Servidores fizeram uma varredura em parte da unidade e se depararam com o material, que foi recolhido para análise.
Detentos fazem churrasco de carne supostamente humana em Alcaçuz - alguns bandidos dizem que a carne é de boa qualidade
Peritos
do Instituto Técnico-científico de Polícia (Itep) do Rio Grande do
Norte recolheram na tarde de ontem partes de corpos durante inspeção na
Penitenciária Estadual de Alcaçuz, onde um massacre deixou 26 detentos
mortos na semana passada. Os servidores fizeram uma varredura em parte
da unidade e se depararam com o material, que foi recolhido para
análise.
O órgão não informou a quantos corpos
pertenciam as partes nem se eram vítimas do confronto do fim de semana
passado ou de quinta-feira, quando as facções Sindicato do Crime e
Primeiro Comando da Capital (PCC) entraram em confronto na prisão.
No
total, três equipes de perícia e duas de medicina legal entraram no
presídio para a varredura. Nos últimos dias, agentes policiais e
socorristas têm enfrentado dificuldades para entrar no local. Dos 26
presos mortos no massacre do fim de semana passado, quatro ainda não
foram identificados.
Muralha
O
Batalhão de Choque da Polícia Militar voltou a entrar em Alcaçuz, na
manhã de ontem, agora para começar a construção do muro para separar as
facções criminosas dentro da prisão. Desde a noite da sexta, já chegavam
ao presídio caminhões com materiais de construção, além de contêineres,
cada um com 12 metros, que devem compor estrutura emergencial. A
situação na prisão, cujos detentos estão rebelados desde o dia 14,
estava aparentemente calma ontem.
A muralha
anunciada pelo governo do Estado deverá separar os pavilhões 1, 2 e 3 de
4 e 5. Os primeiros são ocupados por presos ligados ao Sindicato do
Crime e os últimos, pelos detentos do P em 15 dias. Serão usados blocos
de seis metros de altura, para ficar do mesmo nível dos muros de
Alcaçuz. Questionado sobre ações para retomada
do controle nos pavilhões, o comandante-geral da Polícia Militar, André
Azevedo, ressaltou o risco envolvido na operação. "Alcaçuz é uma das
maiores penitenciárias do Brasil em extensão territorial e está
destruída. Por mais que as armas sejam retiradas, qualquer pedaço de
ferro, de grade, vira uma arma."
O assessor de
relações institucionais da 7ª Brigada de Infantaria Motorizada do
Exército, em Natal, coronel Erland Mota, dava as primeiras informações,
anteontem, sobre a atuação das Forças Armadas na cidade, enquanto
tentava resumir: "Olha, vai funcionar exatamente como da outra vez, em
agosto". Como naquela ocasião, a articulação nas ruas da facção
Sindicato do Crime (SDC) forçou a volta dos homens de farda camuflada ao
patrulhamento da capital.
Reagindo a uma
transferência de 220 integrantes, após a chacina de 26 presos na
Penitenciária Estadual de Alcaçuz, na Grande Natal, o SDC deflagrou
ataques pela capital e dez cidades do interior, com ônibus queimados e
bases da polícia alvejadas, e voltou a demonstrar força, mesmo acuado
pelos rivais do Primeiro Comando da Capital (PCC), responsáveis pelo
massacre dentro do presídio. Mesmo com o
reforço do Exército nas ruas, um carro foi incendiado na madrugada de
sexta, no bairro de Felipe Camarão, zona oeste. Ninguém foi preso. Em
negociação com órgãos de segurança, empresas e funcionários do
transporte público haviam se comprometido a voltar a circular, mas com a
frota reduzida.
Nem duas operações,
deflagradas pela polícia e pelo Ministério Público no ano passado, com a
transferência de membros para presídios federais, representaram abalo
significativo à estrutura da organização. Especialistas veem esse fator
com preocupação, uma vez que o cenário de insegurança pode repetir-se
mesmo com o eventual controle de Alcaçuz, rebelada desde a semana
passada.
Mensagens
Do
celular apreendido em agosto de 2016 de João Maria dos Santos de
Oliveira, o João Mago, apontado como integrante da cúpula da facção, foi
identificado que o modo de agir é o mesmo de agora. Mensagens anexadas à
denúncia criminal mostram a comunicação dele com um preso, em que diz:
"Parceiro, usa a estratégia. Não fica mandando ódio, não, dizendo que
vai fazer as coisas porque eles já ficam esperando. Tem de chegar e
fazer. E tem de ser só órgão público".
As
mensagens mostram ainda a articulação para aquisição de material
incendiário, munições e o planejamento detalhado dos pontos a serem
atacados. Oliveira foi transferido para presídio federal em agosto.
Segundo a Polícia Civil potiguar, as investigações relativas aos ataques
mais recentes já mostraram a difusão de ordens tomadas a partir da
transferência de presos em Alcaçuz. Na
quarta-feira, em Parelhas, a cerca de 250 quilômetros da capital, três
homens foram presos após atacar um veículo de transporte público. Os
investigadores encontraram ordens de ataque ao Centro de Detenção
Provisória e à delegacia móvel. Na sexta, o irmão de um detento foi
preso após incendiar um ônibus em São Paulo do Potengi, a 90 quilômetros
de Natal.
O ex-secretário nacional de
Segurança Ricardo Balestreri questiona a efetividade do reforço militar e
das políticas do Estado na área. "São soluções desesperadas para
momentos desesperadores. Mas já tivemos essa mesma intervenção em agosto
e estamos tendo agora diante de um fenômeno similar. Quantos meses mais
vamos suportar até o Exército voltar de novo para as ruas de Natal?" Ele
explica que o Rio Grande do Norte se assemelha a outros Estados na
precariedade do sistema prisional, mas se mostra especialmente ineficaz
na contenção desses distúrbios. "Aqui, se está tomando a dianteira no
sentimento de impotência da população e no desespero do governo. A
gestão bate cabeça e parece não encontrar saída", afirmou.
As
informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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