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quinta-feira, 30 de junho de 2022

Qual o impacto da queda do desemprego na campanha de Bolsonaro? - O Estado de S. Paulo

Alexandre Calais*

Taxa ficou abaixo dos 10% pela primeira vez desde 2016

Esta é a primeira vez que a taxa de desemprego fica abaixo de 10% desde o trimestre encerrado em janeiro de 2016, quando ficou em 9,6%. O resultado também foi o menor para o trimestre encerrado em maio desde 2015, quando estava em 8,3%.

Em igual período de 2021,[ápice da pandemia] a taxa de desemprego medida pela Pnad Contínua ficou em 14,7%. No trimestre encerrado em abril de 2022, a taxa de desocupação estava em 10,5%.

O País ainda tem 10,631 milhões de desempregados. [quando Bolsonaro iniciou o Governo, recebeu do presidente Temer um Brasil com  12,669 milhões de desempregados - uma herança maldita do desgoverno do PT/PMDB
Evolução de 2012 a 2018: Desde 2012, quando registrou 7,1 milhões de desempregados, esse número vem crescendo, em 2015 foi de 8,8 milhões, e logo se tornou, em 2016, 12 milhões; e em 2017 e 2018, 13 milhões. 
Em 2019, nos primeiros trimestres que incluem trimestres do próprio ano, há uma redução do desemprego
Não pode ser olvidado que a última pandemia havida até 2018, ocorreu na primeira metade do século passado. 
Já o presidente Bolsonaro iniciou 2020, já no primeiro trimestre sob  os efeitos da pandemia  COVID-19, que ainda persistem até o presente, arrefecendo lentamente.]

Se considerada toda a mão de obra subutilizada, que inclui quem trabalha menos horas do que gostaria e quem não procura emprego por acreditar que não encontraria uma oportunidade, falta trabalho para 25,401 milhões de brasileiros. No entanto, a taxa de desemprego ficou abaixo do patamar de dois dígitos pela primeira desde o trimestre terminado em janeiro de 2016.

“Esse é um processo de recuperação que segue em curso”, resumiu Adriana Beringuy, coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE.

Para o economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores, a queda na taxa de desemprego tem influência da resiliência da atividade econômica no primeiro semestre deste ano, mas também reflete o não retorno ao mercado de trabalho, após a pandemia de Covid-19, de uma parcela da população, formada principalmente por mulheres e idosos. “Quando comparamos maio com fevereiro de 2020, temos ainda 2,8 milhões de pessoas a mais fora da força de trabalho. São pessoas que não conseguiram retornar ao mercado”, afirmou Imaizumi. “As mulheres sofreram mais com a pandemia, quando tivemos um desmantelamento grande na rede de apoio e assistência em relação ao cuidado das crianças. No caso dos idosos, está muito relacionado a aposentadorias precoces, o medo de pegar covid e sequelas de longo prazo pós-infecção”, disse o analista.

 Brasil cria 277.018 empregos formais em maio

A LCA Consultores acredita que a redução da taxa de desemprego a um dígito tenha recebido também impulso gerado pelas medidas de estímulo adotadas pelo governo, como a antecipação do 13º salário do INSS, os saques extraordinários do FGTS, a redução da bandeira tarifária de escassez hídrica e a desoneração fiscal de combustíveis, energia elétrica e comunicação. Isso de alguma forma tem ajudado a vermos números melhores na atividade e, consequentemente, no mercado de trabalho”, apontou Imaizumi.

Os números da Pnad Contínua acrescentam um viés de alta à projeção do C6 Bank de crescimento de 1,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2022, afirmou a economista Claudia Moreno. Ela agora prevê que a taxa de desemprego desça a 9,2% no trimestre encerrado em dezembro.

