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sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

E Lula dilmou de vez - Percival Puggina

Adivinhe qual a emissora de TV que Lula escolheu para sua primeira entrevista de temas múltiplos após o início de seu governo? Bingo! Acertou de cara, amigo leitor: a Globo News, representada no ato pela indefectível jornalista Natuza Nery, comentarista de política do canal e de quem nunca se viu, em quatro anos, o mais tênue deslize em sua trincheira oposicionista.

Lula falou sobre a necessária aplicação da lei aos que tentaram golpe de Estado, disse que os militares devem tirar a farda para fazer política e prometeu acabar com o desmatamento. E, de repente se pôs a falar sobre Economia. Nessa área ele consegue ser pior do que Fernando Haddad e transforma a estabanada Dilma Rousseff em seu posto Ipiranga.

O jornalista Álvaro Gribel, da mesma Globo, e sobre cuja posição não cabe dúvida, pois considerou serem palavras “de estadista” aquelas com que Lula respondeu as três questões mencionadas acima, criticou fortemente as posições do novo presidente em questões econômicas. Lula considerou uma bobagem a independência do Banco Central, reiterou ser contra a meta de inflação e contra o teto de gastos.

Lula sempre pensou assim. Lá atrás, no começo do século, ele já pensava “que uma inflaçãozinha não fazia mal algum”. Não foi por outra razão, além da inveja que tinha de FHC, que seu partido se opôs ao Plano Real, sem o qual estaríamos até hoje em hiperinflação. E aquela loucura dos anos 90 do século passado começou com alguma inflaçãozinha e descontrole fiscal vinte anos antes.

Para Lula, estabilidade social e fiscal são objetivos antagônicos por causa da ganância das pessoas mais ricas.  
Ao que se acresce uma sentença que deveria ganhar versões em bronze e enviada aos empresários que apoiaram a volta de Lula ao poder: “O empresário não ganha muito dinheiro porque trabalhou, mas porque os empregados dele trabalharam”.

O novo governante tem instalada na cabeça, sobre Economia, uma verdadeira súmula das idéias que deixaram a situação fiscal do Brasil em pandarecos nas mãos de seu partido, mesmo transcorridas suas quatro gestões num dos períodos mais benfazejos em tempos de globalização. Para ele, todo gasto do governo, mesmo furando o teto, mesmo aumentando impostos, mesmo reestatizando o que foi privatizado, mesmo ampliando a inflação, é “investimento”. Gasto, do tipo dinheiro roubado (imagino), é pagamento de juros.

Ele não sabe que juros elevados não são sobrepreço de empreiteiras e fornecedores. 
Eles são pagos a quem usa seus recursos privados para financiar a despesa pública superior à receita. 
Ou seja, juros da dívida são a consequência inevitável da irresponsabilidade fiscal.  
E é exatamente isso que ele vem prometendo cada vez que fala sobre Economia.

Se, como se diz, “promessa é dívida”, as de Lula  fazem isso mesmo: vão aumentar o endividamento do Estado. Em entrevista exclusiva à Globo, como deferência à empresa e prenúncio de tragédia à nação, Lula apontou o caminho do fracasso.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


sábado, 13 de fevereiro de 2016

Um erro caro

A produção industrial terminou o ano de 2015 em um nível 17% mais baixo que em 2010. A política ao setor não só fracassou, como também contribuiu para o rombo nas contas públicas. Os relatórios de estimativas de renúncia fiscal, divulgados em cada início de ano pela Receita, revelam que mais de R$ 130 bilhões podem ter sido gastos para estimular o setor. É difícil dizer quanto custou, mas é fácil saber que deu errado.

Os números vermelhos da indústria se repetiram nos últimos anos, mas em 2015 foi recorde em todas as séries: 8,3% de queda. O Boletim Focus, com previsões do mercado financeiro para 2016, prevê uma nova contração este ano, de 4%. E há números mais pessimistas, como da consultoria Rosenberg Associados, que estima uma contração de 4,5%.

Os dados ficam piores quando se sabe que o governo abriu mão de bilhões em receitas para estimular o setor. Ou seja, ao mesmo tempo em que a indústria desabou mais de 8% no ano passado, as desonerações contribuíram para que o Governo Federal fechasse o ano com déficit primário de 1,9% do PIB e entrasse no atual labirinto fiscal.  O ministro Armando Monteiro Neto me disse em entrevista na Globonews que agora não há mais espaço para aquele tipo de política industrial e que a melhor forma de tentar estimular a indústria no momento é com acordos comerciais que abram mercados. Quando perguntei se a política anterior estava errada, ele admitiu apenas que foi excessiva. Isso, outras pessoas do governo têm admitido: o erro teria sido na dose.

Aqui neste espaço sempre critiquei a política de escolher “campeões” e de beneficiar empresas e setores com renúncias fiscais e subsídios implícitos e explícitos. A discussão se o erro foi da política em si — que é a minha convicção — ou apenas de dose vai continuar, mas os dados favorecem quem critica o que foi feito porque não apenas a produção industrial despencou como foi aberto um rombo sem solução nas contas públicas. O “Valor Econômico” publicou um levantamento que mostra que apenas o subsídio via BNDES para as empresas, seja da indústria ou de outros setores, vai custar ao todo R$ 323 bilhões e pesará sobre os contribuintes até 2060. Apenas o que foi transferido aos empresários entre 2008 e 2014.

Questionada sobre o quanto foi gasto em desonerações ao setor industrial, a Receita Federal respondeu que não tem essa informação pronta. Já o economista e gerente de estudos técnicos do Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) Álvaro Luchiezi Jr. explica que é possível saber o quanto foi estimado com esse tipo de gasto nos Demonstrativos de Benefícios Tributários que o órgão emite no início de cada ano. Somando o que foi previsto ao setor industrial, a conta chega a R$ 135 bilhões entre 2011 e 2015.  — Esse demonstrativo não é um valor exato, apenas o quanto a Receita estimou que iria acontecer. De qualquer forma, as desonerações tiveram um custo fiscal elevadíssimo. A folha de pagamentos, por exemplo, teve custo de R$ 22 bilhões no ano passado e não estimulou o crescimento. Pelo contrário, aumentou o déficit e diminuiu a confiança — afirmou.

O economista Marcos Lisboa, que foi secretário de política econômica do Ministério da Fazenda no primeiro mandato do presidente Lula e hoje é presidente do Insper, há muito tempo vem chamando atenção para o fato de o país não conseguir medir com clareza os resultados, e os custos, de vários programas de incentivo ao crescimento.  — A conta foi ficando bem confusa, com as diversas medidas tomadas e os criativos critérios contábeis que foram sendo adotados. Desde o ano passado há um esforço da Fazenda para acertar os números. Várias estimativas já foram divulgadas, por exemplo, sobre o custo do PSI — disse Lisboa.

Para 2016, a estimativa da Receita é de mais R$ 32,2 bilhões de gastos com desonerações ao setor industrial, um pouco menos que os R$ 33,4 bi estimados para o ano passado. A principal despesa vem com o Simples Nacional, com custo estimado de R$ 16,8 bilhões. Depois, vem o gasto com a Zona Franca de Manaus, com mais R$ 5 bi. Ao setor automotivo, há a rubrica de R$ 1,47 bilhão e mais R$ 748 milhões para o Inovar Auto. Muito foi feito para proteger a indústria, mas estava errado, e por isso não funcionou e custou caro.

Fonte: Coluna da Míriam Leitão - Com Alvaro Gribel, de São Paulo - O Globo
 

domingo, 3 de janeiro de 2016

A sombra que ficou e a certeza que Dilma violou, reiteradamente, a Lei da Responsabidade Fiscal = é uma criminosa

Uma sombra vai continuar pairando sobre o governo Dilma Rousseff este ano: o fantasma das pedaladas fiscais. Elas foram argumento para embasar o processo de impeachment e, por isso, o governo fez tudo para pagar integralmente as dívidas com os bancos públicos na última quarta-feira, mas, ao fazer isso, confirmou as acusações que pesam sobre a presidente.

O pagamento das pedaladas foi feito pelo Ministério da Fazenda como se passasse uma borracha sobre um fato incômodo. As marcas ficaram. Na própria nota do Ministério está dito que aquela montanha de R$ 72,4 bilhões seria paga porque eram “débitos da União junto a estas instituições”. Com isso, o governo derrubou sua própria defesa. O governo disse, e o relator está repetindo para tentar aprovar as contas de 2014, que as dívidas não eram dívidas. Eram um inocente resultado negativo previsto em contrato.

Se atrasar um pagamento de R$ 72 bilhões por um ano não for considerado uma operação de crédito, fica difícil saber o que mais será. O pagamento do Tesouro na última hora aos bancos públicos e ao Fundo de Garantia foi praticamente uma confissão de culpa. A dívida com Banco do Brasil, FGTS, BNDES e Caixa foi crescente no governo Dilma. A dimensão da conta derruba também a tese de que houve o mesmo nos governos Fernando Henrique e Lula.

O governo não tinha alternativa a não ser pagar, porque do contrário seria o segundo ano a terminar com essa dívida pendente. Poderia ser entendido como crime continuado de desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. A mudança quantitativa gerou o salto qualitativo. O que era um simples atraso contratual virou operação de crédito.

No dia 31 de dezembro de 2014, o Tesouro devia cerca de R$ 18,6 bilhões ao FGTS; R$ 20,2 bi ao BNDES; R$ 10,9 bi ao Banco do Brasil. Com a Caixa, ainda havia um débito de R$ 882 milhões. Ao longo do ano, a maior parte da dívida com a Caixa, que chegou a R$ 6 bilhões, já havia sido quitada. Sobre todo esse passivo foi incorporada a atualização monetária. Assim se chegou a R$ 72,4 bilhões. Tudo isso foi pago quarta-feira. Débitos feitos em 2014, carregados por todo 2015 e quitados no último dia útil do ano. Instituições estatais de crédito financiaram o seu controlador. Isso é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Não cabe mais a discussão se é ou não operação de crédito. Eles mesmos o disseram.

O que interessa aqui é que houve violação da LRF, lei que consolidou a estabilidade monetária, estabelecendo travas para impedir o retorno ao passado hiperinflacionário. A decisão do impeachment é política e cabe aos deputados e senadores decidir se esse descumprimento da lei é o suficiente para a interrupção de um mandato presidencial. Do ponto de vista fiscal e orçamentário, contudo, o governo Dilma desrespeitou a lei.

A nota da Secretaria do Tesouro detalha a dívida com cada ente estatal, chegando a R$ 50,7 bilhões. As atualizações monetárias atingiram quase R$ 5 bilhões. A isso se somam as obrigações acumuladas durante 2015 e chega-se à cifra de R$ 72,4 bilhões. A conta única é um colchão formado para rolar a dívida em momento de dificuldade. Não pode ser usada para pagar despesa corrente, segundo garantem os técnicos em questões fiscais. 

Dela foram tirados R$ 70,9 bilhões. Tudo foi pago com títulos já emitidos ou com recursos da conta única. Parte ficará na conta do déficit alargado de 2015 e parte em “espaço fiscal pré-existente”. Parece neopedalada. Além disso, permanecerá o debate sobre se o pagamento, mesmo se for tudo considerado fiscalmente correto, terá apagado retroativamente o crime cometido.

A ideia da lei era de que um governante não terminasse seu mandato com dívidas pendentes para o seu sucessor. O governo pode então argumentar que Dilma é sua própria sucessora e, portanto, não há descontinuidade. Mas aí ficará configurado que é um mesmo governo e o que ela fez em 2014 pode ser cobrado do mandato que ela assumiu em 2015.

Dilma se enrolaria se não pagasse, mas se enrolou também ao pagar. Não havia saída fácil para o labirinto no qual entrou quando decidiu que a esperteza dos truques revogaria as regras da contabilidade. Há muitas dúvidas no ar que ela terá que responder ao longo deste ano que começa.

Fonte: Coluna da Míriam Leitão - Com Alvaro Gribel, de São Paulo