Três
casos continuam a criar uma imagem negativa da Olimpíada que deveria ser
celebração da alegria
[tudo bem! os gringos fizeram bobagem e mereciam, no mínimo, um bom susto: uns sopapos, algumas horas presos ou então serem colocados em uma viatura, levados para um passeios pelas ruas do Rio e depois liberados próximo a uma favela.
Mas, nada justifica o esforço da polícia do Rio para justificar a culpa dos gringos.
Se a Polícia Civil usasse 1% do empenho usado para descobrir que os atletas mentiam no sentido de identificar e prender assassinos de policiais com certeza muitos matadores de policiais estariam presos.
A propósito: os bandidos da favela do João, que assassinaram aquele jovem soldado da Força Nacional já foram identificados e presos?]
Nada como o esporte para incentivar o ódio entre os
povos. Atenção: isso é uma ironia. Todo mundo percebeu, mas no
clima atual de espíritos olímpicos transformados em espíritos de porco, não
custa esclarecer. E que clima! Do ponto de vista dos
americanos, a intercepção dos nadadores Gunnar Bentze e Jack Conger,
quando já estavam dentro do avião que os levaria para longe do Rio e da
encrenca do assalto a ser esclarecido, lembra as cenas
finais de Argo.
É aquele
filme com Ben Affleck sobre a saída clandestina dos americanos que haviam
conseguido se esconder quando iranianos enfurecidos invadiram e ocuparam a
embaixada dos Estados Unidos, em 1979. Aliás, é incontável
a quantidade de filmes em que os mocinhos escapam num avião perseguidos pelos
bandidos que invadem a pista, mal encarados, barbudos e quase que
inevitavelmente do Terceiro Mundo. Daí a facilidade da identificação emocional.
Os
nadadores americanos não escaparam e ainda está por ser esclarecido se são os
mocinhos. Mas dificilmente seriam os
bandidos, mesmo que apareçam outros desdobramentos sobre a história do
assalto sofrido por eles, mais James Feigen e Ryan Lochte. Este é o mais
conhecido e medalhado, daí o destaque maior ainda com que uma história dessas
está sendo acompanhada. Desde que uma juíza pediu a
apreensão dos passaportes dos quatro nadadores, até que o famoso “esclarecimento” mostrasse
se houve mesmo assalto ou foi uma falsa comunicação de crime para
encobrir alguma atividade do ramo “proibidão”,
desencadeou-se na imprensa americana uma espécie de “onde está Lochte”.
O
tablóide Daily
News deu a resposta:
está de volta aos Estados Unidos, na companhia da namorada, Kayla Reid, que já
posou para a Playboy.
Kayla veio com ele para o Rio, mas não foi identificada em nenhum momento
da festa antes do assalto que deu tanto o que falar. Aquele
pessoal que vive de insinuar escapadas, várias delas depois comprovadas,
levantou a hipótese, ajudado pela entrevista de Renzo Gracie a Veja. Os
pais de Lochte também acompanharam o filho na viagem. A
mãe dele, Ileana, de origem cubana, foi quem divulgou pela primeira vez a história do assalto, depois desmentida,
depois confirmada, depois
contada pelo nadador de cabelos descoloridos numa entrevista a um canal de
televisão.
Formaram-se
assim os campos em guerra. De um lado, na visão de muitos americanos, Lochte e os outros nadadores, vítimas de
violência e depois de patriotadas. O jornal Los Angeles Times chegou a entrevistar um professor
universitário que “estudou política
latino-americana”, Lowell Gustafson. Disse ele: “Parece bastante comum que a polícia e a burocracia do Brasil contestem
qualquer um que faça acusações. A ideia é dizer que essas coisas não acontecem
no Brasil.” Ah, os professores universitários…
Do outro
lado, está a turma dos brasileiros
ofendidos pelas críticas e até pelos fatos, convencidos de que existe uma
conspiração internacional para esculhambar com a Olimpíada. Como se o grande
acontecimento esportivo não estivesse cercado de Brasil de todos os lados. Para não ofender sensibilidade acirradas,
os responsáveis pela equipe britânica sequer identificaram o atleta que sofreu um assalto a mão
armada ao voltar de uma balada no Rio, num caso parecido com o de
Lochte, se é que o nadador foi mesmo roubado. Mas
avisaram a todos os integrantes da equipe que “não vale o risco” sair da Vila Olímpica
para cair na night.
Quem,
mesmo assim, insistir no que seria o
melhor dos jogos fora das competições, a alegria e a farra da noite carioca,
não deve usar roupas que os identifiquem como atletas,
levar objetos de valor e nem tomar táxis. Ou seja, devem se comportar como brasileiros. Aqueles que, mesmo assim,
insistirem em incursões perigosas, deve avisar a direção da equipe antes de
sair. Alguma dúvida? “O Rio não oferece um
ambiente seguro e o nível de criminalidade subiu nos últimos dias”, acrescenta
o comunicado. “E
o atleta que foi assaltado deveria cair fora logo, antes que a polícia
prenda a vítima em vez de ir atrás dos suspeitos”,
comentou um leitor do Daily Mail,
dando o tom das reações.
Ou seja,
além dos franceses, os batalhões
virtuais americanos e ingleses também estão em pé de guerra. O caso de Renaud Lavillenie, o campeão de salto com vara
vaiado, continua a ser o mais comentado nos jornais europeus por
envolver, de certa maneira, um choque de culturas.
Nas primeira reações ao
comportamento inadequado dos torcedores, Lavillenie reclamou do “público de m•••” e se comparou a Jesse
Owens. Uma comparação errada:
o campeão americano negro que venceu na Alemanha
nazista foi aplaudido e não vaiado. [algumas
versões relatam que Adolf Hitler, chanceler do IIIº Reich, se negou a
cumprimentar Jesse Owens.
Nada disso. Ocorreu que quando Hitler
começou a cumprimentar os atletas acarretou uma grande correria e confusão, já
que todos procuravam se aproximar do líder. Uma
imensa movimentação foi feita, em que os anfitriões cantavam o hino alemão "Deutschland, Deutschland
über Alles" ("Alemanha
acima de todos", em português), saudavam com um "Sieg Heil".
O Presidente do COI sugeriu que sendo
Hitler convidado de honra teria que ou cumprimentar todos os atletas –
aumentando ainda mais a confusão – ou não cumprimentar nenhum.
Hitler optou então por não descer mais da tribuna de Honra; quando Owens ganhou as medalhas,
Hitler já tinha tomado a sua decisão. E ao
contrário de ter-se mostrado indignado, abanou efusivamente para o atleta.
Nas palavras do próprio Owens: "Quando eu passei, o
chanceler se ergueu, e acenou com a mão para mim, eu respondi ao aceno." Lavillenie depois se desculpou.
Suas lágrimas ao receber a medalha de prata deveriam comover o mais
empatriotado dos corações brasileiros.
Incitar brigas xenófobas é um dos
métodos clássicos dos tablóides. Se continuarem a ser alimentados com material
negativo, os choques culturais vão azedar a imagem do Rio olímpico. Por
enquanto, só nos resta esperar que Lochte tenha dado uma maquiada nos fatos.
Uma perspectiva pouco animadora.
Fonte: Veja – Vilma Gryzinski - Mundialista
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