Educação e saúde
O mercado de trabalho mostra recuperação desde o segundo semestre de 2021, embora o movimento não tenha ocorrido simultaneamente para todas as atividades, disse o IBGE. Os serviços presenciais demoraram mais a gerar vagas, mas já se vê mais recentemente a volta da ocupação nessas atividades, que agora têm como destaque as áreas de educação e saúde.

Mais 2,282 milhões de pessoas passaram a trabalhar em apenas um trimestre, fazendo a população ocupada alcançar um recorde de 97,516 milhões. “(A alta na ocupação) Tem a ver com a conjuntura favorável do ponto de vista sanitário. Tem também uma demanda maior por trabalhadores pelas atividades econômicas, sejam na condição de trabalhadores formais e de informais”, disse Adriana Beringuy, do IBGE.

No trimestre terminado em maio, houve melhora no emprego com carteira assinada, que já superou o patamar pré-pandemia, mas também crescimento no emprego informal, que também alcançou contingente recorde: 39,1 milhões de pessoas, ou 40,1% dos trabalhadores em atividade.“A gente já observa desde o fim do ano passado que não apenas o trabalho informal vinha sendo o majoritário no processo de recuperação da população ocupada”, lembrou Beringuy.

MATÉRIA COMPLETA - Economia & Negócios - O Estado de S. Paulo 

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Maia atua nas falhas e omissões - Míriam Leitão



O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, vai arquivar o projeto do governo para mineração em terra indígena, acha “inacreditável” a moção de repúdio aprovada pela comissão presidida por Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) contra o presidente eleito da Argentina e diz que preservar o meio ambiente é a forma de proteger a economia. Ele recebeu bem o conjunto de reformas econômicas, mas diz que a proposta que tramita na Câmara do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) é melhor do que a PEC Emergencial.

Perguntei a ele, em entrevista na Globonews, qual é o limite do protagonismo do Legislativo no presidencialismo. Ele respondeu que governo não é só o Executivo, e que o Congresso também é um dos poderes e tem prerrogativas:  — É claro que os limites vão sendo dados um pelo outro. Se um fica muito forte, o outro poder vem e equilibra. A política tem que ser feita de forma equilibrada entre Câmara, Senado, Executivo, nos limites dados pelo Supremo. Se não é prerrogativa exclusiva do Executivo, o Legislativo pode ter protagonismo.

Nas ausências e falhas do governo, o presidente da Câmara tem atuado. E quando o governo, na avaliação dele, acerta, o presidente da Câmara o apoia. É assim com as propostas de reforma econômica que chegaram esta semana ao Senado.  — Os projetos são bons, mas a PEC Emergencial poderia ser mais robusta se tivesse sido usada na largada a proposta do deputado Pedro Paulo, que construímos ainda na legislatura passada. Seriam R$ 100 bilhões. Isso facilitaria também a negociação, porque mesmo com a redução permitiria uma ótima economia. A PEC do Pacto repete um pouco a ideia dos gatilhos e tem a PEC dos Fundos. Sem dúvida vai na linha correta, porque o governo tem que controlar seus gastos correntes. Não é possível que o Brasil, que na década de 90 tinha quase 30% do seu orçamento em despesas de capital (investimentos), só tenha hoje menos de 1%, e ainda com déficit.

Ele não acha preocupante a junção das rubricas de educação e saúde. Perguntei sobre o temor de que vá mais para saúde, por causa das emergências, e menos para educação, que é investimento de longo prazo. Ele acha que seria preocupante se o governo tivesse mantido a ideia inicial de incluir os inativos na conta, porque isso reduziria o gasto social.

Maia está organizando uma pauta social na Câmara. Os trabalhos têm sido conduzidos pela deputada Tábata Amaral (PDT-SP). Perguntei se ele fez isso para tentar mudar a atitude do governo em relação ao assunto. Ele disse que não, que tomou essa iniciativa porque ela é urgente, a pobreza está aumentando no Brasil, e o Congresso tem a vantagem de reunir a parte vencedora e a parte vencida nas eleições, a sociedade está mais bem representada:  — A principal peça democrática é o Orçamento, a aplicação dos recursos, e a partir do próximo ano vamos ter uma mudança profunda: o Orçamento passa a ser impositivo. O governo manda as suas prioridades, quem ratifica ou retifica somos nós.

