O Globo
É preciso cumprir a Carta, que impõe parâmetros de produtividade e qualidade ao funcionalismo
É imprescindível a modernização administrativa do Estado na sequência da
reforma da Previdência. Governo, Câmara e Senado se mobilizam na
preparação de projetos, aparentemente convergentes, sobre reestruturação
de cargos, redução do número de funções de confiança, adoção de
critérios de mérito nas carreiras e, também, revisão da estabilidade no
emprego público. Na semana passada, a Comissão de Assuntos Sociais remeteu ao plenário do
Senado, para decisão urgente, um projeto de lei complementar
instituindo a avaliação periódica e obrigatória de desempenho para os
servidores nos três Poderes.
Depois de três décadas, pretende-se regulamentar um artigo (nº 41) da
Constituição. Ele estabelece como condição obrigatória a avaliação de
mérito no desempenho de servidores, para admissão ou demissão. Pelas projeções oficiais, no ano que vem o país deverá somar quase 12
milhões de funcionários nas administrações federal, estadual e municipal
— essa conta não inclui os empregados de empresas públicas e
autarquias. Hoje são 6,7 milhões nas prefeituras, 3,7 milhões nos
governos estaduais e 1,2 milhão na União.
A expansão do emprego público nas últimas três décadas foi mais
acentuada nos municípios, por efeito da concentração de serviços de
educação e saúde nas prefeituras, áreas que absorvem 40% da folha
salarial. No conjunto, o setor público remunera seus empregados em média
50% acima do setor privado. Não há, porém, qualquer garantia de
contrapartida ao contribuinte em padrão mínimo de qualidade e eficiência
nos serviços (caros) que são prestados.
A maioria dos estados e municípios está em virtual falência, com excesso
de pessoal ativo em áreas intermediárias da burocracia. Os gastos com
pessoal extrapolam todos os limites legais e consomem recursos que
deveriam ser destinados às atividades essenciais, como saúde, educação e
segurança. O lobby das corporações do funcionalismo, no entanto,
construiu uma muralha jurídica que impede demissões até por inoperância
no setor público. Assim, servidores concursados, com estabilidade garantida após três
anos, só perdem o cargo mediante infindável processo administrativo ou
por sentença judicial transitada em julgado. A Constituição prevê ainda
outra possibilidade, a da avaliação de mérito, mas até hoje isso não foi
regulamentado.
A premissa corporativa de que é inequívoca a alta qualificação do
serviço público simplesmente não corresponde aos fatos. Não há aferição e
reconhecimento de mérito na carreira, por isso não se distingue o
funcionário de desempenho sofrível, que custa em dobro ao contribuinte. É preciso cumprir a Constituição, que impõe parâmetros de produtividade e
qualidade ao funcionalismo. O Senado abriu o debate e deveria avançar,
celeremente, em outros aspectos dessa modernização, fundamental ao
Estado brasileiro.
Editorial - O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário