Fala de Barroso é a de um burro ou a de um cínico; ele não é burro. Fux tenta ser sagaz, mas acaba se atrapalhando e confessa a barbaridade legal
O Senado foi notificado na noite desta
quarta sobre a decisão da Primeira Turma do Supremo que, nesta terça,
afrontando a Constituição e o Código de Processo Penal, afastou o
senador Aécio Neves (PSDB-MG) do seu mandato, impondo-lhe ainda as
seguintes medidas cautelares: proibição de falar com outros
investigados, entrega de passaporte ao tribunal e recolhimento noturno
obrigatório. Roberto Barroso, sempre muito criativo — é aquele que já
reescreveu o Código Penal, tentando legalizar o aborto com a sua toga,
ao conceder um simples habeas corpus — inventou a semi prisão domiciliar.
Mas sigamos: tudo caminha para que a Mesa submeta essa heterodoxia ao
plenário. E, como já escrevi, uma das Casas do Legislativo brasileiro
vai dizer se continua de pé ou se assina a própria extinção.
Os senadores que vieram a público até
agora, incluindo Eunício de Oliveira (PMDB-CE), presidente, defendem que
a decisão final cabe ao plenário. Dois ministros do Supremo foram
explícitos a respeito: Marco Aurélio e Gilmar Mendes. E notem que eles
não costumam seguir, digamos, a mesma cartilha. Quem conhece os
bastidores do Supremo diz que assim também pensam Ricardo Lewandowski,
Dias Toffoli e Alexandre de Moraes. Até Cármen Lúcia, que, a meu juízo,
está na raiz dessa crise, teria considerado a decisão da Primeira Turma
inoportuna. Ninguém tem dúvida sobre a opção de Edson Fachin. Foi ele
quem inventou o afastamento quando relator do caso. Já sabemos o
pensamento glorioso do trio do barulho: Roberto Barroso, Rosa Weber e
Luiz Fux, os exóticos. Celso de Mello é incógnita. Um me diz: “É claro
que ele discorda daquela aberração”. Ao que outro emenda: “Mas anda tão
esquisito!”
Bem, meus caros, de toda sorte, a
decisão está com a Mesa do Senado. Caso submeta a questão ao plenário, e
se este a anular, anulada a coisa está. Não enxergo hipótese de
judicialização posterior via STF. Se houvesse, nesse caso, triunfaria o
bom senso. Roberto Barroso, com aquele seu ar
superior, quase etéreo, que passou a exibir depois que ganhou um lugar
na corte, tentou justificar a excrescência:
“Respeito todos os pontos de
vista e acho que as pessoas na vida têm direito à própria opinião. Mas
não aos próprios fatos. Os fatos são os seguintes: a Constituição
brasileira, no artigo 53, parágrafo 2º, prevê que a prisão de um
parlamentar só pode se dar em hipótese de flagrante de crime
inafiançável. A primeira turma do STF não decretou a prisão do senador”,
A observação é burra ou cínica. E burro o
doutor não é. Mostra-se até muito esperto. Ele deveria dizer a que
artigo da Constituição recorreu para impor aquelas medidas. Resposta: a
nenhum! Apelou ao Artigo 319 do Código de Processo Penal, só evocável
quando, havendo os requisitos dados para a prisão preventiva (Artigo 312
do CPP), opta-se por medidas mais moderadas. Como o 312 não se aplica a
Aécio, porque abrigado pelo Artigo 53, as medidas restritivas são
ilegais. Ademais, um Senado que pode reverter até uma prisão em
flagrante por crime inafiançável certamente pode rever ações menos
gravosas.
Já Luiz Fux, aquele que resolveu zombar
de um senador enquanto estuprava a Constituição, tentou ser sagaz, mas
foi apenas desastrado. Afirmou:
“Temos de deixar o Senado
pensar bem naquilo que vai fazer diante da decisão judicial porque, se
não me falha a memória, o senador já esteve afastado por decisão
judicial, e não houve esse clamor todo”.
A memória não falha, mas o seu juízo
sim! Não houve o que ele chama “clamor” porque cabia recurso. De tal
sorte a decisão era estupefaciente que se dava como certo que seria
revertida. Agora, como se sabe, não há apelo possível no tribunal. O que
ele chama “clamor” é só um convite para que o Senado exerça a sua
prerrogativa.
E o doutor entrega todo o serviço quando afirma:
É uma medida prevista
expressamente no Código de Processo Penal, no artigo 319, que diz com
todas as letras: são medidas cautelares diversas da prisão. Esse
dispositivo foi acrescentado ao Código de Processo Penal pelo Congresso
Nacional em 2011. Portanto, é o Congresso Nacional que definiu que essa
não é uma hipótese de prisão. Com todo o respeito a todas as opiniões,
não há dúvida jurídica aqui. O direito é claríssimo. Agora, as pessoas
todas podem ter a sua opinião política a respeito dessa matéria, menos
eu, que não sou comentarista político.
Opinião política uma ova. É Fux quem tem de explicar o que fazer do Parágrafo 6º do Artigo 282 do mesmo código:
“A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar”.
Os Artigos 312 e 319 do Código de
Processo Penal são indissociáveis. É preciso que estejam dados os
pré-requisitos do 312 (prisão preventiva) para que se apliquem, então,
as medidas restritivas do 319, mais brandas. Pergunta: Aécio poderia ser
preso nas condições dadas? Não! Logo, a decisão foi arbitrária. Opinião política, doutor? Quem confessou
ter chegado ao Supremo apelando aos préstimos de Delfim Netto, João
Pedro Stedile, José Dirceu e Antonio Palocci não pode ser, assim, tão
altaneiro ao ignorar a lei.
Rosa Weber, tudo indica, não disse nada. Tão logo ela entenda o debate, talvez se manifeste.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo
Nenhum comentário:
Postar um comentário