Sobre a reforma tributária que está tramitando na Câmara, ele adiantou que ela não ficará restrita aos impostos indiretos sobre bens e serviços. Que deverá tratar do Imposto de Renda também.  Maia define como “narrativas” as declarações autoritárias do governo, feitas com muita frequência, e diz que em breve o governo vai perceber que, mesmo aprovando as reformas, os investidores podem se afastar por causa das falas autoritárias e antiambientais do governo. Chamou de inaceitáveis as declarações feitas frequentemente pelo ministro do Meio Ambiente. Eu perguntei como ele receberia a proposta que o ministro das Minas e Energia fez sobre mineração em terra indígena:  — Recebo e arquivo, recebo e arquivo. A gente não pode usar o argumento de que está havendo mineração ilegal para liberar a mineração em terra indígena. Vamos acabar com a mineração e o garimpo ilegais. Vamos fiscalizar e coibir os atos ilícitos. Depois disso vamos dialogar com as comunidades indígenas. [para que tanta terra nas mãos dos indígenas?
grandes riquezas minerais que podem ser exploradas de forma a não causar danos ao meio ambiente, ficam em reservas indígenas para no futuro serem exploradas por estrangeiros.
Logo vão dar status de nação às terras indígenas e defender que os 'donos' podem negociar com estrangeiros - que elas não estão sujeitas aos interesses soberanos do Brasil. ]
 
O deputado disse que vai se reunir com produtores culturais para ouvi-los sobre os constantes sinais de censura. Definiu como histórico o documento assinado por ele com os líderes em defesa da ciência. E disse que é “inacreditável” ter uma moção de repúdio da Comissão de Relações Exteriores da Câmara contra o presidente da Argentina, “eleito de forma legítima”. Na visão dele: “não podemos tratar a Argentina desse jeito.”

Blog da Míriam Leitão, jornalista - com Alvaro Gribel, São Paulo


quinta-feira, 29 de agosto de 2019

O trilhão duvidoso da Previdência - Míriam Leitão

O Globo

Proposta do Senado enfraquece reforma da Previdência 



A proposta do Senado desidratou o projeto à vista e reidratou a prazo. E um prazo duvidoso. Portanto, o número vistoso que parece tão próximo do trilhão sonhado pelo ministro Paulo Guedes pode não se confirmar. Só ocorrerá se forem aprovadas as reonerações de alguns setores hoje isentos. E isso terá que passar pela Câmara que, no caso do agronegócio, já derrubou uma vez. A retirada do BPC da Constituição aumenta o risco de judicialização.

As concessões feitas pelo relator Tasso Jereissati (PSDB-CE) reduziram a economia em 10 anos em quase R$ 100 bilhões, e uma parte por supressões feitas no texto da emenda original, que sendo aprovada vai para sanção. O relator argumenta que, em compensação, haverá um aumento de receita de R$ 155 bilhões. Só que isso está na PEC paralela que passará pela Câmara e, portanto, é mais duvidoso. O setor agropecuário exportador passaria a recolher contribuição previdenciária, que hoje não paga. Já se tentou isso na Câmara, mas foi derrubado. Além disso, o relator retirou a isenção das entidades filantrópicas de educação e saúde, e incluiu a obrigatoriedade de as empresas do Simples recolherem o correspondente ao custo do acidente de trabalho. Essa receita só virá se a PEC paralela for aprovada.

