Vozes - Guilherme Fiuza
Constituição do Brasil segurança jurídica - Foto: Beto Barata/Arquivo PR
A imprensa que acoberta os abusos de Alexandre de Moraes passou de todos os limites. O inacreditável presidente do TSE declarou rindo que “ainda tem muita gente para prender e muita multa para aplicar”.
Essa declaração é incompatível com a conduta de qualquer juiz, especialmente um integrante da corte máxima – e presidente do tribunal eleitoral, que virou um comando de caça.
O que fez essa “grande” imprensa que enxagua as brutalidades de Alexandre de Moraes?
Fez o de sempre: enxaguou a brutalidade. Os veículos do consórcio de fake news perfumadas noticiaram esse absurdo como a coisa mais normal do mundo.
Sabe como se tenta dar aparência de normalidade a um absurdo? Escrevendo coisas como “o presidente do TSE não deu detalhes” sobre a promessa de prisões e multas em série.
Que simpático. A notícia não é uma autoridade descontrolada disparando ameaças genéricas.
A manchete legaliza a ameaça intolerável como se ela fosse o anúncio das datas do Enem, e diz que só faltaram os detalhes.
Vamos explicar os detalhes a essa imprensa vergonhosa: todas essas prisões e multas acontecerão graças a inquéritos de mil e uma utilidades que podem dispensar o processo legal e a participação do Ministério Público. Os detalhes compõem a transformação do direito em vontade pessoal. Com a cumplicidade escandalosa da imprensa.
Os veículos do consórcio de fake news perfumadas noticiaram esse absurdo como a coisa mais normal do mundo
No dia seguinte à “tirada” ameaçadora de Alexandre de Moraes ocorreu uma operação policial em vários estados, a mando do próprio, contra diversos cidadãos acusados de “atos antidemocráticos”. Ou seja: na véspera, o presidente do TSE vazou sua própria operação persecutória, dando risada.
A manchete correta seria “Alexandre de Moraes cumpre sua ameaça”. Mas é claro que a imprensa não ligou uma coisa a outra e só envernizou a notícia com aquela cantilena de que o caçador de toga é uma muralha contra o fascismo imaginário.
Nunca se bajulou com tanta desinibição, nunca se incentivou a escalada autoritária com tanta desfaçatez.
Um servidor público que faz ameaças cifradas à sociedade tem que responder por isso. E, no atual estado de coisas, não vai responder.
O Congresso sumiu. O presidente do Senado é o barítono do coral Missão Dada é Missão Cumprida.
O Ministério Público já interpelou, mas o interpelado ignorou solenemente a interpelação e ficou por isso mesmo.
As quatro linhas hoje no Brasil são uma fotografia amarelada numa parede encardida.
Não dá para ver onde acaba uma e começa outra. Lembrança pálida de um passado constitucional.
Foi nesse cenário pastel (não confundir com mané) que se deu a eleição presidencial. Um processo criteriosamente conduzido sob espessa neblina – com final apoteótico: diante do questionamento formal sobre os diversos indícios de irregularidades, a autoridade eleitoral respondeu exatamente do jeitinho mencionado acima: com desprezo e ameaças. Claro que a imprensa marrom aplaudiu de pé. Missão dada é missão cumprida.
As quatro linhas hoje no Brasil são uma fotografia amarelada numa parede encardida. Não dá para ver onde acaba uma e começa outra
Sem as tais quatro linhas visíveis a olho nu, tudo que se opõe ao tabu eleitoral – e sua intocável neblina – é considerado pelo juiz absoluto como “antidemocrático”. A lei virou um chicote em mãos sádicas.
Apesar da imprensa cínica e do seu expediente vergonhoso, tentando fantasiar o chicote de espada justiceira, a população já entendeu o golpe. Não tem mais volta.
Guilherme Fiuza, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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