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domingo, 18 de dezembro de 2022

Lições da Copa para a vida - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

O que Tite, técnico da Seleção Brasileira de Futebol, fez depois da eliminação do Brasil para a Croácia é o degrau mais baixo que um técnico ou dirigente pode cruzar

Técnico do Japão e Tite, após eliminação da Copa do Mundo do Catar | Foto: Reprodução redes sociais/Dave Shopland/Shutterstock
Técnico do Japão e Tite, após eliminação da Copa do Mundo do Catar - Foto: Reprodução redes sociais/Dave Shopland/Shutterstock
 
Iniciei minha vida no voleibol aos 12 anos de idade. Aos 16, competi em meu primeiro campeonato mundial. Depois de quatro Olimpíadas e mais de duas décadas dedicadas ao vôlei brasileiro, posso tranquilamente afirmar que o esporte é o campo mais inclusivo, mais tolerante e com a maior diversidade que alguém pode imaginar. Crenças, religiões, opções sexuais, a posição de cada um no espectro político-ideológico ou a cor da sua pele — nada disso importa. O que está em jogo é única e exclusivamente sua capacidade atlética. De quatro em quatro anos podemos testemunhar essa celebração e a verdadeira mensagem de tolerância nos Jogos Olímpicos e na Copa do Mundo de Futebol.

Pela imensa força e capacidade do esporte de propagar mensagens, geralmente de união e tolerância, competições e atletas não ficam imunes de serem usados como veículos para pautas políticas e ideológicas. Infelizmente, nos últimos anos, atletas consagrados também se tornaram alvos de ódio e intolerância exatamente por expressarem suas escolhas políticas. É claro que é preciso fazer uma distinção óbvia entre o direito de qualquer esportista de se manifestar politicamente, o que todos têm direito de fazer (e sou a primeira a apoiar), e a invasão de agendas político-partidárias em competições esportivas, dividindo um espaço reservado para a união de atletas, torcedores, culturas, povos e nações.

Mesmo em um clima de alta competição, o esporte — especialmente nos Jogos Olímpicos e na Copa do Mundo — sempre semeou um campo onde as diferenças, além das esportivas, não brotavam. Qualquer desavença política sempre foi tratada como apenas um figurante que mal aparece em um filme bom. Roteiro que, de quatro em quatro anos, sempre deixa histórias de superação e enredos dramáticos de derrotas e vitórias espetaculares. Inimigos geopolíticos dão ao mundo esperanças de paz durante as semanas de competição — como uma trégua. O espírito e o orgulho que podem levar a tantas guerras também podem semear a paz. Mas o que mudou nos últimos anos? Infelizmente, algo vem atingindo a alma do esporte, dentro e fora das arenas esportivas. E isso vem sendo demonstrado da maneira mais estúpida possível, por uma sociedade repleta de personalidades imaturas, afetadas e hedonistas.

Depois de alguns ciclos políticos que trouxeram não apenas a banalização da história — com o politicamente correto tomando conta de cada palavra, cada uniforme, cada gesto —, a ressaca desse movimento em que há a politização de tudo é a mediocrização da espinha dorsal do esporte. Nada mais importa: competição, histórias de superação, união entre as nações e também dentro dos países entre correntes de diferentes pensamentos — tudo jogado no lixo para dar espaço à sinalização de virtude, ao politicamente correto e agora ao ataque a atletas por suas escolhas políticas. Repórteres esportivos — correspondentes nessas competições acham necessário dar opiniões sobre política também. O esporte já dava sinais que não ia escapar à “idiotização” política, com frases repetidas como papagaios e atletas de importantes campeonatos, como a NBA e NFL, se ajoelhando para a palhaçada do politicamente correto e para os sequestradores de almas que precisam entrar em algum balaio coletivista por afirmação.

Mas a imbecilidade e a imaturidade dos idolatrados e dos endinheirados que jogam todas as baboseiras politicamente corretas no terreno sadio do esporte não ficaram restritas apenas a esses milionários atletas. A imprensa e os torcedores esportivos resolveram atuar no campo da política até quando opiniões são dadas fora das arenas. A Copa do Mundo deste ano foi um exemplo disso.

Na vitória da Seleção Brasileira contra a da Sérvia, por 2 a 0, a atuação de Richarlison, autor dos dois gols brasileiros, foi celebrada por petistas, já que o atacante faz coro com algumas políticas defendidas pelo PT e seus partidos satélites e é chamado de “progressista”. Durante a partida, Neymar sofreu uma lesão no tornozelo e deixou o jogo chorando. Por declarar apoio ao presidente Jair Bolsonaro, petistas e apoiadores do ex-presidiário Lula ironizaram e comemoraram a saída do jogador do PSG, fazendo o que de melhor faz a turma do “mais amor”: odiar.

Do campeão de fake news na campanha presidencial, André Janones, à presidente do PT, Gleisi Hoffman, todos fizeram piada com a lesão de Neymar, que o tirou do jogo. Em seu perfil no Twitter, o deputado escreveu: “Machucou, agorinha! Tava andando e colocou a mão na perna! Agora, agorinha!”. No intervalo do jogo, a presidente da facção de Lula foi questionada sobre Neymar e disse: “Nem vi ele (sic) no jogo”. Ao término da partida, ao ser perguntada novamente por jornalistas sobre a saída do jogador, disse em tom de deboche: “Foi tarde”. 