O texto do relatório usa argumentos fortes para defender o fim dessas isenções. “Não temos clareza sobre por que faculdades destinadas à elite da elite, hospitais que pagam salários de seis dígitos, ou bem-sucedidos produtores rurais não devam pagar INSS dos seus funcionários. A lógica é simples, se eles não pagam, alguém está pagando.” O que as entidades de ensino argumentam é que isso se reverte para a população mais pobre, porque eles têm que dar bolsa. Os exportadores do agronegócio dizem que não se pode exportar imposto. E até agora têm convencido os parlamentares quando essa proposta aparece.

O presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), João Eloi Olenike, prevê aumento de carga tributária se o governo elevar a arrecadação com o INSS em R$ 155 bilhões em 10 anos. — Se tiver aumento real de arrecadação do INSS é óbvio que a carga tributária vai aumentar. É uma medida que vai na contramão da redução da carga prevista pelo governo — afirmou. Além disso, lembra que o Brasil está para discutir uma reforma tributária.

O relatório do Senado reduziu de 20 para 15 anos o tempo mínimo de contribuição de quem ainda não entrou no mercado de trabalho. Na tramitação da Câmara havia sido reduzido para quem já está no mercado de trabalho. O próprio texto mostra a contradição dessa decisão. “A idade mediana da população vai aumentar em 13 anos até 2050. O avanço será um dos maiores do mundo segundo a ONU. A título de comparação, será de somente 4 anos nos Estados Unidos e 8 anos na Argentina”. Ou seja, quem entrar no mercado de trabalho no ano que vem, por exemplo, e vai se aposentar só depois de 2050 — quando o Brasil terá aumentado tanto a expectativa de vida ainda assim terá que contribuir apenas 15 anos.  O problema de retirar da PEC o critério de renda para a concessão do BPC é que aumenta o risco de continuarem as decisões judiciais com valores maiores. Pelo texto da Câmara, é considerado miserável quem tem apenas um quarto de salário mínimo como renda familiar per capita. O custo da mudança, segundo o Senado, é “inferior a R$ 25 bilhões”.

Outra desidratação foi a mudança na pensão por morte. A proposta era de ela ser 60% do valor do benefício do cônjuge falecido, acrescido de 10% por filho menor de idade. O Senado passou para 20%. Com dois filhos, portanto, chega-se a 100%. Isso parece justo para uma viúva ou um viúvo pobre. Mas o verdadeiramente pobre nem tem esse direito porque o BPC não deixa pensão. O problema são os altos benefícios. Pensão por morte, diz o texto do relatório, nos dois regimes, custam R$ 150 bilhões e crescem 4% acima da inflação. Na Alemanha, o cônjuge recebe 30%, no Canadá, 40%. [perguntinha boba: com uma pensão de 60% de um salário mínimo, como fazer face aos custos com remédios? na Alemanha e Canadá, os gastos do cônjuge com saúde são inexistentes ou mínimos - no Brasil, alguns remédios custam mais de um salário mínimo.]

O que parecia ser um grande avanço, que foi a inclusão dos estados e municípios, também dependerá da Câmara, porque está na PEC paralela. Além disso, é só autorizativo. Exigirá a aprovação de um projeto de lei em cada assembleia. É mais fácil aprovar do que uma emenda, mas ainda precisará de muito esforço legislativo. O governo nada reclamou das mudanças. Está torcendo para que não haja mais desidratações no relatório durante a discussão no Senado.


Blog da Míriam Leitão - Alvaro Gribel, de São Paulo - O Globo

segunda-feira, 22 de julho de 2019

Legislativo já debate o fim da estabilidade - O Globo - Editorial

O Globo

É preciso cumprir a Carta, que impõe parâmetros de produtividade e qualidade ao funcionalismo

É imprescindível a modernização administrativa do Estado na sequência da reforma da Previdência. Governo, Câmara e Senado se mobilizam na preparação de projetos, aparentemente convergentes, sobre reestruturação de cargos, redução do número de funções de confiança, adoção de critérios de mérito nas carreiras e, também, revisão da estabilidade no emprego público. Na semana passada, a Comissão de Assuntos Sociais remeteu ao plenário do Senado, para decisão urgente, um projeto de lei complementar instituindo a avaliação periódica e obrigatória de desempenho para os servidores nos três Poderes.

