Moradores do Entorno são obrigados a conviver com a insegurança
Última reportagem da série O Cinturão do Crime mostra como a criminalidade prejudica quem mora em Formosa, Planaltina de Goiás, Águas Lindas e Santo Antônio do Descoberto
A falta de planejamento urbano e o crescimento desordenado dos
municípios goianos do Entorno são um dos principais motivos para a
violência na região. Prefeituras não conseguem prever e ordenar as
demandas da população, que só faz crescer. Bairros surgem sem que haja
vagas no sistema público de ensino ou efetivo de segurança para dar
conta desse boom. A falta de equipamentos públicos, espaços de
convivência, escolas, hospitais e transporte, atrelado ao abandono das
autoridades, é terra fértil para a proliferação do crime. Quem vive na
região já se adaptou ao contexto de vulnerabilidade e, para conviver com
tráfico, roubos, furtos e assassinatos, fazem silêncio.
Na última edição da série O Cinturão do Crime, a reportagem do Correio visita os municípios de Formosa, Planaltina de Goiás, Águas Lindas e Santo Antônio do Descoberto (leia Cidades irmãs abaixo),
para mostrar as consequências da criminalidade na vida dos moradores
das localidades. Distantes 40km entre si, os dois primeiros municípios
abrigam histórias de pessoas transformadas pela violência urbana.
Sobreviventes lutam para se recompor, mas nem sempre resistir é uma
opção.
Servidora licenciada da Prefeitura de
Formosa, Marilene Pereira dos Santos, 50 anos, ficou devastada quando a
droga tirou dela, em 15 dias de diferença, dois dos cinco filhos. O
primeiro morreu aos 20, com 18 tiros de pistola, e o segundo, de 18, foi
assassinado à queima roupa no sofá de casa. Dos três que restaram, um
está preso e os outros ela tem pouco tem contato. A própria Marilene
encontrou nas drogas uma forma de anestesiar a dor. Usou maconha,
cocaína e não resistiu ao crack. Morou na rua, vendeu tudo e se
endividou. Nunca se livrou do vício. Hoje, vive com um companheiro,
também viciado, e escreve poemas para aliviar o fardo. “Vi na pedra a
saída para a depressão. O meu refúgio foi o crack. Não sei nem como
estou viva”, lamenta.
Vítima de latrocínio
A 40km dali, em
Planaltina de Goiás, em um bairro pobre de terra batida, Daiane Cristina
da Silva Xavier, 28 anos, chora ao lembrar da mãe, Lourdes Maria da
Silva Xavier, 53 anos. Ela perdeu a vida durante um roubo à residência
do irmão de Daiane, no Jardim Paquetá. Acompanhada da neta de 4 anos,
Lourdete preparava-se para tomar um banho quando se deparou com o
criminoso. Ele arrombou o lote pela porta dos fundos e, antes de fugir,
esfaqueou a vítima, que morreu no local. “Ela não fazia mal a ninguém,
mas foi assassinada mesmo assim. Minha filha de 4 anos presenciou tudo e
ficou marcada de sangue”, recorda.
O
assaltante foi preso horas depois, acabou solto, mas voltou para a
prisão por ter cometido um estupro, também em 2013. As marcas da perda
resistem em Daiane até hoje. Ela passou a ter medo de andar na rua e só
deixa as filhas de 8 e 4 anos brincarem em frente à casa quando o marido
está presente. Não conseguiu sequer completar o curso técnico de
enfermagem que fazia.
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