Casemiro, um dos líderes da equipe, ressaltou sua decepção com o fato de que, nas redes sociais, diversas pessoas chegaram a celebrar a lesão do camisa 10. “Infelizmente, a vida tem dessas coisas. Isso é muito grave e ficamos tristes. O Neymar não merece isso.” Em apoio a Neymar, o ex-jogador Ronaldo Fenômeno divulgou uma carta condenando a covardia e a maldade daqueles que debocharam da lesão do atacante. Em sua publicação no Instagram, Ronaldo pediu para Neymar não exaltar “os covardes e os invejosos”. “A que ponto chegamos?”, escreveu Ronaldo. “Que mundo é esse? Que mensagem estamos passando para os nossos jovens? Vai sempre existir gente torcendo contra, mas é triste ver a sociedade num caminho de banalização da intolerância, de normalização dos discursos de ódio”:

Estou certo de que a maioria dos brasileiros, como eu, te admira e te ama. Seu talento, aliás, te levou tão longe, tão alto, que tem amor e admiração por você em cada canto do mundo. E é também por isso, por ter chegado aonde chegou, pelo sucesso que alcançou, que tem que lidar com tanta inveja e maldade. Num nível de comemorarem a lesão de uma estrela como você, com uma história como a sua. A que ponto chegamos? Que mundo é esse? Que mensagem estamos passando para os nossos jovens? Vai sempre existir gente torcendo contra, mas é triste ver a sociedade num caminho de banalização da intolerância, de normalização dos discursos de ódio.
Moriyasu foi até a torcida, agradeceu com o tradicional gesto japonês, voltou ao meio do campo, falou com o grupo de jogadores que estava unido em um círculo, e depois cumprimentou cada um dos jogadores com lágrimas e gratidão nos olhos
É na contramão dessa violência verbal com poder destrutivo que te escrevo hoje: volte mais forte! Mais esperto! Com mais fome de gol! O bem que você faz dentro e fora de campo é muito maior que a inveja na sua direção. Não se esqueça nem um segundo do caminho percorrido que fez de você um ídolo do futebol mundial. O Brasil te ama! A torcida de verdade — a que torce a favor — precisa dos seus gols, dribles, ousadia e alegria!

Não exalte os covardes e os invejosos. Celebre o amor que vem da maior parte do seu país. Você vai dar a volta por cima, Neymar! E que todo o ódio vire combustível”.
Logo após as covardes reações de esquerdistas que celebraram a contusão de um atleta que estava defendendo o Brasil e a certeira carta de Ronaldo, muitos me abordaram para que eu opinasse sobre toda a situação, já que estive por ali, com a nossa bandeira no peito e na alma por mais de duas décadas. Minha resposta, de coração, foi a de que eu jamais — jamais! — torceria contra o Brasil por Tite, técnico da Seleção, ser esquerdista, admirador de Fidel Castro e apoiador de Lula. [tite, além de incompetente é um comunista nojento, que não canta o Hino Nacional, esquecendo que o  nosso Hino é muitas e muitas vezes superior a ele - um nada.] 
Uma bandeira em um uniforme significa a defesa de sua soberania. 
Seja em guerras militares, seja em guerras esportivas. 
Contra meu inimigo externo, meu adversário interno é meu aliado — simples assim. A primeira medalha olímpica do vôlei feminino, em 1996, na Olimpíada de Atlanta, veio assim. 
Não éramos amigas, não éramos confidentes, havia alguns grupos bem diferentes dentro daquela seleção, MAS, quando estávamos em quadra, não havia uma única diferença, pequena ou grande, que pudesse ser capaz de bloquear nosso único objetivo: a histórica medalha olímpica. 
A clássica semifinal, com Cuba, perdida no tie-break, trouxe lágrimas, muitas lágrimas. O sonho do ouro havia terminado, mas aquela derrota nos mostrou não apenas uma união especial para dar a volta por cima e conquistar o bronze, mas o elo que criamos para uma vida.

Em Atlanta, podemos dizer que, apesar da amarga derrota, saímos com uma vitória. No entanto, os incontáveis momentos de fracassos e lágrimas ao longo de todos os anos dedicados ao esporte são muito mais constantes do que os troféus e as medalhas. E é ali, em tantos caminhos trilhados por frustrações e tristeza que encontramos lições que carregamos para absolutamente todas as outras áreas da vida pessoal e profissional, seja qual for o novo campo de atuação depois da carreira de atleta. Há imensas lições no esporte. E há imensas lições através das pessoas que estão no esporte com você. Há lembranças e lições de vitórias espetaculares, cenas que, de tempos em tempos, cruzam a mente, principalmente quando ouvimos nosso Hino Nacional. No entanto, as melhores ferramentas às quais somos expostos ao longo de toda uma jornada de horas, dias e anos são colhidas nos tropeços, na humilhação, na incredulidade de acontecimentos que você jamais imaginou que chegariam até você. E é aqui, exatamente aqui, que você aprende; vendo com os seus próprios olhos e sentindo na própria pele quem é técnico e quem é líder.