Depois de três décadas, pretende-se regulamentar um artigo (nº 41) da Constituição. Ele estabelece como condição obrigatória a avaliação de mérito no desempenho de servidores, para admissão ou demissão. Pelas projeções oficiais, no ano que vem o país deverá somar quase 12 milhões de funcionários nas administrações federal, estadual e municipal — essa conta não inclui os empregados de empresas públicas e autarquias. Hoje são 6,7 milhões nas prefeituras, 3,7 milhões nos governos estaduais e 1,2 milhão na União.

A expansão do emprego público nas últimas três décadas foi mais acentuada nos municípios, por efeito da concentração de serviços de educação e saúde nas prefeituras, áreas que absorvem 40% da folha salarial. No conjunto, o setor público remunera seus empregados em média 50% acima do setor privado. Não há, porém, qualquer garantia de contrapartida ao contribuinte em padrão mínimo de qualidade e eficiência nos serviços (caros) que são prestados.

A maioria dos estados e municípios está em virtual falência, com excesso de pessoal ativo em áreas intermediárias da burocracia. Os gastos com pessoal extrapolam todos os limites legais e consomem recursos que deveriam ser destinados às atividades essenciais, como saúde, educação e segurança. O lobby das corporações do funcionalismo, no entanto, construiu uma muralha jurídica que impede demissões até por inoperância no setor público. Assim, servidores concursados, com estabilidade garantida após três anos, só perdem o cargo mediante infindável processo administrativo ou por sentença judicial transitada em julgado. A Constituição prevê ainda outra possibilidade, a da avaliação de mérito, mas até hoje isso não foi regulamentado.

A premissa corporativa de que é inequívoca a alta qualificação do serviço público simplesmente não corresponde aos fatos. Não há aferição e reconhecimento de mérito na carreira, por isso não se distingue o funcionário de desempenho sofrível, que custa em dobro ao contribuinte. É preciso cumprir a Constituição, que impõe parâmetros de produtividade e qualidade ao funcionalismo. O Senado abriu o debate e deveria avançar, celeremente, em outros aspectos dessa modernização, fundamental ao Estado brasileiro.
 
Editorial - O Globo
 

quarta-feira, 13 de março de 2019

Os limites da desvinculação

Discutir a desvinculação do Orçamento do governo é crucial, mas a promessa do ministro Paulo Guedes de liberar R$ 1,5 trilhão é inviável

O projeto de desengessar o Orçamento é crucial para a União, estados e municípios. O país está ficando ingovernável pelo volume de destinação obrigatória. Mas prometer que os políticos terão controle sobre R$ 1,5 trilhão, como fez o ministro Paulo Guedes, é vender uma ilusão. Há despesas que permanecerão sendo obrigatórias, mesmo se for aprovado o fim das vinculações. Desse total do Orçamento, R$ 637 bilhões são pagamentos ao INSS e R$ 350 bilhões são despesas de pessoal. Além disso, há R$ 60 bilhões de Benefício de Prestação Continuada, e mais R$ 44 bilhões de custeio da máquina pública, que já sofreu muitos cortes nos últimos três anos de crise. Não será trivial mexer nessas despesas.

É preciso entender a importância da tarefa, mas não se vender terreno na lua. Primeiro: é fundamental enfrentar o problema do excesso de rigidez orçamentária. Vários economistas de candidaturas de pontos opostos do campo político defenderam isso nas últimas eleições. Segundo: não é verdade que os políticos poderão decidir sobre R$ 1,5 trilhão porque mesmo desvinculando eles não poderão, por exemplo, decidir não pagar aposentadorias e salários, entre outras diversas despesas.

