já perderam verbas este ano
A despeito das críticas da presidente Dilma Rousseff de que um
eventual governo Temer acabaria com programas sociais, as ações nesta
área já vêm sofrendo cortes significativos em função do ajuste fiscal e
da retração da economia. Pelo menos dez iniciativas importantes em
diversos setores — como reforma agrária, creches, combate às drogas e
até o Bolsa Família — perderam recursos neste ano em comparação com o
Orçamento de 2015.
A desidratação dos programas, como o fenômeno é chamado pelos técnicos,
ocorreu principalmente nos últimos dois anos, com o agravamento do rombo
das contas públicas. O governo anunciou uma tesourada no Orçamento de
2016, quando refez as contas e precisou cortar R$ 30,5 bilhões. Na
época, o Minha Casa Minha Vida foi o mais atingido: teve sua previsão
inicial reduzida de R$ 15,6 bilhões para R$ 7 bilhões.
Em 2015, o governo suspendeu o Minha Casa Melhor, que oferecia
crédito para compra de móveis e eletrodomésticos a beneficiários do
Minha Casa Minha Vida. A iniciativa, criada em 2013 como desdobramento
do programa habitacional para baixa renda, acabou em menos de dois anos.
NEM VITRINES DO GOVERNO ESCAPAM DE REDUÇÃO
Grande vitrine das gestões petistas, que alcança um quarto da população brasileira, o Bolsa Família não ficou imune às tesouradas. Em valores reais, corrigidos pela inflação, a verba do programa caiu 5,7% — de R$ 30,4 bilhões para R$ 28,7 bilhões. Os cortes atingiram também as políticas para a reforma agrária, que perderam cerca de 30% em verbas.
Para o doutor em Ciências Políticas José Matias-Pereira, da Universidade de Brasília, os programas sociais só teriam sido preservados, em meio à falta de recursos, se fossem submetidos a uma gestão séria, diligente e sem viés eleitoral: — A grande falha dos governos do Brasil nas últimas décadas é a incapacidade de avaliar as políticas públicas. Os programas sociais foram alvo de uma verdadeira orgia de alocação de recursos que, em tese, tinha objetivos interessantes, mas com resultados limitados. Vimos então um salto num primeiro momento e, agora, com a situação de baixa arrecadação, os problemas começam a ficar evidentes.
Na avaliação de Matias-Pereira, o ideal é não anunciar “benesses”. — A situação das finanças públicas é tão grave que um novo presidente não deveria começar prometendo benesses. Até porque não adianta dizer que vai ter um montante específico no Orçamento para determinada ação e, na hora de desembolsar, não haver recursos disponíveis.
Especialista em Orçamento e professora-associada do Coppead/UFRJ, Margarida Gutierrez aponta três fatores para a mudança no perfil dos gastos sociais: os novos decretos de despesas terem de passar por autorização após os problemas das pedaladas fiscais, queda brusca na arrecadação do governo e um engessamento dos gastos. Do total do Orçamento, só 8% são despesas livres para corte, sendo o restante de despesas obrigatórias, como gastos previdenciários. — A queda brusca na arrecadação já ocorreu em cima de uma queda no ano anterior e tiveram que cortar as despesas discricionárias. Com isso, nem preservar os programas sociais de cortes o governo está conseguindo mais — disse Margarida.
Uma das áreas mais simbólicas do governo, que tem o slogan “Pátria Educadora”, a Educação também sofre cortes. Além da redução de recursos para a construção de creches e para o Pronatec, programas de apelo social, como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), diminuíram. No caso do Fies, a queda foi menor, de 5%. O quadro aponta para um “equívoco na eleição de prioridades do governo”, segundo Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação: — Quando o governo federal restringe recursos para creches, além de atingir as crianças e as famílias, inclusive com impacto na empregabilidade das mães, sabe que a cobrança por esse serviço recai sobretudo em cima dos prefeitos. Por outro lado, preserva o Fies, em que o sucesso estará atrelado diretamente à esfera federal.