As memórias que tenho de algumas derrotas são perturbadoras até hoje. Mas elas mantêm meus pés no chão e a cabeça lúcida quando a neblina insiste em embaçar a visão. A dor diante de absolutos fracassos ressurge em frutos ao longo dos anos na forma de pragmatismo, avaliação, autocontrole, mais dedicação e lealdade — uma lealdade digna de filmes de guerra. Atletas têm mania de ver lições em quase tudo, nada é descartado e, mesmo diante de uma Copa do Mundo atípica, devido ao importante momento político no Brasil com o grave cenário de ruptura constitucional promovida pelo STF, a desclassificação do Brasil nos deixa lições. Lições para nosso esporte, para a nossa vida pessoal e profissional, para nossa capenga política e seus peões, para magistrados, para qualquer um que queira fazer diferença em nossa sociedade.

Como já bastante elucidado nesta nossa resenha, não há nada mais comum no esporte do que as derrotas e as dores, lágrimas e lições que elas trazem. Derrotas fazem parte do próprio contexto do êxtase que existe nas glórias. 
O que não é aceitável é a suprema covardia de quem abandona seus comandados, de quem, em um rompante narcisista e egoísta, abandona seus soldados em campo depois de uma batalha perdida. O que Tite, técnico da Seleção Brasileira de Futebol, fez depois da eliminação do Brasil para a Croácia é o degrau mais baixo que um técnico ou dirigente pode cruzar: o abandono de campo com o seu batalhão ainda preso na trincheira pelo abate, pelas lágrimas, pela frustração e pela tristeza diante da derrota. 
Assim que o jogo terminou, Tite saiu do campo sem acolher os jogadores, que choravam no gramado.

O abandono de campo — e de seus jogadores ainda em campo — foi de uma covardia difícil de engolir, mais até que a derrota em si. Não vou entrar no mérito técnico da partida ou dos pênaltis, não sou expert em futebol e não tenho problemas em assumir isso, mas o Brasil, apesar de brilhantes jogadores, perdeu para um técnico arrogante e covarde. O esporte não premia covardes — vencer não é o mesmo que ser premiado. Comandar não é o mesmo que liderar. A covardia é repugnante, abjeta e inesquecível. E é exatamente nas derrotas que os covardes mais aparecem.

Mas a Copa do Mundo, assim como os grandes eventos esportivos, e por isso é preciso evitar a politização deles, deixa lições excepcionais, para o mundo, para os brasileiros e para Tite. Tite deveria aprender com o técnico da seleção japonesa, Hajime Moriyasu, também eliminada pela Croácia nos pênaltis.  
Após a frustrante e dolorosa eliminação, Moriyasu foi até a torcida, agradeceu com o tradicional gesto japonês, voltou ao meio do campo, falou com o grupo de jogadores que estava unido em um círculo, e depois cumprimentou cada um dos jogadores com lágrimas e gratidão nos olhos.
As imagens correram o mundo e encheram novamente meu coração de que ainda há homens dignos no mundo, capazes de serem grandes até nas adversidades. 
No esporte, há uma GIGANTESCA diferença entre ser um técnico ou um comandante e ser um LÍDER. 
Líderes deixam lições e memórias que você carregará por toda a vida. Lições de companheirismo, princípios, ética e lealdade digna de campos de batalhas.
 
Quando me perguntam sobre as minhas inesquecíveis derrotas no esporte, posso enumerar uma penca delas. Creio que quando essa pergunta é dirigida aos brasileiros, a resposta vem num piscar de olhos: o fatídico 7 x 1 diante da Alemanha, na Copa do Mundo de 2014, no Mineirão.  
A Seleção Brasileira era uma das favoritas para conquistar o hexa. Comandada por Luiz Felipe Scolari, o Felipão, técnico do título do penta, o Brasil havia sido campeão da Copa das Confederações em 2013. Jogando em casa, o time tinha todo o apoio da torcida que lotava os estádios. Mas aquele 8 de julho jamais será apagado da nossa memória, mas também pelo emocionante comportamento do técnico, que, diante de histórica humilhação, não abandonou o campo, abraçando e consolando cada um dos jogadores. 
Diante do profundo estado de choque de quem assistia àquele atropelo pela TV, ver Felipão de mãos dadas com seus jogadores e chamando para si toda a responsabilidade da derrota na coletiva de imprensa é o que ficou na minha memória daquele dia. Talvez por conhecer de perto as marcas do abandono e da liderança diante da humilhação, marcas mais inesquecíveis que a própria glória e o transe das vitórias.

Aos meninos do Brasil: valeu, meninos! Valeu, Neymar. Vocês lutaram como puderam, mesmo sem um comando digno da entrega de vocês. Ao Brasil e seus agentes políticos, uma das muitas frases dos inspiradores discursos de Ronald Reagan, 40º presidente norte-americano: “O maior líder não é necessariamente aquele que faz as maiores coisas. Ele é quem leva as pessoas a fazerem as maiores coisas”.

 
Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste  
 
 

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