O projeto, se for bem-sucedido, evitará que o Brasil bata contra um muro. E o país está indo velozmente na direção desse muro. No Orçamento de 2019, 90,4% são despesas obrigatórias. E vem crescendo ano a ano, reduzindo o espaço do executivo e do legislativo. Já há estados em que a soma dos gastos obrigatórios é maior do que a receita. Há muitas perguntas que precisam de respostas: 
- em quais despesas é possível mexer? 
- Como ampliar o espaço de decisão para os representantes eleitos? 
- A desvinculação reduzirá as receitas destinadas para as áreas essenciais como saúde e educação?

Paulo Guedes não está sozinho. Outros economistas vêm alertando para isso há muito tempo. A diferença é que ele diz que vai propor, e agora, em abril. Em tese, o ministro está correto. Mas não pode parecer que num passe de mágica, com uma PEC de nome bonito, PEC do pacto federativo, tudo se resolverá. “Os deputados vão entender que, em vez de discutir R$ 1,5 milhão ou R$ 5 milhões de emendas, vão discutir R$ 1,5 trilhão do Orçamento da União, mais os orçamentos dos municípios e dos Estados”, disse ele na entrevista ao jornal “Estado de S. Paulo”.

Os parlamentos foram criados exatamente para que representantes do povo pudessem decidir sobre a destinação dos recursos públicos. Na escassez, cada setor quis garantir a sua parcela. Mas quando a soma das parcelas fica maior que o todo, o caminho é aumentar o endividamento ou elevar os impostos. Municípios e estados estão mal, e isso parece música para os ouvidos, mas eles também sabem que terão que continuar cumprindo inúmeras obrigatoriedades de destinação, mesmo se a PEC foi aprovada. Embutido nesse projeto há um novo programa de ajuda aos estados, o Plano de Equilíbrio Financeiro (PEF), que será enviado via Projeto de Lei. O Regime de Recuperação Fiscal tinha exigências para a entrada que tornavam muito difícil a execução. O novo fará também exigências de contrapartidas, mas pode ajudar mais estados. É o que Guedes chamou de “balão de oxigênio” na sua entrevista de domingo.

Inicialmente, o ministro se referiu a esse projeto para desamarrar, desindexar e desvincular o Orçamento como o Plano B.O bonito é que se der errado pode dar certo. Se der errado a aprovação da reforma da Previdência, é bastante provável que a classe política dê um passo à frente e assuma o comando do Orçamento”, disse em janeiro. Foram dois erros numa declaração só. A reforma da Previdência precisa dar certo e esse projeto não pode ser a compensação caso a reforma não seja aprovada. São igualmente importantes para construir um novo marco fiscal do país. A PEC que proporá a mudança no Orçamento precisará de muita negociação, porque será natural que as bancadas de defesa da educação e da saúde, entre outras, briguem contra a mudança. Pela reação que provocará, pelo tempo de convencimento que exigirá, o risco é desviar o foco da reforma da Previdência, que é a tarefa da vez. Nada aconteceu desde que o projeto da Previdência de Bolsonaro chegou ao Congresso. Hoje se instala a CCJ. Será muito difícil para o governo travar duas batalhas econômicas ao mesmo tempo.
 
Coluna da Miriam Leitão - O Globo


 

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Dinheiro, tem. Mas acaba

Dinheiro, tem. Mas tudo comprometido

O próximo presidente vai mesmo gastar aquele trilhão e tanto da LDO, mas não vai decidir onde e como 

O próximo presidente vai gastar muito dinheiro algo em torno de R$ 1,4 trilhão. Essa espantosa despesa consta da Lei de Diretrizes Orçamentárias, já aprovada pelo Congresso, e que será a base do projeto de orçamento federal para 2019 – o qual, aliás, será encaminhado amanhã ao Legislativo.  Olhando o dinheiro, muitos candidatos se encantam. E os candidatos liberais se encantam mais ainda quando verificam que a União dispõe de estatais e imóveis. Já pensaram? Vendem-se ativos, paga-se dívida e tome gastos sociais e investimentos.