COMBATE AO CRACK TAMBÉM PREJUDICADO
Na Saúde, a situação não é diferente. O programa Unidades Básicas de Saúde, estratégico para desafogar os hospitais, perdeu 23,7% dos recursos. Iniciado em 2011, o programa Crack, é possível vencer, está com orçamento de R$ 395,2 milhões, ante R$ 786 milhões de 2015, uma redução de 49,7%.
Lígia Bahia, médica sanitarista e doutora em Saúde Pública, considera que a crise econômica não justifica a redução de recursos em programas basilares da área. Ela propõe que os cortes ocorram em outras áreas e aponta a política de subsídios como mais uma falha do governo: — No momento em que falta vacina, penicilina e antibiótico nos hospitais, não faz sentido continuar financiando hospitais filantrópicos que não atendem ninguém do SUS e todas as deduções fiscais concedidas hoje. Vamos cortar a Saúde ou o salário do Judiciário? A Saúde ou um grande número de cargos públicos? — questiona.
Os ministérios que executam os programas citados mencionam a necessidade de readequação das ações em virtude do ajuste fiscal. Sobre o Minha Casa Minha Vida, o Ministério das Cidades afirma que espera um aporte adicional de até R$ 4,8 bilhões de recursos do FAT. E minimiza a queda de 74% na verba, argumentando que o programa tem várias fases e que a necessidade de verbas em 2016 é menor do que em 2015. O Ministério da Saúde argumenta que a previsão de orçamento para unidades básicas, considerando investimento e custeio, chega a R$ 1,7 bilhão, 40% maior que o executado em 2015, mas com valores sem correção. Sobre a Rede Cegonha, a pasta reconhece reduções, mas afirma que, conforme os serviços são instalados, é natural que a demanda diminua, passando a pressionar uma outra fonte de repasse de recursos: o teto de alta e média complexidade.
O Incra destacou que vem buscando novas fontes de recursos para a política agrária, inclusive com o BNDES. Já a Educação informa que fez modificações no Fies e ProUni para economizar sem diminuir o acesso aos estudantes. As pastas de Desenvolvimento Social e da Justiça não se manifestaram.
Em meio à necessidade de ajuste fiscal, iniciativas na área social
foram suspensas ou canceladas. O Ciência Sem Fronteiras é um deles. O
último edital, que beneficiou 101 mil estudantes de graduação ou pós com
bolsas fora do país, foi em 2014. Ainda estão suspensas novas bolsas no
exterior do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). O outro braço de apoio da pós-graduação, a
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do
Ministério da Educação, suspendeu mais de 7 mil bolsas.
Para o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), os números destroem o discurso de Dilma de que protege os programas sociais: — Eles estão falando na possibilidade de cortes de um novo governo, mas já estão fazendo os cortes. Isso deixa claro que o discurso é uma coisa e a prática, outra.
Fonte: O Globo
NEM VITRINES DO GOVERNO ESCAPAM DE REDUÇÃO
Grande vitrine das gestões petistas, que alcança um quarto da população brasileira, o Bolsa Família não ficou imune às tesouradas. Em valores reais, corrigidos pela inflação, a verba do programa caiu 5,7% — de R$ 30,4 bilhões para R$ 28,7 bilhões. Os cortes atingiram também as políticas para a reforma agrária, que perderam cerca de 30% em verbas.
Para o doutor em Ciências Políticas José Matias-Pereira, da Universidade de Brasília, os programas sociais só teriam sido preservados, em meio à falta de recursos, se fossem submetidos a uma gestão séria, diligente e sem viés eleitoral: — A grande falha dos governos do Brasil nas últimas décadas é a incapacidade de avaliar as políticas públicas. Os programas sociais foram alvo de uma verdadeira orgia de alocação de recursos que, em tese, tinha objetivos interessantes, mas com resultados limitados. Vimos então um salto num primeiro momento e, agora, com a situação de baixa arrecadação, os problemas começam a ficar evidentes.
