A tática de Luiz Inácio Lula da Silva no intrincado xadrez do clima
parece clara. Segue a receita tradicional: bater bumbo para a narrativa
do momento, buscar articulações que ampliem a superfície política de
contato, reduzindo assim a pressão exercida sobre o Brasil pelas forças
externas, e, entrementes, ir tocando a vida de acordo com as
necessidades práticas, preenchendo o tempo com ataques continuados aos
adversários políticos do momento.
Posto que a realidade material nunca consegue ficar circunscrita aos
discursos, alguma hora os fatos terão, porém, de se impor.
Logo o
governo brasileiro terá de decidir a autorização ou não para explorar o
petróleo na foz do Amazonas.
E autorizar trará necessariamente custo
reputacional [em nossa opinião 'custo reputacional' é um valor que só incide sobre boa reputação - qualidade que a folha corrida do cidadão mostra ser ele desprovido.]que para um presidente empenhado em se apresentar como
liderança planetária nos assuntos do momento, entre os quais brilha o
clima.
E tem pelo menos outro nó aí. A reindustrialização, agora repaginada
como neoindustrialização (também para reduzir a área de atrito com os
antidesenvolvimentistas), ocupa lugar central nos planos governamentais,
sem ela vai ser difícil reduzir estruturalmente as altas taxas de
desemprego. [neo industrialização com as taxas extorsivas de impostos que nos alcançarão nos próximos dias?] O PIB projetado é bom, mas a beleza dos números deve-se na
maior parte ao agronegócio, cuja vocação não é empregar. Serviços e
indústria comem poeira.
Qual é a real, então? Não haverá reindustrialização sem energia barata.
Aliás, encarecimento da energia causa desindustrialização. Que o diga a
Alemanha.
E, posto que o preço nunca está imune à lei da oferta e da
demanda, fica claro que é ficção reindustrializar sem energia abundante.
O papel e o Power Point aceitam tudo, mas alguma hora governos têm de
entregar o que projetaram para o futuro.
Pois se há algo certo sobre o futuro é que ele sempre chega.
O Brasil tem um dos perfis energéticos mais limpos, graças
principalmente às hidrelétricas. Mas o potencial hídrico ainda
inexplorado concentra-se na Amazônia, a construção das barragens ali
enfrenta oposição cerrada. [afinal, uma imensidão das terras localizadas na Amazônia é reserva indígena - o governo Bolsonaro acabou em 31 dezembro 2022, mas, a declaração '‘Hoje, o maior latifundiário do País é o índio’, diz Nabhan', permanece atual e os indígenas são especialistas em cobrar pedágio de tudo.] Ah, há também o etanol, mas a cana sofre a
concorrência dos alimentos pela área plantada. Um desafio adicional
para o país que aceitou o dogma de, também para ajudar a salvar o
planeta, congelar a fronteira agrícola.
As energias eólica e solar vêm em franca expansão, mas não deixam de ter
impacto sócio-ambiental.
Seus custos estão caindo rapidamente, mas a
oferta nem de longe será capaz de atender a demanda imediata.
O mesmo
vale para a energia nuclear. Ou o Brasil acelera a exploração de
petróleo e gás, ou a reindustrialização acelerada continuará confinada
aos discursos e às apresentações.
É provável que, com o tempo, as soluções pragmáticas acabem se impondo, e
o presidente sempre terá à mão o argumento de, afinal, estarmos um
período de transição energética, daí precisarmos usar todas as fontes
disponíveis.
Mas Lula neste tema não joga em casa, não tem com ele a
torcida incondicional dos mecanismos construtores de opinião pública nem
a simpatia da arbitragem.
Mais um detalhe. Em 2014, a acusação de que adversários parariam a
exploração do pré-sal e privilegiariam as energias limpas foi decisiva
na reeleição de Dilma Rousseff.
Agora, Mefistófeles aparentemente veio
acertar a fatura.
A ver se Lula, como Fausto, consegue escapar de ter de
pagar toda a conta.
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