Pura ilusão. O presidente vai mesmo gastar aquele trilhão e tanto, mas não vai decidir onde e como.   Começando pelo orçamento, conforme os parâmetros da LDO. A maior parcela vai obrigatoriamente para benefícios do INSS, nada menos que R$ 635 bilhões. Depois, vem a folha de salários e encargos do funcionalismo, com R$ 322 bilhões. Em seguida, a conta de despesas sociais, como o benefício de prestação continuada. Mais R$ 225 bilhões. Somando essas três rubricas, já se foi a parcela de 83,5% do gasto total.

Há ainda despesas que podem ser remanejadas aqui e ali, mas têm que ser feitas, por determinação constitucional, em educação e saúde. Isso leva mais R$ 135 bilhões. Tudo somado e subtraído, daquela espantosa cifra inicial sobra para o próximo presidente decidir onde gastar a mixaria de R$ 98 bilhões, algo como 7% da despesa total. E para todo o funcionamento da máquina e investimentos.

É verdade, que na parte das receitas, tem um dinheiro bom – R$ 303 bilhões – que são renúncias fiscais, ou dispensa do pagamento de impostos para diversos setores e empresas. É tentador: cancelem-se algumas isenções e aparecem mais alguns bilhões.
Verdade, mas as isenções não caíram do céu. Foram colocadas no orçamento por lobbies políticos e econômicos bastante poderosos, que continuam todos por aí. Não será fácil eliminá-las, tudo dependendo de negociações no Congresso. Dirão: o presidente recém-eleito vem com muita força. Mas os deputados e senadores também estarão carregados de votos novos.

Deve-se notar ainda que todas as despesas previstas para 2019 na LDO registram aumentos em relação a este ano. Há, por exemplo, reajustes salariais para diversas categorias, inclusive para juízes. A conta de aposentadorias continua subindo.  Há candidatos falando em introduzir o orçamento de base zero. Significa eliminar todas as vinculações e regras obrigatórias. Bacana, mas depende de um amplo conjunto de emendas constitucionais e centenas de leis.  E o dinheiro das privatizações e imóveis? De fato, há estatais que valem dinheiro, como a Petrobras e o Banco do Brasil, não por acaso aquelas cuja venda tem mais restrição política, ideológica e de poderosas corporações. [restrição politica, ideológica e até interesses de poderosas corporações podem ser removidos, neutralizados - basta um presidente com pulso, com aquilo roxo - como dizia o Collor.]

E os imóveis? No balanço patrimonial da União aparece uma fortuna, pouco mais de R$ 1 trilhão, com a observação de que muitos imóveis podem estar subavaliados. Todo governante novo – por novo entendendo-se aquele que nunca esteve no poder federal – começa com essa expectativa, de fazer caixa com a alienação de imóveis.   Mas quando se olha a coisa no detalhe, o quadro muda bastante. Nesse trilhão e tanto, encontram-se: parques, reservas, quarteis das Forças Armadas, prédios de repartições e escolas, os tais palácios, residências, como o Alvorada ou o Jaburu, e até estradas. É verdade que se poderia vender a luxuosa residência do vice-presidente, o Jaburu, já que o vice não faz nada, a não ser política ou politicagem. Mas quem o compraria? Daria um hotel? Sem condição.

Cita-se muito como um bom ativo o velho prédio do Ministério da Fazenda, no centro do Rio. De novo, quem compraria um edifício deteriorado, precisando de reformas, num momento em que sobram prédios comerciais?  Todos admitem que há problemas nas contas públicas. Já é um avanço. O próximo passo é admitir que a crise fiscal é muito grave, urgente e, pois, sem soluções simples. Há dois pontos aqui: primeiro, o candidato entender o tamanho da encrenca; segundo, mostrar isso ao eleitorado e convencê-lo que não há solução fácil.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista