Guilherme Fiuza
O pré-candidato do PSDB João Doria - Foto: Pablo Jacob/Governo de SP
– Tomei uma decisão e não tem volta.
– Que decisão? Pensa bem. Decisão sem volta não tem volta.
– Já pensei. E ninguém vai me fazer mudar de ideia.
– Fala logo.
– Não sou mais candidato à presidência.
– O que?
– Isso mesmo que você ouviu. Não adianta insistir.
– Estou confuso.
– Imagino. Vou surpreender a todos.
– Não. Estou confuso porque achei que você já tivesse desistido antes.
– Como assim?! Tá louco? Até um minuto atrás eu era candidato a presidente.
– Então devo ter me enganado. Achei que algum tempo atrás tivesse ouvido você dizer que não disputaria.
– E você acreditou?
– Claro.
– Esse foi o seu erro.
– Acreditar em você?
– Não. Ignorar os movimentos da política.
– Que movimentos?
– Política é como a maré: vai e volta.
– Entendi. Você foi e voltou.
– Não. O que vai e volta é a política. Eu sempre estive no mesmo lugar.
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– E esse lugar era o de candidato a presidente.
– Exato. Mesmo quando parecia não ser.
– Agora ficou claro. Então você sempre foi candidato a presidente mesmo quando parecia não ser e agora decidiu desistir da desistência de desistir.
– É por aí.
– E por que você não quer mais ser presidente da República?
– Não é que eu não queira.
– Ih... Então o que é?
– A República é que não me merece.
– A República?
– É. O país. A sociedade. O povo.
– Entendi. Como você chegou a essa conclusão?
– Comecei a perceber isso no dia em que estava andando num shopping vazio.
– O que aconteceu?
– Acenei para ninguém e ninguém respondeu.
– O que há de errado nisso?
– Tudo. Num país educado, nenhum aceno fica sem resposta.
– Você não acha que se em vez de acenar para ninguém, tivesse acenado para alguém, alguém teria correspondido?
– Isso não é problema meu. Fiz a minha parte, que era acenar. E não gostei da falta de resposta. Povo malcriado.
– Povo? Você disse que não tinha ninguém no seu caminho...
– Justamente. Se fosse um povo educado estaria no meu caminho para acenar para mim, me aplaudir e gritar meu nome.
– É, realmente é falta de educação deixar uma pessoa que quer ser presidente do país andando sozinha por aí.
– Completa falta de educação. E olha que eu dei todas as pistas para eles perceberem a minha importância.
– Trancou tudo, né?
– Exato. Tranquei todo mundo alegando emergência sanitária e fui passear em Miami, onde não tinha nada trancado. Eles não entenderam meu gesto.
– Não mesmo.
– Gente burrinha. Incapaz de distinguir um líder corajoso.
– Corajoso?
– Claro. Tranquei milhões de pessoas e fui curtir as praias da Flórida. Sou ou não sou corajoso?
– Sem dúvida.
– Danem-se todos. Cansei. Vou retomar meus negócios da China. Saio da vida pública e volto para a privada.
– Você merece.
– Eu sei.
Guilherme Fiuza, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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