Nova esquerda
Ainda assim, há que se tentar entender mais ou menos o que se passa, já que o Brasil é parte do mundo e, nos dias de hoje, tem muito mais importância do que na época da II Guerra ou da Guerra Fria. Hoje somos responsáveis pela cadeia alimentar do mundo e temos um imenso território de riquezas minerais inexploradas. Temos, portanto, todos os motivos para sermos enxergados como estratégicos por qualquer potência global. Dominar o Brasil é dominar a cadeia de produção alimentos mundial.
Oposição ao progressismo é terrorismo doméstico
Nos Estados Unidos, temos assistido a uma tentativa crescente de criminalizar a oposição ao progressismo, alegando tratar-se de terrorismo. Ora é supremacismo branco, ora é crime de ódio, etc. Pessoalmente, o que me chamou mais a atenção foi a tentativa de tachar de terroristas domésticos os pais que se manifestassem contra o ensino de teoria crítica da raça (negro = bom; branco = ruim) em escolas. Mas isso aconteceu só depois do paradigmático 6 de janeiro de 2021, o “Ataque ao Capitólio”, no qual terroristas domésticos quase acabaram com a democracia mas felizmente foram contidos pelas security forces (“forças de segurança”). Nisso, uma manifestante levou um tiro letal.
Esse processo de criminalização é generalizado no Ocidente e, se tratado à exaustão, daria um livro maior que o Houaiss. O último causo que me chegou vem da Noruega, onde uma mulher pode pegar três anos de cadeia por ter dito no Facebook que homens não podem virar lésbicas. Discurso de ódio. Na Inglaterra, a novela é longa, e pode ser acompanhada pela trajetória da ativista Posie Parker.
Tendo em vista esses dois nomes usados para a criminalização – “terrorismo doméstico” e “discurso de ódio” –, cabe então pegar uma lupa e voltar à lei brasileira de 2016, sancionada quando Trump nem tinha sido eleito presidente ainda. Ela trata como terrorista quem for motivado por “xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião”. A xenofobia mal faz parte do léxico do político brasileiro médio, e no entanto é citada primeiro. Essa expressão está na ponta da língua dos progressistas do primeiro mundo, que lidam com uma imigração descontrolada. Quanto à religião, a redação é ambígua; não sabemos se é motivado por “xenofonia, discriminação… e religião”, ou se por xenofobia e preconceitos relativos à cor da pele e à religião. Como no Brasil o evangélico foi pegado pra Cristo (à falta de homens brancos), eu aposto firmemente na primeira interpretação. Gente como Jean Wyllys volta e meia fala de “fundamentalismo cristão” como se fosse algo análogo ao fundamentalismo islâmico – que, como se sabe, produz terroristas aos montes.
Dito isso, eu não acredito que essa lei tenha sido redigida dentro do Brasil.
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O que petistas, trumpistas e bolsonaristas têm em comum
Se os trumpistas estiverem corretos, o mecanismo consiste em fomentar o caos para passar a repressão depois. Quem opera esse mecanismo? O tal do Deep State, ou Estado Profundo, que consistiria em agentes estatais fixos que não saem do governo com as eleições e que são os reais detentores do poder nos EUA. É parecida com a noção de “aparelhamento”, usada pelos brasileiros para se referir aos postos burocráticos tomados por esquerdistas.
Pois bem. Falando neles, em 2013 os petistas estavam plenamente convencidos de que os black blocs estavam a serviço da CIA e queriam derrubar Dilma. Em 2014, era a vez dos defensores do impeachment de acusar os black blocs de estarem a serviço de outrem; - no caso, do PT, que teria o fito de transformar as manifestações em quebra-quebra e afastar os manifestantes sérios – que eram a maioria. Agora, tendo fresco na memória o caso do Capitólio, torna-se bem natural a direita supor que se tratava de uma operação análoga, que fomenta o caos para legitimar a repressão. Quem seriam os incendiários? Recomendo este dossiê de Kim Paim sobre o assunto.
Mas agora deveríamos recuar mais no tempo e pôr os olhos na lei de 2016. É possível que os petistas estivessem certos quanto aos black blocs serem plantados pelos EUA de Obama; - é possível que os antipetistas estivessem certos quanto os black blocs serem infiltrados. E o fito era o mesmo de hoje: passar a repressão. No caso, a repressão que Dilma passou é uma lei 100% alinhada com a esquerda dos EUA.
O guru Fukuyama e a desilusão dos neocons
Os últimos presidentes dos Estados Unidos foram: George W. Bush (2001 – 2009), Barack Obama (2009 – 2017) e Donald Trump (2017 – 2021), com Biden começando em 2021. Antes desse período, os EUA estavam em seu apogeu no plano global: vitoriosos na Guerra Fria, líderes mundiais do capitalismo e da democracia.
Agora Fukuyama diz que um Deep State é necessário à manutenção de democracias liberais, e que ele mudou de ideia após ver o colapso dos Estados montados pelos EUA no Iraque e no Afeganistão.
Uma hipótese
Creio que Obama tenha marcado uma profunda mudança no Deep State, que trocou a ideologia neoconservadora pelo progressismo duro, que fomenta relações promíscuas entre Estado e empresas. (Thomas Sowell diz, por isso, que Obama é fascista.) O governo Obama foi marcado também por um uso maciço de espionagem sobre países estrangeiros, como mostrou o Wikileaks à época, cujo fundador, Assange, paga o preço até hoje.
No Brasil, o governo Dilma marcou uma mudança profunda no perfil da esquerda. Antes de Dilma (e Obama) a esquerda brasileira era majoritariamente antiamericana e anticapitalista; durante Dilma (e Obama), a esquerda brasileira se transformou em opositora do “racismo”, “machismo” e “homofobia” em vez de opositora dos EUA. Dilma fez as alterações legais que permitiram a Lava Jato e, com isso, neutralizou-se a ala tradicional da esquerda brasileira, alinhada com o Foro de São Paulo. Gosto de lembrar que Dilma não foi punida pela refinaria da Petrobras nos EUA (a “ruivinha” Pasadena) e que o Ciência Sem Fronteiras, bilionário, transferiu dinheiro do Brasil para as universidades públicas e privadas dos EUA, que estão sempre em crise. (Biden deu anistia às dividas estudantis agora; se ele tivesse uma Dilma, talvez isso não fosse necessário.)
Essa nova esquerda é bem ruim de voto. Lula é solto com um papel a cumprir e o seu governo, em vez de se assemelhar a Lula I e II, desenha-se como uma continuidade do governo Dilma.
Ou seja: essa catástrofe financeira deve ter sido planejada em Washington, do mesmo jeito que a lei antiterrorismo.É esta então a minha hipótese: o governo Obama marcou uma nova direção nos rumos da política global dos EUA, e Dilma era uma infiltrada aliada.
Bruna Frascolla, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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