Na avaliação de Matias-Pereira, o ideal é não anunciar “benesses”. — A situação das finanças públicas é tão grave que um novo presidente não deveria começar prometendo benesses. Até porque não adianta dizer que vai ter um montante específico no Orçamento para determinada ação e, na hora de desembolsar, não haver recursos disponíveis.
Especialista em Orçamento e professora-associada do Coppead/UFRJ, Margarida Gutierrez aponta três fatores para a mudança no perfil dos gastos sociais: os novos decretos de despesas terem de passar por autorização após os problemas das pedaladas fiscais, queda brusca na arrecadação do governo e um engessamento dos gastos. Do total do Orçamento, só 8% são despesas livres para corte, sendo o restante de despesas obrigatórias, como gastos previdenciários. — A queda brusca na arrecadação já ocorreu em cima de uma queda no ano anterior e tiveram que cortar as despesas discricionárias. Com isso, nem preservar os programas sociais de cortes o governo está conseguindo mais — disse Margarida.
Uma das áreas mais simbólicas do governo, que tem o slogan “Pátria Educadora”, a Educação também sofre cortes. Além da redução de recursos para a construção de creches e para o Pronatec, programas de apelo social, como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), diminuíram. No caso do Fies, a queda foi menor, de 5%. O quadro aponta para um “equívoco na eleição de prioridades do governo”, segundo Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação: — Quando o governo federal restringe recursos para creches, além de atingir as crianças e as famílias, inclusive com impacto na empregabilidade das mães, sabe que a cobrança por esse serviço recai sobretudo em cima dos prefeitos. Por outro lado, preserva o Fies, em que o sucesso estará atrelado diretamente à esfera federal.
COMBATE AO CRACK TAMBÉM PREJUDICADO
Na Saúde, a situação não é diferente. O programa Unidades Básicas de Saúde, estratégico para desafogar os hospitais, perdeu 23,7% dos recursos. Iniciado em 2011, o programa Crack, é possível vencer, está com orçamento de R$ 395,2 milhões, ante R$ 786 milhões de 2015, uma redução de 49,7%.
Lígia Bahia, médica sanitarista e doutora em Saúde Pública, considera que a crise econômica não justifica a redução de recursos em programas basilares da área. Ela propõe que os cortes ocorram em outras áreas e aponta a política de subsídios como mais uma falha do governo: — No momento em que falta vacina, penicilina e antibiótico nos hospitais, não faz sentido continuar financiando hospitais filantrópicos que não atendem ninguém do SUS e todas as deduções fiscais concedidas hoje. Vamos cortar a Saúde ou o salário do Judiciário? A Saúde ou um grande número de cargos públicos? — questiona.
Os ministérios que executam os programas citados mencionam a necessidade de readequação das ações em virtude do ajuste fiscal. Sobre o Minha Casa Minha Vida, o Ministério das Cidades afirma que espera um aporte adicional de até R$ 4,8 bilhões de recursos do FAT. E minimiza a queda de 74% na verba, argumentando que o programa tem várias fases e que a necessidade de verbas em 2016 é menor do que em 2015. O Ministério da Saúde argumenta que a previsão de orçamento para unidades básicas, considerando investimento e custeio, chega a R$ 1,7 bilhão, 40% maior que o executado em 2015, mas com valores sem correção. Sobre a Rede Cegonha, a pasta reconhece reduções, mas afirma que, conforme os serviços são instalados, é natural que a demanda diminua, passando a pressionar uma outra fonte de repasse de recursos: o teto de alta e média complexidade.
O Incra destacou que vem buscando novas fontes de recursos para a política agrária, inclusive com o BNDES. Já a Educação informa que fez modificações no Fies e ProUni para economizar sem diminuir o acesso aos estudantes. As pastas de Desenvolvimento Social e da Justiça não se manifestaram.
Para o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), os números destroem o discurso de Dilma de que protege os programas sociais: — Eles estão falando na possibilidade de cortes de um novo governo, mas já estão fazendo os cortes. Isso deixa claro que o discurso é uma coisa e a prática, outra.
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário